Capitulo 25
Pov Alice
Por todo o caminho até sua casa até o momento que eu toquei a campainha, eu não hesitei nem por um segundo, nem quando uma mulher de olhos gentis atendeu a Marina e a garota que quebrou o coração do seu sobrinho.
Apenas o infeliz instinto de olhar em direção a sua janela me fez questionar tudo.
Seus inconfundíveis olhos escuros me fitavam friamente de uma pequena brecha na janela, no momento em que nossos olhares se encontraram eu senti meu coração pular uma batida. Por medo? Amor? Assim como eu não sabia o que meu coração sentia, eu também não sabia o que seus olhos diziam pela primeira vez.
Vozes chamando meu nome me tiraram do meu transe e com muito esforço consegui tirar meus olhos dos seus.
- Na verdade, estive esperando por vocês pelos últimos dias, por qualquer pessoa que o tirasse daquele quarto – a mulher abriu um pouco mais a porta e nos deu sinal com a mão para entrarmos – suba as escadas, primeira porta a direita.
Entrei na casa e subi os primeiros degraus das escadas, não me dei o trabalho de olhar em volta. Olhei pra trás uma última vez procurando conforto nos olhos da Marina, e mesmo que me diziam boa sorte, pareciam já saber do resultado.
Subo as escadas.
{...}
Três batidas.
Clássico, não mais que o necessário, mesmo que eu quisesse bater naquela porta até minhas mãos caírem, e ao mesmo tempo queria fugir dali pra nunca mais voltar, por vergonha, medo.
- Vai embora. Foi você que me disse pra eu me afastar de você – Sua voz ecoava de longe no quarto.
- Eu falei isso da boca pra fora, além de desconfiar de mim você tem desconfiar dos meus sentimentos também?
- Você vai mesmo se fazer de vítima? Que vergonha Alice. Não faça parecer como se fosse minha culpa! – Ele alertou em alto tom, e eu dei um passo para trás, ele estava cada vez mais perto – Você sabe o que disse, se responsabilize por isso.
- Você está certo, me desculpe – Encostei minha mão na porta e dei mais um passo, estava tão perto que meus lábios quase a encostavam – Vamos conversar.
- Não quero conversar.
Sua voz saiu num sussurro rouco, o suficiente pra que eu pudesse o ouvir, e sentir sua presença solitária grudada do outro lado da porta.
Por Deus! Arranhei a madeira, imaginei sua pele, meus lábios trêmulos encostavam levemente na porta, e eu sabia que os seus também.
- Mas eu quero, e eu sei que você também.
{...}
O tic da porta sendo destrancada me fez me afastar imediatamente e juntei minhas mãos a frente do meu corpo as apertando dolorosamente.
Quando Julian finalmente a abriu, eu grudei meus olhos diretamente aos meus pés e não os movi de lá nem por um segundo enquanto adentrava o quarto, e enquanto a porta era fechada, levantei meu olhar e varri meus olhos pelo quarto. Ao contrário do que imaginei, aquilo estava uma bagunça, um violino jazia encima de uma cama bagunçada, no canto uma lata de lixo estava rodeada de bolinhas de papeis de tentativas fracassadas de acertar naquela cesta, a luz do fim de tarde tentava passar pela cortina escura que bloqueava a janela impiedosamente.
Passeei pelo quarto sem ainda olhar para Julian, em uma escrivaninha uma foto me chamou atenção, um casal com sorrisos brilhantes pousava com um menino em uma praia, imediatamente reconheci Julian um pouco mais jovem, e provavelmente seus pais.
A mãe tinha um par de grandes e escuros olhos, e um longo cabelo que caiam formosamente pelo seu corpo em contraste com sua pele clara, e seu pai brilhava com um pele bronzeada e sinais espalhados por ela, cabelos cacheados e claros, bagunçados propositalmente pela sua cabeça. E mesmo que parecesse tanto como a mãe, Julian carregava o belo sorriso de seu pai, sorriso de criança.
Não tive coragem de a pegar e perguntar. Ele também não disse nada.
Me virei e me dei de cara com Julian a poucos centímetros de mim, seu cabelo molhando fazia cair gotas em seu peito até um certo ponto nu, e senti imediatamente o doce cheiro de lavanda que vinha dele. Lutei contra meus olhos mas eles insistiram em o estudar, e assim como seu pai, alguns sinais salpicavam seu pescoço, seu peito como estrelas no céu. Levantei meu olhar apenas para o bater com seu rosto, com lábios e bochechas vermelhas como a própria maça do pecado, mordi meus lábios em frustação.
Porque ele tinha que estar tão lindo? Por acaso ele tinha saído de uma sauna?
