A procura ღ Capitulo 3

Após alguns filmes assistidos, alguns doces e muita risada, Sofia e Cristian adormeceram. Sentada em sua cadeira, Sol observava os irmãos em sono profundo. Após mexer em seu notebook para passar o tempo, da janela do seu quarto avistava uma parte da cidade ainda acesa e sentia a brisa fria entrar. Ela sempre pensava em tanta coisa ao mesmo tempo que, no fim, não pensava em nada. Passava das onze horas, a fome havia chegado de novo e ela queria mandar a dieta para o ar naquele momento quando percebeu que passaria a noite preocupada.

— Não irei ligar, tenho que viver mesmo preocupada? — Ela falou baixo e cruzou os braços, voltando a encarar o notebook fechado.

Seu celular recebeu uma notificação e ela pegou-o às pressas.

Yurikim curtiu sua foto.

Ela bufou, ignorando a notificação.

Sol estava ciente de que seu pai não havia cumprido a promessa, mesmo com muitas pessoas torcendo por isso. Ela relembrava sua saída de casa e da sua barba feita. Quis com toda sua força que Charles permanecesse naquela forma. O álcool em excesso se tornava uma doença, um vício, e por tudo que via há três anos, nunca sentiu a mínima vontade de provar, nem mesmo em festas que foi com Cecilia.

Saindo do quarto em passos lentos, após se certificar de que seus irmãos estavam realmente dormindo, ela seguiu rumo às escadas que a levariam à cozinha. A casa estava silenciosa; sua avó dormia cedo e Nicole, após corrigir atividades, foi para a cama. Era essa a rotina e Sol sabia muito bem dela.

Com o celular em mãos, se recusava a ligar para sua mãe e a deixar preocupada em plena madrugada. Preferia esperar ali, sozinha. Ela encostou-se à pia da cozinha e encarou o arranjo de frutas na mesa, tornando-se pensativa.

— Era pedir demais apenas deixar a comida lá e voltar para casa, pai? Não é como se eu conseguisse apenas deitar e dormir, que merda.

— Está com fome? — Nicole falou, assustando-a. — Por que está sozinha no escuro?

A luz acendeu e Sol encarou sua tia que se aproximou e encostou-se à pia também. A professora não precisava de muitas palavras para decifrar as emoções da sobrinha, então apenas a entregou uma maçã verde e recebeu um sorriso.

— Obrigada, tia, pensei que estivesse dormindo. — Sol sussurrou, mordendo a maçã azeda. — Estou pensando e achei o esconderijo do cigarro da vó entre as plantas no quintal. — A menina sorriu e Nicole bufou.

Luzia foi proibida de fumar em prol da sua saúde, mas a mesma dizia fazer o que queria, assim comprava e os escondia.

— Sua vó não tem jeito, os molhou? — Ela perguntou, e Sol consentiu.

— Achou que todos estivessem dormindo, por isso está aqui sozinha?

Sol a encarou e percebeu que Nicole não seria enganada facilmente. Era isso; Nicole nunca acreditava nas desculpas esfarrapadas que sua sobrinha contava para esconder as preocupações.

— Não é como se precisasse fugir de você, apenas estudei e não estou com sono. — Ela explicou, e Nicole ouviu com atenção.

Nicole gostaria de acreditar, se não a conhecesse tão bem. Ela sabia que Sol sempre se preocupou demais com problemas que não eram seus, sempre tentava resolver situações que não tinha a obrigação, principalmente quando se tratava do pai. Nicole também sabia que ela não dormiria até Charles chegar, e não adiantava pedir por isso.

— Não precisa esconder suas preocupações ou sorrir o tempo todo, estamos todos no mesmo barco. Não existe ninguém feliz o tempo todo, acredite. — Ela sorriu para a sobrinha, que não a encarou. — Quero que pense em você, nos seus estudos e na sua patinação. Resolveremos o resto...

Sol ouvia tudo com atenção e se recusava a deixar suas lágrimas cair, segurando-as com firmeza. Ela sabia que sua tia estava certa e sempre dizia as mesmas coisas, mas não era tão simples assim.

— Obrigada por tudo que faz por nós, ajuda mais do que sabe. — Sol sussurrou. — Queria salvá-lo...

Nicole suspirou e não soube o que falar.

— Eu sei, mas... — Nicole tentou falar e foi interrompida pela sobrinha com a mão levantada. — Ok...

— Você deixaria de tentar salvar o vovô mesmo sabendo que ele poderia morrer a qualquer momento? Mesmo que a culpa fosse dele, você pararia de tentar? — Sol piscou os olhos lentamente e aguardou uma resposta.

