Capítulo 17 - Sob a sombra do destino

Arthur já estava mais aliviado, Melanie havia dormido logo após fazer o último curativo, os anestésicos naturais que a mãe lhe ensinara a usar estavam fazendo efeito, respirou fundo cansado, limpou o suor do rosto e a cobriu gentilmente, teriam de trocar os lençóis pela manhã, não iria acordá-la agora, pegou uma cadeira e sentou exausto, pegou o livro que tinha caído no chão com a pressa, colocando-o sobre a cama ao lado do travesseiro de Melanie.

Olhando mais uma vez para Melanie que repousava com uma respiração pesada, Arthur decidiu que finalmente poderia descansar, recostou na cadeira, deixando-se cair, sua cabeça pendia para trás no alto, tentava em vão acalmar os pensamentos dos últimos acontecimentos. Ali no silêncio da respiração de Melanie poderia sentir a dor da perda, da forma que não deixou-se sentir antes de tê-la de volta, lágrimas escorreram por seu rosto, descendo em direção as orelhas encharcando seu cabelo, pela primeira vez em muito tempo, Arthur não reprimiu nada, deixou-se chorar como fazia quando criança quando ainda tinha sua mãe para consola-lo.

***

Quando acordou com uma voz que o chamava, Arthur sentiu seu pescoço doer, tinha dormido de mau jeito naquela cadeira e sentia-se ainda pior depois da noite terrível que tivera, a única coisa que o consolava era ver Melanie repousando a sua frente.

"Vamos, Arthur, eu fico com ela. Você deve ir."

Não tinha escutado o que Ben dissera antes, ir? Para onde eu deveria ir agora, afinal? Não compreendeu a princípio, mas quando virou e viu a expressão de Ben, entendeu. Aquele dia seria o enterro de Dom.

Sentiu-se mal, olhou para si mesmo, teria de trocar de roupa antes de encontrar a todos no funeral, olhou para Ben novamente.

"Você não..."

Não terminou a frase, sabia que não importava o que ele dissesse, Ben não iria ao funeral de Dom, aquilo doía muito mais nele do que em qualquer outro a não ser Marion e seu pai, podia ver pelas bolsas de insónia embaixo de seus olhos pela noite não dormida, levantou da cadeira, foi até Mel e acariciou sua face, viu machas de lágrimas e lamentou por elas. Parou novamente antes de passar pela porta olhando para trás, Ben sentou-se na cadeira que Arthur havia dormido e ficou ali imóvel olhando Mel com pesar, Arthur sabia exatamente o porquê.

***

A partir daquele momento nada mais seria fácil, assim que Arthur veio desesperado chamar por Merlin, pois Melanie se contorcia de dor, já tinham uma ideia do que teriam de fazer. Merlin não o deixou entrar, pedindo para voltar ao quarto de Melanie que logo iria a seguir, fechou a porta capturando um olhar de rendição de Melanie, finalmente chegara a hora em que teria de assumir de vez o papel de Teresa.

Juntos saíram seguindo rápido pelos corredores, ao chegarem no quarto de Melanie, entraram e encontraram o ambiente um tanto cheio, Ben e Arthur tentavam conter a jovem Melanie que se contorcia na cama, Doris estava por perto, devia ter tentado trocar os lençóis antes de Melanie começar a se contorcer, quando a viram ao lado de Merlin, Ben não entendeu o que ela estava fazendo ali a olhando com uma expressão hostil, já Arthur quando a viu ofegou surpreso.

"Merlin, o que significa..."

Era Ben quem inquiria.

"Afastem-se os dois agora."

Merlin falou em um tom que não deixaria ninguém questionar suas ordens, Ben e Arthur se afastaram relutantes, indo para trás, passando por Melanie que permanecia com a cabeça baixa, Merlin tocou a testa da jovem Melanie e sussurrou para somente Melanie que estava a seu lado ouvir.

"Ele a envenenou. Agora entendo o porquê de ter de usar esse feitiço, você sabe o que isso significa."

Olhou para ela aflito.

"Sim, sei exatamente o que significa, parece que meu destino já estava escrito, afinal."

"Mel... você ainda não sabe se algo pode mudar..."

"Não, mas sei o que terei de fazer agora e as consequências disso, você também sabe, não podemos evitar, você não pode fazer esse feitiço precisamos de você, somente eu posso cura-la, ironia não acha, ter de trocar minha vida por mim mesma."

Sorriu, estava começando a se conformar, empurrou Merlin para o lado delicadamente, abaixou até estar próxima de sua orelha e pronunciou uma única palavra.

Troca.

