Quando nos libertamos
22 de janeiro de 2018
Voltar a Hogwarts, no fim, não foi o tenebroso monstro que pensei.
Mas estava acostumado a ser exagerado e talvez um tanto dramático.
A maioria dos alunos, ainda muito fechados em suas próprias dores, mal notavam minha presença e quando isso ocorria as reações eram variadas, não positivas nem negativas, talvez penosas e curiosas fosse o mais correto a dizer. Todos pareciam muito cheios de dedos, com medo de me ferir tanto quanto eu estava de feri-los, muitos jovens machucados da guerra e com um retrato bem claro do que a intolerância fazia com os seres humanos.
Ninguém queria fazer novas feridas, ou mexer nas velhas.
Ainda era muito difícil para todos estar ali, e de forma infeliz, eu estava completamente certo sobre uma parte em especial do retorno. A falta que sentia do meu padrinho. Ir às aulas de poções, encarar o novo diretor da sonserina, matar tempo no salão comunal, muitas vezes eu evitava até mesmo olhar a mesa dos professores durante as refeições. Com certeza, não ter Snape por ali era a pior parte.
Mas estava indo bem, nenhuma crise e poucas aulas faltadas, havia até mesmo feito uma poção durante o período de aula e, depois desse dia, pedido para mamãe enviar a caixa que ganhei de meu padrinho, até o final do ano eu conseguiria ler os diários. Sabia que iria demorar, que ia doer, mas eu poderia lidar com isso. Iria continuar os estudos do meu padrinho, e um dia, poderia juntar meus próprios diários de pesquisa com os dele. Era um doce pensamento otimista que eu me permitia ter.
— Draco! — Diminuo o passo ao ouvir a voz de Pansy ressoar empolgada pelo corredor.
— Bom dia. — Cumprimento.
— Péssimo dia, aula prática de herbologia no primeiro horário, quem foi o demônio que planejou isso?
— Realmente se sujar de terra logo cedo não me parece agradável. — Respondo franzindo o rosto, eu nunca iria gostar de Herbologia, as aulas teóricas ainda eram tragáveis, mas as práticas… gostaria que uma mandrágora gritasse em meus ouvidos por horas invés disso.
— Porque não é. — Ela fez uma careta de desgosto por alguns segundos antes de lembrar de algo e seu semblante virar malicioso. — Potter está te procurando e pondo Hermione doida.
— Imagino que essa informação tenha vindo diretamente do dormitório feminino da grifinória. — Provoco sorrindo malicioso, Pansy ri pelo nariz sorrindo igualmente.
— Poderia ter vindo diretamente da boca do cicatriz se você fosse um pouquinho menos bom em se esgueirar pelo castelo e mantivesse um romance discreto como eu.
— Hilário, Pansy, hilário. — Reviro os olhos tentando manter a postura séria, mas querendo gargalhar do “Romance discreto”, pois suspirar durante todas as aulas conjuntas e falar a todo momento com Hermione não poderia se encaixar nessa categoria.
— Eu tento. — Ela sorri antes de dar de ombros. — Anda logo, Blaise deve estar querendo nos matar.
Concordo com um menear de cabeça, andando mais rápido com ela em meu encalço e praticamente pendurada em meu braço. Recuo um passo quando vejo o trio de ouro a alguns passos da porta do grande salão, na esperança de Pansy não notar e eles entrarem antes de nós, o que obviamente não acontece e invés disso, tenho os três mosqueteiros bruxos parados esperando na entrada.
— Bom dia, Mione. — Pansy cantarola antes de largar meu braço e ir avançando alguns passos à minha frente para falar com a mulher. — Dormiu bem, princesa?
— Bom dia! — Ela direciona um sorriso doce a minha amiga que retribui quase suspirando, e se isso era a ideia de ser discreta de Pansy, nós deveríamos conversar.
Levanto meu olhar, vendo a careta cômica no rosto de Weasley e um olhar de curiosidade de Potter para a cena. Não sei até onde eles sabem do relacionamento, mas não era como se elas escondessem bem, a qualquer modo, até um trasgo veria. Era fofo, apesar de estranho, elas combinavam ao mesmo passo em que não tinham nada haver. Assim como um acidente mágico que você não consegue desviar o olhar.
