7. Como Uma Deusa
No breve intervalo entre as aulas de segunda-feira, acomodei-me confortavelmente em uma das espaçosas mesas retangulares da cantina. Geralmente, durante esse período, os alunos optavam por desfrutar do café da manhã trazido de casa ou adquiriam lanches disponíveis na cantina. No meu caso, a segunda opção era a escolha do momento, enquanto eu saboreava um croissant adquirido recentemente.
Para minha surpresa, Luan apareceu de repente, tomando assento na cadeira à minha frente.
— Cadê seus amiguinhos, Sr. Popular? — provocou, enquanto dava uma mordida na maçã-verde em sua mão, com o cotovelo casualmente apoiado no encosto da cadeira.
— Estão na fila, comprando algo para comer — respondi com um gesto de descontentamento. Luan, no entanto, parecia indiferente, mantendo seus olhos fixos em mim enquanto saboreava um pedaço da maçã.
— E então, como vai o seu clubinho de poesia? — Perguntou enquanto mastigava.
— Pensei ter deixado claro que não existia um clube desses na escola — retruquei, ligeiramente contrariado. Será que ele realmente imaginava que eu me daria ao trabalho de criar um do zero? — No final das contas, me inscrevi no clube de artes cênicas. Teatro, para ser mais específico, caso não esteja familiarizado com o termo — expliquei, ao perceber seu olhar de idiota. — Não tenho experiência alguma nisso, mas enfim, quando se está no inferno, é melhor abraçar o capeta. E, de toda forma, era um dos últimos clubes com vaga disponível.
Luan pareceu ponderar por um instante antes de se levantar da cadeira, assumindo uma posição de destaque ao ficar em pé sobre a mesa. Meus olhos se arregalaram instantaneamente, observando todos ao nosso redor voltarem suas atenções para ele. O rapaz à minha frente estendeu a maçã mordida na minha direção, soltando em seguida:
— Ser ou não ser, eis a questão, caro Romeu.
— Desça daí imediatamente, todos estão olhando para cá! — sussurrei, tentando empurrá-lo da mesa. Luan soltou uma risada descontraída ao voltar a se sentar em sua cadeira.
Gradualmente, as pessoas retomaram suas conversas, esquecendo rapidamente o momento constrangedor que o idiota provocara. Suspirei com pesar. Este abestalhado não havia afirmado que era na dele? Por que diabos então chamou tanta atenção assim?
— Essa citação é de Hamlet, não de Romeu e Julieta, sua besta quadrada — apontei, referindo-me ao crossover inusitado que ele inventara entre essas duas obras de Shakespeare.
Por trás de Luan, avistei aqueles dois amigos dele mais distantes nos encarando. Rafael e Felipe não pareciam ser nenhum pouco amigáveis. Pelo contrário, a aura que emanava deles era pesada. Ainda assim, mantiveram distância, sem tirar os olhos de nós. Por estar de costas, Luan nem se deu conta da presença dos dois alguns metros mais distantes.
— Relaxa, Romeo. Se pegarem uma peça de romance para fazer, você finalmente vai poder perder o BV — Luan riu em deboche, mas acho que não tardou para ele reparar na minha expressão de descontentamento com seu comentário. Ele então me olhou sério. — Espera, tá brincando que você realmente nunca beijou ninguém, né?
— Qual é o problema?
— Nenhum, mas... Eu pensei que você e aquela sua amiga já tivessem se pegado. Você pareceu bem incomodado quando estávamos flertando outro dia na boate.
— Leh e eu somos apenas amigos. Nunca aconteceu nada entre nós.
— Ah, você é mesmo mole com as garotas, né? — Ele riu, como se finalmente tivesse compreendido. Enquanto ele falava, avistei Letícia se aproximando por trás dele, sorridente. — Não se preocupe, não vou mais dar em cima daquela sua amiga loira valentona. Vou deixar o caminho livre.
Sem que se desse conta, Luan levou um tapa na nuca assim que minha melhor amiga ouviu a forma como ele se referiu a ela.
— Valentona é a senhora sua vó! — Letícia disse, sentando-se ao lado dele. — E você acha mesmo que quero algo contigo? Recolha sua insignificância.
Luan levou a mão à nuca em sinal de dor, olhando para ela sem entender de onde ela tinha surgido. Este gesto me arrancou uma risada sincera.
— Além do mais, estou conhecendo um cara.
Suspirei, resignado com a recente revelação de minha melhor amiga. Até aquele momento, eu estava completamente alheio ao fato de ela estar envolvida com alguém. Entretanto, dado o conhecimento que eu tinha sobre Letícia, já era de se esperar que esse novo relacionamento fosse passageiro, como todos os outros. Era um padrão incorrigível dela: se aproximava de alguém, construía laços e, no momento em que as coisas começavam a se aprofundar, simplesmente pulava fora.
Assim que Leh mencionou seu pretendente, ela acenou na direção de alguém que se aproximava da nossa mesa. Virei-me para observar pela primeira vez aquele rapaz notável.
