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ELIZABETH MOORE
- Ok, ok. - Dei um basta naquilo. Encostei em minha porta respirando fundo. Margareth e sua boca gigante!
- Opa, desculpe - Ouvi a voz dela. Revirei o olhos, era óbvio que não estava nem um pouco arrependida.
- Vá embora Daniel - murmuro
- Sabe perfeitamente bem que não irei.
- É. - Lamentavelmente tive que concordar. Respirei fundo novamente - Me espere na sala de estar que em cinco minutos desço.
- Agora quero entrar no seu quarto.
- Não vai entrar.
- Pare de ser um pé no saco um vez em sua vida.
- Eu estou falando sério, Daniel. Ou você me espera lá embaixo e cale a porra da sua boca ou... Ou...
- Ou? - Podia sentir o divertimento. Fiquei calada. - Está vendo só Margareth, deixei sua irmã sem palavras.
Ouvi a risada dela. Simplesmente ignorei, irei deixa-lo falando sozinho. Caminhei até meu banheiro e tomei um longo banho.
Caro cérebro, vamos recapitular as coisas.
Anos atrás, quando minha mãe conseguiu um emprego de enfermeira no hospital da cidade, ela e a mãe de Daniel viraram grande amigas. Consideravelmente eram bem mais próximas do que são hoje em dia.
No entanto, A mãe de Daniel sofria pela separação recente do casamento e muitas vezes vinha para casa almoçar conosco, e como se não bastasse, ela trazia seu belo e magricelo filho irritante, Daniel Parker.
Margareth sempre gostou de Daniel, eu sempre gostei da família dele, só nunca gostei dele. Ele se esforçava pra falar comigo, se esforçou por longos anos. minha mãe e a dele sempre quem iam na casa uma da outra nos forçavam a ir junto, e eu ficava bastante irritada. Aprontava tanto só para minha mãe me trazer de volta para casa.
Porque eu preferia ficar com meu pai em casa do que na casa de alguém que eu não tinha uma amizade.
No meu aniversário de onze anos a mãe de Daniel o forçou a me dar algo. Ele criou um mural com coisas simples, e fotos nossas que nossas mães obrigavam a gente a tirar. Nas dez fotos nesse mural, 9 eu to com cara rabugenta e uma eu tô sorrindo porque meu pai estava conosco.
Entre minha mãe e meu pai eu sempre fui próxima do meu pai. Ele não me forçava a fazer as coisas, como minha mãe me forçava a fazer amizades.
Ninguém entra no meu quarto, por isso eu nunca fiz questão, mesmo que anos tenha passado, de guardar esse mural estúpido. Pode me julgar cérebro, me achar meio maluca, mas se eu ninguém vê eu não me incomodo em deixar em qualquer canto do meu quarto.
Até agora.
- Já que fez esse show todo por estudos - desci as escadas jogando os livros didáticos em cima do sofá ao lado do otário, ops, Daniel. - Vamos estudar pelo menos três desses livros.
Eu já havia tomado banho, não estava mais fedendo e nem com a boca suja de chocolate. Estava vestida de forma apresentável. Ele estava com os olhos focados em mim, me olhando como se eu fosse de outro planeta. Me olhava de um jeito estranho.
Será que estava pensando no mural? porra, ele nem viu! Demorei quase uma hora no banho só para ver se ele esquecia essa merda.
- Tem meleca no meu nariz? - Perguntei. Ele piscou e franziu a testa
- Se tem não estou vendo.
- Ótimo. Então pare de olhar para mim desse jeito.
- Que jeito?
Dei de ombros
- Desse jeito.
Ele olhou para baixo e sorriu. Me arrepiei. É o quê Elizabeth?
Sério, foi um sorriso sincero! Um sorriso sem maldade, sem ser forçado, sem deboche! Porra, porquê ele sorriu? E por qual motivo estou pensando no sorriso dele?
Foi até bonito.
Ok, chega, chega! Será que tinha drogas no meu chocolate? Falando nisso eu joguei ele no chão.
Será que ainda dá pra comer?
- Por que você está me olhando com essa cara de quem pensa que sou a comida mais gostosa do planeta? - ele perguntou
Pisquei
- Não estou.
- Liza? - ouvi a voz de Margareth, olhei para a porta da cozinha que dava na sala de estar, onde estávamos. - Tem uma babinha aqui ó.
Ela apontou para a boca dela, riu e voltou para a cozinha. Revirei os olhos.
- Está pensando em me devorar? - Seu sorriso de divertimento. Ufa! Agora o sorriso dele é feio. Sorri aliviada
- Nunca na minha vida, nem em outra.
Ele riu, olhou pra baixo de novo. Nossa, como ele fica bonito sorrindo e olhando pra baixo. Não, não! Chega!
- Levanta a cabeça Daniel, no chão só tem sujeira.
