Side Story #3
↳ ❝ [ H I S A O & A M A Y A ] ¡! ❞
Capítulo Especial
3 de 6
Itálico, memórias
Um passo de cada vez, um dia após o outro.
É dessa maneira que Hisao Ishihara passou a maioria de seus dias desde a infância, o filho único de uma pequena família de produtores locais da região de Hyogo, aprendeu desde cedo o ofício do trabalho. Enquanto a maioria das crianças gastava o tempo livre brincando, ele acompanhava os pais nas plantações cuidadas pela família, ajudando da maneira que podia.
Apesar de não reclamar e sempre fazer o seu melhor, os momentos favoritos eram quando parava para ver a mãe e a avó cozinharem para alimentar os trabalhadores do dia. Um alimento simples para sustentar o corpo durante o resto do trabalho, mas feita com carinho.
Suas memórias mais felizes eram de quando estava na cozinha. O gosto e curiosidade pela culinária o fez seguir esse caminho como se não houvesse outra opção. Ficar horas testando receitas, treinando corte com facas e estudando comidas do mundo fazia com que cada dia fosse único. Ainda em época de curso arrumou um estágio numa padaria próxima à faculdade, além de ganhar algum dinheiro extra também podia vivenciar desde cedo a rotina de uma cozinha profissional.
Sua família já estava praticamente aposentada, os avós já haviam partido, assim como seu pai. Ele na casa de seus vinte anos apenas tinha a mãe com quem se preocupar, a mais velha — forte —, repleta de vigor, o deixava livre para praticar suas vontades. Por esse motivo, era comum o ver aproveitando a cozinha do trabalho fora do horário de serviço, sempre começando horas mais cedo.
O cheiro doce ocupava a cozinha logo pela manhã, o ambiente estava quente pelos fornos trabalhando. Normalmente ele seria repreendido, mas mesmo não dando certo, suas receitas faziam um belo café da manhã para os funcionários.
Naquele dia o resultado não foi como o esperado, o gosto estava bom, mas ainda não tinha o encanto que estava buscando na receita. Enquanto apoiado com os braços no balcão, tinha os olhos fixos no caderno surrado de receitas batendo a ponta do lápis de maneira ritmada. Como se encarar a lista de ingredientes, lhe dê alguma resposta.
— Chegou cedo Ishihara — uma voz de mulher fez com que ele erguesse a cabeça. — Deu errado de novo?
O questionamento veio de uma de suas colegas, uma atendente simpática que costumava opinar sobre as suas invenções de maneira sincera. A garota começou a trabalhar algumas semanas antes dele, e sendo uma dupla de novatos eles acabaram por se aproximar rapidamente.
Com um suspiro, Hisao ajeitou sua postura, bateu as mãos no avental e cruzou os braços.
— Errado não — rebateu desviando o olhar para a assadeira —, mas ainda não está do jeito que eu quero.
A colega, que tinha a sua idade, se aproximou apoiando os cotovelos na mesa de metal no centro da cozinha. Seus olhos brilharam com curiosidade analisando as criações recém tiradas do forno do futuro chefe de cozinha.
— Estão bonitos pelo menos. Posso experimentar?
Hisao levantou a mão para o pescoço — Claro, mas estão longe do que realmente deveriam ser.
Ele não iria admitir em voz alta, mas repentinamente surgiu certa antecipação em seu peito, esperando para ver sua reação. Na primeira mordida um resmungo positivo, e então um franzir de testa.
— Certo, eu entendi o que você está tentando fazer — ela disse limpando o canto da boca —, e tenho certeza que seu problema está na canela. Eu tentaria usar canela-de-ceilão ao invés de canela-cássia.
Surpreso pelo comentário, Hisao a encarou por alguns momentos. — Como você sabe o tipo de canela que eu usei?
Com o rosto corado pelo olhar intenso, a garota abaixou a cabeça desviando de seu olhar.
— Gosto de pesquisar temperos, é um passatempo.
— Isso é uma novidade — respondeu o garoto.
Do outro lado da sala, ela tinha as mãos no próprio avental passando o laço pelas costas a fim de voltar a o amarrar na frente.
— Não tenho um paladar tão afiado quanto ao seu — confessou —, só sei o tipo de canela que usamos na loja por cuidar do estoque às vezes.
Ela se virou ajustando o tecido — Mas tenho confiança o suficiente para dar uma sugestão.
Seus passos a levaram para perto de Hisao, mais precisamente para os rolinhos de canela que supostamente deram errado perto dele. — Mude a canela e terá o resultado que quer.
