22 - Circunstâncias e Cicatrizes
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Mewhicann permaneceu de pé por mais alguns instantes, os olhos analisando cada detalhe do skatepark. Ainda que a pista estivesse vazia naquele momento, o vento deslizava pelos obstáculos, assobiando de leve entre os corrimãos e ondulando as folhas das árvores próximas. O sol derramava sua luz dourada sobre o concreto, refletindo nas barras metálicas e criando brilhos passageiros que dançavam conforme a brisa soprava.
Não havia dúvidas de que aquele espaço agora pertencia a Akenmyuu, mas a familiaridade de certos aspectos o fazia lembrar de seu filho, outra criança outrora tão destemida e cheia de energia quanto o atual príncipe. Quanto mais pensava sobre as semelhanças implícitas entre Aken e Devim quando pequeno, mais sentia que era como se de certa forma, as lembranças de Devimyuu parecessem mais vivas através dele. Kinmyuu não podia se lembrar de seu irmão, e a existência de Devimyuu não podia ser mencionada até que o Rei Supremo recuperasse suas memórias. No entanto, ainda assim, ali estava Aken, inconscientemente levando adiante o legado de seu tio adotivo, como uma prova silenciosa e imutável de que Devimyuu esteve ali. Mewhicann não podia negar que refletir sobre isso trazia a ele certa paz de espírito.
Sem pressa, ele caminhou até a borda de uma das rampas e, com um leve suspiro, sentou-se ali, um joelho dobrado e o outro esticado sobre a superfície lisa e levemente aquecida pelo sol. O toque do concreto contra suas mãos era sólido e firme, uma sensação que contrastava com os pensamentos que o invadiam.
Mewhicann retirou novamente o antigo diário de seu sobretudo. Queria poder visualizar mais de seu filho se aventurando naquele lugar. Sendo assim, prosseguiu virando algumas páginas aleatoriamente na esperança de encontrar mais um dos relatos de Devimyuu sobre suas conquistas na pista de skate.
Talvez houvesse algo ali, algum registro de suas brincadeiras, ou alguma impressão do que aquele lugar significava para seu filho na época. Até que seus olhos se fixaram em um relato que parecia irradiar uma energia especial. Contudo, foi apenas ao começar a ler que percebeu o tamanho impacto que aquelas palavras teriam sobre ele.
"Hoje foi o dia do torneio mirim de skate. Foi o Kimu que disse que eu devia me inscrever. Eu curti muito a ideia na hora mas quando chegou o dia, eu tava muito nervoso! Passei a semana toda treinando, mas mesmo assim não sabia se conseguiria fazer as manobras direitinho na hora. O meu mano tentou me tranquilizar dizendo que o importante era me divertir e tals, só que não adiantou muito. O Kimu e a mamãe estariam lá por mim, o que era ótimo, mas confesso que eu me sentiria um pouquinho mais confiante se o papai estivesse lá também.
Foi ele quem me deu meu primeiro skate e me ensinou a ter equilíbrio pra andar, me acompanhando na pista de patins, segurando a minha mão e só soltando quando via que eu tava mesmo seguro pra tentar sozinho. E ás vezes que eu caía nem era tão ruim assim porque ele também se deixava escorregar dos patins só pra me distrair do tombo. Eu sei que era de propósito porque o papai sabe patinar desde criança. A mamãe até disse uma vez que ele costumava andar de patins dentro do palácio só pra irritar o pai dele, que dizia que isso não era comportamento adequado para o príncipe herdeiro. Mas aí a vovó dizia que o papai podia fazer o que quisesse e ficava tudo por isso mesmo, hah! Meu pai não fala quase nada do meu avô, mas parece que ele era meio mala e eles não se davam muito bem depois que ele cresceu… Bom, de qualquer forma eu já tenho meu vôdrastro Mewrilin que é super divertido igualzinho o papai, então eu não ligo muito pra quem foi o meu avô Mewthur, ele morreu antes do Kin nascer e parece que ninguém nem sente falta dele mesmo… Mas não deixa de ser engraçado saber que o papai aprontava todas com ele e era meio rebelde.
O Kimu é o melhor irmão de todos e o meu ídolo, mas tem certas coisas que só o papai consegue me fazer sentir 100% seguro, afinal, ele é o nosso pai, né? Por isso eu queria que ele também pudesse vir me ver no meu primeiro torneio de skate.
