ᴅᴇᴜs ɴᴀ̃ᴏ ᴇ́ ɪɴᴊᴜsᴛᴏ

Fiz um resumo de como tem sido as coisas em São Paulo pras meninas, todas me ouviam com atenção e sempre faziam comentários engraçados, acabavamos rindo juntas.

Contei sobre a escola e como o sistema é diferente, contei sobre a igreja, sobre o culto e de como eu aceitei a Jesus, Carol foi a única que permaneceu quieta e sem expressão enquanto eu falava.

Eu não sabia o que se passava na cabeça dela, mas eu sabia que Carol se intitulava ateia, sei seus motivos e respeito apesar de querer que ela conhecesse Jesus pois Ele pode curar as feridas ainda abertas dela.

- E daí depois do culto nós fomos pra uma pizzaria. - termino de contar e elas começam com novos comentários.

Com todo carinho eu converso com elas e só depois de muito papo que nós retornamos ao filme.

Em todo tempo notei Carol calada, distante, diferente de quando eu ainda não havia revelado minha fé em Deus.

Pretendia conversar com ela, pra saber se a minha conversão a Cristo mudava algo entre nós.

Algumas horas mais tarde a mãe dela desceu com alguns cachorros quentes e o pai da garota com três baldes de pipoca.

Equilibrista, é o que ele era.

Nós comemos enquanto assistiamos Riverdale.

Quando o meu relógio marcou nove horas eu pedi licença, me levantei e fui até minha mochila.

Peguei minha bíblia e me virei para Carol.

- Posso usar seu quarto rapidinho? - pergunto a ela que agora mantinha um sorriso no rosto.

- Claro, vai lá. - permite depois de encarar por poucos segundos o livro em meu braço.

Agradeço e me retiro da sala.

- Está tudo bem Angel? - a mãe da minha amiga me encontra no corredor.

- Está sim, eu preciso apenas tirar um período de oração. - respondo - Eu e meus amigos começamos um propósito e eu preciso ligar pra eles. - explico.

- Ah certo, tudo bem. - assente - Carol deixou que usasse o quarto dela? - pergunta com certa surpresa.

- Sim. - respondo simples.

- Que avanço, bom, mas de qualquer maneira se você quiser pode usar o quarto de oração do Fred. - responde simples. - A Carol ainda está abalada com a morte do Lucas e se recusa a acreditar...

- Eu sei, eu sei. - a calo, sabia que aquele assunto ainda era difícil pra todos - Não precisa se explicar Helô, eu entendo, obrigada por oferecer, mas eu vou ficar por aqui mesmo. - falo calma - Sei que o quarto de oração do tio Fred é um lugar íntimo pra ele, não quero invadir a privacidade de vocês.

Ela assente com um sorriso, as quase imperceptíveis rugas se formam no canto de seus olhos e ela pede:

- Por favor Angel, apresente minha família nas suas orações querida, só Deus sabe como estão as coisas depois da partida do meu pequeno. - fala chorosa e eu vejo a tristeza em seus olhos.

- Pode deixar, nós oraremos por vocês. - lhe dou um abraço e depois entro no quarto.

Respiro fundo e caminho até a cama da minha amiga, perfeitamente impecável, tudo no seu devido lugar.

Não perco tempo e ligo pra Valentina, chama uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete vezes e cai na caixa postal.

Olho pra tela do celular com a sobrancelha arqueada e tento novamente, na terceira vez que chama ela atende.

CHAMADA ON

* Angel? - diz ao atender.

* Eu mesma, está tudo bem? - pergunto sentindo que tem algo acontecendo.

* Está tudo na medida do possível amiga, desculpa não atender antes, meu pai estava conversando comigo. - diz calma, mas sua voz estava abatida.

* Tem certeza que está tudo bem Tina? - insisto.

* Tenho sim, não se preocupe, foi só um dia puxado, o time treinou hoje e a professora pegou pesado. - tenta se explicar.

Eu suspiro sabendo que tinha caroço naquele angu, meu coração se angustiou e eu temi por ela.

- Tudo bem, então vamos ler a bíblia? - pergunto e ela limpa a garganta.

* Sobre isso Angel, eu não quero mais que você leia pra mim. - anuncia e eu franzo o cenho.

