Capitulo 8
Pov Marina
Nem me lembro de quando começamos a andar por aqueles corredores repletos de pessoas e lojas, boutiques de todos os tipos, e embarcamos em objetivo de explorar aquele mapa chamado shopping parando em cada loja em que chamava nossa atenção e gastando mais dinheiro do que eu imaginei que desse para gastar em roupas, mesmo que não levamos nem um terço do tanto que experimentamos e admiramos por toda a tarde que se passou. Não fazia sentido sofrer experimentar e desfilar em saltos doloridos e usar roupas que pessoas como eu nunca poderia usar, mas a diversão nunca teve que fazer sentido, e eu não me lembrava a quanto tempo eu me divertia assim.
- Você acha que eu sou seu manequim ou algo do tipo? Porque estamos fazendo isso mesmo?
- Porque eu estou entediada, simples. Suas roupas são um horror e parecem ficar pior a cada dia que eu te vejo, e a única coisa que as deixa menos piores é a sua aparência. Você é tão bonita... eu poderia te cobrir de cera e te fazer de manequim para sempre.
- Por favor não fale mais isso, vindo de você eu não duvido nada.
- Durma com um olho aberto essa noite – Alice provocou com um olhar sugestivo, depositando mais um vestido com os outros em meu braço estendido que começava a pesar – Apenas pense nisso como um favor...! Eu estou te pagando todas essas roupas lindas, que tipo de pobre é você?
- Um pobre com orgulho! Se quer mesmo me fazer um favor use esse dinheiro pra pagar minhas contas! – Repliquei entrando no provador e jogando o monte de roupas num canto, fechando a porta atrás de mim.
- Esse não é o meu trabalho, nem se eu te conhecesse a anos e realmente gostasse de você, isso não seria meu trabalho.
- Seria desconfortável se fosse – Conclui.
- E mesmo que eu estivesse disposta, você nunca deixaria.
- Pelo menos isso você sabe.
Me atentei ao som dos seus passos até sumirem de vez, o silencio pairou e presumi que ela estava sentada em um dos banquinhos perto dos espelhos, a minha espera. Analisei o monte de roupas e aquilo iria demorar séculos, minha estratégia era pegar as que eu mais gostei antes e rezar pra que ficassem muito bem em mim, ai Alice se empolgaria e esquecesse das outras roupas que eu tinha pra experimentar. Me despi e vasculhei naquele monte pela peça mais simples possível, e acabei por escolher por um vestido branco de tecido fino e detalhes de renda, sem dificuldades eu me vesti nele e me analisei minha imagem no espelho, sorri genuinamente, das infinitas peças que provei hoje essa era uma das poucas que tinham me agradado, o tecido caia como uma pena e ressaltavam as poucas curvas do meu corpo, e delicada renda cobria até meu cotovelo e dei uma voltinha, fazendo a sair do vestido rodar acima dos meus joelhos.
Me apreciei como nunca fiz antes de sair e mostrar o resultado a Alice, que começava a me apressar e provavelmente reclamaria do aspecto inocente e antiquado que o vestido pudesse parecer para ela. Abri a porta e caminhei hesitante em sua direção, que mexia no celular e demorou a notar o som dos meus pés descalços, seus olhos se levantaram e me mediram de cima a baixo, aos poucos mostrando um brilho que eu nunca vira, e logo meu sorriso se tornou o seu.
- E então... você gostou? – Perguntei timidamente, enquanto ela me guiava com pulinhos e um sorriso de orelha a orelha até o enorme espelho que tomava quase toda uma das paredes.
- Você deve ser idiota mesmo... precisa de palavras para dizer que eu adorei quando eu estou agindo assim? – ela retrucou fingindo irritação, que logo se dissolveu em uma expressão sincera e admirada enquanto admirava ainda mais meu reflexo no espelho, com o rosto encostado em meu cabelo e as mãos firmes em meus ombros, não transpareci minha surpresa por seu toque repentino, mas também não a rejeitei.
- Tem razão... eu achei que não fosse gostar, não parece o seu estilo.
- Talvez não em mim, mas o vestido é perfeito para você! É branco e rodado, passando uma aura inocente e fresca como brisa de verão, vê? Seu cabelo vermelho é o Sol, seus olhos verdes são o verde da natureza e o vestido as nuvens que enfeitam o céu azul interminável.
Senti meu rosto queimar.
- Uau...! Eu nunca poderia ter pensado dessa forma, isso é tão bonito hehe... – Ouvi sua risadinha em minha nuca, que ria do meu embaraço e rosto vermelho, tratei de mudar de assunto rapidamente – Você é boa nisso! Como aprendeu a se vestir bem assim?
