Capítulo 2 - Sou ressuscitado por quatro fadas
— Morte.
Yuna ciciou a palavra e deu dois passos para trás, os soltando abruptamente. Ainda com os braços estendidos permitiu que a fumaça saísse de sua derme.
Os gêmeos mantinham-se muito confusos, mas principalmente surpresos e temerosos. Jungkook recuou e Junghyo manteve-se a sua frente de maneira protetora, desviando os olhos para o caminho que a fumaça seguia.
Se espalhou aos poucos, moldando formas e cores em segundos um cenário de horror foi criado.
Gritos de agonia soaram de repente causando comoção aos súditos presentes.
Haviam pessoas caídas sem vida no chão, o fogo se alastrando primeiro por ele e por novas vítimas, queimaduras e muito sangue dominando o ambiente. O gelo aparecia pelas extremidades, seguindo uma trilha menor, ainda que tão destrutiva quanto, súditos foram petrificados e empalados, a cor vermelha ressaltada pelas gotas caindo ao solo.
Ao final, havia um castelo e uma criança caída em destaque perto da entrada e as duas figuras impotentes se atacando. Lados extremos, os responsáveis pela chacina sendo um aliado do fogo e o oponente um aliado do gelo.
— Se eles viverem, em fogo e gelo, nosso mundo irá ruir.
A fumaça evaporou conforme o silêncio perpetuou em relação a sua sentença. Jungkook tinha ambas as mãos encolhidas contra o próprio corpo, aterrorizado com as imagens, suas pernas tremiam e ele não conseguia desviar os olhos das íris amarelas da ministra. O olhar enfezado dela, por outro lado, não surtiu efeitos no mais velho. Junghyo manteve-se firme à frente do irmão.
Seus míseros quatro anos de vida não permitiam entender a magnitude do que foi mostrado a todas aquelas pessoas e entender de fato todo o susto deles em sua direção, mas pode compreender que Yuna era uma ameaça para ele e o irmão.
— Morram!
— Não!
Yuna ligeiramente empunhou uma adaga e partiu com cólera para cima deles, Junghyo teve reflexo apenas para ir para trás, porém a forte corrente de vento e gelo passando ao seu redor e a figura das fadas em sua frente foi o suficiente para pará-la.
— Os espíritos vão protegê-los mesmo sabendo que destruirão tudo que a gente construiu? — Afastada, ela questionou as fadas e sentiu uma mão em seu ombro.
— Pare com isso, Yuna. São apenas crianças!
Ao tentar desarmá-la, Jisu recebeu um corte profundo na palma. E aproveitando-se da distração, Yuna o empurra com força.
Ela não tinha tempo a perder, os remédios e encanamentos que trouxeram ali não iriam durar muito tempo.
— Não tente me impedir, Jisu!
As mãos de Frost emanam um brilho azul, pronta para atacar e procurou advertir de modo pausado para ter certeza de que foram compreendidas.
— Recomendo que a senhorita fique parada e não tente mais nada. Tenho total autorização para te transformar em um cubo de gelo. Não vamos condenar duas crianças por um show de luzes!
A fúria dominou o olhar da ministra de Goren.
— Este é o meu dom, é a minha função neste mundo: ver o futuro. Eu lhes mostrei a verdade, mostrei o que eu vi e eis o que irá acontecer, tudo será destruído na luta de ego deles! Eles mere...
Naquele instante um raio corta o céu, assustando a todos.
Os gêmeos olharam para trás e viram os raios elétricos passeando pelo corpo de Nara. A rainha se moveu para frente de Yuna em um piscar de olhos.
— O crime de difamação a Coroa é punido com pena de morte. — Ela sussurrou, contendo sua ira para não acabar eletrocutado todos ao redor. — Como sua rainha e mãe das crianças que deseja matar, eu mesma farei a sua execução!
Os olhos de Yuna saltaram quando a rainha levantou a mão, no entanto, o impacto não chegou até ela. Tecidos haviam se enrolado pelo corpo de Nara, sendo afastada. Ainda tentou resistir e só parou quando Halin tocou em seu rosto.
— Nara, se acalme. Tem crianças presentes, nós vamos resolver isso de outra forma. Estão todos assustados, não faça isso na frente dos seus filhos...
Os súditos continham gritos de pavor, encolhidos uns nos outros. Os demais ministros estavam em posição de defesa em relação a Yuna e quem conseguiu desarmá-la foi o ministro de Aseam, o gancho de água passou sorrateiramente por trás dela e pegou o punhal, trazendo para longe.
— Fadas, levem as crianças daqui, a festa acabou. — Kahir decretou, observando a dificuldade que o ministro de Nahen estava tendo em conter Nara com os tecidos. — Nós vamos resolver esse mal entendido.