Nicole tornou-se muda. Ela sabia que Sol jamais deixaria de tentar ajudar seu pai, e sabia o quão Charles era amado por seus três filhos e que o perder deixaria um buraco nos três. Nicole sabia bem sobre o sentimento de perder um pai e não o desejava para ninguém.

— Não, eu tentaria salvá-lo mesmo que minhas chances fossem nulas... — Nicole admitiu e bufou em seguida. — Desde pequena você deixa as pessoas sem palavras, como pode fazer isso? — Nicole abraçou os ombros da sobrinha, e Sol sorriu sem vontade.

— Quero salvar meu pai do vício, mas sinto não ter como. — Sol sussurrou, e Nicole deglutiu seco. — Isso é frustrante...

Sol se aconchegou nos braços da tia e deixou uma lágrima cair, após muitos minutos segurando-as. Nicole fingiu não perceber, Sol não gostava de parecer fraca, mesmo que isso fosse humano.

— Ligou para sua mãe? — Nicole sussurrou, ainda abraçando a sobrinha, e ela negou. — Não ligue, andamos conversando muito e não dá mais para ficarmos dando chances. Durma tranquila, amanhã aliviará sua cabeça nas pistas e tudo se resolverá em breve.

Todo mundo falava isso há anos...

— Nesses três anos tentamos de tudo, não é? Estamos desistindo? — Sol encarou Nicole e suspirou.

Mesmo sendo uma menina muito madura desde criança, Sol tinha o coração mole quando se tratava das pessoas que amava.

— Tentamos de tudo e não estamos desistindo, sabemos que isso é uma doença e que, assim como todas as outras doenças, precisa de tratamento. Ele vai se curar, vai voltar a ser o Charles que amamos. — Nicole falou e puxou a sobrinha pela mão.

A professora estava escondendo toda sua preocupação, ela levou a menina até seu quarto e abriu a porta devagar para que seus irmãos não acordassem. Sol subiu a escada rumo à sua cama, já de cima fez um gesto com os dois dedos formando um coração para a tia, que respondeu com um beijo.

Nicole fechou a porta do quarto e discou o número do cunhado mais uma vez. Ela insistiu, e o mesmo não atendia, chamando até cair na caixa postal.

— Vamos, Charles, resista. — Com o celular na orelha, Nicole lamentou. — Você estava indo bem...

Ela passou a semana esperançosa de que o cunhado sairia do vício, e não sabia como ele encontrava dinheiro para beber, já que Isis tinha parado de emprestá-lo qualquer quantia e seus pais não davam mais. Porém, todos sabiam que o que mais existia no mundo eram amigos para pagar bebida, e amigos Charles sempre teve, e muitos.

Sol deitou na cama e buscou conversar com Cecilia para esfriar a cabeça, caso contrário pensaria em mil coisas que poderiam acontecer na madrugada.

Está ai, Ceci? Achou aplicativos legais? Não consigo dormir, nem assistir.

Sol digitou rapidamente e a amiga logo respondeu.

Estou aqui, da mesma forma. Fiz a atividade e baixei um aplicativo novo. ;)

Qual é jogo da vez? Aquele de empilhar é horrível. Tem algum mais animado? Eu também fiz a atividade, bem difícil aliás.

Sol ficava feliz ao falar com Cecilia, o tempo passava rápido e esquecia os problemas.

Sem jogos dessa vez, a loja indicou um que se chama Cicle Of Friends. É novo e parece ser legal, baixei para testar.

Com a mão no queixo Sol pensava o que poderia ser aquilo.

Círculo de amigos? É rpg?

Não Solzinha, é um aplicativo que você conhece as pessoas anonimamente, envia uma solicitação apenas vendo o nome da pessoa, depois ver a foto. Você conversa com alguém e faz amizades saudáveis, tudo que é improprio o próprio aplicativo bane.

Sol balançou a cabeça em negação e sorriu, claro que não iria embarcar naquela loucura sabendo como o mundo tem pessoas maliciosas e golpes.

Ceci, isso não parece ser uma boa ideia. Existem pessoas ruins no mundo se passando por outras para fazerem coisas ruins. Esse não dá, vamos ver outro. :/

Ela foi sincera e Cecilia demorou a responder, por um momento ela questionou ter sido dura demais.

Tem razão, esse aplicativo deve ser igual aos outros no fim das contas. Acharei um jogo bom, você é a parte da amizade que tem juízo.

Sol sorriu encarando a tela do celular, Cecilia era compreensiva com seus medos e vice versa.

