T R Ê S

    David Smith encontrou Enzo West dois andares acima do qual o apartamento de Sofia ficava. Ele estava parado no meio do corredor, falando no telefone com quem deduziu ser Angelina, e Dave esperou alguns segundos até que o chefe desligasse para dar a notícia:

     — Sofia estava fugindo.

     Enzo levantou os olhos do telefone para Dave, sem muito entusiasmo, e perguntou:

     — Fugindo?

     — É, fugindo. — Harry White apareceu no fim do corredor, interrompendo a explicação que Dave estava prestes a dar. — Faltam roupas no armário e fotos no mural da mesa do computador. Precisamos achar a mala, ou um carro; se ela tiver um carro, a mala estará lá dentro, então tanto faz.

     — Se — Enzo enfatizou a sua constante descrença nas teorias de Harry White — ela estivesse fugindo mesmo... Do que seria?

     — Eu não sei, Enzo. Não sou médium. Mas se acharmos a mala, provavelmente acharemos a resposta para a sua pergunta.

     Enzo suspirou e se direcionou para David:

     — Encontre o responsável pelo prédio e veja se ele tem acesso às gravações do estacionamento. Pergunte também qual é o carro de Sofia e, se não souberem, procure nos vídeos todos os veículos que entraram no prédio no mesmo horário em que a vítima costuma chegar da faculdade.

     — Procure um Porsche preto ou algo do tipo — Harry aconselhou.

     Dave olhou desconfiado para White, não entendendo muito bem qual era a intenção do homem com aquela frase, mas ao invés de tentar descobrir se era algum tipo de pegadinha ou piada interna murmurou entendido e saiu apressado.

     Enzo e Harry permaneceram ali, parados.

     — Já tem algum plano, gênio? — West perguntou.

     — Não.

     Enzo lançou a Harry o seu melhor olhar desconfiado. Algo que dizia eu não nasci ontem, White, pode parar de mentir, mas ao invés de confessar o plano, como sempre acontecia, o detetive negou:

     — Não faço mais isso, Enzo. A partir de agora vou ser um policial normal, ou sei lá.

     West riu.

     — Você? Estou ansioso para ver quanto tempo isso vai durar.

     Ouviram passos no fim do corredor, e cessaram a conversa. Era Steven Hemmings, o quarto membro do grupo, que havia passado a tarde toda conversando com os amigos de Sofia na faculdade em que ela estudava. Harry não sabia como, mas Stev sempre era o mais rápido de todos. Qualquer outro membro do grupo teria demorado pelo menos dois dias para fazer todos os relatórios que uma faculdade cheia de jovens curiosos exigia.

     Ele também era quem Harry gostava de chamar de certinho. Não que aquilo fosse uma ofensa à alguém além de White, mas o deixava menos invejoso de não conseguir escrever três linhas de relatório sem cair no sono enquanto, Stev, pacientemente, redigia três por hora.

     — Nada na faculdade - disse o Certinho.

     Harry quase sorriu. Nada pessoal, mas sempre foi muito competitivo quando se trava dos casos de sua carreira.

     Quando Steven continuou, porém, o sorriso sumiu:

     — Mas eu conversei com um rapaz que trabalha no café do outro lado da rua, e ele tem algumas informações interessantes.

     Felizmente ninguém viu quando Harry revirou os olhos. Então Steven os mostrou as anotações que tinha feito quando conversou com Matthew Horan, que trabalhava há anos naquele café de toldo verde que amanhecera fechado, e Enzo concordou que eram ótimas informações.

     — Ligue e peça para ele comparecer à Scotland Yard amanhã. Quero essas informações em vídeo, para um relatório formal.

     — Isso é mesmo necessário?—questionou White.

     — É a morte de Sofia Spilman. Então, sim.