Jungkook foi agarrado nos braços por Frost. Parecia impossível que um ser do tamanho dela conseguisse segurar uma criança com tamanha facilidade, mas ela e Leaf pareciam muito confortáveis ao voarem com eles para longe dali.
— Vocês sabem o caminho? — Junghyo perguntou, se agarrando ao corpo da fada, estava assustado apesar de voar ser muito legal.
— Não se preocupe, o vento corre por todos os lados. — Laef piscou com um dos olhos e ele assentiu. — Já já estaremos de volta ao castelo.
Jungkook mal percebeu quando Frost o colocou em cima da cama, tirando a coroa de sua cabeça, arrumando os fios escuros para depois recolocar o adorno.
Ele funga ao limpar o rosto com o dorso da mão.
— A mamãe... e se fizeram mal para a mamãe?
— Não, não. Nada acontecerá com a mamãe, Jun. Ela é forte! — O irmão tocou em seu ombro. — Ela vai nos proteger daquela bruxa.
— Querido, precisa ficar tranquilo. — Leaf falou ao começar a sentir a temperatura cair. — Você tem um controle muito forte sobre o elemento que porta.
— Respire fundo, está tudo bem... Nós... — Frost levantou as mãos, vendo-as ficar transparentes, assim como as de Leaf. — Não, não... ainda não!
— Kahir disse que a festa acabou... — A fada do outono recapitulou, arregalando os olhos. — Só tínhamos autorização para ficar durante a festa...
— Fadinhas? — Junghyo as olhou preocupado e Jungkook parecia cada vez mais assustado, o que tornou o clima quarto ainda mais frio. — Fadinhas!
O grito do gêmeo foi abafado pelo transporte. Elas estavam de volta ao refúgio, dentro da árvore mãe, as outras fadas das estações bateram palminhas em um anúncio de boas-vindas.
— Nossa, a de vocês acabou rápido, hein? — Pear, a fada do verão pontuou. — A Flora demorou mais.
— Não é uma competição, Pear. Se bem que o batizado da Sra. Nara foi realmente demorado, durou mais de doze horas. — A fada da primavera apontou. — Sarin me pediu um relatório enorme e-... Por que essas caras?
— Nós precisamos voltar! — Leaf segura o corpo da irmã.
— Voltar? Para onde, hein? — Pear as rodeou, confusa.
Frost concordou.
— Sim, precisamos... Eles não podem ficar sozinhos agora, precisam de nossa proteção!
A fada da primavera franziu o cenho.
— Podem nos explicar o que aconteceu?
Laef segurou em seu braço e a puxou a caminho da saída.
— Explicamos no caminho, Flora. Agora precisamos voltar para Katella!
— Ah, tudo bem, vamos pedir uma audiência e então conseguir autorização. — Pear falou e quando Frost negou, ficou confusa. — Não saímos sem autorização, Frost. Além do mais, Thanhala fica muito longe de Katella, é muito tempo de viagem. Dois dias!
— Para tudo tem sua primeira vez e são dois dias andando, os espíritos estão ocupados agora e vão demorar para aceitar uma audiência conosco. — Argumentou, empurrando a irmã. — Precisamos ir agora, bata essas asas, deixe de preguiça.
— Fácil falar quando estamos na sua estação, hein?
— Pear! — As três a repreenderam em conjunto.
— Ah, tudo bem, mas vocês que se virem para explicar para Naevi depois, hein?
💨
— Chegar atrasados já foi uma ofensa!
— Prever aquilo na frente de todos foi covardia!
— E ainda disseram que ela estava doente!
— Ela tentou matar duas crianças, onde estão os modos de Goren?
— Ministros!
O grito de Kahir foi o suficiente para encerrar a discussão naquele momento.
— Não vamos chegar a uma decisão com vocês apenas acusando.
— Me admira você estar tão calmo, Kahir. — Odara contemplou o irmão. — São seus filhos sendo ameaçados!
— E se eu perder a cabeça, uma chacina começa, governamos com a razão ao invés da emoção.
No fundo da sala, os resmungos de Nara foram escutados, finalmente se livrou daquele maldito tecido encantado.
— Pois nada disso me importa. Eu quero ela morta!
— Nara...
— Majestade, por favor, reconsidere! — Jisu suplicou. — Eu lhe imploro, assim como para você é terrível o que ela fez, matar minha irmã não trará benefícios!
Novas cargas de eletricidade passaram pela derme de seu braço e cerrou os olhos na direção dele.
— Considere que estou sendo generosa, ministro Kim. Eu podia mandar exilar toda a sua família, te depor do cargo! Yuna não vai sair impune disso.
— Vamos acalmar os nervos e fazer como sempre fizemos — Kahir ordenou. — Quem vota a favor da execução de Kim Yuna levante a mão direita e diga em voz alta.