Sou mesmo, ache um jogo de verdade e me diga. Irei dormir agora, durma também Cavaliere. S2

Irei dormir Solzinha, acharei o melhor jogo. S2

Ela gostava de conversar com Cecilia, aquela amizade foi a primeira que Sol sentiu ser verdadeira. A ruiva era o tipo de pessoa que estava sempre acordada, não importa a hora que Sol mandasse mensagem. Elas iam a festas, dividiam as dores, sorriam juntas, patinavam e tinham certeza que permaneceriam daquela forma por muitos e muitos anos. -Sol bloqueou a tela do celular e encarou o teto.

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Normalmente, adolescentes saem de casa escondidos para festas, mas não Sol. Ela fechou o portão de casa com medo de ser pega por sua tia, após Nicole levá-la para o quarto, Sol permaneceu deitada, orando para que o sono chegasse, mas isso não aconteceu. Passava de meia-noite, e ela havia decidido sair à procura do pai em bares próximos, aqueles que ele frequentava no famoso Beco Listrado, que no mês do carnaval deveria estar lotado.

Com seu moletom e o capuz na cabeça, a menina sentia o frio intenso da madrugada paulista. Seus óculos embaçavam com facilidade, e ao respirar, uma fumaça saía de seus lábios. Ela colocou o celular na cintura e deixou o medo em casa quando saiu pela porta. Seu bairro era tranquilo, mas a cidade em si não era, e ela sabia disso. Por sorte, seu pai nunca tentou se esconder, poucas ruas após a sua havia uma rua estreita conhecida como o Beco Listrado, onde havia muitos bares próximos uns dos outros.

Sol andava com as mãos dentro do moletom, o silêncio pairava e não havia ninguém na rua. Em passos longos, ela estava cada vez mais perto do beco e podia ouvir músicas altas vindas de lá, mas não sabia o que encontrar em um lugar que nunca tinha ido. Forçando a vista, avistou a rua e retirou o capuz da cabeça.

Ela procurou o carro do pai por toda a rua e não encontrou nada. As pessoas encaravam a menina enquanto ela passava de bar em bar em busca dele, sem demonstrar vergonha. Determinada a encontrá-lo, ela examinava todas as mesas.

— O senhor viu um homem na casa dos quarenta anos, com cabelos ondulados e olhos esverdeados? Charles... — Sol se aproximou de um garçom, que balançou a cabeça negativamente.

— Desculpe, é complicado lembrar rostos. — O garçom explicou. — E por nome não me lembro!

Seria difícil lembrar rostos se ele não estivesse aqui...

Sol continuou andando pela rua, repleta de bares. Alguns estavam iluminados com luzes coloridas, a música era alta e o cheiro de cigarro barato era intenso. Com os olhos cheios de lágrimas, estava ficando cada vez mais difícil controlar sua raiva e medo. 

Charles estava no final da rua, em um bar de procedência duvidosa e com seus amigos sentados à mesa, ele sorria à toa, já embriagado. Ele não havia conseguido manter sua promessa mais uma vez, o vício falava cada vez mais alto quando ele se sentia inútil. Não sabia como tudo havia começado; no início, era apenas uma cerveja com amigos, e quando se deu conta, já sentia a necessidade de beber mais todos os dias.

— Mais uma para fechar. — Um homem gritou para o garçom, que assentiu. — Mais uma porção de torresmo também, Chico.

— Chico, o Rodrigo paga tudo hoje. — Charles sorriu. — Vamos mais uma partida de carteado, ainda está cedo, mas preciso ir.

A noite estava boa para Charles. Após entregar a marmita da esposa, ele se permitiu vencer a vontade de parar. Era assim que ele se sentia, mas era essa vontade que o destruía pouco a pouco, quebrando corações ao seu redor.

Sol passava de bar em bar, recebendo olhares, mas sem se importar. Alguns garçons pediam para que ela fosse para casa, dizendo que aquele ambiente não era adequado para uma jovem como ela, e estavam certos. Foi então que, à distância, ela o viu. Sol cerrou os punhos ao ver seu pai e sentiu seu coração apertar. Ela reconheceu aquele moletom, que ela havia trazido de uma das viagens com Cecilia, para ele.

Ela caminhou cada vez mais rápido em direção a um dos últimos bares da rua, um local escuro e lotado. Havia apenas duas mesas com muitos homens e uma mesa com seu pai e dois amigos, que ela não conhecia. Ainda de longe, ela parou e tentou segurar as lágrimas com a mão no peito, deixando-as cair e aumentando sua raiva.

