Capítulo 15
AURORA
Acordo esfregando os olhos, ainda sonolenta quando escuto um ruído vindo da janela. Fico em silêncio a fim de escutar melhor, novamente o mesmo barulho. Já escutei isso antes...
Será que é o meu irmão de novo?
Levanto-me da cama, acendo o abajur e vou em direção à janela. Tomo cuidado para não tropeçar nos sapatos e roupas espalhados pelo chão. Encaro a paisagem abaixo e sinto a brisa acariciar meu rosto e cabelo, o que me faz suspirar profundamente.
— Caio...? — Murmuro enquanto encaro o breu noturno.
Meus olhos se ajustam à escuridão. Observo uma figura masculina se espreitando ali. Patrick está todo de preto, de modo que a própria escuridão aparenta ofuscar-se. Continuo olhando para o menino lá embaixo para ter certeza de que é real.
Será que estou sonhando? O que ele está fazendo aqui?
Patrick parece perdido... Abalado.
O garoto de cabelos negros fez um gesto silencioso, que se assemelha a um "Posso entrar?" Assinto com a cabeça em sinal de confirmação.
Patrick sobe o pequeno muro que há embaixo e entra pela mesma janela que usou para arremessar pedrinhas há poucos minutos atrás. Ele para a poucos centímetros de mim, o suficiente para que eu possa perceber sua respiração quente roçar meu rosto. Ao sentir o cheiro mentolado, inconscientemente tento o gravar em minha mente.
— O que você está fazendo aqui? — Pergunto, tentando não parecer muito assustada.
Está no auge da noite.
— Eu... Não sei. Só queria ir para qualquer lugar e acabei vindo para cá. — Patrick murmura — Ele leva as mãos ao cabelo negro levemente bagunçado — Eu consigo enxergar você lá de fora, mas nunca cheguei a entrar... não até agora.
Sinto minhas bochechas corarem, pois geralmente eu ando pelo meu quarto apenas com um camisetão.
— Como sabe que eu moro aqui? — Pergunto ao levantar às sombrancelhas.
— Eu não moro longe daqui. Nós seguimos o mesmo caminho para escola, e um dia eu te vi entrar nesta casa.
Devo estar com muito sono ou ficando completamente maluca por permitir que ele entre assim em meu quarto, mas não é hora para pensar nisso.
Abro passagem para ele. Patrick se senta silenciosamente na cama, faço o mesmo ao seu lado. Ele observa cada detalhe do quarto, que é visível apenas pelos finos feixes de luz da lua. É a segunda vez que Patrick está aqui em casa, mas ele nunca entrou em meu quarto.
Por um momento, ficamos apenas em silêncio. Com o sono esvaído viro o rosto de lado para encará-lo melhor. Sem perceber meu olhar desce até a cicatriz, que agora adorna seu pescoço. Não me contentando, levo a mão a ela, tocando-a. Patrick solta um suspiro trêmulo quando minha mão toca sua pele, como se isso tivesse algum efeito sobre ele. Recuo um pouco ao notar o que estou fazendo.
— Por que você está agindo assim? — Patrick pergunta em um murmuro aflito.
Solto um suspiro à medida que o encaro, não consigo desviar a atenção de seus olhos profundos.
— Assim como? — Indago, mesmo que saiba exatamente do que ele está falando.
— Diferente... tem algo de errado.
Patrick se aproxima mais de onde estou. Encaro seus olhos aflitos diante do tom... e da urgência. Como se o modo como eu agisse o afastasse e isso o machucasse.
— Como você conseguiu a cicatriz?
É tudo o que eu consigo perguntar. No fundo, só quero que Katie esteja errada, que ele não tenha feito o que ela falou.
— É por causa disso? — Patrick aponta para a marca — Você acredita no que eles estão dizendo sobre mim?
Não digo nada e ele encara isso como um sim, o que faz algo como mágoa lampejar em seus lindos olhos. Sinto meu coração diminuir, mas continuo em silêncio enquanto encaro um ponto distante.
— O que quer que eu diga? — Pergunto ao abraçar meus joelhos.
— Você quer a verdade ? — Patrick pergunta de modo retórico — Depois de um silêncio duradouro ele continua — Aquele dia... que estávamos ao telefone eu escutei vozes alteradas. Foi aí que eu desliguei para ver o que era.
Patrick faz uma pausa antes de continuar.
— Minha mãe e meu padrasto estavam na sala discutindo. Ele nos ameaçou de morte e iria atacar minha mãe, mas eu entrei na frente... E ele acabou me acertando. — Ele aponta para a cicatriz — Não me arrependo do que eu fiz. E não ligo para o que as pessoas dizem sobre isso. Mas você...
Sinto minha boca ficar seca à medida que Patrick profere as palavras. Tento disfarçar o choque, mas não consigo esconder o arrepio que desce por minha coluna. Se isso é verdade... porque ele não desmentiu os boatos na escola?
É por isso que ele faltou três dias na escola. Provavelmente, ficou com medo de deixar a mãe sozinha caso o padrasto retornasse a procurá-los.
Por um momento, me sinto horrível por ter acreditado que Patrick é realmente perigoso. Eu sabia que não era o que eu estava pensando. Mas a voz de Katie ficava reverberando por minha cabeça, e isso fez com que eu não pensasse direito.
— Por que você não disse a verdade para as pessoas? — Pergunto um pouco confusa.
Patrick ainda me encara com aquele olhar profundo. Eu quero dizer... dizer que eu acredito nele, que desde o começo eu acreditei nele.
— Pra quê? Não iria mudar nada. As pessoas acreditam no que querem acreditar.
Ele me olha. De verdade. Seus olhos com um brilho significativo, parecem querer dizer algo.
— Você está com medo? — Pergunto, repentinamente.
— Não por mim, mas por ela. — Ele se refere à mãe.
— Sabe o que eu faço quando estou com medo?
— O quê? — Ele arqueia as sobrancelhas.
— Olho o céu e observo as estrelas. Tá vendo aquela? — Falo apontando para um aglomerado de estrelas — Aquela é o Pássaro Branco. Está vendo sua forma? — Patrick balança levemente a cabeça conforme encara o céu escurecido — E aquela — Digo apontando para o outro lado — Aquela é o Meteorus. Parece uma pedra se você olhar bem. — E aquela… — Aponto para a estrela mais brilhante ao topo — É a estrela Acima. Ela fica no topo de todas.
Depois de uma pausa continuo.
— Quando eu olho para as estrelas me lembro que não somos nada. Nossos problemas não são nada. Somos apenas uma pequena parte de algo muito maior e melhor. E que não importa o que aconteça, sempre terei um caminho de volta para casa.
Inspiro e expiro o ar, saboreando a brisa serena da noite. Olho de soslaio para Patrick e percebo que ele também está me encarando. Há um brilho em seus olhos e sua boca está entreaberta. Sinto seu hálito frio em minha pele. Com sua respiração entrecortada, tento afastar a sensação de queimação que desce pela minha garganta.
Patrick se aproxima mais e toca minhas bochechas. Fico paralisada diante do toque repentino e encaro aqueles olhos agora suavizados. Meu coração é um amontoado de batidas frenéticas dentro do peito. Apenas nos encaramos profundamente, como se isso bastasse.
Ele afasta carinhosamente a mão do meu rosto, voltando a olhar para às estrelas. Em silêncio, faço o mesmo. Apenas observando, sentindo e respirando...
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