.Capítulo 14.

A notícia do acidente reverberou em minha mente, cada gota de chuva que tocava minha pele parecia carregar o peso da responsabilidade. Eu me culpava, questionando se algo que fiz ou deixei de fazer poderia ter evitado aquele desfecho trágico. Caminhando entre os destroços do carro, a sensação de impotência me envolvia, enquanto eu buscava entender as consequências de nossas escolhas.

Ricardo estava ao meu lado, e sua expressão refletia a mesma angústia que atormentava meu interior. Seus olhos encontraram os meus, buscando respostas que eu não tinha para oferecer. A chuva persistia, mas seu som se misturava com os soluços contidos que escapavam de nós dois.

- Nicolas, eu... eu não consigo acreditar nisso. - Ricardo murmurou, sua voz entrecortada pela emoção.

Minhas mãos tremiam enquanto eu tentava encontrar palavras que pudessem aliviar a carga emocional que ambos carregávamos. Eu não podia ignorar a sensação de responsabilidade que pairava sobre mim, mesmo sabendo que o acidente não estava diretamente ligado às minhas ações.

- Eu sinto tanto, Rick. Se ao menos tivéssemos sido mais rápidos para chamar ajuda... - minha voz falhou, e meu olhar desviou para o chão, incapaz de suportar o peso do que acabáramos de testemunhar.

Ricardo segurou meu rosto entre suas mãos, forçando-me a encará-lo novamente. Seus olhos transmitiam uma mistura de dor, solidariedade e uma busca desesperada por conforto.

- Isso não foi sua culpa, Nick. Não podíamos prever o que aconteceria. Vamos ficar bem, juntos. - Ele tentou me acalmar, mas a tormenta de emoções dentro de mim persistia.

- Eu só quero que ele fique bem, que todos fiquem bem. - Murmurei, as palavras saindo como uma prece silenciosa.

Ricardo envolveu-me em um abraço, e por um instante, permiti-me sentir a segurança que sua presença proporcionava. A chuva continuava a cair, lavando nossas lágrimas enquanto enfrentávamos o desconhecido juntos.

A sirene da ambulância ao longe anunciava a chegada do socorro, e a esperança renascia. Estávamos prestes a enfrentar um desafio árduo, mas a certeza de que meu avô  receberia o cuidado necessário trouxe algum alívio a nossos corações atormentados.

***

Meu avô já estava reclamando quando eu acordei do seu lado no hospital. Dizia que a comida estava horrível e queria tirar o oxigênio do nariz, dizendo que estava ótimo e que não precisava mas daquilo. Teimoso como sempre.
Me levanto da poltrona ao ver todo aquele caos, e a sua discussão com a enfermeira que esteva tentando acalmá-lo.

- Vô,por favor. Isso é para o seu bem. Tome o remédio e pare de mexer no oxigênio.  Seus pulmões estão fracos, por causa das lesões no peito.

- Eu estou ótimo. Já disse!_ reclama alterando a voz.

- Minha mãe está na sala de espera junto com a vó. Prefere que elas venham aqui para te obrigarem a tomar o remédio e parar de mexer no oxigênio?_ questiono com autoridade.

Ele se cala e deixou a enfermeira fazer o serviço dela. O que uma chantagem não faria, não é mesmo?

- Seu Tião, como o senhor é muito forte mesmo, ehm?_ disse Kenan entrando no quarto, com as muletas e uma perna quebrada, que também acompanhava seu nariz e as faixas amarradas na sua cabeça.

Estava me sentindo culpado por eles estarem daquele jeito. Se não fosse por mim, naquela festa do rodeio, Kenan estaria bem, e meu avô não estaria novamente no hospital.

- Kenan, estar se sentindo melhor? Falou com seus pais hoje?_ perguntou minha mãe entrando no quarto com dois copos de café.

- Sim. Estão bastante preocupados ainda. Vão vir me buscar amanhã de manhã. Vou voltar pra São Paulo. Obrigado, Sra. Tavares por me ajudar.

- Não precise agradecer. Sei que se fosse com Nícolas, você faria o mesmo.

