Capítulo 18 - Pedido de ajuda

Passar a noite em claro pensando em várias coisas não me fez nada bem. O fato de ter tido uma insônia horrível noite passada me fez chegar atrasada na aula e receber um olhar atravessado de Arthur, que não gostara nada do meu atraso. Todos os alunos já estavam lá, o que deixou tudo muito mais vergonhoso.

Ainda me sentia preocupada com a Deborah e a tal pessoa que me seguiu de madrugada. Também pensava em Barbara e seu telefonema misterioso e para completar o pacote, ainda tinha que me preocupar com a escola e com meus próprios sentimentos.

Na minha lista de prioridades, eu ainda não sabia qual das minhas preocupações me afetava mais.

— Será que dá para você colocar mais emoção nessa frase, Ramona? — indagou Arthur, derrubando seu roteiro no chão e passando as mãos pelo rosto, em um sinal claro de que ele não estava em um bom dia.

Ramona o olhou com nervosismo, e tive a impressão de que ela iria sair correndo dali a qualquer minuto.

— Ela está quase se borrando nas calças! — zombou uma menina que segurava o outro refletor. Eu dei uma risada baixa.

— Fico feliz em saber que você está se divertindo, Dianna. — O comentário de Arthur estava carregado de sarcasmo. A menina que estava ao meu lado, cujo nome eu tenho quase certeza de que é Mikaela, se afastou na mesma hora.

Eu tinha quase certeza de que havia dado uma risada muito baixa e discreta.

— Por que você não vem até aqui para fazer essa cena no lugar da Ramona? Se for boa o suficiente, pode até ficar com o papel. — Ele me encarou com um olhar desafiador.

Quase larguei o refletor de qualquer jeito no chão. Tentei manter a compostura enquanto caminhava até ele de forma calma. Ramona saiu do palco praticamente correndo, e eu peguei o roteiro que ela havia deixado cair na pressa.

Diego, que estava no palco, me encorajou com um sorriso.

— Leia para mim as falas grifadas e cante e dance a música do terceiro ato. Acha que consegue fazer isso? — Balancei a cabeça de forma afirmativa, mas minhas mãos estavam tremendo.

— Consigo.

Procurei as falas que estavam grifadas para começar a ler.

— Depois de viver por tantos milênios, cantar milhares de canções e decifrar tantos versos de harpas celestiais, eu encontrei o amor. Eu finalmente me apaixonei! Mas você é um idiota, e não consegue encarar bem todas as coisas boas que entram no seu caminho.

— Eu não quero nada de bom! Eu não quero você na minha vida. Será que você não entende? Eu sou a pessoa mais complicada do universo, não sou nada bom. Isso nunca vai dar certo, Anlynx. Você é um anjo, e eu um humano! — Arthur gritou, entrando no personagem.

— Diga isso olhando nos meus olhos! — Aumentei meu tom de voz, me aproximando dele. — Diga!

— Eu não te quero. — Arthur manteve a voz baixa, olhando para o chão, exatamente como descrevia o roteiro. Emoções se passaram pelos nossos rostos, mas ele quebrou o momento de novo.

— Agora vamos para a cena da música do terceiro ato — Arthur desviou os olhos dos meus bruscamente antes de se afastar, pedindo para que a galera da sonoplastia soltasse o instrumental da música.

Me posicionei no centro do palco. A princípio, eu me senti nervosa e acuada, pois as luzes dos refletores me iluminavam, e todos estavam me olhando. Mas, quando a música começou a tocar, eu me senti leve. Me senti como se fosse a própria personagem, e fiquei tranquila ao começar a cantar a primeira estrofe.

Eu já tinha lido o roteiro da peça antes, e sonhava em fazer essa cena porque eu me sentia conectada com a personagem de uma forma muito estranha, mas não havia percebido que a música dizia o que eu sentia dentro de mim em relação ao CBA, sobre me sentir assustada e até mesmo um pouco incompreendida. A minha vida toda eu fui subestimada pelas pessoas, sempre aparentando ser uma garota frágil e sem talento. A única pessoa que nunca duvidou de mim foi a minha mãe, e eu cantava essa música pensando nela.

Comecei a me movimentar pelo palco, fazendo pequenos e leves passos de dança.

Fiquei me sentindo aliviada em conhecer a letra da música, e isso me fez ter mais coragem de mover meus pés. Naquele momento, nem a dor que eu sentia em minha unha iria me fazer parar.

Naquele momento, eu não enxergava mais as pessoas ao meu redor. Não sabia se Arthur estava detestando a minha atuação ou adorando. A única coisa que eu sabia, era que o meu lugar era bem ali, no palco.

Eu levantei a minha perna no ar e dei um giro, continuando a cantar a música. As luzes dos refletores me seguiam por onde eu andava, mas nem aquilo me intimidava no momento.

Na parte instrumental da música, eu continuei dançando, só que com mais firmeza. Os movimentos continuaram leves, só que mais fortes conforme a música ia crescendo. Eu tinha me unido a música e ela a mim, e eu não fazia ideia quando fora a última vez que havia me sentido daquele jeito. Eu sorri, rodopiei, e quando voltei a cantar, me senti mais viva do que nunca.

Quando a música acabou, eu me sentia ofegante e cansada. As luzes principais se acenderam, e a turma inteira se levantou para me aplaudir. A vergonha me dominou, mas agradeci timidamente e tremi quando Arthur veio em minha direção. Seu semblante não me dava nenhuma pista do que poderia estar se passando pela sua cabeça e aquilo me deixou bastante temerosa.

