Capítulo 7 - Aperto de mãos

7

O DIA FOI PÉSSIMO.

O que estava ruim, ficou pior.

O único momento bom entre eu e o Thomas foi, de fato, quando eu estava brincando com Jack.

De resto, foram farpas o dia inteiro. Eu não aguentava ficar de pé na água. Tive que ficar sentada o dia todo conversando com Érick e Charles, que não queriam me deixar sozinha. Rose, Thomas e Nicolas ficaram na água e jogaram alguns jogos de bebidas. Thomas não parava de me lançar indiretas -diretas- sobre como eu estraguei o dia, fazendo os garotos ficarem sentados comigo.

Acabou que ele e os garotos discutiram algumas vezes em minha defesa, inclusive Nicolas.

Fora que, Charles e Thomas mal estavam se aturando. E, sim, essa é a palavra certa: aturar. Thomas não parava de lhe lançar olhares com raiva. Charles o olhava com uma expressão de deboche. Os olhares eram tensos. Queria saber o que aconteceu entre eles.

No fim, a única pessoa que realmente aproveitou foi Rose, fingindo que não estava vendo o campo minado que aquele simples passeio se tornou.

Na hora de ir embora, não me deixaram ir embora na caçamba. Tive que ir no banco da frente com Thomas.

O clima entre nós não podia estar pior.

Rose foi na caçamba com Érick. Nicolas, Charles e Jack foram atrás. Eu e Thomas na frente.

Como a maioria ir ficar junto, como exemplo, Charles e Nicolas na mesma casa e Rose e Érick também, eu acabei sendo a última, fora que eu morava mais longe.

Não que Benkeler seja muito grande. No fim, nada é realmente tão distante de algo.

O carro está em um silêncio sepulcral.

Não consigo parar de me mexer no carro.

—Pode aquietar o rabo? —Thomas falou quando paramos em um semáforo.

—Desculpa se eu não consigo arranjar uma posição confortável para meu pé.

—Não é minha culpa. Pelo contrário, tentei te ajudar. —falou, movimentando o carro pela rua novamente.

Me virei pra ele com fúria.

—Você acha que eu iria aceitar qualquer coisa de você, depois do que me disse? Me desculpe por não ter te perdoado imediatamente.

Ele ficou em silêncio. No fundo, acho que ele sabe que eu estou certa.

O carro ficou silencioso por longos minutos, até ele soltar um suspiro.

—Me desculpe.

O olhei rapidamente.

—Eu fui criado em um ambiente extremamente machista. As vezes eu esqueço os valores que aprendi fora de casa e ajo como um idiota. Eu não vou mais fazer isso. Você não merece. Pelo contrário. Eu sinto muito.

O olhei estática por algum tempo, sem saber o que dizer. Ele não olhou para meus olhos, mas o vi apertando o volante com um pouco mais de força. Deve ser difícil pra ele estar fazendo isso.

Ele estacionou o carro de repente. Ainda sem respondê-lo, olhei para o lado de fora, vendo um lugar que não conhecia.

—Onde estamos? —Perguntei, o vendo sair do carro e abrindo a porta pra mim.

—Hospital. —ele falou, me ajudando a sair.

—O que? Eu não tenho dinheiro pra pagar nada, Thomas. O sistema de saúde aqui é bem mais caro. —comentei.

Ele tirou Jack do carro e agarrou a guia dele em um poste da calçada.

—Fique quieto aí, garoto. Papai já volta.

Achei adorável ele falando com Jack. Ele trancou o carro e veio na minha direção.

Ele não me respondeu, apenas me deu o braço para que eu me apoiasse. Fiquei o olhando.

Thomas soltou um suspiro cansado.

—Por favor, não dificulta as coisas. Me deixa me redimir com você.

O olhei, ainda indecisa. Ele revirou os olhos, me pegando no colo e me carregando como uma noiva até o hospital.

—Ei! Me solta! —bati em seu ombro.