Mas era impossível porque hoje também era o Congresso Semestral dos Reinos, e o papai, como Rei Supremo, tinha que estar lá. Eu entendo isso. Ele é o governante mais importante do mundo, então claro que tem que ir. Mas mesmo entendendo, queria que ele estivesse na arquibancada torcendo por mim. Eu queria que ele me visse…
Bom, eu tentei desencanar porque logo os jurados iam me chamar pra ser o próximo. Quando finalmente chegou minha vez de entrar na pista, eu tava bem tenso, mas respirei fundo, subi no skate e me preparei. Mas assim que eu entrei eu ouvi! Uma voz conhecida e empolgada, gritando meu nome bem alto na primeira fileira da arquibancada. Era ele! O papai estava lá! Ele veio!
Eu quase caí do skate de tão surpreso! Até olhei duas vezes pra ter certeza de que não tava imaginando coisas, mas era ele sim! Ele estava lá acenando pra mim como o pai mais empolgado do mundo, como sempre sem a menor preocupação com tradições bobas, e não estando nem aí com o que os outros reis e rainhas pensariam dele, porque é assim que o papai é. Ele largou tudo, abandonou aquela reunião chata só pra vir me ver! Porque eu sou mais importante pra ele, porque ele me ama de verdade.
E quer saber? Depois disso eu nem tava mais ligando se eu ia ganhar ou perder. Porque o meu pai estava lá. Ele deixou literalmente todos os outros reis e rainhas do mundo esperando só pra vir torcer por mim.
E na real, eu fiz o meu melhor, mas acabei não vencendo mesmo. Só que o papai nem ligou. Ele me abraçou e fez o maior auê como se eu tivesse levado o troféu pra casa, e sabe de uma coisa? Acho que no final eu até gostei mais assim, porque eu ganhei algo muito maior. Depois ele disse que queria comemorar comigo e com Kimu, então adiou a reunião sem se importar com nada! E o legal é que como ele é o Rei Supremo, ninguém pode discutir com ele, haha! Daí voltamos pro palácio e ele pediu um monte de pizza, refrigerante e sorvete. Alguns colegas de BMX do Kin vieram também, e claro que ele chamou a namorada Elsy e eu convidei a Miz (a Miz é a Anmy, e só eu posso chamar ela assim) que aliás, também tava lá no torneio torcendo por mim. Ela não curte muito essas coisas, mas foi me assistir porque é minha melhor amiga né. E no final fizemos um torneio de videogame também, e acabou que a nossa comemoração foi bem mais divertida que o próprio torneio. Foi um dos melhores dias da minha vida!
"Sério, o meu pai é incrível. O melhor pai do mundo! Eu amo demais ele!"
No espaço vazio da meia página que seguia após o relato de Devimyuu, havia presa com pequeno pedaço de fita adesiva um pouco amarelada pelo tempo, uma foto dele junto a Odimyuus, o abraçando orgulhoso ao final do torneio. A felicidade estampada em seu rosto de apenas doze anos, captada por aquela imagem, não poderia ser descrita em palavras
Mewhicann não percebeu quando sua visão começou a ficar embaçada. Só notou que estava tremendo ao ver uma lágrima despencar silenciosamente sobre a página aberta.
“O melhor pai do mundo.”
Ele não podia discordar. Não podia sentir inveja, nem ciúmes. Pelo contrário... uma parte dele sentia-se profundamente grata a Odimyuus por ter sido esse pai para Devimyuu. Por nunca ter deixado o filho sentir-se sozinho, por tê-lo amado e priorizado acima de qualquer dever real ou tradição sem sentido.
Mas, ao mesmo tempo, era doloroso demais.
Doía porque aquela era uma lembrança compartilhada entre o filho e seu outro pai; uma lembrança que ele jamais poderia fazer parte.
Doía porque Devimyuu nunca soube que de fato havia outro pai no mundo, um que o amava desde o momento em que soube de sua existência.
Doía porque ele nunca teve a chance de estar ali, torcendo por seu filho. Nunca pôde presenciar nenhum de seus momentos, desde os mais simples aos mais importantes como fizera com a sobrinha/filha adotiva Mewstary.