— Desculpa minha educação, bom dia, Draco! — Hermione me cumprimenta.
— Bom dia, Granger, Weasley e Potter.
— Bom dia, Draco. — Harry diz me olhando fixo com um sorriso, Hermione coça a garganta e ele sem desviar o olhar de mim completa — E Pansy.
— Que nojo, vocês vão fazer meu estômago quebrar de tanto nojo. — Hermione revira os olhos e quando Ronald passa por ela recebe um tapa na nuca. — Isso doeu!
— Vamos entrar também. — Pansy passa o braço pelo de Granger que entra arrastada salão a dentro. Até tento fazer o mesmo, ir de encalço a ela para o salão como estávamos anteriormente, mas recebo um pisão no pé e os olhos vibrantes de Harry me congelam no lugar.
— Eu ando te procurando, — Ele começa com certo receio, engolindo em seco. — para agradecer.
— Pelo o que?
— Falei com minha avó antes de vir a Hogwarts, não faço ideia de como conseguiu aquele endereço, mas muito obrigado! — Harry tinha um olhar tão brilhante, como se eu tivesse acabado com a fome mundial, não contive o ímpeto de encolher diante de tanta expectativa. — Ela está bem velhinha, me trata como se eu fosse meu pai, é engraçado. Muito obrigado por isso.
— Não adianta falar que não fui eu, correto? — Umedeço os lábios em nervosismo tentando desviar um pouco a conversa.
— Não mesmo. — Ele nega, sacudindo aquela cabeleira cacheada e sorrindo.
— Então de nada, fico feliz. — Sorri fino, quase constrangido com o entusiasmo dele, na verdade, bem constrangido com sua euforia.
— Durante as férias, você poderia ir comigo lá…
— Eu? — Falo mais alto do que o necessário, espantado.
— Sim como meu na-
Harry parou a fala do nada ficando vermelho em seguida, apenas arqueei a sobrancelha curioso.
— Como seu? — Insisto.
— Nano explorador e amigo.
— Você acabou de inventar essa palavra. — Falo com ar de riso.
— Sim, mas faz sentido, você teve que explorar cada micro detalhe para achar o endereço... — Ele riu parecendo constrangido, sua risada me fez sorrir, ela possuía um jeito único de iluminar o corredor inteiro. — Mas você viria?
— Talvez, Potter. — Sorri mais aberto, me virando em direção a porta. — Talvez.
(...)
Eu estava me sentindo exausto, tinha plena consciência que qualquer parede que me encostasse seria o suficiente para adormecer, faltavam dois dias para o primeiro mês do ano acabar e já estava cansado de dois mil e dezoito. O último ano em Hogwarts conseguia ser mais cansativo que todos os outros juntos, eram aulas demais, tarefas demais, para tempo de menos. Se antes não tinha ânimo para ficar nessa escola infernal, agora não havia nem forças. Esse lugar me tirava tudo, até minha beleza.
Meu dia foi composto por desviar de diversas azarações, feitas por alunos do primeiro ano que estavam fazendo uma excursão na escola, afinal a diretora Minerva achou genial executar uma semana de inclusão aos futuros alunos com os oitavanistas. Claro que seria perfeito juntar fedelhos rebarbados com jovens adultos amargurados, óbvio, se houvesse maior genialidade eu desconhecia.
E se isso não fosse péssimo por si só, hoje tivemos duas aulas extras de DCAT provindas de horários vagos sendo preenchidos, eu saia morto das aulas comuns, essas horas extras foram tão boas como sentir o beijo de um dementador, meu corpo odiava Defesa Contra as Artes das Trevas tanto quanto minha mente, mas claro que não seria apenas isso, óbvio que ainda tinha treino de quadribol para terminar de maltratar meu corpo desabituado de exercícios.
E como minha vida nunca pode ser fácil, quando fui ao salão comunal, na doce ilusão de ler um livro antes das aulas voltarem, houve uma enorme confusão. Um aluno da lufa-lufa invadiu nosso salão e estava querendo bancar o engraçadinho, levantando as saias das meninas, óbvio que quando ele chegou próximo de Pansy fui obrigado a fazê-lo vomitar lesmas preso no teto pelo resto da tarde.