—Ok. —ele me colocou no chão e me fez andar rápido com ele— Ai! —reclamei sem querer. Ele me olhou com uma sobrancelha arqueada. Suspirei rendida. Ele me pegou no colo novamente, me carregando até o hospital.

Fiquei vermelha com sua aproximação. Automaticamente da bebedeira do Thomas venho na minha cabeça.

Eu quase beijei o Thomas.

Fiquei ainda mais vermelha.

Fiquei me focando apenas no seu perfume enquanto entrávamos no hospital.

O clima lá era tranquilo, sem muita movimentação. Assim que entramos alguns enfermeiros vieram preocupados, mas Thomas os assegurou que eu só machuquei meu pé e pediu para falar com um tal de Doutor O'brian.

Algum parente dele, provavelmente.

—Claro, menino Thomas. Faz tempo que você não vem aqui. Gostaria de ir ver sua–

—Não. —Thomas a cortou bruscamente— Só quero ver o meu tio.

Ela assentiu sem demonstrar chateação pela grosseria de Thomas, como se já estivesse acostumada.

Imaginei que fosse a irmã dele... Ainda lembro da minha conversa com Rose. Afinal, quem não iria querer ver a irmã doente?

Talvez ele só não queira fazer isso comigo perto.

Afinal, ele não sabe que eu sei.

A recepcionista em questão discou alguns números em um telefone com fio e depois nos liberou para ver o tal médico tio do Thomas. Os enfermeiros me ofereceram uma cadeira de rodas e foi assim que eu fui até a sala do médico.

—Não sabia que você tinha um tio médico. —comentei, enquanto ele me levava até o elevador.

—Tem muitas coisas que você não sabe sobre mim. —ele comentou distraidamente, apertando o botão do terceiro andar.

Ficamos em silêncio novamente.

O clima ainda não estava tão bom assim.

Assim que chegamos, fui levada para a sala 2. Junto da plaquinha com o número estava escrito "ortopedia". Thomas entrou sem bater, e vimos um médico sentado em sua cadeira observando alguns papéis com óculos de descanso caindo de seu rosto.

Ele levantou o olhar para nós.

—Thomas! —o mais velho me olhou rapidamente— Vejo que a noite foi divertida. —comentou o médico, me vendo na cadeira de rodas.

Arregalei os olhos e me senti ficando completamente vermelha pela vergonha.

—Para de graça, tio. —Thomas reclamou, revirando os olhos e fechando a porta atrás de nós.

Nos aproximamos da mesa.

—Eu estou só brincando, filho. Vem me dar um abraço, tem um tempo que não te vejo! —O doutor disse.

Enquanto davam um abraço "masculino", com batidinhas nas costas, pude ver a semelhança entre eles. Claro, o médico já deveria estar no auge de seus trinta e poucos anos, mas poderia ser facilmente confundido por um jovem adulto. Seus cabelos são ruivos como os de Thomas e ele é barbudo. Ele é bem bonito. Que genética boa, viu.

—No que meus serviços podem ser úteis? —ele perguntou, olhando pra mim dessa vez.

—A coisa inglesa aqui machucou o pé.

—Olá, coisa inglesa! —o doutor se abaixou para ficar da minha altura na cadeira de rodas. Ainda estava com vergonha de seu comentário— Posso saber seu nome verdadeiro e o que aconteceu com seu pé?

—Oi, é um prazer. —disse e estendi a mão, ele apertou com um sorriso simpático— Sou Ally. Eu caí em pé e machuquei o tornozelo. —comentei.

—Certo. Pode vir aqui na maca, por favor? —ele pediu, tirando os óculos e colocando um estetoscópio no pescoço.

Thomas me ajudou a levantar da cadeira de rodas e me colocou sentada na casa.

O médico começou a analisar o meu tornozelo e arregalou os olhos.

—Meu Deus! —ele exclamou, agora levando meu pé entre suas mãos— Como você não está gritando de dor? Só de olhar consigo ver o inchaço. Chega a estar torto. Que queda feia, essa. Vou ter que engessar. Deve estar doendo muito.