Ao pegar seu celular, ela encarou a hora e pouco passava de uma hora. Ela discou o número do seu pai e o viu recusar sua chamada fazendo ir para caixa postal, aquilo fez com que mais lagrimas caíssem. Sol se aproximou do bar e tornou a receber mais olhares, menos do seu pai de costas para ela.

— Pai. — Ela sussurrou, mas não foi ouvida. — De novo...

Os olhares foram desviados e ninguém parecia se importar com sua presença. Sol deu um passo para trás, e aquele foi seu primeiro passo de desistência, mas Charles não sabia. Suas lágrimas caíam com facilidade, a ponto de precisar tirar os óculos, mesmo sabendo que o encontraria ali. Seu coração foi esmagado, sua vontade era armar um escândalo, gritar e tirá-lo à força daquele lugar, mas nada fez. 

Apenas deu as costas e, ainda sem óculos, correu para fora do bar.

— Burra, achou mesmo que ele iria tentar... — Ela murmurava para si mesma, com a vista totalmente embaçada, correndo o mais rápido que podia.

Sua corrida poderia ter dado certo se sua miopia não deixasse tudo à sua frente embaçado. Tudo ficou pior com as lágrimas e o desespero acumulado por sempre se reprimir. Quase no final da rua, ela esbarrou em alguém e caiu.

— Moça, olha por onde anda... — A mulher com quem Sol havia esbarrado disparou alguns desaforos e se afastou.

Ainda no chão, Sol sentia suas mãos sujas e uma delas extremamente dolorida. Ela levantou rapidamente e se sentou no meio-fio até conseguir colocar seus óculos. Ninguém a observava, cada um estava focado em sua própria vida, e ela agradeceu por isso.

Ela encarou a mão sangrando e os cacos de vidro no chão.

— Merda, que saco mano. — Ela gemeu ao assoprar o corte mediano e se levantou com o auxílio de uma mão. Sua calça estava suja, seu celular no chão e a raiva a dominava.

Sol caminhou tentando se limpar e agradeceu por seu celular estar a salvo. Muitas emoções preenchiam seu coração: tristeza, medo, raiva e falta de esperança. Tudo que nunca sentia estava se acumulando de uma vez. A única coisa que ela desejava ao sair de casa era não encontrar seu pai em um bar naquela noite.

Sentada em um banco de cimento em uma praça pouco iluminada, ela arfava de dor após lavar o corte com água mineral e orava para não ter vidro ali dentro. Ela precisava conter tudo aquilo para não precisar dá muitas explicações.

— Minha querida fita, terá outra utilidade hoje. — Sol puxou uma fita dos seus cabelos e a soltou.

Ela prendeu a fita larga em sua mão e deu um nó apertado, sentindo uma dor irritante. Era tudo o que podia fazer naquele momento. Respirou fundo e começou a olhar as fotos em sua galeria lotada, ela nunca conseguia apagar as fotos. Ainda tinha fotos com Yuri, muitas com sua família e milhares com Cecilia. Todas aquelas pessoas de alguma forma tornaram seus dias mais coloridos em várias ocasiões, e naquele momento, sozinha, ela se sentia no escuro.

Com o celular em mãos, ela sentia o frio adentrar suas narinas e pouco se importava com isso. Sol amava jogos, sempre amava zerá-los e recomeçar como se fosse fácil. O que ela não sabia era que o destino estava pronto para entrar em ação quando, em seu jogo, surgiu na tela um grande anúncio sobre um aplicativo próprio para fazer amizades: o tal "Circle of Friends." Sol encarou aquilo e bufou, saindo do jogo, ela odiava anúncios.

Andando de volta para casa com a mão enfaixada, sentia uma dor intensa a ponto de esquecer seu celular no bolso, sem receio da violência em São Paulo. Ela apenas queria chegar em casa e gritar com a cara enfiada no travesseiro.

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Ela pensou ter saído despercebida, mas falhou nisso. Quando fechou o portão e abriu a porta de madeira da sua casa, Nicole estava sentada no sofá com seu pijama infantil. Sol deglutiu seco e apenas fechou a porta com cuidado para não acordar o resto da casa. Escondeu sua mão machucada no bolso do moletom e se sentou ao lado da tia, que bufou.

— Quando você nasceu, sua mãe pediu licença para se dedicar totalmente a você por um ano. Quando ela voltou ao trabalho, eu e sua vó olhávamos você dormir e, quando pegava no sono, esperávamos meia hora para saber se o sono estava pesado. — Nicole sorriu. — Desde então, sempre faço isso com você e com seus irmãos. Vi quando saiu, escondido.