Aquele dia não podia piorar.
Não, claro que podia, e senti ele piorar em níveis incontáveis quando no fim do corredor vi Ginevra usando um dos suéteres de grifinória de Harry, quer dizer, provável que seja, mas ela também pertence a casa, talvez houvesse herdado esse maior de um dos irmãos, faz sentido. Respiro aliviado com minha própria conclusão por exatos dez segundos antes dela se aproximar mais de mim, e eu saber com certeza que era o dele pois havia usado o mesmo suéter meses atrás, sabia que era dele pois quanto mais ela se aproximava eu conseguia ver a remenda verde na gola vermelha que eu havia feito.
Algum cruzamento bizarro entre enjoou e ódio surgiu na boca do meu estômago. E quis prender Harry no teto e fazê-lo vomitar lesmas.
Ela realmente estava usando o suéter dele, aquilo não deveria me incomodar, era só uma roupa, uma roupa dele, apenas poliéster, tecido costurado, mas me incomodava, era quase a mesma sensação de ver eles se beijando depois dele quase ter me beijado. Ginevra passou por mim, parecia furiosa, seu rosto estava quase tão vermelho quanto seus cabelos, nem me notou, não notou meu corpo lentamente se inclinando nas rochas das paredes, procurando amparo físico onde faltava emocional. Eu precisava superar Potter.
Não eram pontos finais e políticas de boa convivência que fariam isso por mim.
Pus-me a andar com certa ira, chegaria no salão comunal da sonserina, aproveitaria o final de semana para dormir dois dias seguidos, na segunda-feira o tempo com Potter seria uma vaga lembrança de um sonho bom, e se eu desse sorte, ele passaria um final de semana romântico com a fêmea da prole Weasley, esquecendo totalmente de sua estadia na minha casa.
Se eu fosse um pouquinho mais sonhador, Ronald poderia falar algo muito idiota, eu responderia, Potter iria me xingar, no cenário perfeito rederia umas azarações como nos velhos tempos, e isso ajudaria a me colocar no meu lugar.
Ou me fizesse chorar como a pessoa nada dramática que sou pelo amor unilateral ao grande herói de guerra, Harry Potter. O que viesse primeiro.
De qualquer forma, o impacto seria devastador, e quando eu fosse encontrado no alto da torre de astronomia preso em meu próprio limbo emotivo, cercado de telas que valeriam milhões, ele saberia do meu amor.
Findo o pensamento revirando os olhos, Pansy está certa, eu deveria começar a escrever poemas depressivos e criativos invés de criar cenários idiotas na minha cabeça.
— Desculpa. — murmurei a contragosto quando dei de encontro com alguém.
— Não, eu que não estava prestando atenção…
Quando percebi que era Potter dizendo, agachado procurando seus óculos quis correr, mas não conseguiria deixar ele ali, praticamente de quatro e cego, tateando a direção oposta onde a armação estava. Eu ainda tinha um pouco de benevolência no coração, pouca, mas existia.
— Toma. — devolvi o objeto, umedeci os lábios antes de pegar minha varinha. — Reparo.
— Valeu. — ele ergueu o olhar e finalmente percebeu quem era ali. — Draco! — soou surpreso.
Acenei com a cabeça, como quem confirma de forma patética que é realmente eu ali, depois desse novo vexame causado que pedirei carinhosamente para Pansy obliviar, me viro para ir embora, mas ele segura meu braço. E pelo visto eu não sou o único com ideias clichês em mente.
— E-eu achei um livro na biblioteca dos Black que você gostaria de ler… eu acho… ao menos — ele parecia nervoso, sua mão havia saído do meu braço e agora apertava uma na outra.
— Certo… — Respondo quase como um robô — Preciso ir.
— Por que você tá fugindo? — Harry resmungou sôfrego e depois arregalou os enormes olhos verdes como quem se choca com o dito, talvez ele não quisesse expressar essa frustração.
— De novo isso? — Massageio a ponta do nariz e ele sorri singelo ao ato, acabei abaixando a mão e o momento morre tão rápido quanto começou.