E estava.

—Não tanto...

—Você é uma garota forte. Mais um dia sem vir ao hospital e adeus pé!

Apesar de saber que ele possivelmente estava exagerando quando disse que eu ficaria sem pé, eu me senti feliz por ser uma pessoa forte que não fica lamentando a dor.

Por um micro segundo, desejei que Thomas estivesse pensando o mesmo que eu.

O doutor examinou meu tornozelo, passou uma pomada super refrescante e depois colocou uma bota ortopédica em mim. Ele até me ofereceu muletas, mas já achei demais. Também me receitou alguns analgésicos caso a dor piorasse.

—Obrigado, tio. —Thomas disse, dando um aperto de mãos no doutor— Depois me diz quanto te devo.

—Não deve nada! Para cuidar de moça bonita eu faço de graça. —ele disse me mandando uma piscadela.

Dei um sorriso tímido pelo elogio.

Thomas revirou os olhos para a graça do tio e nos despedimos por uma última vez.

Perdi as contas de quantas vezes agradeci ao doutor por ter cuidado do meu tornozelo.

Eu e Thomas fomos em silêncio até o carro, ele me ajudou a sentar no banco e deu a volta. Pegou Jack o colocou no carro novamente, entrando no banco do motorista em seguida.

Ele deu partida e ficamos em silêncio.

—Obrigada. —disse, olhando fixamente para o painel.

Ele não respondeu, então o olhei. Ele está olhando para a estrada.

—Eu fui um idiota com você.

Soltei uma risada.

—Foi sim.

Ficamos em silêncio novamente. Não um silêncio constrangedor, mas um silêncio confortável.

—Não só hoje. —falou de repente— No primeiro dia de aula, na praça quando Jack te derrubou, na escola, no dia que te levei na casa do Mike... Tantas e tantas vezes... —disse, como se falasse consigo mesmo. Não consegui dizer nada. Não tem o que dizer. Ele está certo. Eu me aproximo enquanto ele só me empurra para longe— Eu implico com você, mas lá no fundo, em algum lugar tão longe que você não consegue nem ver se não procurar por séculos, até passa vagamente pela minha cabeça a possibilidade de cogitar a possível ideia absurda e surreal de gostar da sua companhia.

Arregalei os olhos, o olhando surpreendida. Ele olhou pra mim com um sorriso de lado, por apenas um momento, antes de se voltar para a estrada novamente.

Meu coração não poderia estar batendo mais rápido.

—Acho que está na hora de selarmos a paz. —comentei distraída, olhando para nada em específico.

—Que tal sairmos? —ele perguntou— Ter um encontro de verdade, já que o outro não deu certo?

Arregalei os olhos.

—Aquilo não foi um encontro! —disse, um pouco mais exaltada do que pretendia. Normalizei meu tom de voz quando o vi arqueando uma sobrancelha, em divertimento— Quer dizer, você me levou para um lugar em que homens sem camisa ficam se batendo... —tentei disfarçar.

Ele soltou uma gargalhada gostosa.

—Por isso eu quero tentar de novo.

—Não vamos ter um encontro. Somos só amigos. Menos que amigos.

—Amigos não têm vontade de beijar amigos como você quis me beijar.

—Você que começou! —falei indignada direcionando meu olhar para frente, nervosa.

Ele parou em outro semáforo, rindo ainda mais.

—Por que é tão absurdo assim você querer me beijar?

—Eu não gosto de mentiras.

—Eu não estou mentindo.

Bufei, revirando os olhos.

—Dá pra superar isso? —falei quando o carro voltou a se movimentar— Foi só um momento estranho. Nada mais. E, outra coisa, não vamos ter um encontro. Só saio com você se for um "não-encontro". —mudei de assunto rapidamente.

—O que seria um "não-encontro"? -senti o tom de divertimento em sua voz e o olhei de novo.

—O oposto de um encontro.