Por fim, ela falou, e Sol baixou a cabeça.

— Desculpa, tia. — Sol sussurrou envergonhada, e Nicole se aproximou dela.

— Moramos em uma cidade perigosa, estamos em uma madrugada fria, e se alguma coisa acontecesse com você? Sei que foi atrás do seu pai, mas não faça mais isso. — Nicole falou seriamente, e Sol deixou uma lágrima cair.

A menina, com seus cabelos soltos, permitiu mais lágrimas caírem, e foi ali que Nicole percebeu o quão mal ela estava. Quando Sol saiu, ela ouviu a porta fechar e perdeu o resto do sono, sendo tomada pela preocupação que não a deixou dormir mais.

— Fui atrás dele naquela rua que a mãe sempre fala, mas nunca me deixou ir. — Sol cochichou, encarando o chão.

— O achou? — Nicole perguntou, já sabendo a resposta, e Sol baixou a cabeça.

— Sim, em um bar de quinta, bebendo feliz com os amigos, jogando carteado e parecendo pouco se importar com quem estava a sua espera. — A menina explicou, fazendo a tia coçar a cabeça.

Sol contou todo seu trajeto, tudo o que viu e também que nada fez ao vê-lo.

— O vício existe, mas sem a consciência, os tratamentos não funcionam. — Nicole abraçou a sobrinha e encarou sua calça rasgada. — O que houve com essa calça? — Ela apontou para o joelho da sobrinha, e Sol retirou a mão do bolso.

Sol retirou a fita lentamente da mão, tornando a sentir dor. Nicole se espantou com o corte e pediu detalhes de tudo já nervosa. A professora sabia que uma das consequências do vicio era a agressividade, e mesmo que o cunhado nunca tivesse manifestado isso, sentia medo.

— Esbarrei em uma pessoa e caí. Ninguém fez nada comigo. — Sol franziu o cenho quando Nicole pegou sua mão. — Não conte nada disso à minha mãe. Ela vai surtar.

Nicole puxou a sobrinha para o banheiro e, em silêncio, pegou uma caixa de primeiros socorros que estava cada vez mais vazia devido aos machucados de Cristian durante suas partidas de futebol. Sol sentou no vaso sanitário fechado, e sua tia fez um curativo mediano. Se não melhorasse, ela teria que levar Sol para receber pontos. Ter uma irmã enfermeira deu a Nicole algumas noções de primeiros socorros, e isso a orgulhava.

— Está mais loira? Foi ao salão hoje? — Sol quebrou o silêncio, e Nicole sorriu. — Está linda.

Nicole, assim como todos da família, tinha cabelos cacheados e castanhos, mas sempre os alisou por não ter paciência para cuidar dos cachos.

— Só você para perceber isso. Clareei mais ontem... — Nicole mexeu nos cabelos longos e bem lisos. — Sempre que preciso esvaziar a mente, mudo o cabelo.

Nicole sorriu, mas sentia receio de um dia ficar careca.

— A Rafaela não te procurou mais? Ainda estão brigadas? — Sol gesticulou e Nicole sorriu.

Nicole se assumiu lésbica aos quatorze anos, após a morte do pai, quando seu coração estava cheio de certezas e medos. Sempre recebeu apoio e amor da família para ser feliz, não importando com quem namorasse. No passado ela dizia não ter sorte no amor, seus relacionamentos sempre acabavam sem muita explicação, mas então ela contou Rafaela anos atrás e ela percebeu que tinha encontrado tudo que precisava, mesmo quando elas brigavam feio.

— Não quero mais brigar. Iremos conversar e ficará tudo bem. — Nicole sorriu, e Sol consentiu. — Agora vá para a cama. Deixarei isso entre nós se nunca mais for atrás dele na madrugada. Tome esse comprimido.

Sol tomou o comprimido e consentiu ao pedido da tia, seguindo para a sua cama. A madrugada estava avançando e o sono não aparecia para ela. Com um curativo na palma da mão, sentiu dificuldade para subir na cama, mas conseguiu. Finalmente, deitou-se em sua cama e deixou mais lágrimas caírem. A raiva misturava-se à decepção e ao medo.

— Que se dane... — Ela ligou seu celular novamente e abriu a loja de aplicativos.

Em um impulso, digitou o nome do aplicativo dado por Cecilia e finalmente clicou em baixar. Pensava que, se bem não fizesse, mal também não faria.

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Um capítulo com muitas dores e reflexões não é mesmo? E esse impulso vai dá muito o que falar...

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