— Okay, certo, péssima escolha de palavras. — Ele possuía uma aura tão tensa que estava começando a me deixar nervoso de tabela, suas mãos não paravam em um só lugar e ficava alternando o peso das pernas de forma constante. — Acho que o melhor jeito de perguntar é ser direto, Hermione costuma dizer que é a melhor forma de se descobrir algo, costumo ter dificuldade de fazer isso, mas acredito que se eu perguntar você vai me responder, a não ser que aqueles primeiranistas estejam certo, mas aí você estaria namorando Blaise, e se ele te proibiu de falar comigo o relacionamento estaria sendo abusivo, e você deveria terminar, mas você teria que ver a situação e as pessoas não costumam ver alem dos namorados quando são abusivos e-
— Harry, você não está fazendo sentido! — Brigo com ele, já cansado do dia exaustivo, de tanta enrolação e frases sem noção, mas quando vejo a forma que ele estancou e ficou vermelho, de repente ficando congelado, como se alguém tivesse o pausado, minha respiração que para, minha própria voz surge repetindo em minha mente: Harry. Eu o chamei de Harry! Fora da minha cabeça!
— O que disse? — Ele fala com cautela.
— Falei para você ser direto! — Entro na defensiva com certo pânico na voz, a postura dele fica mais leve e um sorriso arteiro se forma nos lábios, eu acabo enrugando a cara em uma careta desgostosa. Ele não deixaria aquilo passar batido.
— Tudo bem, por que você está evitando o Harry? — Potter perguntou soando frustrado mesmo que a feição fosse brincalhona, abro a boca para desmentir e ele negou com a cabeça parecendo adivinhar o que eu falaria. — Você andou falando mais com Rony do que comigo!
— Ela está com seu suéter.
E pelo visto alguém colocou veritaserum em minha comida, a frase saiu tão rápida que nem pensei antes de proferir, talvez fosse o cansaço retirando minha sanidade ao poucos, novamente tranco a respiração em pânico e me ponho a andar quase correndo de desespero, minha única opção de fuga seria entrar no salão comunal da sonserina, havia falado demais.
Um dia, eu ainda iria morrer pela boca. E talvez esse dia fosse hoje.
A imagem mental minha definhando na torre de astronomia me pareceu deleitosa de repente.
— Eu não entendi, Draco, volta aqui! — Potter bradava pelo corredor, chutando qualquer política de boa convivência. — Quem tá com meu suéter? O que isso tem a ver? Céus, você anda rápido demais.
— Cala a boca, as pessoas estão olhando! — virei para ele de forma brusca quase batendo de frente novamente, os poucos alunos no corredor pareciam concentrados na cena, provavelmente sedentos por alguns feitiços como nos velhos tempos.
— Eu não ligo. — cruzou os braços e subiu o queixo, quase ri da tentativa de se impor dele.
— Tanto faz, só me deixa em paz. — suspirei e dei de ombros, o dia tinha sido cansativo demais para tanto estresse.
— Não! Estou cansado de "te deixar em paz" e perder a minha, aqueles dias não significaram nada para você?
— Não importa o que significou se você vai pegar a merda do suéter e dar para a primeira pessoa que passar. — não controlei minha língua.
Harry arregala os olhos, e eu acompanhei sua feição sair da raiva com frustração contida a um divertimento escrachado em segundos, cerro o olhar, repreendendo-o.
— Você tá com ciúmes… — soltou um risinho e eu quis socar o rosto dele até tirar.
— Até parece! Você que estava falando do Blaise ser meu namorado!
— Os calouros estavam testando os feitiços de levitação, alguma ramificação do wingardium leviosa e acabaram derrubando uma jarra de poção para plantas na Gina, dei o suéter para ela chegar no dormitório de forma decente.
— Você não tem que me dar satisfação. E poderia ter secado ela com um feitiço. — Faço um bico de birra, a ação foi inerente à minha vontade, e ele apenas soltou uma risada anasalada.