- Ta legal - ele jogou os livros ao lado dele para bem longe dele e levantou ficando de frente a mim. Bem próximo. - Vamos a um lugar.
- Que?
- Você está tentando tirar a atenção do que realmente devemos conversar - ele se aproximou bem mais, quase me peitando - E digamos que eu conheça você bem o bastante para ter percebido isso.
Coloquei as mãos no quadril olhando para cima. Afinal ele é mais alto que eu.
- Não sei do que estamos falando aqui amorzinho.
- Você sabe sim - sorriu de lado - E você vem comigo.
- Não vou a lugar algum com você.
- Vai.
- eu disse que não irei.
- Ou vem, ou conto para minha mãe que você guardou o mural, ela obviamente vai dividir isso com sua mãe que voltarão com os pensamentos de que vamos casar um dia e não deixarão você em paz por um minuto - aproximou o rosto do meu - você sabe como são nossas mães.
Estreitei os olhos
- Nossa, tá calor aqui! - Me abanei e empurrei o peito dele, caminhando até a porta de saída. - MARGARETH EU VOU SAIR, TRANQUE A PORTA E QUANDO MAMÃE CHEGAR DIGA QUE EU SAI COM O DANIEL.
- OK! - ela gritou da cozinha. Aposto que estava se entupindo de sorvete. Abri a porta e sai esperando Daniel. Podia sentir o sorriso convencido atrás de mim.
- Nossa, você me tirou de casa enquanto eu poderia estar estudando para vir até o meio do mato? - Questionei sentindo frio. Me abracei. Estava escuro e estávamos literalmente andando por uma floresta apenas com a luz do celular dele.
Não queria admitir mas eu estava com medo. E se algum louco aparecesse do nada?l
- Você não sabe realmente onde estamos? - Ele perguntou
- Se eu soubesse não estaria me referindo como meio do mato...
Ele negou
- Já passou um dia sem dar patada?
- não sei -tentei lembrar - realmente não sei.
Ele riu
- E você não passa um dia sem rir? Honestamente, é estúpido ficar rindo mesmo quando não tem nada engraçado. Como agora, não tem nada engraçado em nós dois estarmos andando no escuro, no meio do mato com apenas uma luz de celular e... MERDA!
Olhei pra baixo
- Que foi? - ele apontou a lanterna pro meu pé
Eu tinha pisado em um coco. Um coco enorme! Fiz uma cara agoniada. Um som agoniado saiu da minha garganta.
- Que nojo, que nojo!
O babaca começou a rir que nem louco. Não tinha graça alguma! Embora não sujou todo meu pé e sim os dedos. Mas foram todos os dedos! Sujos de merda! Literalmente merda!
- Não tem graça Daniel! - Gritei
Ele continuou a rir. Empurrei ele, eu estava ficando brava. Ele caminhou para trás, de repente só vi o celular voando e ele caindo para trás com tudo.
Estava escuro, só tinha nosso som ali no meio da floresta. Quando o celular caiu a luz estava apontando para baixo.
- p0rra! - Ele exclamou. Eu queria dar risada mas não sabia exatamente no que ele caiu. Com o chinelo fazendo um som irritante afinal grudava no meu pé por causa da bosta de não sei o que. Só espero que não seja bosta de humano!
Peguei o celular em meio as folhas de arvores caídas no chão e apontei para Daniel. Foi impossível, a risada veio antes de eu dar conta. Ele estava jogado no chão, todo sujo de lama. Minha barriga doía, ele me olhava com cara de quem realmente estava puto.
- pelo menos não fui eu que pisei na bosta.
Parei de rir na hora. Idiota.
- Vai ficar aí também para largar de ser besta.
- Elizabeth.
- Vou pra casa, lavar meu pé e você que fique aí.
- Elizabeth.
- Tchau. - comecei a caminhar, com o celular dele em mãos, pé sujo de bosta e sentindo meu rosto vermelho de raiva. Sabia perfeitamente que não devia ter saído de casa. Até me dar conta que esqueci algo.
- Volta aqui Elizabeth! - Ele gritou
Ouvi o barulho do que eu realmente precisava. A chave do carro da mãe dele.
- Acho que esqueceu de algo - ouvi a voz dele por entre o som de grilo e provavelmente coruja. Bufei e voltei, não tinha dado nem 10 passos, achei ele com facilidade. E mesmo deitado na lama, mesmo sujo, ele sorria para mim. Aquele sorriso, arg, irritante!
- Venha antes que eu mude de idéia.
- Você não pensou direito, você nem sabe onde estamos, como iria voltar?
- Cale a boca e me dê sua mão.
- Que maneira indelicada de pedir a mão de alguém.
- Porra Daniel, eu estou com frio merda!
Ele riu. Ele sempre ri. Isso está começando a me irritar. Então ele ofereceu a mão a mim. Coloquei o celular com a luz direcionada para o céu no chão. Com minhas duas mãos o puxei.
