CAPÍTULO 15
"Empatia: ato de se pôr no lugar do outro. Muita gente anda precisando aprender isso. Nunca sabemos pelo que outra pessoa pode estar passando. Uma simples palavra de gentileza pode mudar vidas. Assim como discursos de ódio também podem destruí-las."
Diário de Amélia, 11/06/2019
Amélia
— Você está dizendo que não quer que ela seja expulsa? — perguntou-me Alina Rostchield, a diretora, pelo que pareceu ser a quarta vez.
— Eu não gostaria disso. — eu digo, torcendo para não parecer patética pedindo misericórdia pela garota que me deixara com um olho tão inchado quanto uma bola. — Sei que nós não somos amigas. Contudo, também sei que Astrid é capitã do time de lacrosse e que ganhar uma bolsa na faculdade por meio do esporte é o grande sonho dela.
— Então me deixe adivinhar — Alina balançou a cabeça lentamente, como que acompanhando a minha linha de pensamento. — Você não quer que eu a expulse porque isso significaria arruinar a possibilidade da senhorita Lakshmi de entrar numa universidade renomada. Estou correta, senhorita Ruschel?
— Sim, senhora. — concordei com um aceno de cabeça.
A diretora me olhou por cima dos óculos quadrados, tamborilando a ponta da caneta que segurava entre os dedos na mesa de mogno.
— Entretanto, — ela continuou, parando de bater a caneta na madeira e apontando-a na minha direção. — Como uma boa conhecedora das regras dessa escola, sabe que eu tenho que punir a senhorita Lakshmi pelo que ela fez. O que eu quero muito fazer, considerando o estrago que ela causou sem motivo aparente no rosto de uma das minha melhores alunas.
— É claro, eu não espero que ela fique impune. — me apresso em dizer. — Só não quero que ela seja expulsa.
— Ah, querida. Você não deve ser solidária com quem faz bullying. Afinal, você não quer que ela faça o que fez com você com outra pessoa, quer? — Alina ergue uma sobrancelha ruiva, e sem esperar resposta, clica num botão de seu telefone que faz conexão com o da sua secretária do lado de fora e diz: — Por favor, Lucy, você pode pedir para que a senhorita Lakshmi entre? Obrigada.
— Mas... se ela for expulsa, não vai ser deixá-la sem nenhuma alternativa? — insisto, mesmo sentindo que vou perder a batalha. — Todos os sonhos dela estarão arruinados. O que a senhora espera que ela se torne depois de uma decepção como essa?
No entanto, não consigo obter uma declaração do que ela pensa, porque nem mesmo cinco segundos depois, Astrid abre a enorme e pesada porta do escritório da diretora, parecendo estar meio esverdeada. Olhando de mim para a mulher sentada atrás da mesa no centro da sala, ela aguarda.
— Sente-se, senhorita Lakshmi. — Alina gesticula em direção à cadeira do meu lado. — Eu estive pensando na medida corretiva que tomarei quanto aos seus terríveis atos de violência esta manhã.
Praticamente escorrendo na cadeira, Astrid implora:
— Por favor, por favor, Diretora. Não diga nada aos meus pais. — ela pede, num fiapo de voz, completamente diferente da valentona de hoje mais cedo. — A senhora sabe que eu...
— Silêncio. — ordenou a mais velha, fazendo com que Astrid se calasse. — É inconcebível que você tenha esse tipo de comportamento e seus pais não sejam informados. A respeito de sua punição, para mim está óbvio que deveria ser nada menos que expulsão.
Prendi a respiração, ao passo que a garota de cabelos pretos do meu lado arfou.
— Eu... eu vou ser expulsa?
Alina estalou a língua, obviamente sem paciência para lidar com todo o drama se desenrolando à sua frente.
— Eu disse que deveria. — continuou ela, tirando um formulário de uma pilha ao seu lado. — Mas a pedido da senhorita Ruschel, não farei isso. Ao invés da expulsão, terá de fazer trabalho comunitário na instituição de caridade que patrocino pelos próximos seis meses. Preencha essa ficha com seus dados. É a inscrição para voluntários.
Em choque, Astrid olhou de mim para Alina mais uma vez. Então, com as mãos trêmulas, segurou a folha de papel que a diretora havia estendido em sua direção.
— Obrigada. — balbuciou.
Se não perplexa, eu estava no mínimo surpresa.
Astrid não estudava aqui há mais tempo que eu; chegara dois anos mais tarde. Desde sempre parecera estar acostumada a colocar medo e pressão nas outras garotas e, com seu pavio muito curto, ela era uma pequena terrorista. Não que saísse causando problemas a torto e a direito, porque o Instituto era rígido e ela era bolsista – o que fazia com que fosse exigido dela mais que apenas boas notas.
Contudo, se caso ela se metesse numa enrascada como a que estava agora, eu esperaria dela qualquer tipo de comportamento: raiva, indignação... tudo menos que agisse como se sua bolsa de estudos fosse o que tinha de mais precioso na vida.
Mas agora... a garota que não ligava para nada estava tão pálida quanto alguém que vira a morte bater em sua porta.
— Mas não é só isso. — a diretora prosseguiu. — Será suspensa das aulas durante duas semanas e isso inclui os treinos de lacrosse.
— Duas semanas? Mas eu sou a capitã, não posso simplesmente... — ela não precisou terminar.
— Não seja por isso. Ainda hoje, avise ao seu treinador para começar a procurar entre suas companheiras de time alguém para ocupar o seu lugar. — interrompeu Alina, parecendo bastante satisfeita consigo mesma.