— É verdade, as duas coisas, mas eu quero lhe dá-las e não pensei nisso na hora. Acho que eu estou te devendo uma conversa franca assim como você também me deve. — esfregou as palmas no rosto da mesma forma que vi Sirius fazer várias vezes. — No natal, as coisas ficaram um tanto intensas, sendo honesto, antes dele mesmo, sendo mais sincero ainda, acho que as coisas sempre foram intensas entre nós. Desculpa, eu estou me desviando de novo, bem, eu e Gina estávamos terminando, era um beijo de despedida aquilo que viu, sabe, na cozinha.
— Eu não quero saber… — murmurei só para não perder a fala, pois eu queria muito saber, e tudo que ele dizia parecia reacender aquele fio de esperança que venho tentando apagar nos últimos tempos. — Não aqui.
Ele concordou de forma nervosa, mesmo que falasse não se importar com as pessoas vendo, havia uma quantidade bem grande de alunos surgindo para ouvir a conversa e aquele não era assunto para o bico deles. Com um sopro de coragem, estico minha mão buscando a de Harry, que parece travar, quando enlaço nossos dedos ele sorri bobo e eu rio baixinho, o puxo para fora daquele corredor. Se minha memória não falha, a sala 05 do segundo corredor ainda estava interditada e se não houvesse ninguém transando, estaria livre. Abro a porta com a mão vaga, olhando com cautela para dentro, para minha sorte, estava vazia, entro ali e muito contra gosto, solto a mão de Harry. Ele faz um feitiço de trava na porta da sala e eu saco a varinha fazendo um silenciador.
Agora era nós por nós.
— Quem começa? — Harry falou tão baixo que mal ouvi.
— Você que começou a conversa.
— E você me arrastou para cá. — Ele disse na defensiva, o olho com deboche.
— Então ninguém fala. — o respondo com birra, ele contém uma risada mordendo o lábio e cerro o olhar em sua direção pela enésima vez. Harry Potter me daria rugas.
— Você é tão previsível, Draquinho. — Arqueio a sobrancelha tentando manter a pose séria para o apelido ridículo sendo falado de forma estridente por Harry, mas foi bem engraçado ouvi-lo remedar Pansy, ela que nem sonhe com isso.
— Sério, Potter?
— A voz de Pansy falando isso gruda na mente das piores formas.
Rio da afirmação, ele também, seu olhar se junta ao meu, e aquela conexão mágica entre nós se estabelece novamente. Meu estômago vibra em expectativa e Harry parece compartilhar do sentimento quando morde o lábio inferior me olhando ainda. Tanto eu quanto ele fomos desviando o olhar com calma, dissolvendo o encanto aos poucos. Mantivemos um sorriso singelo nos lábios como se ambos se lembrassem de algo doce. Ou como se estarmos na presença um do outro fosse motivo suficiente para sorrir, e bem, para mim, era.
— Pansy e Hermione, quem diria? — Ele diz baixo, tentando preencher o silêncio. Suspiro antes mesmo de responder.
— Nós somos péssimos em diálogo. Principalmente se forem sobre nós dois.
— Somos.
Ele ri com certo constrangimento e faço o mesmo. Me sento em uma das mesas, Harry apenas me companha com o olhar, ainda em pé no meio da sala, as mãos ainda não conseguiam ficar paradas, sendo apertadas uma na outra em frente ao corpo, ou mexendo na capa do uniforme, e às vezes ele esfregava as palmas no tecido da calça. Aquilo me incomodava, pois demonstrava o quanto ele estava tenso com essa conversa e o teor dela, o que acabava me deixando tão nervoso quanto ele, o que era péssimo, os dois surtando invés de falar.
— Eu me esquivei do nosso beijo no Natal. — Ele solta do nada, arregalo os olhos em choque, ele vai realmente começar pelo pior tópico? — Eu e Gina estávamos distantes desde antes de ir para mansão, abrimos a relação por carta, e na teoria eu poderia te beijar, mas você não sabia que pé andava meu namoro, não achei correto com você e também surtei um pouco com a perspectiva de te beijar, você não parecia bem ali, soou errado e certo. Foi confuso, eu estava confuso.
Acenei positivo com a cabeça formando as novas informações na minha mente. Fazia sentido o recuo, na verdade era acolhedor saber que não tinha imaginado aquele quase beijo e muito menos havia sido rejeitado. Era bom ver que não era o único tendo uma síncope nervosa.