Ele ficou em pé rapidamente. Sem dificuldade alguma.
Estranho.
Estranho o fato de que ele ficou de pé, bem próximo de mim.
Estranho o fato de que mesmo que havia puxado ele nossa mãos ainda estavam juntas.
Estranho também a forma como ele me olhava, e a forma que eu o olha. A intensidade de nossos olhares. Estranho inclusive, as batidas do meu coração terem acelerado. Estávamos tão perto, olho no olho, apenas a luz do celular, quase se tocando e eu podia jurar que sentia o coração dele batendo na mesma intensidade que o meu.
É apenas, estranho.
- Elizabeth - ele murmurou
- O quê? - murmuro
- A bosta está seu pé mas eu tô sentindo daqui. Você fede.
Empurrei ele de novo. Mas dessa vez segurei. Se ele caísse na lama de novo eu não ia puxar novamente.
Ele olhou pra mim
Eu olhei pra ele
De repente, começamos a dar risada.
E sim, essa a primeira vez que eu dava risada junto com ele, sem ninguém por perto, apenas nós dois.
Andamos por mais provavelmente 10 ou 15 minutos. O tempo certo da merda secar no meu pé e a lama no corpo do Daniel também.
- Chegamos - ele disse. Então apontou a laterna por lago. Eu inclinei a cabeça um pouco para o lado, tive a ligeira sensação de que conhecia aquele lugar. - Lembra?
- Tenho a sensação de ser familiar. Mas não sei onde estamos...
- Estamos no lago que seu pai trouxe a gente, quando nossas mães se tornaram amigas.
Olhei para ele pasma
- Você lembra desse lugar?
- Sempre venho aqui correr.
Olhei ao redor. Estava escuro mas com a luz da lua naquele lugar aberto dava para ver ao menos um pouco.
- São que horas? - Perguntei
- quase onze da noite.
- Minha mãe deve estar preocupada.
- Acho que não - olhei para ele - Ela sabe que saiu comigo.- piscou para mim.
Neguei com a cabeça
- Oh, eu esqueci que você é o símbolo da segurança e confiança. Daniel porque diabos estamos aqui?
- Para você lembrar.
- Lembrar de quê?
Ele deu de ombros
- Da menina alegre que você era.
Olhei ao redor novamente, focando no lado.
- Ok meu psicólogo, vamos embora. - virei as costas, ele segurou meu braço.
- Era verão Elizabeth, tínhamos acabado de nos conhecer. Não tente enganar a todos, eu lembro que você nem sempre foi rabugenta assim.
Revirei os olhos e olhei para ele
- Você ficou dessa maneira quando seu pai foi embora com a nova família dele.
Dei de ombros
- Eu nem liguei, até hoje não ligo.
ele olhou para o lago e sorriu. Um sorriso diferente de todos que eu já vi nele.
- Eu também pensei assim por muito tempo, meu pai está em outra cidade perto daqui e ele não me liga a meses. Eu aprendi a me acostumar. Você não se acostumou com a partida do seu, você esconde isso.
- O que isso te a ver com o que de fato você quer conversar?
- O que eu quero conversar?
- Mural.
- É, enquanto você estava no banheiro fiquei me perguntando por qual motivo você guardou o mural.
- Eu me pergunto até hoje porque você o fez para mim.
- Porque queria me livrar das fotos.
- Eu pendurei na parede porque não queria deixar embaixo da minha da minha cama que merece estar sempre limpo, livre de sujeira.
Ele me encarou, encarei ele. E pela segunda vez naquela noite estávamos rindo um para o outro.
- E a verdade, qual é?
- Um dia você descobre. - Respondi - Enfim, o que esse lugar tem a ver com o mural?
- Quer que eu seja honesto?
- Óbvio.
- Nada a ver.
- Então porque me trouxe aqui?
Ele ficou alguns longos segundos em silêncio
- Vamos nadar? - mudou completamente de assunto
- o quê? - Perguntei confusa
- Você esta com o pé fedendo e eu tô sujo de lama - Deu de ombros pela milionésimo vez naquela noite - Nossas opções são poucas. Ou voltamos pra casa assim e corremos o risco de sujar o carro da minha mãe pra no dia seguinte lavar, ou nos lavamos aqui.
- Ok.
Ele olhou para mim, surpreso
- Achei que iriamos entrar em uma discussão. Eu já estava me preparando psicologicamente.
- Se nem você que está ao meu lado aguenta o cheiro do meu pé quem dirá eu. - comecei a caminhar em direção ao lago - Não não!
- O quê? - ele tirava a blusa
- Se liga Daniel, não vai entrar no lago pelado!
Ele abriu os lábios, num sorriso descarado
- Você não sabe o que tá perdendo. - ele disse. Então se jogou dentro do lago. Observei pasma enquanto lavava apenas meu pé. Se para meu pé a água estava fria, quem diria para corpo todo.
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