     Enzo se afastou de Harry quando David voltou, provavelmente trazendo informações sobre as câmeras de segurança e o carro de Sofia, e White ficou ali, com Stev, vendo-o ligar para a testemunha do café com simpatia e boa vontade — o que era, pelo menos para ele, muito irritante.

     — O café estava fechado —  observou Harry, de repente, quando Stev desligou o telefone— Como conseguiu contato com o funcionário?

     — Procurei o dono na internet, falei com ele e consegui a informação de que Matthew e Sofia sempre conversavam quando ela ia tomar café. Então o procurei.

      Céus, ele havia feito tudo aquilo em um dia.

     — Você deveria respirar um pouco — disse White— Parece uma máquina...

     Ele continuaria dando péssimos conselhos se David Smith não tivesse deixado o chefe e se juntado à conversa com uma ótima notícia:

      — Nenhuma câmera conseguiu pegar a imagem, mas um vizinho disse que viu Sofia chegar em um Porshe preto, com um homem dirigindo. Ela desceu do carro e então ele saiu do prédio. — Seu tom de voz era uma mistura de descrença disfarçada e ceticismo. — Certo, White, como você fez isso? Como você sabia qual era o carro de Sofia?

     Harry deu de ombros.

     — É tudo uma questão de prestar atenção nas coisas. É bem fácil, na verdade.

     Ele observou enquanto Dave inconscientemente apurava os ouvidos, sentindo-se um mágico performando para uma criança. Notou que Stev também havia feito o mesmo e que até Enzo, tentando disfarçar, esperou pela resposta.

     — Há a probabilidade de cores escuras para bairros do interior e, com o dinheiro que a família Spilman tem, com certeza seria um Porshe, que foi o carro luxuoso mais vendido do ano. Mas o mais importante, rapazes, é o principal detalhe da dedução... — fez suspense, provocando-os. Estavam vidrados. — Eu encontrei a chave do carro!

     Harry se divertiu vendo a expressão de Dave murchar.

     — Seu filho da puta. — xingou.

     Harry tirou a chave do bolso e colocou nas mãos de Dave. Então explicou a verdadeira lógica do assunto:

     — Tem o logotipo da marca na chave. Já a cor, eu chutei. Levando em consideração que estamos em Londres, seria um carro preto, com certeza. Mas nada relacionado ao bairro no interior!

     Dave olhou para a chave em suas mãos, pensativo, e parecia decepcionado com o fato de que White não havia adivinhado de verdade qual era o carro de Sofia. Enzo balançou a cabeça, envergonhado.

     — Bem, então se não temos câmeras, precisamos tentar achar mais testemunhas que viram esse carro. Ele é bem chamativo, então não vai ser difícil - disse Steven, já pensando no trabalho que teriam em localizar o veículo.

     — Ou - opinou White— Podemos verificar se alguma taxa de congestionamento foi paga para um Porshe. Ele é bem caro e não devem haver muitos desses por aí.

     — Sofia morava aqui. Por que pagaria a taxa?

     Foi Enzo que respondeu a pergunta de Steven:

     — Sempre há a possibilidade de o carro não ser dela. Podemos tentar. É bem mais fácil do que sair por aí perguntando quem viu um Porshe preto sair de um prédio de luxo.

     Naquele momento, todos concordaram.

     — E se não encontrarmos nada?

     Harry White riu, achando a ideia a seguir bem divertida:

     — Temos o alarme do carro em mãos. Vamos dar uma volta por Londres apertando botões e esperando algum barulho.

     Então, quase como se estivesse esperando a fala do detetive acabar, um raio cortou o céu de Londres. Foi alto, mas distante, e acostumados com o péssimo clima da cidade, nenhum dos quatro detetives parados naquele corredor pensou em dar atenção ao frio que passou por suas espinhas.

     Se Harry tivesse confiado nos seus instintos — naqueles que diziam que Londres podia sentir as coisas —, ele teria visto que aquele raio era a voz de uma velha amiga tentando lhe dizer algo importante.

...

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