Capítulo 3



— Os chuveiros são individuais, não são? — minha mãe indagou após eu pedir para ela dar uma desculpa e me livrar da tutoria naquele dia, depois de me lembrar que teria educação física.

— São, mas... você sabe que eu não gosto de tomar banho no vestiário — confirmei encarando o painel do carro. "Como é possível ela não entender isso?"

— Augusto, eu sei que é difícil, mas você tem que reaprender a viver como todo mundo. Você vai ficar bem. — Senti sua mão pressionando o meu ombro. — Se eu não tivesse certeza disso, seria a primeira a querer tirar você daqui.

— Eu vou passar vergonha, mãe... — sussurrei de olhos fechados, imaginando o que aconteceria.

— Não vai. Tenha confiança em si mesmo e lembre que o Mike vai estar lá com você. — Ao ver que seus conselhos não estavam surtindo efeito, ela completou: — Se tiver algum problema, ligue pra mim e eu virei correndo. Mas primeiro tente, está bem?

— Certo... — murmurei me sentindo derrotado.

— Ei. — Ela me puxou para um abraço. — Eu sei que vai ficar tudo bem. Acredite em mim. É intuição de mãe.

***

Desisti de tentar comer depois de vinte minutos brincando com a comida.

— Cara, você tá bem?

— Estou. — Com um dedo, empurrei a bandeja para longe de mim.

— Já que você não vai comer isso, passa pra cá.

— Para de comer, garoto! — Com um tapa, Rox fez Mike recolher a mão que estendia para a minha bandeja.

— Ai! Isso dói, Rox! — Olhou para ela com uma careta enquanto massageava a mão agredida. — Eu tô fazendo um favor ao meio ambiente evitando o desperdício de comida!

Como não estava com ânimo para conversar naquele dia, levantei e comecei a recolher minhas coisas.

— Aonde você vai? — Rox questionou enquanto eu vestia o blazer do uniforme.

— À biblioteca. Vejo vocês daqui a pouco.

Devolvi minha bandeja e segui pelo longo corredor na direção oposta à biblioteca. Nunca tive a intenção de ir lá, só não queria companhia. Empurrei a enorme porta de madeira e desci os poucos degraus até o jardim dos fundos. Caminhei rapidamente, ansioso por chegar ao local onde não existiam bancos e os arbustos altos bloqueavam a visão. Era o local perfeito para eu me isolar quando precisava.

Sentei na grama e voltei a face para o céu, desejando que a claridade que transpassava as minhas pálpebras fechadas e o calor que aquecia a minha pele dissipassem as nuvens carregadas que nublavam o meu humor.

***

— Cara, que raio de escola coloca educação física depois do almoço?! — O Mike perguntou com um gemido enquanto acariciava a barriga.

— Todas, assim não temos que escolher entre chegar atrasado ou fedendo na próxima aula. E seu problema não é o vôlei, é comer como um cavalo. — Revirei os olhos, toda semana era a mesma história.

— Eu joguei melhor do que você mesmo depois de ter comido como um cavalo. Você perdeu quase todos os passes hoje, mané! — gritou, dando um soco no meu braço.

— Não enche.

Ver as cabines frágeis do vestiário fez um calafrio me percorrer apesar do calor provocado pela atividade física. Geralmente eu só lavava o rosto, trocava a camiseta suada e saía correndo para esperar quem quer que fosse me buscar.

Os outros caras da turma começaram a se despir sem o menor pudor, o que fez meu estômago embrulhar, então me voltei rapidamente para a pia e fechei os olhos por um segundo, tentando impedir que a ansiedade crescesse até um ponto em que eu não conseguiria controlar. Quando os abri novamente, vi o Mike me olhando através do espelho com uma expressão ininteligível, o que me fez desviar o olhar, me perguntando o que ele pensava de mim.

— Cara, vamos lá na lanchonete. Eu preciso de água com gás antes do banho. — Não sabia o que ele achava de mim, mas fiquei grato por me dar uma desculpa para sair dali.

