Fase 6: Suspense
No meio do caos
Não! Alguém diz que é impossível, como vim parar aqui? Parece que por mais que pense, a situação fica cada vez mais absurda. Sem condições de existir alguém assim.
Respira Pietra, tenta manter a calma, isso parece mais filme de terror do que tudo. As meninas estão à minha esquerda e os meninos à direita, todos encolhidos como se aguardassem o pior que está por vir.
Não sei como vim parar aqui, na verdade, ainda lembro de uma parte, estava saindo da escola, primeiro ano, acabava de entregar um trabalho e no caminho de casa um senhor que aparentava ter uns sessenta anos, com toda educação, pediu informação para saber onde ficava a loteria, informei e assim que dei as costas para seguir minha vida, senti um pano cobrindo meu nariz e boca, o cheiro de álcool foi tão forte, tentei me debater, mas estava presa, mãos seguravam meus braços e finalmente desmaiei, acordei em meio a esse tanto de gente e o que o jovem rapaz, que me informou que seu nome era Allan, contou para mim, é o cúmulo do absurdo.
— Um momento, deixe-me recapitular tudo. — esfrego os braços em medo e ansiedade. — Eles sequestram pessoas, que tem um bom porte físico, segundo o padrão deles para ser garoto e garota de programa? — quando ele confirma em um leve movimento de cabeça, ponho as mãos no pescoço. — Por quê? Para que? E a polícia? Autoridades? Alguém?
— Desculpe-me por acabar com sua inocência criança, mas a prostituição é um mercado milionário ou até mais do que isso, para servir de brinquedo para homens e mulheres endieirados. — uma mulher fala baixinho.
— Tem policiais ruins envolvidos nesse esquema, se fossemos filhos de gente importante, talvez o governo se mobilizasse para nos tirar daqui. Ninguém se importa com jovens pobres, a maioria não tem família e isso facilita o esquema.
Absurdo, imoral, nojento e não consigo pensar em outros nomes pra isso.
— E os meninos? — deixo a questão mais em aberto.
— Meninos e meninas virgens, a maioria nunca sequer beijou e essas pessoas valem rios de dinheiro, eles colocam preços em nossas testas, como se fossemos produtos de supermercado. Entende agora? — Allan desabafa e meu coração se despedaça, não eu não quero.
— Então quem estava esperando pelo casamento e outros que nunca quiseram se relacionar com ninguém, vão ter que ter relação sexual com estranhos por dinheiro que ficará com terceiros? — uma grande maioria concorda e me trás náuseas, senti meu estômago revirar, só de imaginar a cena de ser obrigada a me prostituir, o vômito subiu até a garganta e no mesmo segundo obriguei-me a engolir.
— Pelo amor não vomita!! — uma voz ao fundo fala com muito nojo.
— Aqui eu não fico e ninguém vai me obrigar a nada!! — ao observar ao redor, tem só colchões espalhados em péssimo estado, uma pequena porta que deve ser no mínimo um reservado que deve estar em péssimas condições.
— E como pretende fugir? Tem homens armados lá fora, um passo em falso e levará um tiro pra ir dessa para uma melhor. — amarro os cabelos em um coque frouxo colocando os neurônios para funcionar.
Quais os armamentos que eles têm?
Quantos são?
Homens, mulheres ou os dois?
Perto dos trinta ou depois dos quarenta?
Não conheço o terreno, então não tem como planejar uma boa fuga.
Será que as pessoas aqui sabem lutar?
Fingir de morto não dá, vamos todos morrer por arma de fogo.
— Para de andar em círculos! — um rapaz fala mais alto, interrompendo o fluxo de pensamentos.
— Ao menos estou pensando em como sair daqui, já que possivelmente vão se render a esses criminosos de merda! — devolvo no mesmo tom.
— Desculpe se não estamos dispostos a morrer. — resmunga no canto.
— Chega! — Allan parece ser o líder dos meninos. — Qual seu nome?
— Pietra. — oculto o sobrenome, talvez não me dêem a devida atenção.
— Se tem um plano, essa é a hora. — sorrio, tenho um, espero que dê certo.
— Primeiro: Alguém tem noção de quantas pessoas estão armadas lá fora? — aguardo alguém quebrar o silêncio.
— Sou o Douglas. Tem três por esse corredor, mais quatro, dois na frente e dois ao fundo. Aqui é um galpão, somos levados vendados para "trabalhar" — faz aspas com os dedos.
— Segundo: Sabem algum tipo de arte marcial? Capoeira, kung fu, karatê, entre outras? Falem seus nomes. — preciso separar quem pode ficar na linha de frente daqueles que precisam de proteção.
— Caroline, graduada em capoeira — Concordo, será que mais alguém se pronunciará?
— Iniciante em defesa pessoal. Claudia.
— Paola, instrutora de tiro.
— Certo, então os outros vão precisar de proteção. Vamos na frente, e vocês logo atrás. Eles dão comida? — confirmam. — Duas pessoas fingem que tão passando muito mal, pode vim capangas e nessa hora, quem souber lutar, parte para desarmar eles e se armar. — tiro o casaco, amarrado na cintura, nessas horas até às cordinhas podem servir de instrumento para enforcamento.
Enquanto aguardamos alguma pessoa trazer comida, sentamos formando uma roda e pensando em diversas situações que poderiam vim a ocorrer, se caso alguém fosse ferido a bala, voltaríamos para resgatar ou deixava-mos lá? Moral e sobrevivência estavam em conflito.
Caroline perguntou sobre minha família e preferi falar que sou órfã, o que é mentira, na verdade sou adotada, porém ninguém precisa saber disso. Meus pais a essa altura deveriam estar desesperados, Gabriel e Paulo sempre insistiram em me criar para ser forte, todavia, nunca para sequestros.