—Ok. O que é um encontro para você?

—Ah, duas pessoas, se sentam de frente uma pra outra, olhos nos olhos, em um lugar um pouco escuro, comem um jantar chique e falam sobre o futuro, depois vão visitar um museu ou algo assim.

—E que tal isso: duas pessoas, se sentam lado a lado, olhando pra frente, em uma lanchonete super iluminada, comendo um hambúrguer e falando sobre o presente. E depois vamos para a praia. Que tal?

Ri da sua fala.

—Praia de novo? —ri.

—Sim. Topa?

Ponderei sobre.

—Tá bom. Quando?

—Agora.

—Agora?! —perguntei, assustada— Acabamos de voltar da praia e do médico.

—Não tem problema.

Ri um pouco.

—Tá bom então. Podemos ir ao nosso não-encontro.

Ele sorriu.

—Mas sem praia. —acrescentei— Não com essa bota.

Ele concordou e o resto do caminho foi silencioso.

Ele parou primeiro no próprio prédio, subindo com Jack.

Depois, Thomas parou numa lanchonete, voltando bem para o comecinho de Benkeler. Ele me ajudou a sair do carro e entramos na pequena lanchonete rústica.

Tem muitos grupos de amigos, casais e famílias aqui.

É um lugar bem bonito.

—Que lugar lindinho. —comentei quando Thomas me ajudou a sentar em uma cadeira, se sentando ao meu lado logo depois

—Eu sei. —falou, olhando o cardápio. Me aproximei dele para olhar também.

Hmm, tem capuccino. —falei, sentindo minha boca aguar.

—Quer? —ele perguntou, me olhando.

Assenti.

—Eu peço. —fiz menção de levantar, mas ele segurou minha mão.

—Eu vou lá por você. Daqui a pouco você desmaia se continuar forçando esse pé.

E então ele foi até o balcão.

Peguei meu celular e mandei uma mensagem rápida para meu pai avisando o meu paradeiro. Ele não respondeu a mensagem.

Uma ponta de preocupação passou por mim, antes de Thomas me interromper, sentando ao meu lado.

—Eles já vão trazer. Pedi seu capuccino, dois hambúrgueres, dois refrigerantes e dois cookies para comermos depois.

—Uau. Vai aguentar isso? —perguntei com uma sobrancelha arqueada.

—Eu poderia comer tudo sozinho. —ele disse, em um tom convencido.

Se no início do dia me dissessem que estaríamos nesse clima tão leve, eu não acreditaria. Fico feliz pela nossa trégua.

—Você diz isso, mas aposto que não pode.

—Esse corpinho gostoso foi presente de Deus mesmo, porque eu me alimento como um pedreiro.

Gargalhei do seu comentário.

—Você se acha muito bonito para o meu gosto.

—Eu não me acho, eu sou.

Ele ficou sério mas logo depois gargalhou também.

Quando nossos lanches chegaram, fizemos exatamente o oposto de um encontro: ficamos olhando para frente, comemos muito, -a comida era muito boa e nada chique- e conversamos sobre assuntos completamente aleatórios.

Quando acabamos, dividimos a conta e fomos até o carro.

—Qual é o nosso destino agora? —perguntei com humor, colocando o cinto.

—Surpresa. —Thomas disse, com a costumeira expressão séria.

Eu não disse mais nada, apesar de estar me corroendo de curiosidade.

Apesar de não conhecer muito a cidade de Benkeler, por não ter explorado muito, eu já sabia que tínhamos voltado para o centro graças a uma placa, e reconheci o caminho para a minha casa. Será que ele me levará de volta?

No fim, reconheci o caminho para a praça.

—Bem criativo. —disse com divertimento, enquanto ele me ajudava a sair do carro.

—Você já veio aqui pela noite? —ele perguntou trancando as portas e me ajudando a andar.

—Não, na verdade.

Ele não disse mais nada, apenas me guiou para a entrada.

Meus olhos se arregalaram em surpresa quando entramos.