Mas ele continuou se aproximando, um passo seu pra frente e um meu pra trás. Não! Não é assim que vamos resolver as coisas, ele pensa que pode vir com esse cabelo molhado e lábios macios, mas não! Nós vamos conversar.
Seu corpo se desvia do meu e ele senta na cama. O que? Olho pra ele, desnorteada.
- Você estava na minha frente.
Ah.
Sento na cama e olho pro violino.
- Estava escrevendo minha música?
- Sim, estava tentando escrever uma música dizendo coisas ruins sobre você.
- E você conseguiu?
- Sim.
- Acho que não. Então o que são todos aqueles papeis?
- Como eu disse, são músicas prontas sobre coisas ruins sobre você, mas achei que não valeria a pena gastar corda com isso.
Senti meu estomago se revirar, e o pouco que comi hoje ameaçou sair pela minha garganta, mas nada era tão ruim quanto o aperto que martelava meu coração com pregos, pensei que poderia ser apenas isso, para doer tanto. Suas palavras não eram tão ruins quanto a frieza da sua voz, tom que há um tempo ele não me dirigia. Eu tinha até me esquecido quão frio ele poderia ser comigo, eu estava mal-acostumada.
Imaginei o quão ruim estariam seus olhos e não ousei olhar em seus olhos.
- Não tem nada a dizer? Porque diabos você veio aqui?
- Eu... você sabe que eu tenho muito a dizer.
- Você sempre teve muito o que dizer e esse é o seu problema. Você disse muita merda Alice, você sempre disse e sempre fez, você sabe disso. Eu só não quero ver a sua ruina mais uma vez, eu só quero manter você por perto, perto e feliz, mas você sempre dificulta isso, você é alto destrutível.
- Mas você também me diz coisas ruins as vezes.
- Eu sempre estive me protegendo, só isso. Me protegendo de você. Você não faz ideia de quão ruim agia antes de a gente namorar, você piorava tudo o que já estava ruim para mim com suas palavras. Você tem alguma ideia disso? Você não carrega nenhuma culpa? Porque você é uma pessoa difícil de se conviver, você machuca eu e você.
- Eu tenho consciência do que fazia com você, e eu sinto essa culpa, mesmo que você não saiba. O seu problema é que você sempre agiu como se fosse superior a mim, naquele dia você me jogou pedras e pedras de palavras exatamente como eu, e pra você não parecia importar o estado deplorável que eu estava ou a história que qualquer uma de nós duas podíamos contar. Pra você nenhuma história importaria, você nem se propôs a esperar pra me ouvir.
Ele deu uma risadinha cínica.
- Se cada um parasse pra ouvir cada loucura que você faz... você seria ainda mais louca.
- Viu?! Nem agora você está disposto a me ouvir, você nunca esteve! Naquele momento eu queria alguém pra me ouvir e me apoiar depois da merda que eu passei, e você só me julgou, é isso que sempre faz.
- Eu nunca te ouvi? E então o que foi que eu fiz e andei fazendo com você desde que a Emily voltou? Diz pra mim! Eu teria ficado com você pela eternidade se você não tivesse enlouquecido e se mandado. Depois de me mandar se afastar de você de vez. Mas eu não faço isso, você sabe que eu fico, mesmo que machuque, sabe que eu sou louco por você!
Chega, eu não aguentava mais ficar aqui, prefiro perder ele agora do que sofrer o vendo. No fim, essa imagem e essas palavras eram as nossas piores, e talvez as mais verdadeiras sobre nós dois, mesmo que queríamos que fossem mentiras. Me levantei e balbuciei que ia embora, e quando ia dar meu primeiro passo sentir sua mão agarrar meu pulso fortemente, e pela primeira vez desde que entrei, olhei em seus olhos, me gritando silenciosamente pra que ficasse.
- Vai embora assim mesmo? De novo? Vai jogar tudo fora, depois de tudo o que passamos?
Deixei escapar um soluço, ele engoliu em seco, seus olhos estavam marejados.
Dane-se! Deixei o orgulho de lado e me explodi em sentimentos entalados dentro da minha garganta, me sentei na cama e pus suas mãos entre as minhas, as apertando freneticamente.
- Ah dane-se! Você sabe disso, eu sei disso, o que dizemos pode ser uma grande mentira ou uma grande verdade, pode ser os dois, mas também é o que somos, é isso que somo juntos. Julian... me perdoe, o que eu disse era mentira, a mais pura mentira. Porque eu não quero que você se afaste, eu quero você por perto pra sempre, eu gosto tanto de você, eu te...
- Diga.
Ele sussurrou juntando nossas testas e apertou suas mãos contra as minhas, tremulas e suadas como as minhas, sua voz chegou a mim novamente, mas também a ouvi como a minha em meu coração, me dizendo para dizer a verdade de uma vez por todas.
- Se você disser, eu serei seu por toda a eternidade.