— Tentei te parar, te manter lá, pois queria você ali, não tinha nenhum grande motivo, eu só não te queria sozinho na mansão, queria você ali onde eu pudesse pelo menos te ver. E não pensei direito, e quando todo mundo só faltou pedir uma declaração de paz verbal sua eu entendi porque não queria ir para inicio de conversa, mas já estava feito e você havia passado a noite se esgueirando de mim, e visto o beijo com Gina… Eu agi por impulso, achei que deveria fazer algo.
Harry me olhou, talvez esperando uma resposta digna, mas eu só consegui engolir em seco contendo um ímpeto de chorar. Aquela noite foi complicada em muitos degraus, e não envolviam apenas ele, honestamente, ele foi apenas um dos problemas. Não gostava de lembrar daquele natal.
— Sabe, você falou muitas coisas naquela noite, algumas delas ainda me perseguem, pois eu vi o quanto estava machucado, mas algumas dessas frases estavam erradas. Rony e Hermione estavam te tratando bem pois estão tentando te ver como eu vejo, um cara machucado da guerra querendo se reerguer é como ela e ele te vêem, eu tenho uma visão um tanto mais tendenciosa sobre você. — Sorrio fino para afirmação. — Draco, você é alguém incrível, encantador, alguém que aceitou todas as exigências malucas do ministério apenas para sua mãe poder ver Lucius, você é esse tipo de pessoa, tem uma mente sagaz para tantas coisas, mas interpretou muita coisa errado daquele natal.
Acabo baixando a cabeça, talvez Harry estivesse certo e eu fui um tanto demasiado naquela noite. Eu poderia arrumar muitas desculpas, porém aceitar que havia exagerado pois não estava pronto para um passo tão grande me soou mais correto. Afinal, era a verdade, não se trava de nós dois, e sim de várias pessoas, feridas de guerra e mágoas passadas, não eram alguns meses e paz passional que iriam curá-las, e mesmo que eu não tivesse nenhuma grande ferida com relação a Harry, ele não vinha sozinho, tê-lo por perto era estar em contato direto com o retrato das maldades de Lucius, minha culpa perante a guerra e todas as minha inseguranças. Não era algo fácil. Mesmo que ele tornasse mais leve, continuava sendo muito para tolerar às vezes.
Eu conseguia lidar com Harry, com nossas tardes de leitura, com seu humor infantil e com a inquietude que o cerca. Foi fácil aceitar que havia me apaixonado pelo garoto corajoso e gentil que era Potter. Difícil era cogitar que ele iria querer algo romântico comigo, que a família dele iria aceitar e que seus amigos iriam ser pacíficos com relação a tudo isso.
— Não estou transferindo a culpa, não houve culpados naquela noite. Apenas coisas demais. — Ele suspira e pelo som, chuto que se sentou em uma cadeira, porém continuei fitando minhas coxas. — Mione sabe que você não é um monstro anti trouxa desde antes da guerra terminar, Rony tentou se aproximar da forma que sabe, te alimentando, ele realmente acredita que é assim que se conquista as pessoas, não julgo, funcionou comigo, mas não é só isso. Ele é grato por ter salvado Fred. Molly fez o suéter para você pois entende que sofreu na guerra e para ela todos somos apenas crianças… Não queríamos enterrar a guerra, ninguém ali conseguiria fazer isso, queríamos superar ela juntos.
— Eu não sei se consigo, digo, enterrar a guerra, ou superar, não agora, tudo que disse aquele dia foi verdade, talvez eu tenha pesado nas palavras mas o sentimento continua… — Suspiro antes de voltar a falar. — Foram coisas demais naquele dia, digo, vocês estão acostumados com natais fraternais, cheios de chocolates quentes, abraços e troca de presentes com significados, meus feriados são sempre em festas burguesas, onde eu torço para conseguir tirar uma hora com meus amigos para falar e comer besteiras escondidos. Eu não estava pronto para tudo que aconteceu naquele dia. Não estava pronto para ver você beijando Gina, para ver Sirius e Remus unidos e trocando confidencia, para ver minha mãe se desdobrar para agradar a todos. Eu só-
Pausei a fala um tanto ofegante, meu lábio tremia de leve e meu coração estava acelerado. Puxei o ar lentamente, Harry tentou falar algo mais erguia a mão o calando, soltei o ar tão devagar quanto o puxei.
