2. O Vampiro do Meio Dia
Toda vez que voltava o olhar para trás, me deparava com o rosto insolente de Luan exibindo um sorriso cínico direcionado a mim. Acreditem, estou na mesma turma que esse cretino que literalmente tentou extinguir minha chama com um extintor de incêndio. Bem, talvez não tenha sido tão literal assim, ainda assim aquilo atiçou minha raiva como se tivessem jogado gasolina em mim.
Surpreendentemente, o líder da tríade de idiotas que tentaram pregar uma peça no diretor não era o filho do mesmo. O amigo dele, que se não me engano se chamava Rafael, esse sim era o filho legítimo do diretor, e era ele quem o Aroldo se referiu ao chamar de filho.
Após Leh me ajudar a me limpar, todos fomos encaminhados à sala do diretor. Os três patetas receberam apenas uma advertência verbal, e enquanto o filho do diretor permaneceu na sala do chefe da escola, nós fomos enviados de volta à nossa sala.
É mole? Eles conspiram para pegar justamente o diretor da escola, e não levam sequer uma suspensão. Se fosse eu, com certeza já estaria expulso... De toda forma, agora Luan e eu estamos na mesma turma de matemática, como mencionei anteriormente. Ele estava sentado lá no fundo da sala, com aquele olhar de delinquente, clássico rebelde sem causa. O sujeito sequer prestava atenção na aula, passando o tempo se inclinando na cadeira e olhando na minha direção, com aquele sorriso insuportável ao relembrar a cena "trágica" — mas para ele, cômica — em que fui atingido por engano.
Ao contrário do que eu imaginava inicialmente, parecia que ele não conhecia ninguém na nossa nova turma, então tudo o que se limitava a fazer era ficar me perturbando. Não que isso me importe, porque não dou a mínima. Estou longe de ser o nerd super estudioso, mas se há algo que tenho certeza na vida é que esse garoto está se lixando para a escola e não presta atenção em nada. O karma cuidará para que, no futuro, eu seja o dono de uma empresa multimilionária enquanto esse delinquente será meu funcionário e vai se arrepender de ter me tratado dessa forma...
— Sua resposta está errada. Você não pode mudar o sinal de desigualdade em uma inequação — Ouvi uma voz grave sussurrando bem perto do meu ouvido, fazendo meu corpo estremecer subitamente. Quando ele chegou ali?
Olhei rapidamente para o meu caderno e percebi que a observação de Luan estava correta. Droga! Isso significava que ele não era tão burro como eu pensava? Após dar um sorriso de canto ao perceber minha frustração com meu erro, Luan se inclinou novamente e dirigiu-se à porta, saindo da sala sem dar a mínima satisfação ao professor.
— O que foi, Kevin? — Um dos meus colegas que estava ao meu lado notou minha expressão de irritação.
Eu estava mordendo o lábio inferior, tentando conter o impulso de agarrar aquele garoto metido a besta e enchê-lo de porrada. Não sei o que estava acontecendo comigo; normalmente ninguém me tira do sério assim. Mas, inconscientemente, apliquei tanta pressão no lápis que estava segurando nas duas mãos que ele se partiu ao meio.
Meu sangue ferveu tanto que, em um impulso súbito, eu estava de pé. E logo após já estava saindo da sala poucos segundos depois do delinquente juvenil. Ninguém se surpreendeu quando ele fez a mesma coisa pouco antes. Afinal, era de se esperar que alguém da laia dele cabulasse aula assim. Mas comigo foi diferente. Quando saí da sala sem pedir licença, senti todos os olhares da turma cravados nas minhas costas. Bem, dane-se o que pensam.
O corredor da escola estava completamente vazio, já que todos deveriam estar nas suas respectivas aulas. Não sei o que deu em mim; nunca tinha feito algo assim antes. Nunca cabulei aula. Mas aquele garoto estava realmente mexendo comigo.
De repente, em sua busca, a única presença humana que avistei nas proximidades foi um vulto com uma jaqueta preta subindo a escadaria no final do corredor. Apressando meus passos segui o alvo da minha irritação.
Corri o mais rápido que pude para alcançá-lo. Por quê? Irineu, vocês não sabem nem eu. De toda forma, Luan chegou ao terraço da escola pouco antes de mim. Vim logo em seu encalço. Ao passar pela porta que separava a escadaria da parte mais alta da escola, o observei de costas, no qual aquele imbecil estava com as mãos apoiadas nas grades do terraço. O amplo espaço estava cercado por uma tela de arame farpado, e mais à frente estava a razão da minha raiva atual.
— O que você está fazendo aqui? — Tentei, aproximando-me lentamente.
Luan olhou de relance para trás, finalmente percebendo a minha presença. Quando se virou brevemente, pude notar que ele estava com um cigarro na boca. Quando viu que era eu, voltou a encarar a grade de arame, como se eu fosse insignificante, e então soltou uma nuvem de fumaça de sua boca. Patife...
— Você tem noção de que usou um extintor de incêndio em mim por engano e nem sequer se desculpou? — Ergui uma sobrancelha ao chegar ao seu lado. Não ia desistir tão facilmente; se eu estava ali, seria para confrontá-lo.
Luan permaneceu olhando para baixo. As pessoas lá embaixo estavam tão distantes que pareciam meras formigas. Ele não parecia se importar com o que acontecia à sua volta. Tampouco me dava atenção. Era como se estivesse sozinho naquele terraço.