— Apesar de não ser uma conduta comum pelo meu povo, eu Heiko Wai, ministro da província de Aseam, voto para a penalização de Kim Yuna.
— Eu Odara Seth, ministro da província de Thanhala e como tio dos gêmeos, voto a favor da penalização de Kim Yuna.
Jisu suspirou derrotado.
— Eu Kim Jisu, ministro da província de Goren, voto contra a escolha de penalização de Kim Yuna.
— Pois eu, Devon Armin, ministro da província de Farhen, estou mais que a favor da decisão escolhida pela rainha e voto na penalização da subministra Kim Yuna.
— E por fim, eu Lord Tissage, ministro da província de Nahen, voto a favor da execução de Kim Yuna por difamação contra a coroa.
O ministro de Goren demonstrou-se desolado, abaixando a cabeça conforme o resultado se formou. Kahir soltou um suspiro cansado, caído sobre a cadeira da mesa de reuniões, passou a mão pelo rosto, tentando segurar a cólera. O silêncio que permitiu perpetuar foi como uma segunda chance para a decisão ser revogada, entretanto ninguém desistiu.
— Eu não posso acreditar! Muito bem, se estão decididos... não vou compactuar com isso! Governem como animais irracionais mesmo!
Levantou-se e deixou a sala a passos pesados.
Os protestos dos ministros não foram ouvidos por ele, continuou seu caminho até o quarto dos gêmeos pois tinha que verificar se as fadas não tinham os sequestrado.
Kahir não tinha carinho algum por Yuna, porém com uma punição tão grave como essa só traria problemas com Goren, independente de certo ou errado sabia que Jisu protegeria sua família.
A raiva em seu interior pulsava tão forte que se segurou para não sair destruindo as paredes do castelo com socos.
Em pouco tempo chegou ao corredor do quarto dos filhos e o rastro de gelo pelo chão trouxe estranheza. A trilha levava até debaixo da porta e parte de sua extensão também.
Seus batimentos cardíacos perderam o ritmo ao ter que forçar a porta para abri-la.
— Se acalme, Jun. É muito legal ter neve por todo o quarto, olha... podemos fazer um boneco de neve...
— Ela disse que vamos matar pessoas, Hyo... o sangue... ele escorria... — As lágrimas do caçula deslizam pelas bochechas pálidas e chegam ao chão já petrificadas. — Vão machucar a mamãe, Hyo, você não entende!
As estalactites do teto cresceram após a sentença.
— Jun, não vão! Por que não acredita em mim? Me acha um mentiroso?
— O que?! Não, Hyo... quer dizer, às vezes você faz xixi na cama e fala que fui eu, sendo que é o seu lado que está molhado...
— Isso é injusto, eu achei que estava no banheiro... — Cruzou os braços, sendo o único ponto de calor do ambiente. — E-... Baba?
Os passos de Kahir tornaram-se pesados ao ponto de rachar o gelo do chão.
— Cadê a mamãe, baba? — Jungkook perguntou, choroso e se aproximando aos poucos.
— Jungkook, pare com isso! — O decreto saiu severo e tão frio quanto o cômodo, causando medo nos gêmeos.
Kahir nunca havia usado esse tipo de entonação para conversar com eles.
As lágrimas de Jungkook se intensificaram.
— Eu não... eu não consigo, baba...
— Ele não precisa parar, a neve é legal, daqui a alguns dias vai ficar tudo branquinho lá fora porque é inverno, baba. — Junghyo mostrou um sorriso empolgado. — Jun fez nevar em casa, ele é incrível!
— Isso não tem nada de incrível! — O grito os paralisou. Jungkook recolheu o corpo para perto do irmão e a neve dentro do quarto se tornou mais densa. — Eu mandei você parar com isso!
— Não sei como... — Chorou com mais intensidade e uma corrente de vento correu formou-se. — Tô tentando...
— Para com isso imediatamente, antes que você machuque alguém! — O grito saiu colérico, acompanhado de um tapa em seu rosto. Jungkook caiu longe, zonzo pelo impacto e sem forças para levantar.
— Baba! — Junghyo arregalou os olhos, se encolhendo quando os olhos dele caíram sobre si.
O gelo do quarto não diminuiu, o que fez com que ele se irritasse ainda mais e andasse em direção ao gêmeo mais novo. Começou a desferir tapas, chutes e socos no corpo pequeno e vulnerável.
Junghyo imediatamente correu em sua direção, tentando pará-lo.
— Baba, está machucando ele! —
Entretanto, seu corpinho foi empurrado para trás e rolou para longe, mas óbvio que Kahir diminuiu a força para afastá-lo. Seus pequenos olhos castanhos caíam nas mãos cheias de sangue e acompanhavam a trilha nos respingos vermelhos sobre a roupa.
— Baba, para!