- Como assim? Achei que... - travo - O que aconteceu Tina? Seus pais descobriram? Você está bem? Eles brigaram com você? - pergunto preocupada.

- Não, estou bem, eu apenas não quero mais ouvir. - fala e sei que está chorando pois sua voz treme - Me desculpa... - fala antes de desligar.

CHAMADA OFF

Por alguns minutos eu fiquei ali paralisada, olhando pra tela do celular e me perguntando o que teria acontecido.

Sem cabeça pra ler eu liguei pra Tom, tínhamos a nossa campanha e ele atendeu no segundo toque.

CHAMADA ON

* Oi Angel, a paz, tudo bem? - atende normalmente.

* A paz Tom, comigo está, mas e com vocês ai? - pergunto ansiosa - Acabei de falar com a Valentina, mas ela disse que não quer mais ler a bíblia, tenho certeza que também não vai mais orar conosco. - digo rápido.

* É, os pais dela descobriram sobre as orações e sobre a leitura, ela comprou uma bíblia pela internet que chegou hoje enquando ela estava na escola. - conta - Eu não sei muito bem o que eles falaram porque quando ela estava comigo na linha o pai dela chegou e pediu pra falar com ela, então teve que desligar. - pausa - Mas pra falar que não quer ler mais a bíblia com você deve ter acontecido algo grave.

* Eu estou preocupada Thomas. - confesso massageando minha testa. - E se ele bateu nela ou se a ameaçou? - pergunto aflita.

* Bater nela eu acho que não, mas muito provavelmente a ameaçou. - fala sério.

* O que vamos fazer? - questiono sentindo as lágrimas escorrerem.

* Vamos orar, a única coisa que podemos fazer. - fala calmo, mas sinto sua tristeza - E o único que pode operar nessa situação é o nosso Deus. - diz e eu concordo.

Ligamos para Blan que atendeu rápido, ele não estava menos preocupado do que nós e disse que tentou falar com Val, mas de nenhuma maneira conseguiu.

Não sei bem dizer se oramos ou se só os meninos oraram porque a única coisa que fiz foi chorar.

Eu estava preocupada com Tina e com sua mudança repentina, com o peito apertado pela família da minha amiga Carol, estava ainda abalada e temerosa por Kelvin, estava no impasse do perdão.

Como perdoar?

Não sei quanto tempo ficamos ali clamando por Deus e por sua providência, mas assim que nós desligamos eu fui ao banheiro e lavei meu rosto.

Quando voltei ao quarto encontrei Carol sentada na cama, seus olhos estavam fixos no chão e suas pernas cruzadas encima do colchão.

Ao seu lado estava a bíblia e meu celular.

- Carol, está tudo bem? - a chamo.

Ela não me responde, continua como antes.

- Carol... - chamo novamente me aproximando.

- Sabe Angel... - fala num sussurro e eu me sento de frente para ela - Como as pessoas podem adorar a Deus sendo Ele tão injusto? - pergunta e eu sinto como se levasse um soco.

Como eu iria responde-la?

- Tantas pessoas ruins, assassinos, aliciadores e estupradores, psicopatas... - vejo uma lágrima rolar - E quem sofre e morre são as pessoas boas. - me olha e eu enxergo em seus olhos a tristeza, a indignação. - Crianças inocentes, homens e mulheres trabalhadoras... - volta seus olhos pro chão.

Eu sabia de quem ela falava, do pequeno Lucas.

- Por que Ele as deixa sofrer? - questiona - Por que Ele não as torna felizes? Por que Ele é tão injusto? - torna a me encarar e eu respiro fundo, clamando por um discernimento divino.

- Sabe minha amiga, pra muitas coisas não temos respostas. - digo e ela abaixa o rosto - A minha visão sobre Deus é totalmente diferente. - conto e ela me olha - Posso compartilhar com você?

Caroline me observa e então assente.

- Eu não vou falar de religião - aviso - Vou falar de Jesus. - afirmo e seu olhar amolece um pouco.

Pego suas mãos e deixando o chinelo cruzo as pernas como ela.

- Deus envolto de glória, de majestade e poder criou a nós para sermos iguais a Ele, porém o homem pecou e nós fomos afastado do Senhor. - digo o que aprendi com a bíblia. - A partir daí o mal passou a operar na humanidade, trazendo doenças, dores e tristeza. - digo calma olhando para ela que deixava a cabeça caída sobre o pescoço. - Deus não teve parte nisso, Ele nos criou para sermos eternos, saudáveis, felizes... - falo e me emociono.