- Eu te amo – dissemos em uníssono, a voz dessa vez tão forte quanto nossos sentimentos.
{...}
Como se soubessem, nossos lábios rapidamente se juntaram, macios e doces como nunca, e como se fosse a primeira vez em muito tempo.
As gotas que caiam de seu cabelo escorriam pelo meu rosto até meu pescoço, meus ombros, o contraste entre a fria agua em meu corpo quente me causavam arrepios. Julian me deitou em sua cama, com o corpo encima do meu, igualmente quente, e quando nossos lábios se separaram lamentei. Ali em sua cama, rodeada pelo seu cheiro, pela primeira vez nem seu gosto em minha boca parecia suficiente, em seus olhos o desejo como um espelho refletia o meu.
Entrelaçou nossas mãos um em cada lado do meu corpo e me sorriu maroto.
Seus lábios gentilmente se encarregam de secar as gotas pelo rosto, e depois para o meu pescoço nu o cobrindo de beijos. Hora leves, como se eu fosse a coisa mais frágil do mundo, hora selvagens como se me saboreasse como um doce e me torturasse, e mesmo assim apertava minhas mãos a cada pequeno som que minha boca fazia, como se assim eu o torturasse também.
Em um intervalo entre esses beijos, seus olhos cravaram nos meus me puxando para si como um buraco negro, e mesmo que eu estava sendo puxada pra si naquele momento um uma viagem sem volta, se olhasse bem, ele também estava preso a mim, sabíamos disso.
Ele esboçou um sorriso solene e disse o que nós dois já sabíamos.
- Está perdoada.
{...}
Descemos as escadas de mãos dadas, contei a ele que Marina estava aqui e disposta a fazer as pazes, também contei sobre a carta que deixei no hospital e como encontrei Marina na colina, e que foi ela que me convenceu a vir fazer as pazes com ele.
Conversamos muito e por isso não me surpreendi quando descemos e vimos a porta da frente fechada e vozes vindo da cozinha.
Quando chegamos a cozinha, Marina e a tia de Julian estavam sentadas a mesa, conversando e tomando café, as duas pareciam se dar muito bem, e me perguntei se eu me daria bem com ela também, quando um dia a conhecesse melhor.
Sua tia foi a primeira a nos notar, ela imediatamente se levantou e correu na direção de Julian, o abraçando e passando a mão em seu rosto. Era lindo de se ver a preocupação e o amor que tinham um pelo outro, e mesmo que ela nunca substituiria sua mãe, era aliviador de se ver que ele nunca estaria sozinho nesse mundo, não sem ela.
A medida que ela fazia perguntas ele as respondia serenamente com sussurros baixos, que só ela podia ouvir. No fim, ele segurou o rosto da tia entre as mãos e disse que eles tinham que conversar depois, com uma convicção e uma paz nos olhos impressionantes. Sua tia sorriu aliviada e se afastou, muito mais leve.
Marina já tinha se levantado e se aproximava dele relutantemente, me afastei e sua tia ficou ao meu lado. Os dois se encararam por um tempo sem dizer uma palavra, a tensão era quase palpável e segurei a respiração por todo esse tempo, mas com apenas um gesto Julian dissipou toda a tensão, em um ato imprevisível ele a puxou para um abraço, e surpresa ela contribuiu e começou a falar.
- Me desculpe. Eu não deveria ter surtado daquele jeito, olhando agora eu não acho que fiquei com ciúmes de você, eu só queria que vocês tivessem me contado, apesar do que aconteceu entre nós dois, nos três ainda somos melhores amigos.
- Tudo bem, nós também erramos, devíamos ter te contado, mas estávamos com medo da sua reação.
Quando eles se separaram começaram a rir, gargalhar e mesmo sem o porquê eu me aproximei e já estava rindo junto, talvez riamos de alivio, como se finalmente pudéssemos respirar desses dias solitários que pareceram anos, martelando em nossas cabeças que...
- Achei que estava tudo acabado.
Pensei alto e os dois olharam pra mim, surpresos por eu dizer o que pensaram por todos esses dias.
O sorriso da Marina foi aos poucos sumindo, olhamos atentamente pra ela, que agora estava branca como papel, seus olhos arregalados penetraram nos meus e mostravam o puro medo.
- Alice, a alguns dias atrás eu corri pro parque tarde da noite porque achava que você poderia estar lá, mas quem estava lá era Emily. Nós conversamos sobre como te conhecemos e sobre como ela se sentia sobre você..., mas isso não importa agora, antes de ir embora ela me disse algo muito estranho, me disse que assim como você estava cansada de tudo aquilo, ela me disse que... que está pensando em acabar com tudo.
O timing foi perfeito.
O barulho da sirene de várias viaturas e de uma ambulância passou correndo pela rua, abrimos a porta correndo e observamos os veículos avançaram em direção ao centro da cidade.