A praça está toda iluminada por pisca-piscas amarelos e brancos, e no meio da praça há um palco, com alguns instrumentos.

—Todos os sábados à noite uma banda toca aqui. —Thomas disse, me guiando até um grande grupo de pessoas, que estão perto do palco.

—É uma banda específica? —perguntei quando paramos.

—Não. Geralmente são bandas sem reconhecimento, bandas de garagem, sabe? Grupos de amigos, esse pessoal.

Assenti em concordância, ainda olhando ao redor. Está tudo tão bonito. Também há algumas mesas de plástico espalhadas pela praça, em lugares estratégicos para ficarmos perto do palco.

—Podemos nos sentar em uma dessas ou precisa alugar? —perguntei quando o incômodo no meu tornozelo me venceu.

—Acho que podemos nos sentar. —ele disse, já me guiando para a mesa mais perto do palco.

Nos sentamos.

—Obrigada por me trazer aqui. —eu disse, após ter olhado as pessoas ao redor.

Ele apenas assentiu, como se não fosse nada.

Acho que ele não gosta muito de agradecimentos.

Ficamos em silêncio, apenas olhando as pessoas ao nosso redor. Não um silêncio constrangedor, mas sim, confortável.

Quando o céu escureceu por completo, um grupo com três garotas e dois garotos subiram no palco. Já está tudo devidamente arrumado e o palco está bem iluminado.

—E aí, galera! —uma das garotas, com cabelo rosa e calça arrastão falou. O público aplaudiu— Somos os The Black Crows, e viemos aqui para animar a noite de vocês! Espero que gostem! —o público gritou em animação— Nossa primeira música será uma de nossa autoria. Com vocês, "Geronimo"!

A menina sorriu, e todos começaram a tocar e cantar uma música animada, que eu desconheço.

Sorri vendo aquelas pessoas corajosas. Eu não faria isso nem em mil anos. Sorri ainda mais vendo a empolgação deles.

Tomara que façam muito sucesso.

Olhei para Thomas e tomei um susto o vendo me olhar de volta, com um sorriso mínimo.

—O-o que foi? —perguntei nervosa.

—Quer dançar? —ele desconversou.

Olhei automaticamente para a minha bota.

—Não precisamos nos mexer muito. Mas deve ser chato para você ficar aí sentada. —ele disse mais alto, por conta da música. Concordei.

Ele me ajudou a levantar e chegamos mais perto do palco, as pessoas pulando animadas. Thomas ficou me observando.

—Posso me apoiar em você? —perguntei.

Ele nada disse, apenas estendeu um braço, que eu segurei de prontidão.

Fiquei apoiada nele durante as músicas. Ele me respeitou e não ficou se mexendo. Ficamos apenas balançando a cabeça e cantando as músicas que conhecíamos, com animação.

—Isso é tão legal! —gritei para ele durante o show.

—Que bom que gostou. —ele disse sério, me olhando.

Sorri para ele.

De repente eles começaram uma música mais lenta. Olhei ao redor, vendo os casais dançando. Dei um sorriso mínimo.

—Me daria a honra? —me virei rapidamente quando ouvi Thomas dizer. Olhei para sua mão estendida com um sorriso divertido.

—Vai dançar com a "coisa inglesa"? —perguntei com uma sobrancelha arqueada.

Ele revirou os olhos, me pegando pela mão e o puxando para si.

Apoiei minha cabeça em seu peito e ouvi seu coração bater. Automaticamente me lembrei do dia em que Thomas me fez ouvir seu coração e disse que não era um monstro.

Mas eu nunca o enxerguei assim. Só sentia pena. Acho que foi isso que me fez perdoá-lo tantas vezes. Sua história. O que eu não sei sobre ele. Eu quero muito saber.

Mas não irei perguntar. Ele vai me dizer quando se sentir pronto.

Gostaria de saber o quer está se passando pela sua cabeça agora.