— É isso, ou não me chamo Amaya Sasaki. — Com um piscar de olho ela passou pelas portas duplas, mordendo o segundo pãozinho e desaparecendo para a frente do estabelecimento com um aceno.
O rapaz ainda encarou as portas por onde ela passou por alguns momentos. Só então tendo as orelhas rompendo num vermelho intenso que fez até mesmo sua nuca ficar quente. Não entendendo o porquê de ficar tão afetado com uma simples piscadela.
Ainda atordoado, se inclinou na mesa e anotou no pequeno caderno de receitas a sugestão de Amaya, desenhando ao lado uma estrela para chamar a atenção.
No próximo teste, teria certeza de oferecer os rolinhos de canela para a garota novamente.
Talvez esse tenha sido o momento em que realizou o real motivo de cada pequena ação da garota o deixar completamente desfigurado. Nada no mundo o fez mais feliz do que ver a garota aprovando a sua receita. Hisao faria qualquer coisa para continuar vendo o sorriso que surgia quando ele lhe apresentava alguma comida nova.
Os encontros vieram de maneira tímida, com o pretexto de ajudar com o conhecimento de temperos e quando menos esperavam, a comida já não era o principal. O deleite vinha da companhia compartilhada, das frases e risadas, ingredientes de uma receita que apenas poderia acabar em amor.
Amaya estava lá quando ele se formou, quando decidiu pular de restaurante em restaurante aprendendo mais do que a escola de culinária poderia ensinar. Ela, que manteve seu passatempo sobre pesquisar temperos, sempre foi a primeira a encorajar Hisao a seguir o caminho que quisesse, independente do que os outros falassem.
Foram dois anos entre namoro e casamento, e menos do que isso para terem a primeira grande mudança. A chegada dos gêmeos, Hideki e Hayato.
Era uma sorte que Hisao estava acostumado a fazer várias tarefas na cozinha ao mesmo tempo. Dessa forma, lidar com dois bebês em simultâneo foi um pouco mais fácil do que o esperado.
A notoriedade do homem como chefe cresceu e então veio a segunda mudança, o próprio negócio. Os anos juntando dinheiro e procurando o sócio ideal valeram a pena, os negócios foram um sucesso. Pode ter demorado um pouco para se fortalecer, mas nunca foi um prejuízo.
Com tudo estabelecido e com os gêmeos mais velhos, a notícia. Voltariam a ter um bebê em casa, e dessa vez uma menina.
— [Nome], sou seu favorito não é?
Hayato, agora com quatorze anos, se sentou ao lado da irmã que desenhava com giz colorido numa folha branca no chão. Os dois pequenos lacinhos em sua cabeça se mexeram quando o irmão a chamou, seu rosto redondo com bochechas coradas quase o fez esquecer o motivo de ter corrido até ali.
— O que é favorito? — Questionou sem dar muita importância, voltando a pintar a cabeça da figura de palito no papel de laranja.
O irmão cruzou os braços e pegou dois gizes da caixa — Se eu for o giz vermelho e Hide o azul, qual você prefere?
— Não acredito que ainda está nisso — Hideki veio para se sentar do outro lado da pequena, encarando o gêmeo como se ele tivesse quatro anos, não [Nome].
Brincar com as cores pareceu chamar a atenção da menina, sem se preocupar com o significado por trás daquelas palavras, alcançou o giz de cor azul sem pensar, usando para fazer bolinhas na folha. Imediatamente causando um choramingar exagerado em Hayato e fazendo um sorriso surgir no rosto de Hide.
— Ah, pare de rir Hide, você disse que não ligava! — Hayo levantou de uma vez apontando para cara do gêmeo.
— Isso significa que não posso ficar feliz de ser o irmão favorito? — o mais velho dos irmãos Ishihara 's colocou a mão na cabeça da caçula.
Da cozinha Amaya escutou por cima a conversa, achando uma situação divertida demais para deixar de lado. A mulher limpou as mãos no avental e então andou até a sala onde os três filhos estavam.
— Do que estão brincando?
— Mamãe! — [Nome] levantou, se apoiou em Hayo para pular suas pernas e correu aos tropeços até a mulher que a pegou no colo beijando sua bochecha. — Hayo disse que é um giz vermelho.
— O quê?
— Não foi bem assim — ele se jogou no sofá com as mãos para cima. — Eu disse que se eu fosse um giz vermelho e Hide um azul, qual [Nome] preferia.
