Capítulo 31

Fazia um mês que eu estava afastada de Caleb, mas às vezes esse tempo parecia uma eternidade. Foi um período muito corrido, o que foi bom de certa forma. Sobrara pouco tempo para pensar... nele. Somente quando eu chegava em casa, esgotada depois do trabalho a frente da vinícola, se tornava inevitável não pensar em Caleb. Em tudo o que aconteceu em nossas vidas.

Desde o dia em que o expulsei da minha vida, Caleb não me procurou mais. Ele havia enviado Andrew à  Toscana na semana seguinte a sua partida, para tratar de alguns assuntos da minha gestão na empresa, conforme tinha prometido no dia que assinamos o contrato sobre o acordo. No final de todos os dias eu enviava o relatório diário para Andrew, às vezes fazíamos reuniões também por videoconferência, reuniões as quais Caleb nunca estava presente.

Com a proximidade do Natal, estávamos finalizando todos os detalhes do pacote especial que criamos, para oferecer aos amantes de vinho a oportunidade de celebrarem a data junto de sua família na vinícola Salvatore.

O pacote proposto por Andrew oferecia três diárias e um roteiro completo com passeios e vistas incríveis, para serem aproveitados em família ou com amigos. Além disso, os visitantes poderiam conhecer o processo de elaboração de seus espumantes, vinhos finos e um pouco da cultura italiana. Oferecíamos também um espaço para degustação dos produtos da empresa e uma programação com café da manhã especial, almoços e jantares com bebidas da casa, incluindo a ceia de Natal no dia 24 de dezembro, que contaria com um pianista e um violinista tocando ao vivo! Por esse motivo, todos nos estávamos sobrecarregados e estressados, pois todos os convites haviam sido esgotados. O evento teria que ser um sucesso, sem sombra de dúvidas.

Andrew tentava me tranqüilizar sempre, cada vez que eu surtava ou dizia que não iria conseguir. Ele era muito gentil e atencioso comigo. Por causa de nossa proximidade no trabalho, acabei me aproximando dele, querendo ou não, ele se tornou meu braço direito a frente da vinícola. Sempre muito profissional, Andrew nunca mencionava nada sobre Caleb, além do necessário, o que me deixava imensamente grata a ele.

Estava atenta em separar alguns documentos para reunião que teria com Pascal Marty, o renomado enólogo que Caleb havia contratado para reformular as linhas de vinho da vinícola. Quando Verônica, minha secretaria entrou sem avisar na minha sala, visivelmente constrangida.

— Senhorita perdão, mas o senhor Giovanny está na ante-sala querendo falar com a senhorita. Eu disse que você não poderia atendê-lo agora, mas ele disse que só sairá daqui depois que a senhorita o atender.

— Giovanny! — revirei os olhos impaciente. — O deixe entrar, por favor, Verônica.

Logo que ele entrou na sala o peguei me estudando dos pés a cabeça com a testa enrugada.

— Queria me ver, Giovanny?

Indiquei a cadeira à frente a minha mesa.

— Sim, irmãzinha.

— Eu não sabia que você estava na toscana.

Me sentei evitando cruzar os braços. Não queria que parecesse que estava nervosa com sua presença ali. Não que estivesse realmente apreensiva com ele em minha sala; era só porque sua figura era sempre séria.

— Cheguei hoje pela manhã. — ele se sentou abrindo os botões de seu terno com corte italiano.

— E Samantha onde está? — perguntei procurando ganhar tempo, enquanto tentava descobrir o motivo de sua visita.

— Quando estávamos chegando aqui, encontramos com Valentim, que se ofereceu para acompanhar-la em um passeio pelos vinhedos.

— Entendi.

— Então eu devo perdi permissão para entrar em minha antiga sala Sophia?

Arqueei uma sobrancelha ao olhar para ele.

— O que pretende com essa visita Giovanny? — perguntei indo direto ao assunto, sem rodeios, o conhecia bem demais para saber que por trás daquela visita surpresa havia outros interesses.