Quinze minutos depois, o vestiário estava quase vazio e os poucos que ainda estavam lá já estavam vestidos. Após tomar o banho mais rápido da minha vida, vesti quase toda a minha roupa no boxe. Enquanto ajeitava o cabelo em frente ao espelho, notei pela milésima vez os meus traços físicos: o nariz pequeno demais, os lábios rosados demais, o queixo fino demais, as sobrancelhas delineadas demais...

"Com esse rostinho delicado, até que ele parece uma menina."

Deixei o espelho antes de me perder naquelas lembranças.

— Mike, você vai demorar? Eu tenho que ir! — gritei para ele enquanto dava o nó na gravata.

— Já tô saindo. — Ele saiu do boxe usando somente uma cueca e me fez ter a visão do inferno.

— Uou. Eu não quero ver isso! — Eu me afastei cobrindo os olhos.

— Fique feliz por eu ter vestido a cueca lá dentro. Agora a calça, eu não ia molhar, né?

— Que seja. Eu já vou, porque estou em cima da hora — expliquei, jogando a toalha no hamper e o saco de roupa suja na mochila.

— Parece que alguém tá com pressa pra encontrar uma certa gatinha ruiva.

— Não viaja. Eu só não quero o senhor Prior no meu pé.

— Sei...

Pela assinatura no livro de registros da biblioteca, soube que Jennifer estava na última sala de estudos e segui até lá. Ao entrar, coloquei os livros em cima da mesa com um estrondo e abri a pasta com os papéis que o senhor Prior me dera.

— Vamos começar com troca gasosa — avisei.

— Boa tarde pra você também. E você tá atrasado.

— O Mike ficou mal depois da aula. — Após essa rápida explicação, inseri o assunto que interessava. — O primeiro tópico que o senhor Prior listou foi esse. Eu sinceramente não sei por que ele acha que você precisa de um professor pra aprender isso. É só ler! De qualquer forma, eu tirei cópias de alguns exercícios do ano passado e fiz um resumo pra você. Se tiver alguma dúvida, é só falar.

— Sim, senhor — ela zombou, batendo continência antes de começar a ler o meu resumo.

Aproveitei para reler alguns conceitos sobre a pesquisa do senhor Prior, que era sobre o cultivo de células-tronco para gerar as células-beta do pâncreas. Se a pesquisa fosse bem-sucedida, ajudaria milhares de pessoas com diabetes tipo I, já que essas células são as produtoras de insulina, que o próprio sistema imunológico deles destruiu.

A sensação de estar sendo observado me fez levantar os olhos e perceber que Jennifer estava me encarando. Ela estava mordendo o bocal da caneta, um hábito nojento, mas que me induziu a olhar para os lábios finos e rosados. Após desviar o olhar, perguntei secamente:

— Alguma dúvida?

— Não, eu só tava me perguntando por que você me odeia.

— Eu não te odeio — rebati, encarando-a novamente, surpreso pela resposta.

— Então você finge bem, porque eu podia jurar que você me odeia.

— Eu só não tenho interesse em fazer amizade, você que entendeu que eu te odeio. — Voltei a ler até perceber que ela continuava me olhando. — O que foi agora?! — perguntei com impaciência.

— Calma, tô só te admirando. Você fica sexy com o cabelo molhado. — Ao sentir o calor subir por minhas bochechas, soube que estava ficando vermelho, o que a fez sorrir antes de voltar a ler meu resumo.

Horas depois, percebi que a biblioteca estava quase vazia. A sala fechava às sete da noite, e já eram seis e vinte. Apreensivo com a possibilidade de ficarmos sozinhos ali, eu olhava ao redor constantemente.

— Você quer ir embora? Essa sua inquietação tá me desconcentrando! — ela reclamou.

Uma vibração na mesa chamou minha atenção antes que eu pudesse responder. Atendi a ligação falando o mais baixo que pude.

— Às sete. Até daqui a pouco.

— Se precisa de carona, eu posso te levar. Não precisa fazer alguém vir te buscar.

— Não é necessário, mas obrigado.

Pouco depois, devolvi os livros às prateleiras, e às sete em ponto, dei o fora daquele lugar.



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