A mais velha andou para o sofá se sentando e soltando [Nome] no chão, que voltou a se concentrar no desenho. Hayo levantou a cabeça e deitou na perna da mãe, ganhando um afago nos cabelos.
— Por que [Nome] precisa ter um favorito? Você consegue escolher entre [Nome] e Hide?
— [Nome], com certeza — respondeu.
— Digo o mesmo — Hideki também disse se inclinando para desenhar com a pequena.
Amaya deu risada — Certo, entre mim e seu pai, então, consegue escolher?
Dessa vez a resposta não veio.
— Pode preferir a minha companhia para fazer os deveres, e seu pai para acompanhar nos jogos de vôlei. Não quer dizer que um seja melhor que o outro, tenho certeza que [Nome] gosta de vocês dois.
— Mas eu queria que ela gostasse mais de mim — reclamou com um bico. Amaya apertou a bochecha do filho de leve, que riu e segurou a sua mão sobre os olhos. Dos três, Hayato era o mais afetivo, sempre buscando algum tipo de contato. Nisso reparou que Hide e [Nome] estavam cochichando.
Alguns segundos depois, a pequena [Nome] levantou com uma folha de papel, entregando para Hayato em seguida. Olhando por cima, viu ser um desenho dos três, com ela no meio, Hayato e Hide um de cada lado.
— Para mim? — Hayo disse com a voz embargada, se sentou no sofá segurando a folha contra o peito a abraçando. — É um tesouro!
— Não, é um desenho.
Para alguém tão nova certamente [Nome] sabia usar bem as suas palavras, Amaya riu quando o filho do meio se inclinou para apertar a irmã entre os braços, recebendo risadas e pedido para a soltar em seguida.
Sabia ter sido uma ideia do mais velho, ainda que ele provocasse o gêmeo, Hideki era extremamente sensitivo em relação aos dois irmãos mais novos. Sempre fazendo de tudo para ficarem bem. Ela então esticou a mão, acariciando os cabelos de Hide com um sorriso carinhoso, reconhecendo seu gesto de gentileza. O filho, muito parecido com ela, também respondeu silenciosamente com um sorriso.
— 'Ayo' me solta — a pequena [Nome] empurrou seu rosto. — Preciso desenhar mais.
Por fim, os três ficaram desenhando, Amaya os observando do sofá. Até mesmo ela ganhará uma folha com o que parecia um jardim desenhado com ela na frente. Agora trabalhavam juntos num retrato de família, cada uma das figuras era feita de uma maneira diferente. Os traços de Hide eram precisos, Hayo fazia mais detalhes do que realmente precisava, sem esquecer da bola de vôlei. [Nome] trabalhava nas flores e até Amaya chegou a colaborar desenhando a pedido da caçula os bolinhos favoritos que o pai fazia.
Quando Hisao chegou da padaria naquele dia, se deparou com a família inteira envolta a pequena mesa de centro da sala, folhas e materiais de desenho para todos os lados. O cansaço de passar horas na cozinha, depois no escritório desapareceram no mesmo instante.
— O que estão fazendo? Tem lugar para o papai? — ele deixou o casaco na porta e se aproximou.
Colocou as mãos apoiadas nas costas do sofá, uma de cada lado da esposa, se inclinando em seguida para deixar um beijo em sua testa, recebendo um "bem-vindo de volta" sussurrado.
— Não é para ver ainda! — [Nome] disse se debruçando no desenho, o deixando levemente confuso.
— É um presente — Amaya explicou tombando a cabeça para trás a fim de ver o marido —, a pequena resolveu dar desenhos para todos.
— Pronto!
[Nome] se levantou, subiu no sofá com a ajuda de Hayato usando seu joelho de degrau e pegou das mãos de Hideki a folha. A mãe ajudou ela a se equilibrar até chegar ao pai que a tomou no colo por cima do encosto.
— Vamos ver — Hisao ajustou a folha. A família estava desenhada com cada um de uma maneira, era uma bagunça. Com todas as coisas que os meninos gostavam, comidas voando, bolinhas e flores em lugares que não faziam sentido. Porém, representava bem a atual família Ishihara.
— Eu adorei, obrigado.
O desenho ficou por anos guardado dentro de um caderno, sendo reencontrado apenas depois de alguns meses da mudança para Tóquio, quando Hisao um dia se sentou no chão do escritório e resolveu organizar suas receitas antigas. Por ficar sozinho na maior parte dos dias da semana, ter as cinco figuras de palito presas na geladeira dava algum conforto.