💨
Os guardas abriram as portas do calabouço e permitiram a entrada da rainha. Em outras circunstâncias a execução da subministra teria uma data marcada e aconteceria em frente ao público, todavia, Nara não daria tempo para que Kahir e Jisu conseguissem ludibriar os ministros e muito menos permitiria que ela fugisse.
Yuna mantinha-se sentada no chão, presa por correntes de ferro. O suor descendo por seu rosto e os ofegos denunciaram a febre e cansaço.
— Veio me pedir perdão, minha rainha?
As íris de Nara tornaram-se tempestuosas, ainda mantendo as mãos atrás do corpo.
— Em poucos minutos tenho certeza que alguém irá clamar por perdão, mas não serei eu. Sabe, Yuna, sempre quis ter uma oportunidade de acabar com você, desde uns oitenta anos atrás quando sugeriu que eu parasse de tentar ter filhos e entendesse que o clã Jeon terminaria em mim.
— Não havia crianças em seu futuro... você sempre foi seca por dentro...
— Tão seca que dei a luz a gêmeos.
— Você teve dois demônios, isso sim! Desde... des... — Ela teve que respirar fundo, Nara esperou que continuasse. — Desde sempre eu sabia que seus filhos seriam uma desgraça para nosso mundo. A maldição Jeon deveria morrer com você!
A rainha riu, cobrindo a boca com a mão.
— O que você pensou que aconteceria? Eu nunca conseguiria ter filhos e então Kahir teria uma segunda esposa para dar herdeiros legítimos ao trono? Ah, imaginou que por ser do conselho ele escolheria você?
O tom cômico morreu em conjunto com a última frase. Nara uniu o indicador ao dedo médio da mão direita, apontando na direção da cabeça da ministra, sem mais enrolação disparou os primeiros raios.
Os gritos de agonia foram abafados pelo som das faíscas. O corpo de Yuna agora sofre com espasmos no chão, a regeneração tentando trabalhar para mantê-la viva.
— Me chateia que uma riath tão poderosa e talentosa como você tenha escolhido esse destino. Admiro sua força e resistência, mesmo com uma doença crônica ainda tem forças para resistir a um dos meus ataques. — Andou para frente e abaixou, apoiando o queixo dela com o indicador mantendo seus olhos conectados. — Meus verdadeiros lamentos vem em relação ao seu irmão, ele é alguém por quem tenho apreço. Só que não posso te perdoar por ele, não quando ousou ameaçar a vida dos meus filhos.
— Es... está condenan... do... no... nosso... mun-mundo!
Nara abriu um sorriso perante a expressão de medo dela.
— Não, eu estou condenando você.
Yuna arregalou os olhos quando a rainha lhe mostrou a esfera enérgica envolta por raios em sua mão esquerda e sem dar tempo para fugas, Nara a empurrou contra seu peito.
Desta vez todo seu corpo foi carbonizado e reduzido a pó em pouquíssimos segundos.
— Que Saros e Salue te condenem ao exílio das almas, sua vaca.
Nara deixou o calabouço, ordenando aos guardas que juntassem as cinzas e as entregasse para Jisu.
Desceu as escadas da torre com pressa, andando em passos largos na direção do quarto dos gêmeos. Boa parte do castelo ainda estava vazio devido a festa, esqueceu-se completamente de designar alguém para cuidar deles além das fadas.
Ao chegar no corredor, notou o gelo cobrindo o chão e escutou barulhos estranhos em conjunto a voz desesperada de Junghyo. Depressa entrou no quarto, paralisando em conjunto de seu coração com o que presenciava.
Jungkook já estava quase desacordado no chão, enquanto Kahir o xingava e batia nele com seu cinto, o sangue manchava a neve que se espalhou pelo quarto e o primogênito tentava pará-lo.
O grito estridente da rainha o despertou de seu acesso de raiva.
— Kahir!
Puxou o ar de modo brusco, recordando de respirar somente agora. Soltou o corpo de Jungkook e se levantou, passando a mão de forma atordoada pelo cabelo suado. Seu corpo deu dois passos para o lado quando Junghyo o empurrou, ajoelhando em frente ao irmão, temeroso em tocá-lo.
— Jun, Jun... Jun...
Nara entrou definitivamente no cômodo, o corpo tremendo dos pés à cabeça, não pelo frio e sim pelo medo e raiva que a envolveram. Diferente de seu primogênito, o povo empurrão que ela deu no marido o fez cambalear até bater com força na parede, rachando-a.
— Você enlouqueceu?! Me diz o que é que você pensa que estava fazendo com o meu filho?
Atordoado, Kahir reagiu.
— Não ouse levantar a voz para mim, Jeon Nara!
Nara apertou os punhos, contendo sua energia.
— Não ouse você levantar a mão para o meu filho, Kabir Seth. Está se esquecendo quem é a mais forte aqui?