Seu sorriso sumiu aos poucos e ela fitou sua imagem no espelho por longos segundos, procurei seu olhar mas eles pareciam viajar no passado, com um semblante nostálgico de repente.
- Ah isso... não é nada demais. Apenas que quando eu era criança, eu e minha mãe costumávamos brincar de modelo e desfiles, coisas desses tipos sabe? Eu amo a moda desde que me conheço por gente e isso veio dela, que estudou moda e nunca pode exercer a função, mas a paixão continuou acessa dentro e ela me ensinou tudo o que aprendeu, esperando que um dia eu pudesse fazer o que ela não fez, mesmo criança eu sabia disso. Infelizmente paixões assim somem com o tempo, ou melhor, são apagadas pela vida, a empresa foi crescendo e ela foi ficando cada vez mais ocupada, e brincamos nessa brincadeira de criar e vestir cada vez menos, até parar de vez. Mas eu nunca vou deixar a minha se apagar, não vou ser como ela e abandonar aqueles esboços de peças de futuro, aquelas risadas e desfiles sob os corredores da casa com as mais belas roupas.... Eu não vou! Não vou ser igual ela.... Eu sei que pode parecer fútil e até ofensivo pra você, nós gastávamos tanto e tínhamos mais ainda, o dinheiro que você nunca teve... mas nesse momento isso é importante pra mim...! Então só por hoje, me deixe relembrar esses momentos e manter minha chama acessa.
Eu não sabia se ela estava chorando ou apenas motivada por aquela história solitária que ela fazia questão de vingar. Sua voz e olhar tinham uma determinação que eu nunca tinha visto e ainda assim, não era fácil pra alguém como eu ver tanto dinheiro ser gastado em panos, mas eu só entendia que suas mãos me apertavam com força e ver alguém tão solitário e triste como Alice querer experimentar o doce sabor da infância, eu engoli meu pensamento e a apoiei naquele sonho repentino e apaixonado que eu nunca achei que ela carregasse, afinal rico ou pobre, todos temos um sonho, seja do fazer um futuro melhor ou viver de migalhas de momentos que nos dão o sabor da alegria única da infância.
- Não é fútil Alice. Sou eu que estou dizendo ouça bem, pela primeira vez eu te entendo completamente.
Seus lábios logo se distorceram eu um sorriso grato e sincero, e senti suas mãos relaxarem em meus ombros.
- Me chame pra brincar quando quiser. Afinal são os momentos assim que temos que apreciar – A assegurei.
{...}
Me deixei levar pela diversão e distração de uma tarde de maratona de compras com Alice, que apesar de ser extremamente exigente sobre moda, o único assunto que ela domina, acabou não sendo tão ruim quanto eu imaginava e me deixou opinar e escolhemos juntas a maioria das roupas que experimentamos, deixando apenas uma parte para o seu gosto pessoal, me surpreendendo com sua maturidade repentina.
Massageei meus pés doloridos e com calos que se formariam logo, e tratei de tirar os saltos altos e brilhantes que torturaram meu pé a tarde toda, que foi a primeira coisa que ela fez questão de comprar, consegui convencer Alice a me deixar na esquina de casa com a desculpa de treinar mais um pouco o andar, mas os tirei assim que seu carro sumiu de vista. Juntei as sacolas que estampavam marcas famosas e roupas mais caras do que deveriam em minhas mãos e comecei a andar em direção a minha casa em uma caminhada arrastada e dolorida, e quando já não aguentava mais me rendi a tentação e pisei os pés na grama da casa mais próxima, sentindo a grama macia e geladinhas entrar sobre meus dedos e fazer cócegas em meus pés. Suspirei aliviada, mas não por muito tempo, o barulho do portão da casa me despertou e uma silhueta surgiu da cerca viva que cobrias os muros, não me dando tempo nem para disfarçar.
- Saia do meu gramado! – Julian gritou apontando seu dedo acusadoramente em minha cara e uma expressão revoltada, meu sangue gelou e eu logo pulei pra calçada assustada, percebendo meu espanto sua expressão relaxou e um sorriso travesso se formou em seus lábios, caminhando até mim com um riso quase infantil – É daquele filme sabe? A casa monstro...
Menino estranho.
O olhei confusa enquanto tentava processar o que acabado de acontecer, a lembrança daquele desenho que eu via me chegou a mente e eu soltei um riso nervoso.
- O que? Ah... Claro! Haha, eu tinha muito medo daquele filme... – Respondi sem jeito.
- Parece dolorido... – Comentou, apontando para os meus pés com uma careta de dor.
- Ah isso.... Enfrentei uma maratona de compras com Alice hoje, ela pagou tudo é claro...
Ele não disfarçou em revirar os olhos.
- Eu imaginei. Só ela gastaria tanto em pedaços de pano que valem mais do que deveriam, imagino que nesse aspecto ninguém pode contraria-la.