From what I've seen
(Pelo que tenho visto)

You're just one more hand me down
(você é apenas mais um item descartável)

'Cause no one's tried to give you what you need
(porque ninguém tentou te dar aquilo que você precisa)

So lay all your troubles down
(então largue todos os seus problemas)

I am with you now
(estou com você agora)

Nessa parte da música desconhecida por mim, olhei em seus olhos. Ele me olhou de volta com uma intensidade desconhecida por mim.

Eu queria muito saber o que se passa na sua cabeça agora.

I'm here for the hard times
(eu estou aqui para os tempos difíceis)

The straight to your heart times
(para os tempos que atingem o seu coração)

When livin' ain't easy
(quando viver não é fácil)

You can stand up against me
(você pode se apoiar em mim)

And maybe, rely on me
(e talvez, confiar em mim)

And cry on me, yeah
(e chorar comigo, sim)

Ele se abaixou para falar no meu ouvido.

—Até que você é uma péssima dançarina.

—Não espere muito de mim com essa bota!

—Então sem ela você dança bem?

Fiquei em silêncio, constrangida e sem saber como mentir sobre isso. Eu sou uma péssima dançarina.

Ele voltou para a postura normal com um sorriso divertido.

Eu gosto muito de como nossa amizade está agora. Thomas, quando não está sendo babaca, é um ótimo amigo.

Eu acabei me lembrando de quando Érick me disse isso, no primeiro dia de aula. Só não esperava ter Thomas tão próximo de mim.

Quem sabe um dia sejamos até melhores amigos?

Eu não sei. Mas se quiser ser amiga dele, eu definitivamente tenho que esquecer o episódio do quase beijo. Eu não sei o porquê fiz aquilo. Na verdade, eu não fiz nada... Mas acho que o problema foi justamente esse; Não ter feito nada.

Eu deveria ter parado Thomas. Não estou pronta para me relacionar de novo. Já fui machucada demais...

Mas isso não vai se repetir. Ele estava meio bêbado e eu fiquei sem reação.

Se pelo menos ele me deixasse esquecer isso...

Agora já não importa mais, porque finalmente estamos em trégua.

Quando a música acabou, nos afastamos.

—Ei! Ally! —senti uma mão em meu ombro, interrompendo os meus pensamentos. Olhei para trás assustada.

—Rose! —falei com animação, me soltando de Thomas e a dando um abraço— O que está fazendo aqui? —perguntei me afastando.

—Vim com Josh. —ela disse, olhando desconfiada para Thomas. Apertou os olhos— E vocês dois, o que estão fazendo aqui? Se resolveram?

Eu e Thomas nos olhando por um momento.

—Sim.
—Não.

Dissemos ao mesmo tempo. Eu disse sim e ele disse não.

Revirei os olhos.

—Sim. —respondi por fim. O vi de canto de olho revirar os olhos.

Hm. Meu Deus! O que aconteceu com seu pé? —ela disse olhando para a minha bota.

Tinha até me esquecido dela. Até da dor eu esqueci.

Mais tarde eu vou sentir.

—Meu ossos fraturaram. Tive que pôr a bota. Mas está tudo bem, só doendo um pouco.

—Que bom, amiga. Melhoras. —agradeci— Querem se juntar a nós? —Rose perguntou para mim e para Thomas.

O olhei. Vi negação em seus olhos.

—Na verdade, vou para casa agora, amiga. Aproveita com o Josh. Vocês quase não tem tempo. Compensa a praia de hoje.

Rose assentiu com um sorriso.

—Só uma coisa... —ela me puxou pela mão, falando em meu ouvido— O que é isso? Estou sentindo um clima rolando.

—Só saímos hoje. Como amigos. Um não-encontro. —falei.

—Claro... —ela disse desconfiada. No mesmo momento mãos rodearam sua cintura. Vi o rosto de Josh.

—Olá, Ally. Boa noite. —ele disse com um sorriso mínimo, de forma educada.

—Oi, Josh! Boa. Como está?

—Tudo ótimo, e com você?

