Capítulo 20 - A Foto
A batida inebriante da música pareceu se fundir com as minhas veias, transmitindo uma corrente elétrica por todo o meu corpo. Eu segurava a mão de Arthur com firmeza, mas sentia que as minhas pernas tremiam um pouco.
A pista de dança estava lotada, e eu tive medo de que as pessoas pudessem começar a reconhecer o Arthur, mas aquilo não aconteceu e eu logo percebi que ele estivera certo em relação aos frequentadores daquele estabelecimento quando disse que as pessoas só queriam se divertir.
Aquele vídeo que eu tinha visto fora consentido pelo próprio Arthur a ser postado, e isso me deixou mais tranquila.
Olhei para os lados, aflita em sentir o calor da sua mão na minha junto com as luzes fluorescentes do lugar em cima de mim e me perguntei se dançar com Arthur seria uma ótima forma de esquecer os meus problemas.
Paramos de frente um para o outro e senti uma das mãos de Arthur envolver a minha cintura e me segurar com firmeza. Sua outra mão continuou segurando a minha e Arthur ergueu um pouco meu braço, para podermos dançar lambada. Estremeci quando eu vi os casais ao meu redor, mas Arthur fez com que eu o encarasse e algo na firmeza daqueles olhos claros e límpidos me fez criar coragem para começar a mover o meu corpo.
Movi a minha cintura de forma lenta de um lado para o outro, de forma acanhada. Arthur assentiu levemente com a cabeça e começou a me conduzir pela pista de dança. Eu sentia o interior da sua perna roçando na minha coxa e me senti totalmente constrangida com aquilo.
Eu sabia que era meio idiota me sentir daquele jeito, já que era uma dança que exigia muita sensualidade, mas ter o corpo de Arthur tão próximo do meu me fez sentir espasmos de calor por todo o meu corpo. Afinal, eu nunca havia dançado daquele jeito antes. A minha dança era tão recatada e pessoal, que eu nunca pensei que pudesse ser capaz de me mover daquela forma.
Posicionei uma das minhas coxas de forma que ela ficasse grudada ainda mais na de Arthur e continuei balançando o meu quadril. Segurei em seus ombros quando ele encostou o seu peitoral em meu corpo e arqueei a minha coluna para trás, sentindo as mãos firmes de Arthur passeando pelas minhas costas de forma respeitosa.
Nós nos abaixamos juntos, eu esfregando minhas coxas em suas pernas e vice-versa e nos levantamos rapidamente, começando a nos mover mais pela pista de dança. Me agachei e deixei uma perna levantada no ar enquanto o restante do meu corpo girava. Arthur me seguiu e me puxou pelo braço em sua direção, fazendo com que meu corpo trombasse no dele propositalmente.
Uma comoção no lugar ocorreu com aquele gesto, fazendo com que todos passassem a assistir a nossa dança. Havíamos chamado a atenção, mas eu não me importava.
Meu vestido esvoaçava enquanto eu girava diversas vezes, sendo seguida por Arthur, que segurava uma de minhas mãos com leveza.
Enrosquei minha perna esquerda na coxa de Arthur, que segurou a minha cintura enquanto eu esticava a outra perna e arqueava a minha coluna novamente para trás.
Arthur me levantou com firmeza no ar, fazendo com que eu me sentisse zonza e quente ao mesmo tempo. A batida da música pulsava em nossas veias como se fosse uma droga viciante que nos deixasse tontos de adrenalina. Nossos corpos suavam, mas não deixamos de nos mover um segundo sequer.
As mãos de Arthur exploravam toda a extensão do meu quadril e da minha coluna, mas naquele momento, eu estava envolvida demais para perceber o que eu fazia.
A dança possuía uma extraordinária magia de me deixar anestesiada, e parecia que aquilo amplificava quando eu estava ali com o Arthur, no meio daquela pista de dança.
A música acabou, e sem que eu percebesse, nossos dedos estavam entrelaçados. Nós nos olhamos por cerca de 2 segundos, ofegantes.