— Parabéns, Dianna. O papel agora é seu. Não estrague tudo. — Ele olhou para um ponto atrás de mim. — Desculpe, Ramona. A iluminação vai ser o seu departamento a partir de agora. — O rosto de Ramona estava pálido, mas ela parecia estranhamente aliviada por ter sido substituída.

A felicidade que eu senti foi tão grande que um sorriso se abriu em meu rosto. Acho que Arthur também queria sorrir, mas alguma coisa lhe incomodava. Dava para ver que ele parecia cansado, desanimado e abatido.

Diego veio em minha direção me parabenizar, dizendo que agora podíamos ensaiar juntos as falas e a nossa coreografia e eu concordei, ficando cada vez mais empolgada.

Quando a noite chegou, eu me sentia exausta. Além do ensaio da peça, tive aula de jazz, um pouco de teatro e também uma aula de canto. Depois, ainda ensaiei a coreografia da avaliação com o Diego — que parecia um tanto frustrado após o fim do ensaio — e participei de mais um dia de castigo com Arthur. Quero dizer, ele só me mandou continuar limpando a sala, mas disse que não poderia me ajudar e que iria aparecer de tempos em tempos só para ver se eu estava trabalhando.

Naquele momento, eu só desejava a minha cama.

Eu caminhava em direção ao alojamento feminino parecendo um zumbi desconjuntado.

— Dianna, posso falar com você? — Diego estava parado na porta do meu alojamento de braços cruzados. Era um milagre que nenhum zelador tivesse lhe visto ali ainda.

— Está tudo bem?

O semblante no rosto de meu amigo me dizia que a cama teria que esperar.

— É sobre a nossa coreografia. — Ele coçou a nuca, parecendo desconcertado. — Podemos conversar lá embaixo?

— Claro. — Abri um sorriso incerto e o acompanhei até o andar de baixo. Meu amigo parecia inquieto, o que me deixou em estado de alerta.

Paramos perto de um dos bancos do térreo, quase em frente à sala dos professores.

— O que aconteceu?

— Você acha que a nossa coreografia está funcionando?

Mordi o lábio e pensei em como parecíamos travados no ensaio de hoje, principalmente eu.

A música que havíamos escolhido era rápida e difícil, e mostrava um lado meu que eu ainda nem sabia se tinha.

— Eu acredito que ela pode melhorar... — Ele percebeu a incerteza em meu tom de voz.

— É uma coreografia muito ousada e difícil e não conseguimos transmitir bem a energia que ela necessita.

— Você acha que eu sou o problema?

— Eu não disse isso, Di. — Meu amigo realmente parecia sincero. Suas bochechas estavam coradas pela vergonha. — Mas temos que admitir que as coisas não estão fluindo como gostaríamos.

— Nós podemos aumentar o horário dos nossos ensaios. Eu posso ver vídeos também para poder me aperfeiçoar ainda mais ou falar com um dos professores.

— Acho que podemos fazer isso... É uma ótima ideia. — Mas dava para ver que ele ainda não tinha certeza se ia funcionar, principalmente depois que ele tocou meu queixo com a ponta dos dedos e afagou a minha nuca.

Nós nos despedimos um do outro e eu fiquei parada ali no térreo feito um poste por uns bons minutos, apenas pensando em todas as coisas que eu precisava melhorar. Alterar a coreografia estava fora de cogitação, se eu não conseguisse me superar agora, isso nunca mais aconteceria, e eu precisava ser mais ousada se quisesse continuar no CBA. Aquele ranking de desempenho foi mais um alerta do que qualquer outra coisa.

Quando eu finalmente deitei em minha cama, um vídeo me chamou a atenção. Ele estava na minha lista de recomendados, e aparecia o rosto de Arthur numa thumb mal feita de um print de qualidade duvidosa. Coloquei os fones de ouvido e dei play no vídeo, pois Barbara e Clara já dormiam.

Arthur estava em uma pista de dança do que parecia ser uma balada, dançando de forma sensual com uma mulher muito linda. Eles dançavam lambada, e os movimentos que faziam juntos me deixaram encabulada só de assistir.

O vídeo demorou uns dois minutos para acabar, e eu o assisti hipnotizada. De uma hora para a outra, eu sabia a quem precisava recorrer para melhorar a minha sensualidade na dança. Só não tinha certeza de que Arthur iria concordar em me ajudar nisso.

[...]

Nem eram 8 horas da manhã ainda e o sol já estava brilhante no céu. O calor escaldante do Rio de Janeiro já começara a dar as boas vindas para mim e para a maioria dos alunos, que permaneciam em suas respectivas camas.

Mais uma vez, eu não havia pregado o olho direito à noite pensando em como falaria com Arthur sobre as minhas dificuldades na dança, pois apesar de me sentir muito confortável ao lado dele, a timidez me vencia só de pensar em ter que lhe pedir ajuda.

Então, eu decidi que o esperaria na porta de sua sala. Eu sabia que de manhã cedinho era o melhor horário para conversar com um professor, pois a maioria dos puxa sacos ainda estavam dormindo, e eu não queria que ninguém me visse falando com ele.

Como eu previa, Arthur apareceu cedo no topo da escadaria. Ele estava sozinho, e segurava algumas pastas contra o corpo. Me levantei assim que meu professor se aproximou e eu notei que, assim como eu, ele não parecia ter dormido muito bem. Arthur pareceu surpreso quando me viu.

— Bom dia, Dianna. Deseja alguma coisa?

— Sim. Preciso que me ensine a ser sexy na pista de dança. — falei tudo de uma vez, recebendo de Arthur um olhar surpreso.

Droga, eu sabia que devia ter tentado uma abordagem diferente.

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