— Sophia. — Giovanny disse tranquilamente meu nome, os cotovelos apoiados no tampo da mesa, as mãos entrelaçadas servindo de apoio para o queixo. — O que você pretende assumindo a direção da vinícola junto com aquele canalha?

Ele agora me mirava com olhos frios, cheios de uma curiosidade estranha, totalmente silenciosa. Quem não o conhecia poderia pensar que ele estava calmo, mas eu o conhecia suficientemente bem para saber que Giovanny estava furioso por me ver a frente da empresa.

— O que acha que eu pretendo Giovanny? — perguntei numa falsa calma.

— Como você pôde se aliar aquele homem? — ele perguntou com um tom de censura exagerado, se reclinando na cadeira. — Você enganou a todos com aquele contrato sigiloso e agora eu só quero entender, por que se aliou a Caleb para tomar a vinícola de nossa família.

Senti um arrepio na nuca ao ouvi as idiotices que meu irmão estava dizendo. Graças a Giovanny, eu me vi obrigada a fazer a coisa mais difícil que já fiz na vida; aliar-me a Caleb em um plano totalmente descabido. Fui obrigada a enfrentar todos os meus fantasmas do passado sozinha, porque graças à ganância e a má administração de meu irmão quase perdemos tudo.

— Eu não sabia que tinha uma imagem tão distorcida sobre mim Giovanny. — me obriguei a responder enquanto o observava batucar os dedos impaciente no tampo da mesa. — Mas saiba que meu único interesse é salvar a vinícola da falência.

— Claro. — ele sorriu de forma irônica. — Se unindo apenas com o maior tubarão do Reino Unido.

Meu sangue ferveu.

— Eu jamais me uniria a Caleb para prejudicar nosso pai! — rebati sentindo meu rosto queimar. — Minha única intenção realmente é salvar a vinícola de sua ganância. — expliquei com o dedo em riste. — Como você teve coragem de roubar o papai? De penhorar todos os nossos bens? De enganar toda a família?

— Eu? — perguntou com a expressão de espanto. — Sophia tudo o que eu fiz foi pelo o bem da nossa família. Posso ter cometidos erros sim, mas foi procurando acertar.

Engoli em seco, a esperança de que ele realmente tivesse uma boa explicação para tudo o que fez se esvaindo completamente.

— Sim, induzindo nosso pai a comprar uma vinícola com forte suspeita de fraude em seus vinhos Brunello di Montalcino. — franzi o cenho. — E como se não bastasse, você ainda resolveu continuar com a fraude, adicionando as potentes uvas Cabernet Sauvignon e Syrah no mosto de Sangiovese, tornando os vinhos mais ricos e vigorosos. E graças a sua fraude a Salvatore se viu forçada a rebaixar seus Brunellos da safra de 2003 para uma classificação mais simples. O que obviamente trouxe um prejuízo gigantesco a nossa empresa. — ele balançava a cabeça em negativa, o que não me impediu de continuar. — Por sua culpa Giovanny, nosso pai comprou gato por lebre. Então, não venha me acusar de traição diante de toda essa sujeira provocada por você!

Ele ficou paralisado, absorvendo minhas acusações.

— Sophia, quando propus a compra da vinícola para nosso pai, eu não sabia do que estava acontecendo...

— Por favor, Giovanny, não minta para mim. — o interrompi bruscamente. — Você era um dos diretores da antiga vinícola, estava ciente de tudo o que estava acontecendo internamente. Sabia muito bem que se comprássemos a vinícola, arcaríamos com tudo o que estava por vim. E ainda sim, você não impediu nosso pai de investir em uma bomba que estava prestes a explodir.

Era difícil acreditar, mas meu irmão era um mau caráter. No mínimo um idiota egoísta, com a alma corrompida pela a ganância. Infelizmente pessoas como ele eram capazes de fazer qualquer coisa.

