Capítulo 44
AURORA
— Michael Belizardo. — Sussurro ao notar seu nome adornado em prata na sepultura.
Aprendi que existem coisas que o tempo não cura. Apenas torna mais tolerável de lidar.
E uma dessas coisas é a Dor.
Dizem que o luto tem cinco estágios: Negação; Raiva; Negociação; Depressão e Aceitação. Mas no meu caso foi um pouco diferente. Foi tudo misturado e bagunçado. É algo que nem eu mesma sei ao certo como explicar.
Algumas coisas são assim na vida. Não sabemos explicar, então, apenas sentimos.
Tento afastar a lembrança da última vez em que estive aqui. Do que passei.
Já faz tantos meses desde então.
Com passos lentos me aproximo do seu túmulo, enquanto sinto pedregulhos em meus pés, um nó já começa a se formar em minha garganta, mas o afasto.
Coloco a rosa que peguei no meio do caminho em seu túmulo. Me sinto um pouco culpada por não tê-lo visitado mais vezes, mas procuro não pensar muito nisso enquanto encaro sua sepultura.
A memória de ontem a noite passa como flashes na minha mente. Não me arrependo de nada, pelo contrário, então, com murmúrios, eu falo sobre meu namoro com Patrick, sobre a Star, e sobre minha amizade com Laura que cresce cada dia mais. Cada detalhe. Conto tudo. Nada mais que uma conversa entre pai e filha.
Para mim sempre será assim. As lembranças que tenho dele são apenas boas, porque ele era uma boa pessoa, acho, que, a melhor pessoa que conheci. Ele era um bom pai, um bom profissional, e um bom marido.
— Não vim aqui reclamar ou desabafar sobre minha vida. Eu só quero que saiba que está tudo bem. Pela primeira vez em muito tempo está tudo bem — Sinto lágrimas quentes adornando meu rosto à medida que eu profiro as palavras. Mas não são lágrimas de tristeza; são de saudades. Saudade e nostalgia de um tempo que não vai mais voltar. Dos momentos que eu não posso mais vivenciar.
— Mas, pai, não quero lembrá-lo com tristeza, pelo contrário, quero lembrá-lo com carinho e alegria... — Fungo, com minha voz expressando um turbilhão de sentimentos — Quero me lembrar de todos os momentos em que tivemos juntos e saber que foram bons. Você fez deles assim.
Sempre vou me lembrar de Michael. Da sua voz. Do seu rosto. De tudo. Mas agora não com tristeza ou dor por te perdido ele tão jovem, mas, sim, com amor e gratidão por todos os momentos bons que tivemos.
Nossa família sempre o lembrará pelo o homem que meu pai era. Eu sempre me lembrarei. E quando eu envelhecer e tiver filhos eles também saberão. Não importa quanto tempo passe, sempre estará em meu coração. Ele pode não estar mais vivo nesse mundo, mas eu posso senti-lo dentro de mim.
Agora eu eu compreendo que não foi culpa do meu pai ter falecido, muito menos minha. Sei que a vida não é justa. No entanto, eu prefiro acreditar que tudo acontece por um motivo.
Em algum momento, levanto meu olhar para encarar o céu que está em um tom de azul suave, nuvens adornam todo o lugar agora.
Eu não sei quanto tempo se passou, mas fico apenas assim, e parece ser o suficiente. Dou um último suspiro conforme me afasto de sua sepultura. Entrelaço às mãos em frente ao corpo e saio do cemitério.
Já estou em movimento quando vejo uma figura conhecida entrar no local.
CAIO
É fim do alvorecer quando resolvo ir ao cemitério ver meu falecido pai. Não vim aqui nenhuma vez desde o velório.
Para algumas pessoas é assim. Elas fingem que a dor não existe para poderem seguir em frente, mas isso não faz com que a dor seja menor, pelo contrário, isso vai se acumulando e quando você vê não há nada além de dor e tristeza em seu coração. É por isso que temos que encarar nosso passado de frente.
É um sacrifício até mesmo ver a fotografia do meu pai. Mas,eu preciso da sua companhia. Acho que sempre vou precisar.
Eu me sinto tão culpado por não ter vindo aqui antes. Me sinto culpado por todas as vezes em que discuti com meu pai por motivos bobos, em que fui egoísta, e me comportei feito uma criança e o deixei falando sozinho, quando ele só estava preocupado comigo. E agora ele não está aqui nem para sequer brigar comigo...
Eu queria tanto que ele estivesse aqui.
Mas ele não está. Isso me parte o coração. Meu pai, que sempre foi meu herói, não está mais aqui.
— Aurora? — Murmuro ao notar minha irmã perto da sepultura de Michael — Não sabia que estava aqui.
— É.. Eu acabei resolvendo dar uma passada. — Ela me lança um olhar de carinho e compreensão — Vem comigo — Minha irmã estende a mão que eu acabo aceitando.
Algo dentro de meu peito se abre e afunda quando dou passos lentos pelo local. Encaro o túmulo de meu pai enquanto minha irmã fica ao meu lado, me apoiando.
Contudo, não consigo impedir as lágrimas quentes que agora descem pelo meu rosto. Coloco a palma na mão na frente do meu rosto para que minha irmã não me veja dessa forma. No entanto, ela afasta minhas mãos.
— Tudo bem chorar. Não é uma fraqueja — Ela sussura e passa as mãos pela minha costa — Pessoas fortes também choram.
É fácil fingir que estou bem, na escola ou quando saio com meus amigos, mas ha dias em que esse sentimento é esmagador, e não consigo lidar, mesmo que não demonstre isso, não significa que não sinto. Afinal sou humano. Apesar desse sentimento já não ser tão recente... ele ainda assim é doloroso. Mas estou tentando, por ele e pela minha família, eu juro, estou tentando.
Tenho tantas coisas para dizer, mas nada sai da minha garganta. Estou assim por muito tempo. Parece que todas as palavras foram arrancadas de meu peito quando soube da notícia que ele sofreu um acidente e não resistiu. Acho que não apenas as minhas palavras, mas, também, meu próprio coração.
Negar a dor não faz com que ela fique menor, aprendi da pior forma, só piora tudo. No começo venho a negação, depois o luto, que foi silencioso e doloroso; mesmo que eu tenha minha mãe e minha irmã, na maior parte do tempo, me senti sozinho e triste. Depois pensei que estava bem, mas não estava. E agora... tudo está indo no seu devido tempo. Entretanto, em meu coração sempre vai ter um vazio pela falta que meu pai faz.
Esse espaço só ele ocupa.
Às vezes, penso que tudo isso é um sonho, eu gostaria que fosse, assim eu poderia acordar um belo dia e ver que meu pai continua vivo e tudo voltaria a ser como antes.
Mas sei que isso não vai acontecer.
Mas não estou mais triste, estou apenas com saudades e nostalgia. Talvez esse sentimento nunca passe, não de verdade, e nem sei se quero que passe... só estou com medo.
Sinto os braços da minha irmã rodearem meus ombros em um gesto de solidariedade.
— Está tudo bem — Aurora murmura — Eu estou aqui com você.
Por algum motivo, acredito em suas palavras. Passo o polegar pelas lágrimas quentes enquanto minha irmã me abraça. É a primeira vez, depois de tanto tempo, que me permitido chorar.
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