Refugiado mirim

I

Enquanto fitamos

A imagem – absurda sinistra cruel

Pedimos – pela falta total de palavras – íntima e fortemente

Por um milagre: que o menino – deitado de bruços na beira do mar

desperte e saia correndo na areia da praia, ele esteve apenas

brincando de faz-de-conta

                      de esconde-esconde    

                       de morre-morre.


II

Aguardamos incrédulos.


III

São tantas as homenagens:

O menino com asas de anjo

O menino no céu

Brincando na areia, no mar, com um barquinho de papel

O menino nas mãos de uma onda do mar

Acalentado nos braços de um anjo alvo altíssimo

O menino barrado frente a um muro farpado

Com uma rosa na mão.


IV

São tantos Aylans*, meninos, meninas, bebês, curdos, sírios, yasidis, afegãos, eritreus, nigerianos, meninos ciganos refugiados do Kosovo, iraquianos, paquistaneses, somalianos, malineses, congoleses, ganeses, meninos rohingyas refugiados de Mianmar, nepaleses, sul-sudaneses, senegaleses, haitianos, os esquecidos jemenitas, guarani-kaiowá, terenas, crianças índias do Mato Grosso do Sul.


V

Inocentes, ultrajados, atormentados . Anjos envoltos em lágrimas e dor.


VI

O menino na praia, dormido na areia, morto no mar

O menino na areia, jazido ao relento, morto sem lar

          deveria estar dormindo em seu berço quentinho

                                       aconchegado

                                        bem longe dos braços do mar.


VII

Emudecemos

Não mais adormeceremos

          sem o olhar mareado

(a memória clara, o coração tranquilo, o ninar leve)

          fixo na imagem incrustada – estranhamente

estampada em nós.



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*Alan Kurdî (Kobanê, 2012 – Bodrum, 02.09.2015), refugiado sírio mirim registrado na Turquia com o equivalente Aylan; e foi assim que o seu nome chegou a nós.


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