Parecia que eu havia entrado em uma cabine a prova de som, pois eu não ouvia mais nenhum barulho além do de nossas respirações, que estavam meio descontroladas pela dança que tínhamos terminado de fazer.
Arthur também sentiu uma mudança na atmosfera, porém, ele se afastou no momento seguinte dando um passo para trás. Havia ainda um fulgor e um brilho em seus olhos causados pela dança que me fazia querer sonhar com eles mais tarde. Eu acho que nunca havia experimentado algo assim antes.
— Bom trabalho. — Abri um sorriso, pois eu sabia que aquele era um elogio e tanto. Pela primeira vez em muito tempo eu tinha me soltado na pista de dança ao ponto de não ser completamente eu mesma, e eu sabia que de vez em quando seria necessário que eu saísse do meu casulo, principalmente se eu quisesse continuar no CBA.
Arthur me conduziu até a saída do estabelecimento, pois já estava ficando muito tarde. Breno nos interceptou nesse meio tempo, nos parabenizando pelo nosso belo desempenho na pista de dança.
Arthur se ofereceu para me levar de volta até o CBA em seu carro, e eu aceitei.
Ficamos em silêncio por um bom tempo dentro do veículo, enquanto fazíamos a viagem de volta para a casa.
— Dianna, o que aconteceu hoje precisa ficar entre nós. Apesar de eu sugerir ao Arnaldo trabalhos de campo com os alunos, ele ainda está avaliando se é possível e de que forma isso pode ser feito — disse ele, com seriedade. — Se alguém descobrir, pode haver consequências sérias tanto para mim quanto para você.
— Eu imaginei que diria isso. — E eu ainda não acreditava que eu realmente fora capaz de burlar uma das regras mais importantes do colégio, mesmo sem querer. — Pode ficar tranquilo, eu não vou contar nada. Nós nos encontramos por acaso, não foi algo planejado.
Pensar que eu poderia ser expulsa da escola por ter me encontrado — com um professor, ainda — já me dava calafrios. Tudo bem que nos encontramos por acaso, mas ainda era assustador. Sei que Arthur só queria me ajudar, pois ele não deu em cima de mim em nenhum momento, mas ninguém nunca acreditaria nisso, principalmente o tão temido diretor Arnaldo, vulgo seu pai.
No entanto, pensar em meu professor dando em cima de mim me deixava estranhamente encabulada, principalmente depois de termos dançado daquele jeito tão sensual no clube. Tinha sido tudo muito profissional, mas o seu olhar afiado e sedutor e seu corpo no meu ainda me provocavam alguns arrepios, e eu tentei me convencer de que aquilo era absolutamente normal, afinal, Arthur era um homem muito bonito.
A viagem de volta para o CBA ocorreu tão rápido quanto eu imaginava, já que o clube não era tão longe. Arthur parecia tranquilo, mas eu estava alerta e tensa. Minhas mãos estavam muito suadas, e eu só queria entrar no meu alojamento para poder pensar em tudo o que havia me acontecido naquele dia.
Arthur estacionou o carro na garagem dos professores e usou sua chave para podermos entrar pelos fundos. O colégio estava muito escuro, e o medo que eu sentia de sermos pegos me deixou atenta a qualquer barulho que fosse suspeito.
— Então, acho que é isso. — abaixei a cabeça, brincando com um fiapo do vestido. — Boa noite, Arthur.
— Boa noite, Dianna. — Os olhos de Arthur brilhavam com a luz do luar que entrava pela fresta de uma das janelas do 2° andar.
Ele assentiu com a cabeça de forma lenta e eu dei alguns passos hesitantes para longe dele. Meu coração estava acelerado pela adrenalina e por algo mais que eu ainda não tinha coragem de identificar.
[...]
A chegada do fim de semana nunca foi tão bem vinda por mim quanto naquele dia. Grande parte dos alunos tinha ido passar o fim de semana com os pais, de modo que não havia tanta gente no colégio para presenciar o meu nervosismo.