Sua pele exibia uma tonalidade de ébano profundo, destacando seus traços finos e distintos. Seus cabelos, naturalmente crespos, eram curtos e densos. Além disso, vestia-se com roupas justas que acentuavam sua magreza.
— Meninos, este é o Christian — Letícia o apresentou. Seu "peguete" fez um breve aceno de cabeça em cumprimento a nós.
Em seguida, ele curvou-se em direção a Letícia, selando seus lábios carnudos nos dela.
— Bom dia, minha deusa — Christian disse para ela assim que seus lábios se separaram, fazendo Luan segurar a risada que claramente estava prestes a escapar oriunda do fundo do seu peito.
Confesso que também me esforcei para não revirar os olhos. Não por causa de Christian, mas por Leh mesma. Parecia que ele já estava de quatro por ela. Apesar de amar minha melhor amiga, não achava legal a falta de transparência dela para com os caras com os quais flertava.
O fato de Christian só cumprimentá-la agora indicava que provavelmente não eram da mesma turma.
— Nos vemos depois da aula? — Leh perguntou olhando em seus olhos de um profundo castanho, semelhantes a ricas nozes torradas.
Christian concordou com a cabeça, selou seus lábios nos dela uma última vez e acenou em despedida para mim e Luan. Depois, afastou-se, nos deixando a sós novamente.
— O que foi? — ela perguntou, franzindo as sobrancelhas quando percebeu nosso olhar desconfiado.
— Nada — respondi, tentando evitar julgamentos.
— Ele é claramente um gado — Luan disse, enquanto arremessava o resto da maçã na lixeira do outro lado da cantina.
— Gado ou não, ele é um gato — Leh inclinou-se sobre a mesa, fuzilando Luan com o olhar. — E quem está pegando ele não está reclamando.
— Claro que não, quem reclamaria de ter um otário te chamando de deusa? "Como uma deusa, você me mantém" — Luan começou a cantar desafinadamente para provocá-la.
— Olha, eu tentei. Mas você é insuportável — Leh se levantou, dirigindo-se então a mim. — Espero que traga resultados positivos essa nova "amizade" de vocês dois.
Leh se afastou, lançando um sorriso malicioso para Luan, que não fazia ideia do que aquilo significava. Eu, no entanto, tinha conhecimento de que Leh acreditava que minha aproximação com esse garoto era para obter informações pessoais sobre ele e, posteriormente, apunhalá-lo pelas costas, conforme sugerido anteriormente por ela.
No entanto, já não enxergava a situação sob essa perspectiva. Eu estava começando a gostar de Luan, e acreditava que dessa relação poderia surgir uma amizade verdadeira.
— Garota esquisita — comentou Luan, dando de ombros. — Ah, antes que eu me esqueça. Sobre aquele convite para quarta...
— Relaxa, eu sei que você tem que trabalhar. Nem deveria ter feito o convite.
— Você é realmente precoce, né. Nem me deixou terminar de falar — ele disse, sorrindo. Ergui a sobrancelha, sem compreender. — Me darei ao luxo de tirar folga nesse dia. Sinta-se honrado. É bom que faça valer a pena, seja lá onde você pretenda me levar.
Um sorriso involuntariamente se formou em meus lábios diante da resposta de Luan. Confesso que não esperava que ele fosse aceitar. A expectativa dele em relação ao meu convite me deixava um pouco inseguro se ele realmente iria gostar do local que eu havia planejado, afinal, ele nem sequer fazia ideia de onde iriamos. Ainda assim, expectativas foram criadas para ambos.
— Você vai gostar. Ah, e vá vestido de forma formal — informei, fazendo-o franzir o cenho em dúvida.
Antes que conseguíssemos articular mais alguma coisa, nossos colegas de classe se aproximaram da nossa mesa, cada um carregando seus respectivos lanches. Alguns se acomodaram ao meu lado, enquanto outros escolheram ficar próximos ao Luan.
— E aí, Kevin? — Vinicius dirigiu a palavra a mim, seu olhar se voltando em direção a Luan. Os outros três aguardavam ansiosos que eu os apresentasse oficialmente a ele.
Eu teria feito isso de bom grado se, no mesmo instante, Luan não tivesse se levantado e saído da mesa sem proferir uma única palavra. O gesto de má educação deixou todos na mesa boquiabertos.
Olhei para trás e o vi se aproximando de Rafael e Felipe, que estavam no fundo da cantina, engajando-se em uma conversa que não consegui captar devido à distância entre nós. Passei a me questionar sobre suas ações, especialmente porque ele havia mencionado anteriormente não ter amigos além de James. Então, por que a proximidade repentina com aqueles dois?
— O maluco é maluco mesmo — Vinicius comentou, e os outros concordaram.
Tenho que admitir que as atitudes de Luan eram bastante peculiares. Parecia que ele não tinha interesse em se aproximar de nenhum dos nossos colegas de classe além de mim. Mesmo tendo me explicado seus motivos para não querer fazer novas amizades, não justificava ser tão hostil com os demais. Embora esse comportamento me deixasse intrigado, ao menos eu me sentia satisfeito por saber que nossa relação estava suficientemente boa para que Luan aceitasse o meu convite para quarta-feira.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top