— Vocês saíram da guerra, voltaram para um lar, mesmo que destruído, vocês tinham uns aos outros e poderiam se apoiar, eu nunca saí da guerra. Eu ainda moro no lugar que aquele homem fez de covil, meu pai está preso e minha mãe vive paranoica, esperando o dia que vão me prender ou que Lucius aparecerá morto. A guerra ainda assombra cada área da minha vida, e não tem como superar algo que não acabou.
O silêncio que se formou foi pesado, eu respirei fundo, ficando orgulhoso de mim mesmo, por não ter uma crise ansiosa depois de tudo que havia falado. Minha terapeuta ficará orgulhosa também. Encosto minha mão na madeira da mesa, meus ombros relaxam, parecendo mais leves. Dizer aquilo para ele realmente foi algo vital.
— Você não precisa resolver sua vida agora, não precisa virar amigo de todo mundo agora, mas eu te peço para parar de me afastar. Eu venho tentando reviver nossos momentos juntos, ou criar outros, mas você sempre se esquiva, cheguei a cogitar que estava ficando doido e tudo que aconteceu entre nós foi uma enorme ilusão! — ri fraco para a expressão de pânico dele, e lembrando de minha conversa com Zabini a tantos dias atrás, pelo visto eu escolhi uma opção e fiz outra.
— Peço desculpas por isso, eu ainda tenho umas questões mal resolvidas referentes a tudo isso, digo, sobre os dias na mansão. Foi um pouco demais para mim, aquilo também. Você não surgiu em um momento muito propício para novos sentimentos, minha cabeça ainda estava uma zona, sendo honesto, talvez ainda esteja, eu achava que você namorava com Ginevra, julguei melhor tirar sua imagem daqueles dias de minha mente e aplicar ao lado do namorado ideal, casal de ouro. — ergui o olhar a tempo de vê lo franzir a expressão para o termo que escolhi. — As coisas nunca foram apenas sobre nós, acho que nada na minha vida foi realmente apenas sobre mim.
— Nada na minha vida também. — Ele joga a cabeça para trás de forma teatral, sorri para a ação. — O que fiz para merecer isso?
— Não precisa fazer drama, o que quero dizer é que não era sobre beijar ou não Harry, era sobre me sentir bem com isso, sobre me sentir suficiente para isso, era sobre você ser namorado de Ginevra, era sobre nossas famílias e uma guerra que não estávamos do mesmo lado. Não sobre Harry e Draco.
— Mas poderia ser?
Sorri para a pergunta, me levantando da mesa. E quis responder que sim, e até poderia fazer isso, mas perdi a fala quando ele me olhou, sua íris afoita passeando pelo meu rosto todo enquanto a minha não saia dos seus olhos. Avancei um passo em sua direção, esquecendo a quantidade razoável de razões para não fazer aquilo, ele avançou um passo em minha direção esquecendo todas as linhas e barreiras que coloquei entre nós. Ele ergueu a mão encostando na minha bochecha, ignorando tudo que aquilo podia vir a significar para nós. E eu sorri para a loucura do que estávamos prestes a fazer. Ergui minha mão pondo na sua nuca ignorando todos os meus alarmes internos que aquilo era errado.
Colamos nossos lábios aceitando que aquilo tinha que acontecer, nos beijamos lentamente entendendo nossos tempos e desejos. Era inevitável aquilo, ele me puxava para ele como o Sol puxa a Terra. Não importava o resto, eu e ele, estávamos destinados a nos encontrar e reencontrar.
Seus lábios eram macios e doces, suaves quase como se não estivessem ali. Meus dedos iam tão bem por meio dos cachos de sua nuca, e os seus pareciam tão certos encaixados em meu rosto, fazendo um carinho suave pela minha bochecha. O beijo era um carinho entre nós, um pedido de desculpa de ambos pelo tempo perdido, mas altamente necessário.
— Nunca dei para ninguém a jaqueta de Sirius.
Sorri com a sua fala, um sorriso vitorioso, e ele riu, parecendo achar hilário minha infantilidade.