- Não foi de tão ruim.... Odeio me sentir em dívida com alguém, mas os saltos foram o pior, foi a primeira coisa que ela fez questão de comprar e me fazer usar a tarde toda, disse que era para treino e eu achei besteira, mas agora eu entendo... sinto que treinei para ir pra guerra.
- Mas ainda assim te fazer sofrer assim... digo olha o estado dos seus pés! – Ele balançou a cabeça inconformado e pegou o par de saltos que eu segurava em minhas mãos, por fim suspirou e se afastou por uns metros, se abaixando de costas para mim.
Um silencio se formou e eu permaneci atônita, depois de uns segundos ele se virou para mim e levantou as sobrancelhas como se dissesse “ você não vem? ”.
- Suba nas minhas costas, eu te levo pra casa.
Nas pontas dos pés andei até ele e analisei seu rosto esperando que ele caísse na risada a qualquer segundo. A visão do seu rosto levantado me fitando atentamente e sua voz tão casual para uma pergunta tão...! Eu nem sei. Meu coração batia rápido, mas meus pés estavam exaustos, me rendi a muitas coisas hoje, a diversão com Alice e ao cansaço do meu corpo. Murmurei pensamentos aleatórios enquanto tentava pensar em uma resposta, e não sei se apenas para disfarçar meu embaraço ou se eu simplesmente me rendi a exaustão, eu rapidamente enlacei meus braços em seu pescoço e me desmanchei nas suas costas, senti seus braços enlaçarem minhas pernas e logo meus pés estavam no ar.
- As compras... – me lembrei depois de alguns passos, que não pareciam pesar nada para ele.
- Não se preocupe. Alguém da minha casa já vai leva-las pra dentro e logo eu devolvo pra você, eu prometo. Oh... eu falei igual a Alice agora, não é?
- Não... você não é igual a ela, eu sinto isso.
Ele não respondeu e acabei por me convencer que ele tinha entendido, meu coração já não batia tão rápido e eu lutava pra não cair no sono, apoiei meu rosto em sua nuca como e tentei sentir seus batimentos através das suas costas, lutei pra não cair no sono e perder aquele calor humano que me fazia esquecer dos problemas mesmo que só por agora, lutei pra continuar a sentir o vento em meus cabelos e enxergar o pôr do sol que brilhava a nossa frente, lutei pra continuar viva e aproveitar as coisas boas da vida, mesmo que por uns minutos.
E no fim, eu acho que Julian também.
{...}
Pov Alice
Larguei minhas compras em qualquer canto do quarto e desci já fraca de fome as escadas para a cozinha, a noite já começava a cair e as luzes ainda nem tinham sido acessas, apalpei o ar e me dirigi a cozinha na pouca luz que sobrava do céu, e apenas quando eu abri a geladeira e sua luz iluminou a cozinha eu notei duas silhuetas negras me fitando assustadoramente atrás de mim, soltei um grito agudo e apalpei as paredes procurando pelo interruptor, e estava prestes a chamar por ajuda quando a voz da minha mãe chamou pelo meu nome e as luzes foram acessas.
- Que merda foi essa?! – Gritei assustada pros meus pais, que pareciam tão perplexos e confusos quanto eu – A gente tem luz em casa! Quem que fica vagando por ai no escuro?! Eu achei que fossem ladrões...!
- E porque você não acendeu a luz também?! – Foi a vez do meu pai gritar furioso – É assim que você reagiria se entrasse um ladrão aqui em casa? Se fosse real você já estaria morta!
- E é isso que você queria, não é? – Questionei a meia voz, tentando o afetar.
Meu pai estava prestes a avançar em mim com sangue nos olhos quando minha mãe, que tinha ficado encolhida no canto, assustada pela gritaria que se pôs entre nós e tentava acalmar meu pai, parecendo tão minúscula e frágil perto do tamanho quase robusto do marido, eu nunca a vi se opor e não sabia como era a relação dos dois, mas ela sempre me parecia tão medíocre quanto parece quando brigamos, pois ela nunca me defende e fica do lado dele, sem lhe dar a razão ou se opor, apenas tentando acalmar a fera dentro dele, não importa o quanto esteja errado.
- Filha por favor não diga coisas assim... – Ela se virou pra mim, ainda com as mãos em meu pai – Seu pai nunca iria querer isso e muito menos eu.
- Então mande ele dizer! Diga Pai! Diz o que você quer de mim.
Qualquer palavra nessa casa virava um caos, éramos todos como uma bomba prestes a explodir.