Junghyo soltou um grunhido choroso, interrompendo a discussão.
— Mamãe... mamãe, ele não respira!
O quarto inteiro ficou quente quando comparado ao frio que dominou a alma da rainha naquele instante.
Kahir observou o corpo do filho, o arrependimento crescendo conforme realizou o que havia acabado de fazer.
Nara não hesitou em permitir que a cólera fluísse por suas veias e cercou o pescoço do marido, tão rápido que ele sequer teve como reagir antes de receber uma descarga elétrica poderosa o suficiente para perder a consciência e deslizar até cair no chão.
— Mamãe, o ministro Jisu tem poder de cura, ele pode... ele pode ajudar o Jun! — Junghyo falou para ela, totalmente desesperado pelo estado do irmão.
— Jisu não vai ajudar, Hyo... — Nara negou, colocando a cabeça do mais novo em seu colo.
— Mamãe, eu tentei parar o papai... eu juro... eu tentei...
Jungkook mal respirava, deveria ter inúmeros ossos quebrados e feridas internas. Os médicos do castelo não conseguiriam fazer muito por uma criança à beira da morte.
Sem conseguir controlar, as lágrimas rolaram pelas bochechas da rainha, desta vez o medo turvando seus olhos e a esperança se esvaiu em seu peito. Pela primeira vez sua magia não conseguiria resolver o problema e não havia ninguém no conselho que poderia ajudar.
A única pessoa com esse poder provavelmente se recusaria a ajudar depois de ter condenado Yuna à morte.
— Mamãe, por que você tá chorando? A gente tem que achar um médico pro, Jun...
Com dificuldade a rainha negou com a cabeça, acariciando os cabelos escuros, manchados de sangue.
Junghyo se desesperou com suas respostas, não conseguia acreditar que ela ficaria ali deixando beijos na testa do irmão.
— Mamãe, vamos logo, vamos mamãe! Beijinhos não vão funcionar desta vez... Mamãe!
Ela o encarou, melancólica e com um fio de voz esclareceu:
— Não dá tempo, Hyo...
As palavras atravessaram o primogênito com tamanha força que empalideceu. Desde seu nascimento, o frio nunca havia o incomodado, jamais havia presenciado a sensação de um arrepio. Agora, ele entende que esse gelado em sua barriga não é bom.
Junghyo não consegue compreender como a mãe pode dizer aquilo. Alguém tinha que vir ajudar seu irmãozinho, não havia a menor condição de perder Jungkook. Quem seria seu fiel companheiro? Com quem iria brincar? Quem apazigua o seu calor? Com quem iria fazer névoa? O que faria se o floco dentro do vidro derretesse? Não poderia desistir dele.
No momento em que iria levantar para arrastar o corpo do irmão em busca de ajuda, a janela foi aberta de forma brusca e as quatro fadas adentraram o quarto.
— Pelo espírito do inverno! — Frost tapou a boca, espantada com todo o cenário.
A fada do verão, Pear, pousou perto deles com os olhos arregalados.
— O que aconteceu por aqui? Naevi não vai perdoar, hein? Quem fez isso com ele?
— Baba... ele foi mau... — Junghyo a respondeu, limpando o nariz. — Ele matou meu irmão!
— Não, não matou não. — Ela colocou a mão no peito de Jungkook. — Ainda há vida nele, pouca, mas há, hein?
A intenção dela era passar esperança para eles, mas com Leaf voando de um lado para o outro enquanto gritava teve o efeito contrário.
— O que vamos fazer? O que vamos fazer?
Flora pensou em segurar a irmã, mas se distraiu observando a forma como Frost voava por todo o quarto, aparentemente procurando por algo enquanto anula o gelo com sua magia. Ela parou de repente, sumindo atrás dos móveis e retornou alguns segundos depois com uma muda em mãos.
— Flora, Flora! — Entregou para a irmã. — Faça florescer, vamos aumentar as capacidades terapêuticas.
— Não é melhor tentar chamar Naevi? — Pear perguntou séria. — Já estamos aqui, hein?
— Os espíritos não interferem, Pear. Nem nós deveríamos. — Leaf a respondeu, puxando as próprias penas. — Mas não acredito, não acredito que ele fez isso com o garoto...
— Se acalmem! — Flora pediu, girando o punho conforme seus dedos estavam todos juntos, salpicando sua magia pela planta que em poucos segundos cresceu. — Ótimo, preciso de vocês e de espaço, se nos permitir, vossa graça.
Nara concordou e com muita cautela se afastou, colocando a cabeça de Jungkook no chão e pegou Junghyo nos braços, apertando-o com força.
— Vamos meninas, precisamos salvá-lo. — Flora deixou uma das folhas flutuar sobre o centro dele, enquanto estendeu a mão para Frost.