Tudo estava dito e tudo foi ouvido. Nós olhamos e não havia mais dúvida sobre o que ela iria fazer e agora, eu tinha que impedir isso.
{...}
Corremos pelos corredores, mas dessa vez as pessoas pareciam saber o porquê. Apesar do que estava acontecendo lá em cima, os médicos continuavam a fazer o seu trabalho e muitos pacientes e visitantes nos seguiam em direção ao terraço.
Já no corredor do terraço as pessoas se aglomeravam mais e mais até porta, abrimos espaços entre as pessoas com as mãos, sem se dar o trabalho de pedir licença ou se desculpar. Quando estávamos chegando perto da porta do seu único quarto reconheci pela pequena brecha figuras bem conhecidas, apertei os olhos, alguns objetos estavam espalhados pelo quarto e principalmente os pais da Marina, que ajuntavam os pertences e tentavam ao máximo ignorar o formigueiro de gente em frente ao quarto.
Mas o que mais me perturbava era o fato de não ter mais um corpo em coma deitado na cama, o corpo da mãe da Emily.
Procurei desesperadamente Marina pela multidão de gente e quando finalmente achei a puxei violentamente pelo braço, a prensando pela parede.
- Porque seus pais estão naquele quarto Marina? O que aconteceu com a pessoa que estava lá antes? – Quase tive que gritar pra ela me ouvir, eu estava arfando e prestes a chorar, sua expressão confusa apenas me irritava mais e depois de gaguejar um pouco ela finalmente me respondeu como se eu fosse idiota.
- Meu irmão ficou quatro dias internado lá antes de fazer a cirurgia Alice. Porque? E que pessoa?
Não respondi suas perguntas, as peças estavam lentamente se juntando em minha cabeça, e mesmo sem a certeza agora eu podia tentar faze-la mudar de ideia.
Sua mãe estava morta. Estava finalmente, morta.
Abri caminho em direção a porta, dessa vez empurrando pessoas e pisando em pés, ouvi xingamentos a mim as minhas costas, e quando fui barrada pelos policias a porta assim como todas as outras pessoas, eu expliquei toda a situação e disse que poderia salva-la, e acho que eu parecia tão certa disso, que me deixaram entrar. No segundo que eu passei eu a vi, e estava pronta pra gritar seu nome, mas seu olhar me chamou atenção, ele não estava dirigido a mim e sim ao um canto isolado daquele imenso terraço, segui seu olhar e no momento que eu a vi, senti meu coração gelar, tinha finalmente entendido tudo.
Como a dama de branco, sua mãe estava lá, e como em coma, seu vestido branco e seu cabelo negro voava ao vento e chicoteava seu rosto, seus lábios sorriam serenamente, quase como quando sorriam em coma, era assuatador.. Á única diferença era que seus olhos, seus olhos agora pareciam vivos como nunca.
Senti calafrios.
Como pode estar tão plena vendo sua filha prestes a se matar? Porque parecia tão viva? Porque parecia tão...
Feliz.
{...}
Era a minha chance, ela ainda não tinha me visto e nenhum dos médicos que tentavam miseravelmente a convencer de descer também não. Olhei em volta, um canto vazio me chamou atenção, dele eu iria conseguir subir no muro e andar até ela, eu chamaria a atenção deles, e ainda mais a dela.
Eu vou subir.
Nas portas dos andei o mais rápido possível até o muro, tentei controlar o tremor das minhas pernas antes de subir, eu não poderia cair dali antes dela. Apoiei uma mão ao muro, pus um dos meus pés e dei impulso, pronto, eu já estava em cima.
Mesmo que sempre dizem pra que não, eu olhei pra baixo, muitos pacientes e pessoas que apenas passavam por ali pareciam como formiguinhas olhando pra cima, apenas esperando para que o show aconteça e em seu Grand Finale, um corpo se amasse ao chão.
Me levantei e estiquei os braços para equilibrar meu corpo, comecei a andar, eu conseguia ver seus pés a alguns metros de mim, tão longe... foquei apenas nos meus, um passo de cada vez e aos poucos um pouco mais rápido. Quando comecei a ouvir as exclamações de surpresa dos grupos que nos assistiam e o desespero que quem já tentavam salvar Emily, ignorei os mais ainda, junto com as lagrimas que queriam se formar, o grito preso em minha garganta, as batidas frenéticas em meu coração e a pergunta se no fundo, tudo isso valia mesmo a pena.
Um passo em falso e eu estava morta.
Olho em frente e me deparo com seu rosto e pela segunda vez, era como se eu estivesse encontrando com ela pela primeira vez, dessa vez seus olhos finalmente pareciam, desde crianças, um pouco mais... humanos.
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