— Fica tranquila que a foto está embaçada. Não dá para saber que é você. — Clara colocou uma das mãos em meu ombro para me tranquilizar enquanto eu encarava a foto em meu telefone.
Ontem, no clube, tiraram uma foto minha dançando com Arthur. Meu rosto foi camuflado por conta dos meus cabelos esvoaçantes e pela baixa qualidade da fotografia. Arthur era o único que dava para reconhecer melhor, mas mesmo assim, eu estava uma pilha de nervos.
Uma galera já especulava de forma ávida, querendo a todo o custo saber quem era a tal mulher misteriosa que dançava com Arthur naquela danceteria, e eu morri de medo de que descobrissem que a mulher era eu.
— O dono do estabelecimento sabe quem eu sou. — Arregalei os olhos quando me lembrei disso. — E se ele der com a língua nos dentes?
— Você não disse que ele parecia ser amigo do Arthur? Eu não acho que ele faria algo assim. — Clara mordeu o lábio, incerta. Me levantei da cama com o celular ainda na mão. — Aonde você vai?
— Vou falar com o Arthur. — Coloquei a mão na maçaneta da porta e a abri.
— Ele não fica na escola aos fins de semana.
— Ele veio para cá ontem, talvez ainda esteja aqui. — Dei de cara com Barbara na hora em que me virei para sair do quarto. Ela apoiou as mãos em meus ombros para que não trombássemos de frente.
— Olha por onde anda, otária. — A ignorei, irrompendo pelo corredor e deixando para trás uma Clara furiosa que discutia com Barbara por ter me chamado de otária.
O CBA estava mais vazio, mas ainda havia muitas pessoas pelos corredores. A maioria mexia em seus telefones, e eu pude ouvir que grande parte dos grupinhos conversava sobre a foto e a tal mulher misteriosa. Eu não podia deixar que descobrissem sobre mim.
Subi para o alojamento dos professores mesmo sabendo que não podia. Se alguém me visse ali, tenho certeza de que a minha punição iria aumentar. Eu também corria o risco de dar de cara com a Deborah, que com certeza faria questão de me prejudicar ainda mais, mas eu não tinha escolha. Eu não ia descansar enquanto não conseguisse falar com o Arthur.
Os alojamentos dos professores tinham uma plaquinha com seus respectivos nomes, e os corredores por ali estavam bem calmos e vazios.
Bati na porta correspondente ao meu professor e esperei, trocando o peso da perna de forma nervosa e quase desesperada. Ele tinha que estar ali.
Uma fresta da porta se abriu e eu vi os olhos sonolentos de Arthur me encararem de forma confusa.
— O que você está fazendo aqui? Esse andar é proibido para alunos.
— Me desculpe aparecer assim aqui, mas é que você viu a foto que está circulando por aí? — perguntei, olhando para os lados para ver se mais alguém havia me visto. Arthur abriu a porta por completo e me puxou para dentro do seu quarto para não correr o risco de que alguém aparecesse e nos visse.
— Vi. Seu rosto está irreconhecível. — Ele cruzou os braços na frente do peito com tranquilidade. Notei de relance que sua cama estava toda desarrumada, assim como os seus cabelos. Droga, eu tinha acordado meu professor.
— Como pode estar tão tranquilo com isso? — O pânico que me acometia não estava nem perto de chegar a alcançar o Arthur. — Aquele seu amigo viu a gente lá!
— O Breno não faria isso. Além do mais, já falei com ele sobre isso, ele me garantiu que não vai dizer nada e eu confio em sua palavra. Somos amigos de longa data. — Respirei fundo e tentei me acalmar, pois aparentemente, eu era a única a fazer uma tempestade em copo d'água por conta de uma simples fotografia.
No entanto, ao fazer isso, acabei reparando em algo que não deveria. Quando estou nervosa com alguma coisa, dependendo do meu nível de desespero, eu enxergo tudo embaçado. Agora que eu já começara a me acalmar, as coisas ao meu redor foram tomando foco, inclusive Arthur, que estava sem camisa na minha frente.
