Primavera

Ayo

— Desculpa!— Ayo falou para o cara da bicicleta que ela por pouco não atropelou.

Ayo dirigia um Fusca amarelo, presente de sua avó Roseta quando completou seus dezeseis anos, com a carteira recém tirada a garota não era nem de longe uma mestre no volante e o trânsito caótico não ajudava, ela estacionou na primeira vaga que conseguiu torcendo para nenhum carro estacionar atrás dela ou era impossível ela conseguir sair dali.

A primavera acabara de chegar, trazendo com ela o cheiro das rosas e o colorido que Ayo tanto amava, era sua estação preferida, tudo parecia alegre e as cores brilhavam, vibrantes, em diferentes tons, nas árvores, nas flores e nas pessoas. Ayo amava como as roupas da época eram tão cheias de vidas, com estampas, sobreposições, diferentes combinações que davam extremamente certo com seu estilo criativo.

A menina vestia uma jardineira lilás com uma camisa verde que tinha no peito a frase "The future is female", seus tênis vermelho com cadarços de diferentes cores chamavam a atenção das crianças enquanto ela andava pela calçada das lojas, entrando vez ou outra em alguma, apenas para ver os mais novos lançamentos da moda, estava tão distraída que se quer notou uma outra garota vindo em sua direção.

Bam!

As duas peitaram e as compras da outra garota foi ao chão, espalhando potes de tinta e pincéis pela calçada, algumas pessoas que passavam lançavam olhares para elas duas.

— Me desculpe!— Ayo disse enquanto ajudava a colocar alguns potes de volta a sacola de papel que a outra segurava.

— Tudo bem, por incrível que pareça, acontece comigo sempre.

— Qual o seu nome?— Ayo perguntou vendo o macacão sujo de tinta que a menina usava, o brasão de alguma escola de artes estampado no peito.

— Briana e o seu?

— Ayo!— A menina disse e a outra fez uma cara engraçada.

— Ayo? Que nome diferente!— Ela falou e logo depois arregalou os olhos.— diferente bom.— ela completou e Ayo gargalhou da garota que ficou corada.

— Tudo bem, eu estou acostumada com as pessoas acharem meu nome um pouco diferente, meu pai é da Nigéria, ele escolheu meu nome.— Ayo falou e Briana sorriu.

— Aí meu Deus!— A garota falou mirando algum ponto acima da cabeça de Ayo que virou para olhar também, ali se via o relógio da cidade, uma antiguidade com ponteiros enormes que volta e meia parava de funcionar, mas hoje não, hoje ele marcava as horas perfeitamente para quem quisesse ver.— Eu estou atrasada, são uma e cinco, eu entro na escola uma e quinze!

— Tudo bem!—Ayo disse para acalmar a garota que parecia prestes a entrar em pânico.— Onde fica a sua escola?

— Na rua nove! Meu deus, eu tenho prova hoje, é da minha escola de artes, não posso perder, por isso vim comprar umas tintas, porque as minhas estavam velhas e...

— Calma, eu levo você, eu já ia naquela direção mesmo!

Mentira, Ayo iria para casa depois dali, que ficava no completo oposto, mas o desespero da garota fez Ayo pensar que não custava nada desviar o caminho um pouquinho para um bem maior.

— Sério?— a garota perguntou, os olhos azuis brilhando.

Ayo pensou no quão a mãe daquela garota ficaria decepcionada ao saber que a sua filha entraria de tão bom gosto no carro de uma completa estranha, não que a imagem de Ayo fosse suspeita, dado ao fato do seu corpo franzino não aguentar um soco bem dado, ela não ofereceria muito perigo para Briana, desde que o trânsito estivesse calmo, é claro.

— Sim, vem comigo!— ela disse e Briana seguiu a menina até o Fusca estacionado, por um milagre do destino a vaga de trás ainda estava desocupada e assim Ayo poderia sair sem problemas.

— É um Fusca!— Briana falou assim que reconheceu o modelo do carro, estranhamente a garota amava carros antigos.

— sim.— Ayo disse entrando e abrindo a porta do carona.

— Acho fuscas lindos.

— Bom, esse foi presente da minha avó.— Ayo disse entrando na rua.

— Obrigada mesmo, você está salvando a minha vida.— Briana falou distraída mexendo nas sacolas aos seus pés, analisando se não estava faltando nada.

— Não precisa agradecer, você nasceu aqui mesmo?— Ayo disse observando que o rabo de cavalo da garota estava sujo de tinta.

— Sim e você?— Briana perguntou mesmo sabendo que o sotaque forte da garota já indicava que ela não era.

— Não, minha família veio do Brasil, minha mãe é brasileira e meu pai nigeriano, mas aqui é realmente lindo, principalmente a primavera.

— Eu prefiro o inverno, amo a neve.

— A neve é realmente um espetáculo, eu nunca havia visto neve antes de chegar aqui, no Brasil há apenas alguns estados pro sul em que se neva.

— Acho que não conseguiria viver em um lugar onde não posso ver a neve cair durante o Natal.— Briana disse enquanto via o Fusca dobrar uma rua antes da sua escola.—Estamos chegando!— ela disse e distraída deixou um dos potes de tinta cair foi quando se abaixou para pegar que Ayo olhou para garota.

Briana era definitivamente o tipo de garota que Ayo evitava no colegial, loira, alta, olhos claros, provavelmente popular.

Ao contrário do que Ayo previa, Briana era o oposto do jeitinho afetado que essas garotas costumavam ter, talvez se tivesse conhecido a garota em outra situação a acharia metida, com aquele tipo de personalidade esnobe que se acha superior a todos os outros, mas Briana não era isso, ela era colorida, de uma maneira diferente de Ayo e isso talvez foi o que lhe chamou a atenção. Briana brilhava em cores diferentes e se ela tivesse que escolher uma cor para Briana, definitivamente seria azul.

— Escuta, eu ainda não conheço a cidade direito e não tenho muitos amigos aqui, até porque eu cheguei somente a um mês, mas seria legal se eu pudesse tomar um café com você qualquer dia desses.— Ayo disse.

— Claro, onde tá seu celular?— Briana perguntou.

— Meu celular?

— Sim! Pra eu poder salvar meu número.

— Assim... Claro, aqui...— Ayo entregou o celular nas mãos de Briana que com rapidez e agilidade pulava de um número para outros. Com toda a certeza, a mãe de Briana precisava ter uma conversa com a filha sobre "não dar seu número para uma completa estranha".

— Prontinho, agora você pode me ligar.— ela disse já saindo do carro.— Assim! Eu em geral fico livre somente depois das dezoito horas, conheço uma cafeteria que você vai amar, obrigada pela carona Ayo.

— Sem problemas!— Ayo disse vendo a menina virar de costas. — Ham, e Briana?— ela chamou fazendo a garota se virar novamente.

— O que?

— Não entre no carro de estranhos.— Ela disse fazendo rir e entrar no colégio, o rabo de cavalo sujo de tinta balançando de um lado para outro.

A garota saiu dali virando a esquina e tomando o caminho oposto.

As vezes é bom sair um pouquinho da rota

Ela pensou.

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