Ele não respondeu, ele nem parecia mais bravo, mas suas mãos tremiam, se olhar estava distante em algum ponto aleatório,assustado, o rosto incrédulo. O que tinha de errado com ele? Eu tinha finalmente conseguido o assustar? Antes que eu pudesse pensar no que isso significava, e nesse silencio mórbido que se instalou, minha mãe o quebrou limpando a garganta.
- De qualquer jeito não é sobre isso que temos que conversar... é sobre aquilo – Apontou com a cabeça para um papel em cima da bancada, apertei os olhos e li as letrinhas que anunciavam seu conteúdo. O boletim. Senti meu sangue congelar.
Recuperado a compostura de rocha, meu pai se sentou do outro lado da bancada, segurando o papel sem surpresa, o rosto comprimido em desgosto, me sentei a sua frente, encarando apática os números vermelhos e baixos que exibiam a minha estupidez.
Como ele conseguia mudar tão rápido? Ele nunca vai sentir culpa? Nunca vai sentir nada sobre mim? Ele ao menos sente? Ou ele se perdeu na sua atuação eterna?
- Que notas são essas?
- As minhas notas.
- Não se faça de João sem braço! Eu odeio quando você faz isso, você pode até ser burra na escola, mas eu sei que você não é boba, não aqui.
- Você não estava estudando com aquela garota? – Minha mãe questionou.
- Por favor Isabela, você realmente acha que duas garotas de 17 anos vão estudar de verdade? Aquilo foi só enrolação – Ele debochou com uma risada frustrada.
- Você não conhece ela! Não ouse dizer uma palavra sobre ela! – Minha voz já estava alta e logo perderia o controle com meu pai, resolvi tentar com minha mãe – Mãe... quando eu a conheci já estávamos no final do trimestre e as notas já tinham fechado, não tinha como voltar atrás.
- E você achou que milagrosamente iria conseguir todas as notas necessárias pra passar de ano se estudar um pouco? Nem que você estudasse com Einstein iria conseguir o tanto de nota que você precisa! Sua cova esse ano está praticamente cavada.
- E se estiver?! Eu faço de novo ano que vem! Não é como se você se importasse.
- Eu me importo sim! Eu preciso que você faça uma boa faculdade de administração para um dia comandar nossa empresa.
Nem consegui esconder meu sorriso zombeteiro, sua ignorância e expectativa chegavam a ser engraçados e eu não podia deixar de rir, ria da surpresa de ele achar que eu realmente faria isso, e da cara que iria fazer quando eu esmagasse seus sonhos.
- Acho que o Karma chegou pra você, em tempos que a ignorância é uma benção... estou surpresa que você não saiba, você não sabe que eu nunca vou fazer isso? Nunca vou assumir a sua empresa.
Seus olhos baixaram e ele respirou fundo, minha mãe se inclinou preocupada e ele apenas a dispensou com um balançar de cabeça, nenhum dos dois pareciam surpresos.
- Se é assim... então nada mais justo do que eu te proibir de ver ela não?
- O que?
- Você assumir a empresa é importante pra mim, e ela parece ser importante pra você, enquanto você não aceitar a minha proposta não poderá ver ela. É uma troca justa não acha? Não é isso que você quer? Justiça.
- Você não pode...
Seus olhos desafiadores apenas diziam o contrário, analisei seus olhos procurando qualquer sinal de blefe, mas eles apenas zombavam de mim e me desafiavam com a ignorância dos deuses, sem ao menos sentir raiva como se eu não fosse digna dela, sua atitude arrogante era o que mais me irritava e todo o meu choque de suas palavras se foram fervendo meu sangue e acelerando meu coração, eu não aceitaria isso. Bati minhas mãos com força no mármore, ignorando a ardência que começava a se formar nas minhas palmas e levantei com tanta força que a cadeira caiu no chão, um estrondo que parecia ainda maior no silencio daquele grande espaço.
- Você não pode fazer isso! Já não basta ter tirado a Emily de mim... e agora quer tirar a Marina também? Porque você é tão ruim...? Ou você apenas me odeia tanto assim?
Essas palavras sairam da minha boca antes mesmo que eu percebesse, seu nome era maldito nessa casa, mas eu tinha tocado nesse assusto de novo, sem ao menos querer, elas apenas saíram da minha boca, e logo seus olhos perderam a arrogância de antes e deram lugar ao arrependimento doloroso ao olhar pra mim que as vezes nem ele sabia esconder. O problema era que dizem que olhos não mentem, mas eu preferia acreditar que ele nunca estava sendo sincero, não sabia se era doloroso pra ele também, então no final eu era a única que saia machucada. E dessa vez nem minha mãe conseguia interferir, ele não tinha reação para ela o acalmar e ela nunca sabia o que falar para mim, depois do estrago feito e que ninguém sabia consertar eu decidi dar o ponto final.
- É o que eu pensei, então só nos deixe em paz.
E sai.
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