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— Foi bem?
A pergunta repentina me faz dar um pulo, quase morrendo do coração.
Ainda não estou longe o suficiente da sala de Estatística Aplicada para me sentir em segurança, então minha ansiedade não teve tempo de baixar.
Olho na direção da voz e encontro a menina estranha que ficou me encarando o tempo todo durante a prova. Ela está de braços cruzados recostada em uma das paredes do corredor largo. Parece que estava me esperando.
Viviane não mencionou nenhum amigo que tivesse na aula, embora eu devesse ter imaginado. Ao contrário de mim, minha irmã faz amizade com qualquer pessoa que conhece. Mas ela precisava ter me dito, me dado algumas dicas, caso alguém viesse me confrontar — como parece ser o caso agora. Para quem eu posso contar sobre nosso arranjo? Em quem ela confia? Nessa menina aí, de quem nunca ouvi falar? Ou será que devo manter o teatro e continuar me passando por Viviane? Mas como eu vou saber o que falar? Não sei absolutamente nada sobre a garota, só que ela parece ter ascendência japonesa e que fica encarando as pessoas sem o menor pudor, no meio de uma prova importante ainda! Não conheço nenhuma das piadas internas que talvez ela tenha com a minha irmã. Não sei se vou conseguir ser convincente.
— Acho que sim — murmuro, dando um sorriso rápido, e decido que a melhor opção é sair daqui o quanto antes. — Ei, preciso ir embora. Tchau!
O rosto da garota ganha uma expressão bem decepcionada, mas não fico olhando por muito tempo. Me viro e caminho para longe.
Tomo outro susto quando a garota me alcança.
— Você tava bem nervosa pra prova — diz ela, como se a minha despedida nunca tivesse rolado. Ela apressa o passo para me acompanhar mesmo com meu aumento de ritmo para despistá-la. — Você colou?
Eu paro de andar e olho para ela, abismada.
— Claro que não!
Embora, bem... Eu colei mais ou menos, né? Quer dizer, Viviane colou. Não do jeito mais tradicional, claro, mas acho que colocar sua irmã gêmea para fazer a prova no seu lugar também entra na definição de cola.
Só que eu nunca colei na vida, então ser acusada de algo assim me horroriza.
A garota ri.
— Não vou contar pro professor, Vi — me promete num sussurro teatral. — Você pode me contar.
— Não colei! — repito, mais irritada, e volto a andar.
Ela, claro, anda junto comigo, me acompanhando como se fosse natural, como se fôssemos melhores amigas. Mas ela não é melhor amiga da Viviane. Eu saberia se fosse.
— Bom, eu colei um pouquinho. — Ela dá de ombros. — Mas a culpa é do Pacheco também, por não colocar a porcaria das fórmulas na prova. Ele quer o quê, que a gente decore? Fala sério, isso aqui não é ensino médio não!
O modo como ela fala me pega um pouquinho, e me vejo rindo.
Chegamos na frente do prédio e, para a minha surpresa, Viviane está me esperando em frente ao seu carro. Ela arregala os olhos quando percebe que eu não estou sozinha.
— Sua irmã veio te buscar? — a garota me pergunta.
— Aparentemente.
Quando caminho até Viviane, a garota me acompanha.
— Nina! — Vivi diz, parecendo ter se recuperado do pequeno choque.
Nina olha para mim com os olhos semicerrados, e então encara Viviane.
— Espera.
— Ai, meu Deus. Sou eu! — minha irmã exclama, abrindo os braços. — A Rafa fez a prova pra mim.
Ela profere isso sem a menor discrição. Sem nenhum medo de ser pega. Então ergue o pulso e mostra a tatuagem para a Nina, que se vira para mim com uma expressão acusatória.
— Você disse que não colou!
Ergo as mãos.
— Eu não colei! E juro que estou aqui contra a minha vontade.
— Ela está aqui porque é a melhor irmã do mundo! — Vivi diz, me abraçando. É outra coisa que ela fala sem qualquer pudor, mesmo a gente tendo uma irmã mais velha que definitivamente se sentiria magoada se ouvisse isso. — Brigada, brigada, brigada!!! — Ela faz uma pausa, se afastando um pouco. — Você gabaritou, né? Não espero menos.
Encolho os ombros.
— Eu tentei.
— Melhor torcer pra ela não ter gabaritado — Nina opina. — Ou o Pacheco vai desconfiar.
— Aquele monitor dele desconfiou — eu informo.
— Quem? O Leo? — Nina ergue as sobrancelhas, preocupada por um instante, mas logo as abaixa e espana a mão no ar. — Pfff. Ele vai ficar de boa. Não vai contar pro Pacheco não.
— Ele vai ficar decepcionado — diz Nina.
— Ele vai superar — decreta Viviane.
— Se prepara pro sermão.
— Nina, o Leo não tem a menor moral pra me dar sermão.
Pelo jeito, as duas poderiam ficar nessa conversa pelo resto da eternidade, mas eu preciso desesperadamente de comida.
— Ei, Vivi, vamos indo? Acho que eu vou morrer se não almoçar nos próximos cinco minutos, e eu quero muito tomar um banho pra limpar Estatística Básica do meu sistema.
— Claro, mas não limpa tudo não, porque provavelmente vou precisar de você na próxima prova.
Ela ri quando dou um tapa em seu ombro. Se despede de Nina com um abraço rápido e um "Até segunda!" (eu apenas aceno e digo que foi bom conhecê-la), e entramos no carro para ir embora.
Enquanto estamos saindo do estacionamento do prédio de exatas, ela me encara pelo canto de olho.
— Ei, eu tava brincando, mas só mais ou menos. Você foi bem, não foi?
— Considerando que eu não mexia com cálculo há quase dois anos, acho que sim.