Kenan evitava me olhar muito, mas seus olhos lhe traiam. Apesar de saber que Ricardo e eu ajudamos ele baquela noite, Kenan ainda estava muito magoado, claro que de propósito, mais estava agradecido por termos salvado ele

Já haviam se passado três dias, e eu não tinha ainda conversado com Ricardo sobre todas as coisas que haviam acontecido nos últimos dias. Ele estava cogitando não participar da final do rodeio que aconteceria daqui dois dias. Ricardo estava disposto a desistir para cuidar da fazenda enquanto meu avô não estivesse tão bem, e até quando minha avó o prendesse na cama, pra ficar de repouso.

- Soube que já estava acordado, Seu Tião. Não esperava vê-lo tão cedo novamente. _ falou o médico entrando no quarto. Kenan se retira, deixando somente eu e minha mãe, junto com meu avô na cama.

- Como estão as coisas, doutor?_ questiona minha mãe preocupada.

- Estão bem, não quebrou nada. Mas vai ter que ficar por aqui em observação pelo impacto da cabeça e do tórax. Só mais dois dias talvez. Vamos examiná-lo de novo para termos certeza da saúde dele.

- Eu quero ir ver a final do rodeio._falou meu avô, resmungando.

O médico riu, ao ver a preocupação do meu avô.

- Isso irá ser impossível, Seu Tião. Pode ter alta, mas descanso em casa, sem fazer muito esforço. Nada de rodeio.

~*~

Estava escrito no rosto de Ricardo o quão ansioso ele estava. Antes de entrar na arena ele tirou o chápeu e colocou na minha cabeça. Rezando para que conseguisse ganhar.

- Esse prêmio é seu!_ digo olhando para ele

Ricardo me abraçou e beijos minha testa.

- Estamos juntos nessa!_ disse ele.

Então a voz extredente que  saia das caixa de sons que circulavam a arena do rodeio, chamou o nome de Ricardo. Que parecia não querer que eu saisse de seus braços, me soltou, me dando um beijo e correndo para subir no cavalo, enquanto eu torcia por ele!

A atmosfera na arena estava carregada de tensão e expectativa, e enquanto Ricardo se preparava para a montaria, meu coração batia descompassado. Enquanto o touro impaciente aguardava na arena, minha mente vagou por um breve flashback de um momento que compartilhamos.

Lembrei-me da primeira vez que o vi montar em um touro, quando seus olhos encontraram os meus na multidão. Seu sorriso confiante, apesar da adrenalina e do desafio iminente, ecoava em minha mente. Naquele instante, percebi como havíamos percorrido um longo caminho desde então, construindo uma conexão que ia além das palavras.

A competição começou, e meu foco voltou-se para a arena. Ricardo não estava apenas enfrentando o touro; ele estava desafiando a si mesmo, superando limites e provando sua coragem. A dinâmica com os outros competidores era evidente, cada um exibindo sua própria habilidade e determinação. As expressões de determinação, rivalidade e respeito entre os participantes eram palpáveis.

A tensão na arena atingiu seu ápice quando Ricardo montou no touro, enquanto o animal lutava para derrubá-lo. Cada segundo parecia uma eternidade, e eu me encontrava apertando as mãos, sem conseguir desviar o olhar. Cada reviravolta do touro, cada movimento de Ricardo, era uma dança perigosa que mantinha a multidão em silêncio.

O rugido do público ecoou pela arena, misturado com os comentários animados dos locutores. Os comentários destacavam a coragem e habilidade de Ricardo, reconhecendo a intensidade da competição. A plateia, envolta na emoção do momento, era uma sinfonia de vozes que oscilavam entre o êxtase e a preocupação.

Meus pensamentos internos eram um turbilhão de emoções conflitantes. Orgulho, preocupação, admiração - tudo entrelaçado enquanto eu testemunhava a bravura de Ricardo na arena. Eu me perguntava sobre as escolhas que fizemos até aquele ponto, sobre como esses momentos moldaram nossa relação e nos trouxeram até aqui.

E então, quando oito segundos se estenderam como uma eternidade, Ricardo conseguiu permanecer na sela, emergindo vitorioso da batalha. O alívio inundou-me, e meus olhos encontraram os dele na distância. Uma troca silenciosa de reconhecimento e gratidão passou entre nós, enquanto a arena explodia em aplausos e celebrações.

Aquele era um momento de triunfo, mas também de reflexão sobre os desafios superados. Estávamos unidos não apenas pela paixão pelo rodeio, mas por laços mais profundos que nenhum touro poderia quebrar.

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