— Foquem a energia da natureza nele. — Frost instruiu, pegando na mão de Leaf. — Vamos reestruturar o corpo.
— Traremos os ventos até seus pulmões. — Leaf por fim entrelaçou os dedos com Pear.
— Mesmo que os outros não sintam, eu vejo a chama vital nele. — Pear encaixou a outra mão em Flora e assim elas formaram um círculo.
Rodando lentamente, seus corpos projetaram uma aura luminosa iguais às cores dos espíritos guardiões que as regiam. Em feixes de luz as cores se uniram à folha que estava ao centro e aos poucos se transformou em uma flor. Começaram a recitar algo ininteligível para Nara, mas Junghyo entendeu cada uma de suas palavras:
— Oh, chama da vida vinda das estrelas, Saros nosso senhor, criador do fogo, pai do outono e do verão permita que ele floresça, permita que a cura o penetre. — A luz se intensificou e elas prosseguiram. — Ó senhora da morte, que governa os céus e projeta as luas, Salue nossa senhora, criadora da água, mãe do inverno e da primavera, impeça que essa alma transpasse para o outro mundo, guiando-nos de seu coração até a sua alma.
Junghyo tocou sua testa ao sentir um estranho ardor e ao olhar para cima, a lua na testa da sua mãe também havia aparecido como mais cedo na cerimônia.
Flora iniciou o rogatório.
— Irmãos criadores, pelo equilíbrio que os regem, permitam que o poder de Sarin me recubra, dobre e cresça.
Pear continuou.
— Irmãos criadores, pelo equilíbrio que os regem, permitam que o poder de Naevi me recubra, dobre e cresça.
Leaf fechou os olhos.
— Irmãos criadores, pelo equilíbrio que os regem, permitam que o poder de Turion me recubra, dobre e cresça.
Por fim, Frost concluiu.
— Irmãos criadores, pelo equilíbrio que os regem, permitam que o poder de Loriner me recubra, dobre e cresça.
Soltaram as mãos e estenderam para a flor, carregando-a e o corpo desfalecido de Jungkook foi envolvido pelas cores das auras, até as pétalas atravessarem seu peito.
— Pela navegação da água e pela queima do fogo, nós vos rogamos, senhora da Lua e senhor do Sol!
Junghyo se apertou contra Nara, a expectativa cresceu e gritou em alívio ao ver Jungkook puxar oxigênio com brutalidade, como se houvesse acabado de escapar de um afogamento. As fadas continuam repetindo a prece, mas desta vez ele não prestou atenção, estava focado demais em observar a pele do irmão se curar.
Flora ajudou-o a sentar.
— Ah, que bom que está bem!
Leaf começou a passar as mãos por seu corpo, os ventos faziam cosquinha mas tiraram todos os resquícios de sangue até ele estar totalmente limpo. Seu corpo tremia um pouco e Pear ficou próxima, criando uma chama que o aqueceu.
— Podem nos explicar o que aconteceu? — Frost voou para próximo da rainha e limpou Junghyo, ajeitando seu cabelo e limpando suas lágrimas. — Ele já está bem, querido.
— Baba ficou bravo porque o Jun fez gelo no quarto e não conseguia deixar de fazer. Jun, tentou, tentou mesmo!
— Eu acredito, pequeno. Vocês têm dons da natureza, a manifestação da magia acaba sendo física e difícil de controlar, geralmente toda magia age em reação às nossas emoções, mas é importante aprender a canalizá-la.
— Frost está certa, o poder de vocês dois só irá crescer e precisam aprender a controlar como a mamãe. Mesmo que agora seja complicado, hein?
— Acho que podemos ajudar com isso. — Leaf procurou pelo quarto, conforme Frost terminava de descongelá-lo. — Eu nem sabia que isso seria tão útil, devo dar parabéns aos ministros. Pear, consegue cortar um pedaço de cada? Vou precisar que Flora crie luvas para mim.
— Claro, hein! — Aqueceu as superfícies do bastão metálico rúnico até derreter um pouco e Leaf segurar com dois pequenos furacões.
— Aqui está querida. — Flora entregou dois pares de luvas a Laef que deixou o metal cair e impregnar o tecido.
— Certo, Frost e Pear, é o elemento de vocês.
— Uh, certo! — Frost pegou o seu par, adicionando um feitiço de gelo nele, como Pear fez com o outro par. — Isso vai ajudar a conter a magia e impedir que ela saia como hoje, mas lembrem-se, a magia de vocês irá crescer em conjunto, precisam mesmo ir atrás do controle por si mesmos.
— Obrigado... — Jungkook murmurou, permitindo que a fada colocasse as luvas em suas mãos.
— E muda de cor, viu? — Flora comentou orgulhosa. — Assim sempre vai combinar com a roupa que estão usando, também nunca ficam sujas e crescem junto de vocês.