Mewhicann nunca pôde tê-lo nos braços depois de uma vitória ou derrota. Nunca poderia tê-lo levado para casa para comemorar com pizza e sorvete.
E ele nunca pôde ouvir Devimyuu dizer que o amava.
A dor silenciosa rompeu-se em um soluço involuntário, e então as lágrimas vieram de vez, escorrendo quentes por seu rosto. Ele apertou os olhos, deixando o diário cair sobre seu colo enquanto levava uma das mãos à boca, tentando conter o peso avassalador daquele momento.
Ele só queria ter estado lá.
Queria que Devimyuu tivesse tido a chance de conhecê-lo, de saber que ele existia, de saber o quanto o amava.
Mas esse tempo já havia passado. Não importava quantas vezes ele desejasse, não importava o quanto doesse… Mewhicann acreditava que havia perdido seu filho para sempre, e que jamais teria uma segunda chance.
Sem se importar em tentar conter as lágrimas, o Magistrado nem se deu conta do leve tilintar das portas metálicas do skatepark se abrindo, e muito menos do som de passos adentrando que vieram a seguir. Sua atenção só foi captada o tirando do transe de melancolia prestes a engoli-lo quando ouviu uma voz infantil repleta de admiração, empolgação e um pouco de incredulidade chamar seu nome.
— M-MAGISTRADO MEWHICANN!
Akenmyuu mal podia acreditar que de todos os lugares possíveis do palácio, Mewhicann estaria bem ali em sua pista de skate. Seria o último lugar em que ele o procuraria, ou que sequer imaginaria que ele estivesse.
O príncipe apenas tinha ido guardar seu skate, cumprindo o acordo combinado com a avó, no entanto, para sua indescritível surpresa, se deparou com seu mais novo ídolo assim que entrou. Mewhicann estava sentado numa das rampas de costas para a entrada, porém, os cabelos azulados despojados, a postura imponente e o sobretudo preto caindo como um manto sombrio e envolto em mistério sobre suas costas eram inconfundíveis.
— Não acredito! — O ar quase faltava aos pulmões de Aken conforme ele abria um enorme sorriso, se segurando para não correr afoito em direção ao magistrado, contudo, buscando aproximar-se o mais rápido possível — Eu estava procurando o sen… — O príncipe interrompeu seu caminhar rápido, e o largo sorriso que ocupava seu rosto logo se desfez tão rápido quanto surgiu, substituído por uma expressão consternada de preocupação.
A voz infantil e antes eufórica havia cortado o ar como um raio, e o magistrado estremeceu, erguendo a cabeça num sobressalto. Pego de surpresa, Mewhicann levantou-se se virando de supetão, e num reflexo quase automático, passou rapidamente a manga do sobretudo sobre os olhos, tentando rapidamente enxugar as lágrimas dolorosas que mancharam seu rosto, como se pudesse apagar qualquer vestígio de sua vulnerabilidade antes que fosse notado. Mas não foi rápido o bastante.
Akenmyuu parou abruptamente no meio do caminho, pois seu entusiasmo desmanchara no instante em que percebeu a expressão no rosto do Magistrado — o brilho discreto das lágrimas ainda não secas, e a forma como ele desviava o olhar, tentando se recompor às pressas. Aken podia ainda ser uma criança, mas não precisou pensar muito para notar que aquilo não era algo passageiro, não era superficial.
Mewhicann estava triste. Verdadeiramente triste.
O pequeno príncipe se manteve onde estava, a princípio. Hesitante em dar mais um passo sobre o chão liso da pista, como se temesse invadir um espaço que não lhe pertencia. O filhote piscou algumas vezes, processando o que via, enquanto pensava na melhor forma de reagir. Depois de vê-lo em ação nas imagens daquele vídeo, nunca teria imaginado o Magistrado assim. Aos seus olhos Mewhicann refletia uma figura inabalável de força e mistério, alguém que poderia enfrentar qualquer coisa sem hesitar. Mas agora... agora ele estava ali, claramente abalado, tentando esconder as próprias emoções como se não tivesse o direito de senti-las.
E aquilo fez o peito de Aken apertar.