Ele jogou as mãos para cima, frustrado.

— E foi por isso que você decidiu pedi ajuda a seu namoradinho?

Eu não podia deixar que ele desconfiasse que eu nunca reatei com Caleb. Não podia confessar que apenas participei de um acordo, que fui seu joguete em um plano ridículo para reconquistar Marion. Se Giovanny soubesse, não hesitaria em contar tudo para minha família. Tinha certeza absoluta que meu pai se decepcionaria profundamente comigo, caso viesse descobri o que eu me submeti a fazer para salvar a vinícola. Em seu estado de saúde, ele não poderia sofrer emoções fortes, por isso deveria continuar fingindo sobre Caleb.

— Você sabe muito bem que Caleb era a nossa única salvação Giovanny.

— E foi por isso que ele te escolheu como minha sucessora? — Perguntou com uma nota de reprovação na voz, compreendi de imediato onde ele queria chegar com aquela pergunta.

— Então você preferiria que uma pessoa estranha estivesse à frente da vinícola, por não me julgar capaz de assumir o cargo? — respondi sua pergunta com outra pergunta, enquanto o observava caminhar de um lado para o outro, pensativo, considerando e calculando como iria agir.

— Eu não disse isso Sophia.

— Não precisa dizer. — falei frustrada com sua atitude. — As coisas já estão muito claras para mim. — finalizei, colocando os documentos dentro da pasta que levaria para minha reunião com Pascal.

— Não me entenda mal Soph, mas eu realmente esperava que Caleb colocasse uma pessoa com experiência para assumi meu lugar.

Levantei-me da minha cadeira, caminhei em sua direção e parei com rosto a centímetros de distancia dele. Queria deixar bem claro, que não estava nem um pouco intimidada com sua desconfiança sobre minha capacidade.

— Se Caleb me escolheu para assumi esse cargo, ele com toda certeza do mundo deve acreditar na minha capacidade. Não importa os motivos que o levaram a se tornar sócio investidor da vinícola, você sabe muito bem que ele não investe a onde não ver futuro. — expliquei com paciência o que na realidade ele já tinha entendido. — Eu tenho me matado todos os dias Giovanny para consegui levantar essa vinícola e pode ter certeza que eu irei consegui. Agora com licença, tenho uma reunião importantíssima com o nosso novo enólogo.

Cheguei a dar meia volta para deixá-lo, mas ele me impediu.

— Então é assim que você pretende tirar a vinícola da falência? Contratando um enólogo que não temos se quer condições de pagar?

— Não. — respondi sucinta. — O que eu pretendo é recuperar a credibilidade do mercado com um renomado enólogo ao qual nos temos condições de pagar.

Sem esperar que ele respondesse, abri a porta e saí para o corredor rumo à sala de reuniões. Tudo o que eu mais queria era ficar longe de meu irmão naquele momento.

A reunião ocorreu tranquilamente bem. Pascal me apresentou o projeto da nossa nova linha de espumantes e vinhos finos. Ele me explicou como seria a forma de fermentação dos vinhos, falou sobre as uvas que usaríamos e sua expectativa com nossa nova safra e aceitação do mercado. No final da reunião, saí com a sensação de dever cumprido, acreditava piamente que tínhamos tomado o melhor caminho em relação à vinícola.

Peguei todas as anotações que Verônica tinha feito durante a reunião, juntamente com as demandas do dia e redigir o relatório a ser enviado para Andrew. Estava tão cansada mentalmente, que tudo o que eu mais queria era enviar logo aquele documento e ir embora para casa.

Quando estava prestes a mandar o relatório para o email corporativo de Andrew, a janela para o convite de uma videoconferência apareceu em meu campo de visão. Embora aquela reunião não estivesse marcada, cliquei em aceitar no convite um pouco confusa. Quase cair da cadeira quando o rosto de Caleb apareceu na tela do meu notebook.