Foi então que, sem perceber, tirei o cigarro da boca dele de forma exagerada. Luan finalmente me deu a devida atenção. Enquanto eu segurava o filtro do cigarro em minha mão, sua chama permanecia acessa. Não é como se ele estivesse bravo comigo enquanto me encarava; ele me olhava mais como se me desafiasse a fazer algo com aquele cigarro. E, então, abandonando todos os princípios que meus pais me ensinaram, levei o cigarro à boca e comecei a fumar pela primeira vez. Claro, tentei parecer que já estava acostumado a fumar esse tipo de substância.
E, claro, minha atuação teria dado certo... Se eu não tivesse asma! Depois de inalar a fumaça do cigarro, comecei a tossir sem parar, derrubando o objeto no chão. Se Luan me ajudou diante da minha crise? Bem, depende. Se você considerar uma crise de risos zombeteira como ajuda, então sim, ele ajudou bastante — contém uma pitada de ironia.
Com a boca dele entreaberta, pude notar seus dois caninos bem afiados chamativos. Parecia um vampiro daqueles filmes sedento por sangue. Maldito vampirozinho. Aliás, estou impressionado comigo mesmo com a maneira como sempre encontro uma nova forma de xingá-lo.
— Sempre tem um nerd idiota tentando parecer descolado. Sai do meu pé, pivete — Após se recuperar do ataque de risos, Luan finalmente dirigiu a palavra a mim.
Pivete? Tenho certeza de que temos a mesma idade. Ele é apenas alguns centímetros mais alto do que eu.
— Eu não sou nerd, idiota!
— Não? Ficou choramingando para o diretor nos expulsar depois do que aconteceu mais cedo.
— E... E eu estava errado?! — Okey, admito que aqui gaguejei. Esse adubo humano estava tirando a minha paciência.
Luan ficou em silêncio por alguns segundos, olhando novamente em direção a grade. Eu não conseguia tirar os olhos dele. Havia algo nele que me intrigava...
— Não ligo a mínima para essa merda de escola. Meu mano estava puto com o pai dele, então decidi dar uma mãozinha para irritar o diretor. Se eu fosse expulso, melhor ainda. Não seria a primeira nem a última escola a me expulsar.
O sol estava no ponto mais alto do céu naquele instante, fazendo-o refletir no pequeno brinco na orelha direita dele. Apesar de tudo, tenho que admitir que ele tem estilo. Além disso, o cara tem um certo charme e, mesmo sendo um idiota, até mesmo carisma possui, aparentemente.
Qualquer garota se derreteria por ele. Foi então que caí na real. O que estava realmente me incomodando não era a travessura dele de mais cedo, nem a sua rebeldia. Eu também não o odiava, e tampouco estava interessado em ser seu amigo. Eu estava com inveja dele. Inveja de alguém que eu não conhecia, mas que era claramente tudo o que eu desejava ser e não conseguiria.
— O que foi? — Luan percebeu que eu estava pensativo, como se não estivesse prestando atenção ao que ele dizia. E, de fato, eu não estava.
Virei as costas e comecei a caminhar em direção à porta. O que estava acontecendo comigo? Fui atrás desse cara até aqui para quê? Estava com inveja por causa da perfeição dele? Ressentimento por nunca ter ficado com nenhuma garota, enquanto o Sr. "Olhem-para-mim-não-tenho-defeitos" provavelmente tinha tudo o que queria apenas por ser ele mesmo e ter sido agraciado com um maxilar perfeito?
É errado sentir inveja de alguém que é apenas mais bonito e extrovertido, em vez de tentar ser uma pessoa melhor? Talvez seja errado, mas estava decido a não dar mais palco para esse palhaço. Que fosse para o inferno!
Antes de conseguir passar pela porta e sair do terraço, senti um puxão repentino no meu braço. Luan me segurou e me encostou contra a enorme caixa d'água do local. Tentei me soltar, mas ele segurou firme até ter certeza de que seus braços estavam posicionados entre os lados do meu corpo, encurralando-me contra a caixa d'água.
Luan estava muito próximo, sem deixar espaço para que eu escapasse. Eu podia sentir sua respiração e seu hálito próximos. Seu cheiro também impregnou minhas narinas. Eu estava acostumado a estar tão próximo apenas da Leh, de forma que o cheiro natural de outro garoto era tão diferente...
— O que... você... pensa... que... está... fazendo?! — Sim, admito que gaguejei muito além do desejado nesse momento. Afinal, esse cara é um completo desequilibrado.
— Foi você quem disse que não é um nerd. Podemos fazer algo divertido para provar que você não é tão certinho quanto parece — O sorriso travesso de Luan, bem próximo do meu rosto, com intenções até então nebulosas para mim me fizeram engolir em seco diante de suas palavras.
Por que alguém que parecia ser o centro das atenções do mundo todo daria importância a alguém tão normal quanto eu? E... será que eu realmente não queria a amizade dele? Comecei a me questionar, pois, de certa forma, meu coração começou a bater rapidamente com a atitude dele, um misto de ansiedade com empolgação estava passando a me dominar. Não ser tratado como alguém invisível por alguém tão descolado era uma sensação estranha, e eu acho que estava gostando disso, mesmo sem entender suas verdadeiras intenções com esse "algo divertido" que ele mencionou.
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