O menino também desviou o olhar por alguns instantes, o peso da vulnerabilidade daquele momento chegando em sua consciência. Há meros instantes tinha em sua mente a imagem de Mewhicann como um dos poderosos heróis que tanto adorava; que sempre salvavam o dia, que seguiam inabaláveis superando toda e qualquer dificuldade em seu caminho, e que mesmo quando tudo parecia perdido, não se deixavam afetar por nada. Contudo, por mais que gostasse de divagar sonhando que em algum multiverso distante houvesse uma pequena possibilidade de seus herois existirem, sabia que aquele não era o caso. Sua mente de apenas dez anos ainda podia ser infantil, porém, empática o suficiente para compreender que não era momento de vê-lo como um herói de seus quadrinhos ou filmes, mas sim como alguém real, com sentimentos reais, e que naquele instante, simplesmente precisava de conforto e não de uma ovação.
O príncipe respirou fundo, e a pequenos passos lentos e cuidadosos, decidiu se aproximar.
— Lorde Mewhicann… — chamou baixinho, num tom bem diferente do entusiasmo inicial. Sua voz agora carregava um tom suave e genuíno, como se quisesse mostrar ao felin adulto que não precisava esconder nada dele.
Mewhicann forçou um pequeno sorriso, uma tentativa de afastar qualquer preocupação do filhote.
— Olá, príncipe Akenmyuu. E-eu… eu só estava... — Ele começou, mas sua voz soou estranhamente rouca, traindo seu esforço.
Aken não precisou ouvir o resto. Ele já tinha visto o suficiente. Ele hesitou por um instante, então, com a delicadeza de quem realmente queria ajudar, deu um pequeno passo à frente e segurou com gentileza num dos braços do Magistrado.
— O senhor... está bem?
Foi uma pergunta simples, mas repleta de significado. Não era uma formalidade vazia, nem algo dito apenas por dizer. Mewhicann podia sentir que foi uma pergunta sincera, carregada de uma preocupação genuína. Aken realmente se importava, porque era assim que ele era.
— Eu…
O felin adulto desviou o olhar por um momento. Ele poderia mentir, dizer que sim, que estava bem, e com sorte, mesmo que não acreditasse, em nome da educação que recebera, o príncipe provavelmente aceitaria sua mentira sem insistir. Mas por alguma razão, diante da pureza daquela preocupação daquele filhote, com seu olhar empático e atento que esperava uma resposta, ele não teve coragem de dizer que estava tudo bem.
Porque não estava.
Mewhicann então apenas soltou um longo suspiro, que respondia aquela pergunta por si só. Sabendo que não precisaria dizer mais nada para que Aken compreendesse, ele apenas se sentou novamente na beirada da rampa, com o olhar distante, observando. Mas não como se olhasse a pista, mas sim algo além dela. Ecos de um passado que ele nunca viveu, deslizando por memórias que não eram suas, refletindo momentos que jamais poderia recuperar.
Aken se aproximou mais um pouco. Ele não sabia exatamente o que fazer, mas sabia que não podia deixá-lo sozinho. Sendo assim, ele se sentou ao lado de Mewhicann na beirada da rampa. Sem dizer nada, apenas ficou ali, permitindo que sua mera existência servisse de companhia, e torcendo para que, mesmo de uma forma pequena, quase irrelevante, aquilo servisse de consolo para o que quer que o Magistrado estivesse sentindo, e para que, quem sabe, ele não se sentisse tão só.
Mewhicann permaneceu absorto, os olhos presos em algum ponto distante que sequer enxergava de verdade. Era como se sua mente se aprofundasse cada vez mais em um oceano escuro de memórias que não lhe pertenciam, mas que agora o afogavam sem piedade. Ele não queria se entregar, mas podia sentir aquele vazio crescendo dentro de si, ameaçando arrastá-lo para um lugar de onde talvez não conseguisse voltar tão cedo.
O pequeno príncipe, ao seu lado, continuou a observá-lo em silêncio. Seu coração apertava ao ver o Magistrado daquele jeito — podia não conhecê-lo muito bem, e por mais que ainda o visse como alguém poderoso e admirável, sabia que naquele momento, ele era apenas uma pessoa. Uma pessoa que estava sofrendo.