O feitiço da troca, um feitiço muito poderoso que passaria todas as enfermidades de uma pessoa para outra, não era um feitiço de cura exatamente, pois dependendo do que fosse, condenaria a pessoa a qual o executou. Merlin e Melanie sempre evitaram esse feitiço, deixando-o para ser usado em último caso, mas depois de Melanie contar suas lembranças e de como fora curada por Teresa, os dois tiveram a certeza que esse era o único jeito de salvá-la, afinal Kaled tentará matá-la mais uma vez a envenenando, Melanie lembrava de sentir a adaga penetrar sua pele e agora podia sentir a mesma dor novamente, pois assim que pronunciou a palavra, sua carne foi cortada nos mesmo lugares ao qual estavam os ferimentos de sua jovem versão.

Respirou fundo, estavam preparados para isso, enfaixaram seus pulsos, tornozelos e perna antes na esperança de impedir que o sangue escorresse até Merlin executar seu feitiço. Erguendo-se com esforço, Melanie se afastou, indo em direção a Merlin, Arthur se aproximou de Melanie que agora estava imóvel, respirando levemente sobre a cama. Melanie desejou que tudo acontecesse mais rápido queria sair logo dali manter-se impassível perante a dor física que sentia estava se tornando uma tarefa agonizante.

Estava tão dispersa que não notou Merlin mencionar o nome Teresa, até ele chamar a sua atenção dizendo que já estava na hora de irem, Melanie ainda conseguiu acenar para si mesma e desejar melhoras.

Assim que passaram pela porta, teriam de ser rápidos, Melanie não sabia por quanto tempo iria aguentar, quando estava quase perdendo a consciência, alguém veio a seu encontro, era Arthur que os seguira, queria respostas, Melanie virou-se para ele encarando seu rosto no momento em que sua consciência a deixou.

***

Se despedindo rapidamente, Arthur saiu atrás de Merlin e Teresa, queria algumas explicações, pois Merlin não contara nada sobre Teresa, nem o porquê de ela estar ali, o porquê de ser ela a curar Melanie, os alcançou rápido, estavam andando devagar.

"Merlin, eu preciso saber..."

"Agora não temos tempo, Arthur, por favor, temos de ir."

Merlin já ia se virando para ir embora, quando Teresa que estava de costas para Arthur finalmente se virou, somente para revirar os olhos e tombar para frente em um desmaio, Arthur a amparou antes que batesse no chão.

"Vamos depressa, já que está aqui, por favor me ajude a leva-la até minha sala."

Fazendo o que lhe fora pedido, Arthur pegou o corpo em seus braços, a sensação de carrega-la lhe pareceu familiar, o peso e tamanho muito similares aos de Melanie. Chegaram rápido a sala de feitiços, Merlin indicara que a colocasse sobre a cama, assim que Arthur se afastou um pouco Teresa abriu os olhos e se contorceu em agonia, da mesma forma que Melanie fizera mais cedo.

Arthur se assustou por um momento quando viu sangue escorrendo por seus pulsos e tornozelos, nos mesmos lugares onde Melanie fora ferida e ficou ainda mais aterrorizado quando Merlin puxando a capa de Teresa revelou ao levantar seu vestido uma faixa completamente vermelha, encharcada de sangue, exatamente no mesmo lugar onde cuidara do ferimento de Melanie.

"O que significa isso, Merlin...?"

"Sinto muito, jovem Arthur, você não deveria estar aqui para ver."

Merlin então se aproxima do ferimento com uma adaga na mão, Arthur quis protestar, mas não pode dizer nada, olhou abismado para Merlin que retirou as faixas e cortava a carne ensanguentada com a adaga, riscando a pele ferida como uma folha de papel, formando um símbolo feito de sangue, assim que Merlin terminou, Teresa se acalmou parecendo adormecer, os ferimentos pararam de sangrar, mas não sumiram como os de Melanie, principalmente o da perna, que agora além de tudo estava com um símbolo riscado de forma macabra, Merlin sentou em uma cadeira exausto, ainda com a adaga manchada na mão.

"Como... por que ela tem os mesmos ferimentos de Melanie?!"

Arthur perguntava, já temendo a resposta, no fundo talvez já houvesse entendido, sem Merlin nada dizer, continuou.

"Não, não pode ser. Ela não pode... por que faria isso por Melanie? Por que passar essa dor para si mesma?"

"Arthur, se acalme por favor, não posso lhe dar as explicações de que precisa, Teresa é a única que pode. Terá de confiar em mim... terá de confiar nela."

Sua voz soava cansada, nunca Merlin parecera tanto com um velho quanto naquele momento. Arthur não aceitaria fácil ficar sem uma explicação, mas estava cansado e uma urgência de cuidar dos ferimentos de Teresa o dominou, sem dizer mais nenhuma palavra buscou pelo aposento por faixas limpas e ervas que pudesse usar, se ajoelhando em silêncio começou a limpar o sangue e trocar as faixas.


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