— Rafa...
Rio baixinho, colocando a mão sobre a dela no câmbio.
— Não se preocupa com isso. Você sabe que nessa área pelo menos eu me garanto.
Ela vira a palma da mão para cima e aperta meus dedos.
— Que sorte a minha ter uma irmã tão nerd!
Sorrio.
Ela solta minha mão para mudar a marcha, e eu volto a colocá-la sobre meu colo.
Mordo os lábios, pensando em como vou abordar a questão que ficou flutuando pela minha cabeça. Apesar de parecer durona, minha irmã é muito sensível com alguns tópicos e, se eu disser a coisa errada, se me aproximar do tema de forma muito brusca, ela vai se fechar num casco impenetrável, como uma tartaruga.
— Vivi... — começo.
— Ô-ou. — Ela olha para mim assim que toma a estrada para casa e o caminho fica tranquilo o suficiente para poder desviar a atenção por um segundo. — O que eu fiz?
— Hum... Por que você pediu pra eu fazer a prova no seu lugar?
Ela ri, voltando a cabeça para frente.
— Porque eu quero passar nessa droga de matéria finalmente, ué.
Mordo os lábios. Ela está levando na brincadeira, querendo desconversar. Eu sei que ela não gosta de se sentir vulnerável e não quer se aprofundar no assunto, mas, ainda assim, insisto.
— O monitor deu a entender que você estudou bastante.
Viviane fica meio séria.
— O Leo não sabe o que diz — diz simplesmente, olhando firme para a estrada à frente.
— Então ele estava mentindo?
Ela aperta o volante com mais força.
— Não, Rafaela, ele não estava mentindo. — A voz dela sai mais ríspida, quase como se estivesse me dando uma bronca. — Mas, como eu já te disse, estudar não é suficiente. O professor espera que eu seja perfeita. — Ela faz uma mini pausa e me olha. — Ele espera que eu seja você.
Suspiro, abaixando um pouco meu tom para ela saber que estou do lado dela.
— Você conseguiria ir bem na prova. O tal do Leo tinha fé em você. — Estendo a mão e coloco por cima da mão dela no volante. — Eu tenho fé em você, Vi.
Ela engole em seco e sacode minha mão para longe.
— Bom, agora já foi. Podemos mudar de assunto por favor?
Seguro uma mão na outra.
— Ok.
Ficamos um tempo em silêncio. Normalmente, Viviane liga alguma música enquanto dirigimos, mas pelo visto hoje ela quer me punir com silêncio por querer discutir temas sensíveis. Então, talvez para puni-la um pouco também, entro em outra questão meio polêmica:
— O que tá rolando entre você e o monitor?
Minha irmã arregala os olhos, tão surpresa que parece ficar sem palavras por alguns segundos. Um sinal fechado à nossa frente dá a desculpa perfeita pela frear de maneira meio brusca.
E então ela começa a gargalhar.
— Tá louca? — exclama quando se acalma, me olhando como se estivesse dividida entre estar mesmo preocupada com minha sanidade mental e estar achando aquilo hilário. — Absolutamente nada. O Leo é... — Ela limpa a garganta e volta a olhar para a frente, sacudindo a cabeça. — Meu Deus, claro que não.
Cruzo os braços.
— Essa reação foi extremamente suspeita.
O sinal abre, e ela solta uma risada anasalada.
— Se você o conhecesse, nunca diria uma barbaridade dessas. Ele é péssimo. Irritante demais.
— Ele é bem gostoso — argumento.
Viviane revira os olhos.
— Isso não significa nada vindo de você, Rafa. Seu gosto em homem é péssimo. — Ela dá de ombros. — Somos só amigos.
Amigos, é?
— E quanto à Nina? — eu pergunto então.
Minha irmã morde os lábios e respira fundo. Quando solta o ar, responde:
— O que tem?
— Eu não sabia da existência dela.
— Não posso ter amigas, por acaso? — ela indaga, meio na defensiva.
— Para de ser besta, Vi. Eu só achei que eu conhecesse todos os seus amigos. Daí de repente surgem esse monitor aí e a Nina, e você nunca me falou deles antes... Aliás, antes de me meter nessa enrascada de fazer a prova no seu lugar, você deveria pelo menos ter me alertado sobre possíveis interações. Quase fui pega! Aliás, quase nada. Eu fui pega. Ele olhou para o meu pulso e, mesmo com o relógio cobrindo a tatuagem, sabia que não era você. A gente só deu sorte de ele ter resolvido não contar pro professor.
— Tá bom, tá bom. O que você quer que eu diga? Desculpa?
— Eu só queria que você me contasse as coisas, só isso. Suas amizades. Seus crushes. Eu conto tudo pra você!
— Talvez eu não queria contar — ela fala. — Talvez eu não queira saber.
Ai.
Entendendo o recado, fecho a boca e viro para o lado, encarando a paisagem lá fora.
Passamos o resto do caminho em completo silêncio e, quando chegamos em casa, cada uma vai para o seu quarto sem dizer uma única palavra.
Oieeee!
Toda terça-feira agora fico animada porque chega a hora de postar mais um capítulo!
Compartilhar o livro no Wattpad está fazendo maravilhas pra minha escrita! Já consegui adiantar vários capítulos e estou escrevendo quase todo dia. É um milagre! Se eu soubesse, teria voltado antes! Vocês estão me dando fôlego demais pra continuar escrevendo. Obrigadaaaa!
E sobre o capítulo de hoje... O que vocês estão pensando? De quem ficam do lado nessa briga? Será que Viviane tem motivos pra esconder as coisas da Rafaela? E qual seria o relacionamento dela com o monitor?
Ansiosa para saber as teorias de vocês!
Um beijo e até semana que vem!
Com amor,
Julia Braga
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