Não me leve a mal, eu já tinha visto Arthur sem camisa inúmeras vezes na tela da minha televisão, mas ao vivo era uma experiência totalmente diferente. Algo no jeito como ele coçava os olhos e os músculos do seu braço se contraíam me deixou extremamente sem graça, e eu tive que desviar o olhar.
— Bom, se você está tranquilo com isso, eu também estou. — Tomei fôlego ao ver que a minha voz estava trêmula e esganiçada pelo constrangimento. — Me desculpe por ter te acordado.
— Tenha um bom fim de semana, senhorita Smith. — Abri a porta do seu quarto e quase bati o dedo na quina de uma cadeira que eu nem tinha visto ali no canto. Arthur mordeu o lábio para conter uma gargalhada.
— Obrigada.
Saí correndo pelo corredor me sentindo envergonhada. O rubor em minhas bochechas aumentou ao ouvir uma pequena risada sair da direção do quarto de Arthur.
[...]
Se eu pudesse escolher uma coisa para fazer pelo resto da vida, eu com certeza escolheria a dança, porque ela me escolheu primeiro quando eu ainda era uma garotinha. Mamãe sempre fora muito perceptiva, e logo entendeu que eu tinha jeito para a coisa e amava o que fazia.
Com o tempo, dançar se tornou um porto seguro, a minha válvula de escape diária, a única coisa que me deixava 100% alegre e confiante, até mesmo quando meu interior estava inseguro.
A dança era o meu lar.
Acho que é por isso que fiquei tão satisfeita com o ensaio que fiz com o Diego na segunda à tarde. Nós ainda não estávamos 100% na coreografia, mas de 70%, já tínhamos pulado para 95 e eu queria muito chegar aos 100.
— Uau, você andou treinando durante o fim de semana? — Diego pegou sua garrafa de água e deu um grande gole nela.
— Digamos que tive um anjo da guarda e é tudo o que vou dizer. — Levantei as mãos para o alto e sufoquei uma risada com o olhar curioso de Diego em minha direção. Suas bochechas estavam cheias d'água e eu aproveitei para pegar a minha própria garrafa quase vazia. A sede deixava a minha garganta extremamente seca.
— Nós vamos arrasar na avaliação e na peça! Seremos o casal mais poderoso que essa escola já viu.
— Casal? — Me engasguei com a água, o que fez Diego ficar com as bochechas vermelhas, e não era pela água que ele tinha acabado de engolir.
— Somos parceiros de dança, de peça e melhores amigos. — Ele se aproximou de mim e passou um braço por cima do meu ombro. — Somos invencíveis juntos.
— É, nós somos mesmo. — O abracei pela cintura e o encarei com um sorriso divertido no rosto. Quando olhei para a frente, Arthur estava passando com Bruno pelo corredor. Meu professor nos olhou por cerca de meio segundo a mais antes de virar o rosto e continuar andando.
Assim como na maioria das vezes, não consegui decifrar o que se passava na face — e na cabeça — de Arthur.
— Quem você acha que é? — Os olhos de Diego acompanharam Arthur até que ele saísse do nosso campo de visão.
— Quem é o que?
— A garota da fotografia que saiu com o Arthur.
Falar desse assunto deixava o meu estômago embrulhado, principalmente quando eu estava ciente de que as especulações continuavam a todo o vapor pelo colégio todo.
— Ah, eu acho que deve ser uma atriz ou uma mulher desconhecida de outra cidade ou algo assim. Já ouvi dizer que Arthur gosta de mulheres mais velhas e nada parecidas comigo. — tagarelei, fazendo com que meu amigo me olhasse de modo confuso.
— Do que você está falando?
— Da minha teoria. Vai por mim, essa mulher já deve estar bem longe a essa altura. — Dei um tapinha em seu ombro. — Melhor esquecermos esse assunto. O que acha de dançar merengue?
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