— É muita gentileza, obrigado pelo presente e principalmente por terem salvo meu irmão. — Junghyo agradeceu depois de Pear se afastar.
— Estou realmente agradecida por tudo que fizeram por eles... — Nara se pronunciou, a voz carregada pela vontade de chorar.
— Não precisa agradecer, tudo está bem quando acaba bem, Nara. — Leaf falou, ajudando Jungkook a andar em direção a mãe.
Ele pediu colo e Junghyo abriu espaço e os braços, envolvendo-o em conjunto com a mãe.
Pear pairava em cima de Kahir, olhando com uma incógnita e não pode deixar de perguntar.
— Que momento lindo, mas o que vamos fazer com ele, hein?
— Frost deveria apagar as lembranças dele. — Flora sugeriu. — Tudo que conseguir.
Nara crispou os lábios.
— Na verdade, se puder, gostaria que apagassem a memória de todos. Apagar tudo que Yuna disse e fez.
As fadas se entreolharam ao escutar o pedido. A primeira a negar foi a própria Pear.
— Sinto muito, vossa graça, mas não podemos. Como Leaf disse, não poderíamos sequer estar interferindo agora, os mestres não sabem que estamos aqui.
Flora tocou o ombro da irmã.
— O que a Pear está tentando dizer, majestade é que apagar a memória de todos seria interferir no destino de todos. Não podemos apagar a memória do batizado e também não podemos dizer um porquê mais amplo.
— Mas eu ainda posso apagar a memória sobre esse acontecimento. Kahir nunca irá se lembrar que Jungkook perdeu o controle dos poderes e nem que a senhora o atacou.
Leaf pairou entre eles.
— Acho que seria bom apagar a dos gêmeos também. Esse evento é bem traumático...
— A nossa não... — Junghyo protesta.
Frost o ignorou por enquanto, voando em direção ao rei e tocando em sua testa. A pele foi superficialmente envolvida por uma camada de gelo e quando ergueu a palma, puderam ver os fios incandescentes saindo.
— Perto de Loriner, minha magia é limitada. Mas consegui bons resultados, vamos levá-lo para o quarto e Flora vai arrumar o estrago na parede, assim ele vai pensar que logo que deixou a reunião foi beber e caiu no sono. Vamos aos príncipes.
Rapidamente estava em frente a Jungkook e jogou a esfera de gelo maciça para que Pear queimasse as memórias.
— Acho que o frio não vai te incomodar. — Ele concordou e fechou os olhos quando o tocou, ela se afastou abruptamente, encolhendo os braços. Não tem como apagar nada nele. Há uma barreira que mesmo Loriner pode não conseguir passar.
— Tente o esquentadinho. — Flora apontou e Frost obedeceu, tocando em sua testa e se afastou em seguida, decepcionada.
— Definitivamente eu não consigo entrar na cabeça deles.
— Não tem problema, vocês já fizeram muito. Posso cuidar de tudo daqui em diante.
— Você é muito gentil, majestade. Leaf, leve Kahir até seu quarto e Flora adiante o conserto da parede.
— Certo, Pear!
A fada do outono envolveu o rei com fortes correntes de vento e saiu pelo corredor o carregando e Flora passou a restaurar a parede.
Frost cuidou de organizar o quarto para irem mais rápido. Nara se ajoelhou no chão, descendo os gêmeos de seu colo, Jungkook ainda parecia muito assustado e Pear notou. Ela pousou em sua frente, pegando segurando a sua mão e esboçando um sorriso.
— Não tem problema estar assustado e com medo agora. A magia assusta mesmo, mas há grande beleza nela também. Seus poderes vão crescer muito e conseguirá fazer coisas muito incríveis, irão além do floquinho de neve que deu de presente para o seu irmão. Ela não é sua inimiga, é parte de quem você é. — Passou a arrumar os fios de cabelo dele, acariciando o rosto bonitinho. — Você é um menino muito lindinho e meninos lindinhos não abaixam a cabeça, hein?
Jungkook riu, agradecido.
— Terminei, pessoal. Precisamos ir, ou vamos levar bronca. Deixamos o refúgio sem autorização e temos muito o que fazer, o inverno acabou de começar. — Flora declarou, mantendo as mãos atrás das costas e ficou grata de Leaf ter voltado.
Pear continuou parada, estendendo a mão para Junghyo tocar.
— Cuidem um do outro, está bem? Vocês são opostos, mas ainda se completam. Não deixem que nada interfira na conexão de vocês, ou teremos que voltar aqui para dar bronca, hein?
— Vou cuidar dele, prometo, senhorita Pear.
— Sim, também prometo cuidar do Hyo.
Ela abriu um sorriso satisfeita, deixando um beijo rápido em cima de suas cabeças e se afastou ficando ao lado das irmãs.