Senti meu corpo vibrar de felicidade, me sentindo alguém de sorte, pois, para minha completa satisfação, Harry conseguia ser alguém bem persistente, e mesmo não sendo o ser mais eloquente do mundo, eu entendia o que ele queria dizer com a simples frase, soube que ele faria de tudo para não deixar que chegássemos tão longe com sentimentos ruins como viemos fazendo até agora, pois ele sabia me ler tão bem quanto eu a ele.
Mas além de ler um ao outros, aprendemos a nos ouvir.
Eu havia me apaixonado pelo Harry, não pelo Eleito, e ele havia se apaixonado por Draco, não o filho de comensal. E ficaríamos bem, amando cada parte um do outro. Respeitando nossos tempos e avançando conforme o possível.
Potter ergueu o corpo na ponta dos pés de forma exagerada, já que não era tão mais baixo, e deixou um beijo na minha testa, e eu soube que esse era o momento que mais o amei.
Quando nossos olhos se cruzaram ele sorriu doce.
Quando eu encostei a ponta do meu nariz no dele, fazendo um afago.
Quando ele ficou vermelho em resposta.
E principalmente, quando ele estava assim.
Junto de mim.
Notas finais:
Depois desses dez dias afastada, finalmente trouxe o último capítulo. Minha mãe está em progresso e eu estou bem. Muito obrigada a todos que se preocuparam, estão sendo tempos difíceis, mas escrever sempre me ajudou a superar, o apoio de vocês também tem sido fundamental.
Quero dizer que esse projeto é muito importante para mim, muito além de ser minha primeira longfic em dois anos, ela traz traços desse ano difícil que passamos. Eu não sou médica, nem tenho amplos conhecimentos em psicologia, mas gostei de tratar as crises de Draco parecidas com as minhas, e a forma que mesmo não sendo o ponto ápice da história, o fato dele ter recaídas, momentos de fragilidade etc, guiaram a trama sendo uma forma de o humanizar e não deixar fútil a situação do personagem. Espero ter conseguido transmitir um pouco do que é viver com ansiedade e inseguranças afloradas. Afinal, além de uma fanfic Drarry essa é uma história sobre o Draco.
Por muito tempo eu quis escrever histórias no universo de Harry Potter mas me podei, por questões que não valem o mérito, e todo o processo de estar no @Dezdrarry se tornou algo excepcional, realmente abriu meus olhos para várias coisas. Estou falando isso pois sou extremamente grata a tudo que o projeto me proporcionou, as amizades, os leitores, bem, tudo! Sou muito feliz por ter feito e fazer parte disso!
Em suma, muito obrigado a psychocover que fez a capa, serei eternamente agradecida por essa obra de arte e as missugarpurple Miyamura_Harumi RedWidow potterfoy que revisaram, sem vocês isso não seria possível. De verdade!
E óbvio, muito obrigado a todos que acompanharam até aqui, vocês são meus tudinhos! Nunca esperei que a história fosse chegar nessa proporção, seja de leitores como de capítulos, não sei mensurar o quanto estou feliz e até mesmo orgulhosa!
Tenho outra coisa a dizer, sei que tá grande, mas calma. Tenho ideia para um bônus porém, como ando sem tempo e sem cabeça para escrever (acredito que saibam que minha mãe segue no hospital mesmo com a melhora de seu quadro), as coisas ainda estão difíceis, mas acho que a verdadeira questão é se vocês gostariam de ler. Vocês gostariam de um capítulo bônus narrado pelo Harry?
Fiz alguns mimos da fanfic, se puderem dar uma olhadinha ficarei muito grata! Vou deixar os links aqui:
Playlist no Youtube:
https://youtube.com/playlist?list=PLS9QRQ2sHe-Rj6i-LygKPgSpsB08u_-bc
Playlist no Spotify:
https://open.spotify.com/playlist/6otqF5XoKFxGpo6HqpiJjr?si=c049d48285c247db
Pasta no Pinterest:
https://br.pinterest.com/fadadocafe/quando-mais-te-amei-inspiration/
Espero vê-los em próximos projetos e no possível bônus😔💜
A próxima novidade é uma duoshot wolfstar...
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