Ela funga e aperta de leve minha mão.

- Ele nos queria perto, mas o pecado afastou o homem de Deus... - fungo também - Mas Ele nos amava e nos ama tanto, nunca deixou de se importar conosco minha amiga. - afirmo e ela me olha - Então ele enviou Jesus, e Ele pagou por nós na cruz, o preço das nossas almas foi o sangue dEle Carol. - digo e mais lágrimas caem - De inocente Ele passou pra réu e condenado, por nos amar minha amiga. - suspiro - Agora eu preciso te fazer uma pergunta. - olho para baixo - Por que Ele nos ama tanto mesmo nós sendo tão injustos? - questiono.

Ela se entrega em um choro sentido e eu a abracei.

- Eu sei o quanto a morte pode ser dolorida, sei também que presenciar uma pessoa querida sofrer é torturante. - afirmo - Eu sei disso, eu vivo isso em casa, eu vejo minha mãe chorar... - choro com ela - Mas a culpa não é de Deus, a culpa não é dEle. - digo - Lucas era tão pequenino e inocente, com certeza não merecia o que passou e por isso Deus o recolheu, pra parar de sofrer. - falo com os olhos fechados.

- Mas dói tanto... - disse com a voz multada pelas lágrimas.

- Nele também doía, mas Lucas está bem agora, está nos braços de Jesus, o melhor lugar minha amiga. - afirmo - Nós sofremos com a perca, mas temos que ter a esperança que o veremos, eu sei que o verei... - digo e a olho.

Carol está com os olhos e nariz vermelhos, foram poucas as vezes que a vi assim.

- Lucas passou pelas nossas vidas e nos ensinou muitas lições mesmo sendo tão pequeno, cada pessoa tem um propósito de vida nessa terra e ele cumpriu o dele. - digo calma - Cabe a nós praticar as coisas boas que ele passou para nós... - ela me abraça de novo.

Eu respiro fundo.

- Olha amiga, é difícil pensar que muitas pessoas más desfrutam de plena saúde, mas elas merecem a misericórdia de Cristo pois senão pagaram por seus pecados no inferno e eu sei... - a olho - Que será mais dolorido que essa dor que está sentindo.

Ela funga de novo e eu limpo seu rosto.

- Não culpe a Deus, Ele sempre fará o que é melhor para nossas vidas, mesmo que não entendamos no momento. - afirmo.

- Obrigada amiga. - ela diz somente me abraçando.

Carol deitou no meu colo e ficou lá até dormir, quando percebi parei de fazer carinho em seus cabelos louros e a deitei direito.

Deu um beijo em sua testa e peguei minhas coisas, iria voltar pro porão.

Quando sai encontrei Heloísa sentada no chão, a cabeça da mulher estava apoiada nos joelhos assim como seus braços cruzados.

- Helô? - chamo e ela parece dispertar.

Rapidamente eu a ajudo levantar e a mesma me abraça forte.

Não demorei a entender que ela estava ali fazia um tempo e que deveria ter ouvido minha conversa com Carol.

- Obrigada Angel, assim como minha filha eu estava precisando ouvir aquilo. - chora.

Eu aperto ainda mais meu abraço percebendo o quanto somos humanos e necessitados de uma palavra amiga, um abraço amoroso e acolhedor.

- Meu filho teve um bom destino e isso é o que importa, ele parou de sofrer e como você falou, eu o reencontrarei. - afirma se afastando. - Obrigada novamente querida. - me dá um beijo.

- Não precisa me agradecer, agradeça ao Senhor, Ele tem cuidado de vocês. - digo apenas.

Ela assente e se despede em seguida, noto que usava pijama e observo ela entrar em seu quarto e somente assim volto pro porão.

A maioria das meninas já dormiam e apenas Jess e Ali assistiam a uma série policial.

- Cadê a Carol? - Jess pergunta assim que me vê.

- Dormindo, no quarto dela. - respondo.

- Falei, temos uma amiga fraca pra colchões infláveis. - brinca Ali.

Eu me sentei no colchão que dividiria com minha prima, me deitei um pouco absorta pela sequência de acontecimentos e nem percebi quando adormeci também.

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