— Mas diretora, eu...
— Sem "mas". Agora, dê um pedido de desculpas formal à senhorita Ruschel.
Astrid soltou um longo e pesado suspiro antes de se virar para mim.
— Eu não deveria ter batido em você. — disse ela, olhando nos meus olhos. Ou olho, visto que eu não podia nem abrir o outro. — Estava com raiva e... acabei perdendo o controle. Desculpe. — falou, por fim.
— Desculpas aceitas — assenti, em voz baixa. O pedido dela não tinha sido as desculpas mais emocionante do mundo, mas ao menos pareceu ser sincero. Eu também não sentia vontade de estender aquele momento por muito mais.
— Muito bem. Amélia, você deveria ir para casa. — Alina falou, levantando de sua cadeira e indo até a porta de seu escritório, sinalizando para que nos colocássemos de pé. — E Astrid, lembre-se de pegar sua folha de advertência com Lucy do lado de fora. Não se esqueça de que está suspensa durante uma semana e que ao voltar terá que trazer essa mesma folha assinada para mim. Veja se para de arranjar problemas. Violência não é a resposta e você não ganha nada de bom com isso.
— Desculpe, diretora. Não vai mais se repetir. — respondeu, atravessando a passos rápidos a porta que Alina segurava aberta para nós.
Esperando de propósito que Astrid saísse, parei de frente a mulher de terninho branco e cabelos ruivos.
— Obrigada, Alina — agradeci.
— Você deveria ser um pouco menos boazinha, Amélia. Pelo seu próprio bem. — ela advertiu, erguendo uma sobrancelha fina. Então, deixando o ar profissional de lado por um segundo, disse: — Vá para casa e ponha gelo nesse olho. Ah, e mande lembranças à sua avó.
— Farei isso. — acenei, indo embora.
fui para casa mais cedo.
não se preocupe comigo, vovô veio me buscar.
Essa é a mensagem que escrevo para Sebastian assim que avisto o carro de vovô entrando no estacionamento do Instituto. Ajeitando a mochila nos ombros, saio pelas portas duplas de vidro do prédio em direção a ele, para que não tenha o trabalho de ficar me procurando.
— Oi, vovô. — digo, deslizando por cima do banco do passageiro.
— Olá, querida. — ele responde, com um pequeno sorriso que murcha e se transforma em careta no exato momento em que vê meu rosto. — Meu Deus, Amélia! O que aconteceu?! Seu olho está...
— Sim, eu sei. — concordei, passando o cinto de segurança. — Houve uma pequena confusão entre duas garotas e acabei sem querer levando um soco de uma delas.
— Mas como assim? Por que você estava no meio? Como acabou saindo desse jeito?
— Não foi muito sério, vô. — tento desconversar. — A menina já até se desculpou. E em relação ao meu olho, com um pouco de gelo e alguns dias vai estar novinho em folha.
— Ah, olhos de mel. — suspirou, chateado. — Você tinha que estar no meio logo nessas horas? Olhe só para você. Deve ter doído um bocado.
Tento sorrir, mas acabo desviando os olhos.
— Que nada. Sou mais forte do que pareço. Vamos embora? — questiono, fingindo olhar algo dentro da minha bolsa para que meu avô não possa ler a expressão de culpa em meu rosto. Detesto ter que mentir, mas detestaria ainda mais falar a verdade e vê-lo arrasado por minha causa.
— Vamos. — ele disse, apertando o botão para ligar o carro. — Sebastian ficou sabendo que você estava saindo mais cedo?
Sinto meu estômago embrulhar. A verdade era que eu podia muito bem ter esperado para vir para casa com Sebastian. Não faltava tanto tempo assim para as aulas acabarem para que eu não pudesse aguentar.
O que eu não podia aguentar era o olhar que vira nele. Aquele que todos que descobriam sobre o passado que tive quando criança me davam.
Eu sabia que era triste e patética, mas saber que todos ao meu redor sentiam pena de mim era um pouco demais para suportar.
— Ele ficou sabendo sim. — confirmei. — Agora podemos ir? Acho que estou começando a sentir dor de cabeça.
— Claro que sim. Chegar em casa você toma um remédio e vai direto para cama com uma enorme bolsa de gelo.
— É tudo o que mais quero. — digo, e então vamos embora.
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NOTA DA AUTORA:
olá, estrelinhas! não sei se vocês perceberam, mas o livro está de cara nova! (vocês gostaram da nova capa? espero que sim porque deu um pouco de trabalho fazer :)
então, vim aqui para deixar algumas coisas claras:
– Amélia passou por uma infância extremamente difícil e violenta que a deixou com um trauma que mais tarde se transformou em um grave problema de ansiedade. Ela não pensa como as demais pessoas que não sofrem da doença. Muita gente ficou chateada por ela não querer se vingar da Astrid pelo que ela fez, mas tentem entender a essência da personagem. Quando se é criado vivendo de certa maneira, você acaba se acostumando com ela. E com Amélia, que viveu ANOS de violência doméstica, não foi diferente.
E sim, ela faz tratamento. O fato de ela conseguir se comunicar com as pessoas já é prova da evolução dela. Contudo, só quem tem ansiedade sabe como é viver preso e a mercê da insegurança e do medo que seus pensamentos te causam. Eu, como alguém que sofre disso, sei.
Se você desconfia que também pode estar tendo crises e desenvolvendo ansiedade, procure ajuda e tratamento para receber um diagnóstico definitivo.
Lembrem-se de que é um problema sério e que não deve ser generalizado!
XOXO,
MABEL.
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