—Tirando esse tornozelo, tudo ótimo também. —ele assentiu.

Thomas se aproximou e cumprimentou Josh com um aperto de mãos.

—Vou manobrar o carro, já volto.

Thomas foi na frente.

—O que seria um não-encontro? —Rose perguntou.

—A gente fez o oposto do que se faz em um encontro.

Ela assentiu.

—Isso é estranho. —concluiu.

Acabei concordando com ela. Ficamos conversando até Thomas buzinar o carro.

—Beijos, gente. Aproveitem a noite! -me despedi.

Fui mancando até o carro, mas antes de sair, consegui ouvir uma conversa de Josh e Rose:

—Eles estão muito próximos. —Rose disse.

—Eles só saíram juntos. Você sabe que não foi um encontro, né?

—Não, Josh. Eles não sabem que foi um encontro.

Depois disso, não consegui ouvir mais.

Entrei com dificuldades no carro, pensativa.

Thomas começou a dirigir. O caminho está silencioso.

Suspirei, pensando no que Rose disse.

É impossível sair com alguém sem ser visto como um encontro. Podemos ser amigos.

E eu até gosto de como as coisas estão.

Finalmente estamos parando de discutir.

O caminho foi silencioso. Ele estacionou o carro na frente da minha casa e me ajudou a sair do carro.

—Foi divertido. —eu disse, quando ele terminou de me ajudar a subir as escadas de casa.

—Foi sim. —ele disse com um sorriso mínimo— Está na hora de selarmos a paz, não é? O que você acha? —ele perguntou, me estendendo a mão.

Antes que eu pudesse responder, a porta foi aberta.

—Allyzinha! —Ann abraçou minha perna, depois estendeu os bracinhos, pedindo colo— Seu pézinho dodói?

—Oi, amor! —disse, a pegando no colo e dando um beijo em sua testa— A Allyzinha machucou. Mas não se preocupa, já já vai estar melhor. Ok? —ela assentiu.

Ela olhou curiosa para Thomas.

—Seu cabeio palece fogo. —ela disse, estendendo o bracinho para tocar o cabelo de Thomas.

Thomas sorriu, se aproximando mais e se abaixando, para Ann conseguir tocar. Sorri com a cena.

—Que maciiiiio! Pensei que ia ser quente. —ela disse depois de bagunçar o cabelo dele. Thomas riu— Cól é seu nome, tio?

—Thomas. E você, pequena? —Thomas perguntou, apoiando as mãos nos joelhos, para ficar na altura de Ann.

—Ann. Eu fiz isso aqui de idade, sabia? —ela perguntou, levantando quatro dedinhos.

—Sério? —Thomas fingiu surpresa— Uau! É quase uma adulta.

—Eu sei! Eu zá sô gande! —Ann disse com empolgação.

Ri dos dois.

—Ok, senhora grande, agora está na hora de entrar. —disse ao ver Thomas voltar para a postura normal— Obrigada pelo dia, Thomas. —falei, lançado um olhar cheio de significado.

Ele assentiu, sério.

Estendi minha mão e o vi sorrir. Demos um aperto de mãos. Mas, essa parte, só nós entendemos.

A paz está selada.

Ele entrou no carro e ficou esperando até que entrássemos. Quando entramos, ouvi o barulho do carro indo embora.

Coloquei Ann no chão.

—Menina Ally! —ouvi a voz de Ester.

—Ester? —perguntei confusa, a abraçando— O que está fazendo aqui? Papai não está? —perguntei.

Ela lançou um olhar preocupado para Ann, que está no chão terminando um desenho.

—Vamos para a cozinha. —ela disse, me puxando pela mão até a cozinha. A cozinha é americana, então conseguimos ficar de olho em Ann.

—Teté, o que foi? —perguntei, preocupada.

Ela esfregou as mãos, dando um último olhar para Ann e depois olhando em meus olhos.

—Seu pai, ele... —ela suspirou— Ele teve uma crise, Ally. Ele está internado

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