A chuva caía do lado de fora, hoje era uma das poucas ocasiões em que o hotel concedeu uma folga. Após ter uma viagem seguida da outra, sem descanso, sua própria casa parecia estranha. Pela primeira vez em algum tempo o Sr. Ishihara se permitiu dormir até quase o horário do almoço, dormindo além do comum.
Talvez a última vez que fizera um horário como esse, foi enquanto cuidava de sua esposa acamada. Durante os fins de semana, ele cuidava de Amaya durante a noite, e os filhos a olhavam pela manhã enquanto tirava algumas horas para dormir. As madrugadas eram repletas de silêncio, apenas se certificando que ela ainda estava respirando enquanto mantinha sua mão entre as suas. Nos dias em que não estava sob o efeito dos remédios que tiravam as dores, trocavam algumas palavras, sempre lembrando do passado.
Apesar de tudo que aconteceu depois do acidente, Amaya sempre procurou preparar a família para o que viria depois, era como se ela soubesse exatamente qual seria seu fim. Pedia para não se culparem, para não guardarem ressentimentos, e principalmente para continuarem. Viver não apenas por eles, mas também por ela.
Com as mãos apoiadas no balcão da cozinha, Hisao respirou fundo, levantando ambas mãos para o rosto. É difícil se acostumar com a casa vazia. Hayato foi para o outro lado do mundo, Hide estava começando sua própria família e [Nome] estava recuperando a juventude posta de lado.
Claro que ele ficava feliz por ver suas crianças bem, mas de alguma forma, também se sentia ficando para trás.
Nesse instante, ele escutou a porta da frente se mexer e vozes soarem abafadas pela chuva logo em seguida.
— Anda Hide, você não é pequeno.
— Calma, estou com sacolas também.
A luz que estava apagada se acendeu repentinamente, revelando um grupo de visitantes inesperados para um sábado de manhã.
— O que está fazendo parado no meio da cozinha, pai? — Hideki foi o primeiro a aparecer, colocando algumas sacolas de supermercado na mesa. Sendo seguido pela noiva, Ichika, que batia em suas costas reclamando pela demora forçada.
Por último, [Nome], Kiyoomi e a amiga Taya.
— Com licença Hisao-san — a ruiva se curvou com um sorriso, tendo o colega de classe também fazendo o mesmo em seguida.
— Aconteceu alguma coisa? — [Nome] perguntou colocando a bolsa na bancada, olhando para ele preocupada.
Hisao negou com a cabeça e esfregou os olhos — Não, suponho que a chuva me deixou um pouco melancólico.
— Estava chorando? — Hide perguntou.
— Não — o pai respondeu de maneira teatral, balançando as mãos alongando mais as sílabas do que o necessário. — Por que não me avisaram? Me sinto envergonhado de me mostrar para convidados em pijamas.
— Avisamos — Ichika riu —, mas provavelmente não viu seu celular ainda. Pelo menos esse traço de Hayato sabemos de onde veio.
— Culpado.
Hide começou a tirar as coisas das sacolas — Liguei para o hotel ontem, me disseram que já tinha saído e que hoje estava de folga. Faz tempo que não nos encontramos, achei ser uma boa oportunidade, [Nome] também não tinha nada para fazer.
— Ei — reclamou se posicionando do outro lado—, não fale assim. Só não tínhamos nenhuma atividade oficial da escola para atender.
— Mas realmente não tínhamos nada programado — Kiyoomi comentou —, Hide-kun está certo.
— De qual lado você está afinal?
— Ah é um desenho da [Nome]? — Taya comentou olhando para a geladeira tentando aliviar o assunto.
— Sim, achei recentemente — Hisao colocou água para esquentar. — Me faz companhia.
— Que fofo — Ichika se aproximou. — Olha o Hide!
— Como sabe que fui eu que fiz? — a pergunta foi direcionada a amiga ruiva, mas a resposta veio de outra pessoa.
— Você ainda desenha igual.
— Calado, Ace-kun — A namorada o empurrou de leve com os ombros enquanto o restante riu.
O silêncio de uma manhã chuvosa foi imediatamente tomado por uma casa viva, novamente cheia, mas com pessoas diferentes. Ainda assim, família.
N/A: Obrigada por ler até aqui.
Como eu disse no começo, esses especiais são pra ficar de sorriso no rosto. Uma boa oportunidade de ver como era a família antes, e avançar no tempo.
Espero que tenham gostado dessa pequena visita as memórias do Hisao e da Amaya.
Até a próxima, Xx!
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