Mil perguntas surgindo ao mesmo tempo em minha mente. O que eu diria? Por que Andrew não estava ali? O que ele queria? Fingiríamos que nada aconteceu? Eu definitivamente não saberia como lidar com ele naquele momento.

Soltei o ar com força, tentando manter a postura. Mesmo a quilômetros de distancia seu olhar ainda tinha o poder de provocar ações involuntárias em meu corpo. Passei a mão nos cabelos, numa tentativa de parecer menos nervosa. Não importa. Eu era capaz de participar de uma reunião de negócios com ele durante meia hora. Agora era a gestora da vinícola, eu tinha que ter maturidade para lidar com aquela situação.

— Não me lembrava de ter essa reunião marcada. — acusei.

— Andrew comentou que hoje você teria uma reunião importante com o novo enólogo. Queria me inteirar sobre o assunto dessa reunião pessoalmente. Mas não se preocupe, serei breve.

Dei de ombros, abrindo a pasta com as anotações de Verônica. Enquanto ele me olhava curioso do outro lado da tela. Peguei os papeis e comecei a passar cada detalhe da reunião a ele, tratando de ser bem objetiva em todos os pontos que havia discutido com Pascal mais cedo.

Ele ouvia tudo em silêncio, o que já estava me deixando constrangida. Como se tivesse analisando minhas atitudes a frente da empresa, meus erros, meus acertos. Era totalmente desconfortável minha posição naquele momento.

Depois de ouvi tudo o que eu tinha para dizer, ele finalmente compartilhou sua opinião sobre o que achava dos rumos que eu estava tomando em relação à vinícola.

— Andrew não exagerou quando me disse que você estava saindo melhor do que esperávamos.

— Obrigada. — Agradeci visivelmente incomodada com seu elogio. — Ele tem sido um bom tutor.

— O melhor. — ele piscou para mim. — Você vai conseguir Sophia, eu sempre estarei ao seu lado para o que precisar.

— Obrigada por acreditar em mim Caleb, você não sabe o quanto isso tem sido importante para mim.

Apesar de todos os pesares, assumir a vinícola estava me fazendo muito bem. Pela a primeira vez na minha vida, eu me sentia capaz de lutar pelo o que eu realmente acreditava. Estava feliz por finalmente consegui tomar as rédeas da minha própria vida. Era bom não ser tratada mais como uma mulher frágil.

— Então é isso... — falou meio contrariado.

— Ok. — respondi sem saber o que dizer mais.

Ele ficou me observando como se estivesse tomando coragem para dizer mais alguma coisa.

— Eu sinto sua falta Sophia. — disse com a voz vacilante.

— Não faz isso, Caleb. — Passei os braços ao redor do corpo. — Não estrague a boa convivência que estamos começando construir.

— Estou falando a verdade. Todos os dias voltar para casa tem sido um martírio, eu ainda sinto o seu cheiro impregnado em todos os cantos da casa. Desde que te reencontrei eu só sei pensar em você Sophia.

Olhando para ele agora, parecia impossível imaginar que ele mentia. Seu olhar parecia sincero. E devastado também. E meu coração burro começou a sussurrar que talvez ele estivesse falando a verdade. Talvez ele realmente estivesse arrependido.

Mais silêncio. Dessa vez um beeeem longo.

— Eu sou um idiota mesmo. Achei que fosse capaz de passar trintas minutos sem te querer. Prometi para mim mesmo respeitar seu tempo e não te procurar mais. — ele suspirou frustrado. — Mas a verdade, é que eu te amo tanto Sophia que chega doer.

Mais uma cambalhota dentro do meu peito. Minha vergonha na cara ameaçando se esvair.

Antes que meu coração vencesse a batalha contra minha razão, tratei de encerrar a videoconferência. Por mais que doesse, era necessário que Caleb sentisse na pele o que eu passei quando ele me abandonou para fugir com Marion.

Eu não o perdoaria.

Não mesmo.

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