E Akenmyuu pôde sentir. Como algo dentro dele, profundo e instintivo. Um chamado silencioso em direção a Mewhicann. Sua sensibilidade vinha em parte dos dons de sua mãe, em sua posição como a Consorte Celestial daquela Era, no entanto, por outro lado partiam da própria índole do príncipe, do coração de um garotinho gentil que não suportava ver ninguém sofrendo sozinho.
Portanto, ele sabia que tinha que fazer alguma coisa. Mas o que ele poderia fazer? O que poderia dizer? Por um instante, hesitou. Até que sem precisar pensar muito mais,seus pequenos dedos se moveram sozinhos, e ele apenas segurou a mão do magistrado.
Foi um gesto simples, mas cheio de significado. Sua mão pequena, porém quente e cheia de vida, contrastando com os dedos frios de Mewhicann. Sem forçar quebrar aquele silêncio necessário, ele apenas entrelaçou seus dedos de leve, como quem dizia: sei que está triste, mas vai ficar tudo bem. E então, em um movimento ainda mais sutil, encostou a cabeça no braço do magistrado, apoiando-se com a delicadeza de alguém capaz de compreender e respeitar a dor do outro sem invalidá-la, mas deixando claro que ela não precisava ser carregada sozinha.
E de repente, como um bálsamo curativo para sua alma, Mewhicann sentiu o transe melancólico se dissipando aos poucos. Ele piscou, com o calor da mão de Aken o trazendo de volta à realidade; um calor que não vinha apenas do toque, mas do significado por trás dele. A força silenciosa de um menino de apenas dez anos, que, mesmo tão jovem, demonstrava uma empatia que talvez poucos adultos teriam.
Os olhos vagos e dourados de Mewhicann caíram sobre o pequeno príncipe ao seu lado, e, por um momento, ele viu outra imagem sobreposta àquela. Outra mão pequena segurando a sua, outro olhar gentil e sincero, outra criança que, mesmo sem saber, o preenchia de amor incondicional.
Seu próprio filho. Devimyuu.
Seu peito apertou, mas não da mesma forma de antes. A dor ainda estava ali, mas algo dentro dela se aquietou, como se aquele simples toque o tivesse puxado de volta antes que ele se afundasse completamente.
Tomado aos poucos por aquela sensação, Mewhicann se permitiu ficar ali, sentindo o calor daquela pequena mão segurando a sua, com a cabeça de Aken apoiada contra seu braço, num gesto tão puro e sincero que parecia quebrar um pouco da escuridão que o envolvia. Seu olhar pairou sobre o menino ao seu lado, e ele enfim pôde ser abraçado pela sensação que tanto necessitava naquele momento: conforto.
Quase sem perceber, seus dedos se moveram, deslizando suavemente sobre os cabelos de Akenmyuu em um afago hesitante no início, como se o próprio Mewhicann não soubesse se tinha permissão para esse tipo de carinho. Mas, conforme seus dedos se enredaram entre os fios macios e luminosos do pequeno príncipe, o gesto se tornou mais significativo e genuíno. Ele não sabia ao certo por quê, mas sentiu a necessidade de retribuir aquele toque com a mesma sinceridade que o recebeu.
Akenmyuu ergueu o olhar, surpreso no início, mas logo se acalmou ao ver o semblante de Mewhicann. O poderoso Magistrado ainda parecia triste, os olhos carregavam um peso que não poderia ser dissipado tão facilmente, mas ali, bem no canto de seus lábios, havia um sorriso. Pequeno, sutil, mas verdadeiro.
— Obrigado, príncipe Akenmyuu. — Sua voz saiu mais baixa do que o normal, mas firme. Havia algo de diferente nela, algo mais brando — Você é um menino muito gentil.
O príncipe piscou algumas vezes, ligeiramente confuso.
— Oh… Não tem de quê, mas… eu não fiz nada demais.
Mewhicann apenas o observou por mais um instante, seus olhos dourados refletindo um pouco mais de brilho, mesmo diante da compreensão que Aken, em sua inocência, ainda não tinha.
— Você fez sim. Fez mais do que poderia imaginar — Foi apenas o que disse, mas seu olhar transmitia todo o resto.
E por mais que Aken ainda não entendesse completamente o que de fato havia feito pelo Magistrado, o filhote sorriu de volta, porque, no fundo, sentia que de alguma forma havia conseguido ajudar.
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