— Muito obrigada, por tudo que fizeram agora.
— Disponha, vossa graça!
💨
Nara ficou grata por suas damas enfim terem chegado e pediu ajuda com o banho dos gêmeos. Junghyo tagarelou sobre tudo que vinha a mente e Jungkook seguiu em silêncio, absorto em todas as lembranças daquele dia. Ainda recordava de cada uma das súplicas feitas para seu pai e segurou o choro, permitindo que as moças o vestissem como se fosse um boneco, reagindo somente quando sentiu uma urgência por usar as luvas.
Elas os deixaram sozinhos depois de servir uma janta reforçada.
— Foi tão legal conhecer os espíritos, não acha, Jun?
— Sim, eles são incríveis, Hyo.
— Qual presente mais gostou? Sinceramente, amei todos, não sei qual escolher.
— Gostei da concha que os pais da Nora deram.
— Sim! Incrível... será que um dia consigo imitar essa magia com as minhas chamas? — Diferente de Jungkook, Junghyo deixou as luvas de lado, gostava de brincar com sua energia a todo momento.
Jungkook apenas concorda e se encolhe na cama.
— Estou tão feliz que está aqui, Jun. Eu pensei que você fosse me abandonar...
O caçula arregalou os olhos e segurou a mão do irmão com urgência.
— Nunca vou te abandonar, Hyo. Não conseguiria nem se quisesse muito, nem se você continuasse roubando metade das minhas sobremesas.
Antes que pudesse abraçar o irmão em agradecimento, escutam batidas na porta antes que esta fosse aberta. Imaginaram que seria Nara, mas na verdade, era Halin acompanhada da filha.
— Meninos, desculpem, pensei que Nara estivesse aqui.
— Nora! — Jungkook abriu um sorriso, descendo da cama quando ela correu em sua direção e deu um abraço. — Você não estava na festa.
— Tive dor de barriga... — Ela explicou, abraçando Junghyo também. — Feliz aniversário!
— Bom, acho que posso deixar ela com vocês um pouquinho, volto depois, está bem? Se comporte, mocinha.
— Pode deixar, mamãe!
— Nora, deixa eu te mostrar o que papai me deu! — Junghyo a puxou pelo braço, em direção ao seu baú de brinquedos.
Halin os deixou e voltou a procurar a melhor amiga. A encontrou dentro dos templos depois de rodar praticamente o castelo inteiro.
— Como eu te procurei. Não sabia que costumava fazer preces nesse horário.
— Não costumo, hoje foi demais para mim, Halin.
— Ah, querida... — Abriu os braços para ela e o convite foi aceito. — Vai ficar tudo bem, nada do que Yuna disse vai acontecer e vamos conseguir contornar tudo isso.
Nara negou com a cabeça, voltando a chorar.
— Quase perdi meu filho... Kahir descontou toda frustração em cima de Jungkook e ele quase morreu... se não fosse a ajuda das fadas ele teria partido, seria morto pelo próprio pai...
Halin não compreendeu a princípio, mas deixou que ela chorasse antes de pedir por explicações. Sua função agora era ser o porto seguro que a rainha precisava.
— Coloca tudo para fora, estou aqui com você.
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Eu chorei muito escrevendo esse capítulo. Principalmente conhecendo a realidade do nosso país, onde diariamente crianças são agredidas pelos pais em prol da educação e do amor, e sei o quanto isso está enraizado nas pessoas quando vejo os comentários em outra história minha chamada "Recém Casados", onde basta uma criança não ter o gênio mais agradável do mundo devido a uma situação X que as pessoas chegam a dizer que o pai deveria dar ele pra adoção.
Eu estou falando sobre isso aqui, porque é realmente uma questão acerca da nossa realidade, violência infantil é algo aceito no nosso país e praticamente romantizado.
O coitado do Jungkook estava tendo um descontrole emocional, aqui eu não retratei como a famosa "birra", mas ele estava assustado, refletindo pulsões que não conseguia controlar e foi agredido para que parasse, é claro que aqui ficou mais exagerado por conta da fantasia, o Kahir além de adulto, o poder dele é a força mesmo, tipo a Luisa de encanto, sabe?
Este foi oficialmente, o primeiro trauma da vida do Jungkook, que daqui muitos anos, quando acontece a história de RDN que os leitores da Mixys e meu conheceram vai fazer parte da construção dele como uma pessoa insegura, depressiva e com a visão distorcida sobre ele mesmo.
Passando deste tópico, não sou a favor da pena de morte não, mas considerando a época né... Yuna foi de base.
Espero que tenham gostado de conhecer as fadinhas, elas não vão aparecer tanto por aqui mais por enquanto.
Um beijinho e obg aos 100 votos que já alcançamos na história, até o capítulo 3, amo vocês ❤️🩹
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