Papais, vocês criaram uma líder, voltarei para seus braços.
Quando ouvimos uma corrente cair, cada um foi para um canto, uns fingindo dormir e outros chorando. Jéssica e Mariana reclamando de dor e fingindo ter ânsias.
— O que essas prostitutas têm? — a voz do mais próximo parecia um trovão, quase me encolhi de medo.
— Sintomas de gravidez. — fingi tremor na voz, se sair viva, pensarei em teatro.
— Merda e agora? — um homem mais baixo estava segurando vasilhas de comida, pareciam restos, nem porco merece isso.
— Levaremos para tomarem remédio pra tirar isso. O chefe não quer saber de crianças aqui. — vai até as meninas e levanta elas bruscamente pelos braços, obrigando a andar rápido.
Aceno discretamente com a mão, o sinal de violência contra mulher e todos entendem o sinal.
Tinha chegado a hora, matar ou morrer e eu mataria antes de ser morta por seres tão nojentos assim.
Partimos para cima derrubando-os e quando caíram, Paola, pegou a arma da sua cintura enquanto lutava para se soltar dos meninos que prendiam seus braços, recebendo em seguida uma coronhada na cabeça, tão forte a ponto de desmaiar.
O outro sacou a arma e rapidamente atirou em quem estava lutando com ele, Santiago, um jovem chileno. Ele caiu após várias brigas e tiros, peguei a arma e atirei na sua cabeça dele, o barulho deve ter chamado a atenção dos outros, então saímos em disparada, dois grupos, um pela frente e outro por trás.
Segui no segundo grupo e infelizmente ouvimos tiros, assim que chegamos ao fundo, separamos em duplas e corremos o máximo que pudemos, a avenida seria o local de encontro para pedir socorro. Bato no bolso da calça e lá está o celular que roubei do capanga. Puxei Allan para se esconder debaixo de um barranco, tava com sinal, disquei 190 e aguardei.
— Alô, Polícia Militar, qual a ocorrência?
— Sequestro e cárcere privado. Pietra Gonzales Lopes, quinze anos e mais onze pessoas entre meninos e meninas das mais diversas idades. Prostituição. — dei meu nome, se reconhecer, facilitará tudo.
— Ponto de referência. — a voz masculina pede.
Olho rapidamente ao redor e como estamos perto da avenida, após muitos minutos correndo, a placa identifica como…
— Rua YXHS. — tento acalmar a respiração.
— Avenida 78586. — Faz um barulho estranho do outro lado. — Cinco viaturas estão a caminho. Se escondam.
Assim que desligo, quebro o celular e enterro, quando termino ouço tiros e sei que estão quase alcançando a gente.
— Allan, vou servir de distração e caso morra e você conheça meus pais, dê o seguinte recado… — término e empurro ele para correr, sem esperar resposta.
— Olha ela lá. — corro em sentido contrário, preciso acelerar mais, pulo por troncos de árvores caídos e sinto um tiro de raspão no ombro, arde demais, sangue começa a escorrer e não do a mínima, um Lopes precisa fazer o que é preciso.
Minutos que parecem horas passam quando ouço a sirene da PM, sorrio em alívio e na hora que estou prestes a gritar, sinto algo adentrar minha coluna e meu corpo cair no chão. Tiros. Eles me acertaram.
Papais, me perdoem.
Fecho os olhos e me entrego à morte.
Dois dias depois
Allan Marques
Menina tola, deu a vida por desconhecidos, passo o braço violentamente sobre os olhos indignado.
Que merda de homem eu sou?
Ela me salvou, uma verdadeira heroína e eu não consigo me aproximar dos seus pais, estou sem confiança nas minhas pernas, além de ter recebido a notícia que teria consultas psiquiátricas, já que além de sequestrado fui abusado sexualmente.
Isso me torna menos homem?
Pietra, cuida de mim aí no céu.
Respiro e mais uma vez tento andar, eles observam minha aproximação em silêncio.
— Senhores. — Abaixo a cabeça, perdi toda a confiança que tinha adquirido a duras penas.
— Você é um dos rapazes que ajudou na fuga. — o cara mais alto constata.
— Allan Marques. Estava em dupla com a Pietra e infelizmente ela morreu por minha causa, fui um covarde— lágrimas já escorriam incontrolavelmente. — Antes de partir ela deixou uma mensagem para vocês.
Diga a eles que mesmo não falando explicitamente que os amo, amo-os do fundo da alma. Eles me tiraram do orfanato, meus genitores não quiseram saber da minha existência. Mas eles me criaram para ser líder e isso exige sacrifícios.
Mais um Lopes vai conquistar a vitória.
— Falou que vocês iriam entender. — Três homens em prantos, essa seria a cena que quem estivesse de longe veria.
— Mais um Uzumaki vai conquistar a vitória. Ela sacrificou a vida para salvar onze. — um deles, enxuga as lágrimas ao recitar.
— Gabriel, Paulo, Allan. — Uma mulher que nunca vi chega gritando, tapo meus ouvidos, odeio gritos e barulhos altos, me lembram os tiros.
— Alessa, respira, o que aconteceu? — Paulo questiona e acredito que seja ele.
— Paulo… — acertei. — descobriram quem capturou essas pessoas e ninguém acreditou em quem está por trás de todo o esquema de prostituição.
— Quem? — nossas vozes estão unidas em coro.
— O governador do Estado.
Após essas palavras saírem de sua boca, o silêncio se fez tão presente e pesado, que até o barulho de agulha antes inaudível, poderia equiparar-se a uma bomba.
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