Capítulo 86: POV May Singer
Uma mão deslizou pela minha cintura, me abraçando, e eu sorri sem nem abrir os olhos. Senti a respiração de Ethan na minha nuca e o conforto da cama do castelo, me acordando de leve. Respirei fundo, tentando sentir o cheiro do perfume dele, enquanto ele me dava pequenos beijos na nuca, brincando com os meus sentidos.
"Bom dia," ele disse baixinho, me dando um certo arrepio.
"Bom dia," eu respondi, me virando para ele.
Seus olhos tinham um ar sonolento que o deixava irresistível. Eu me mexi um pouco, tentando me encaixar melhor em seu peito, e ele me abraçou mais forte. Apoiei minha testa nele, sentindo a batida de seu coração, forte e estável.
"Eu queria não ter que levantar," falei, tentando bloquear a lista de coisas para fazer que aparecia em minha cabeça.
"Eu sei," ele disse, e eu senti as vibrações da sua voz em seu pescoço. "Mas não tem outro jeito, May, sua irmã precisa de você," ele me deu um beijo na testa e me soltou, começando a se levantar.
Eu fiquei ali, jogada na cama gelada, já sentindo falta do seu toque. Assisti enquanto ele colocava sua calça e arrumava o cabelo, olhando para mim de vez em quando pelo espelho.
"Quer que eu avise a Rainha que você não está se sentindo bem?" Ele perguntou, se virando para mim.
"Para ela ter um ataque cardíaco?" Eu me virei na cama até estar mirando o teto.
Ouvi seu riso de leve e quando ele foi até o banheiro. Eu realmente não queria ter que me levantar, eu não queria ter que encarar o mundo. Seria tão perfeito se eu pudesse simplesmente ter a minha irmã, a festa, minha família, sem ter que me preocupar por um segundo com o trabalho.
Mas não dava e eu sabia disso. Eu tirei a minha coberta de cima de mim, como o primeiro passo para levantar. Um vento frio bateu em mim e eu senti um impulso enorme de me enterrar de volta embaixo dela. Mas eu estava tentando me deixar desconfortável para que a ideia de levantar parecesse cada vez menos pior.
Deixei minha cabeça cair para o lado, me perguntando se eu poderia dormir mais alguns cinco minutinhos. Seria tão terrível esquecer dos problemas só por cinco minutos? Mas eu conseguiria dormir só esse pouquinho? E se eu dormisse mais uns trinta? O mundo não ia acabar se eu simplesmente perdesse meia hora de um dia, não é? E eu poderia me arrumar mais rápido, gastar menos tempo no café da manhã, qualquer coisa dessas. Eu poderia tirar um pouco de tempo de uma atividade para ganhar mais alguns minutos na cama.
Estava prestes a me convencer de que aquela era uma boa ideia, quando percebi que eu estava ficando cada vez mais alerta depois de pensar tanto. Agora já não tinha porque eu continuar deitada, dava na mesma me levantar ou não.
Então foi isso que eu fiz. Mas ao chegar perto da roupa que eu tinha separado para usar naquele dia, eu me senti ainda arrastando meu pé. Eu precisava animar, precisava de energia. E sabia bem como conseguir isso.
Fui até a minha estante, já antecipando o que eu estava prestes a fazer. Com o CD na mão, fui até o rádio em cima da mesa e coloquei para tocar na música mais animada de todas. Girei o volume até não dar para aumentar mais, e a música foi começando de leve e animando e tomando conta do quarto.
Eu comecei a dançar do jeito que dava, dando soquinhos no ar, mexendo meus ombros, sentindo a energia que aquela música me trazia. Eu estava quase pulando, quando me virei para a porta do banheiro e Ethan saiu de lá, secando sua nuca com a toalha de rosto. Ele balançava a cabeça, me reprimindo.
"Quê?" Perguntei, dando outros soquinhos no ar, dessa vez mais exagerados, só para a diversão dele mesmo.
Aquela não era a primeira vez que eu fazia isso. Pelo contrário, música era praticamente o meu jeito de conseguir viver. Eu não tinha o menor jeito para tocá-la, mas não conseguiria viver sem ela. E ajudava ter os contatos que eu tinha.
Ethan foi até a cadeira onde estavam as nossas roupas, pegou sua camisa e começou a colocá-la, abotoando cada um dos botões, enquanto eu continuava a dançar. Ele ria, balançava a cabeça de vez em quando, mas nunca se deixava levar. E eu queria tanto que ele me acompanhasse!
Fui saltitando no ritmo até ele e o peguei pelas mãos bem na hora que ele estava começando a dar o nó na sua gravata. A música acabou e a próxima começava ainda mais calma. Mas a letra era ótima, meio romântica. Então eu o puxei comigo para a parte mais aberta do quarto e tentei fazê-lo dançar. Ele não se entregou de primeira, me deixando mexer seus braços sem dançar de volta. Mas aí chegou o refrão e ele finalmente se deixou levar, dançando sozinho do pior jeito que ele podia imaginar.
Eu ri do jeito que ele se mexia sem ritmo, mas ainda assim fazia uma cara de convencido, como se estivesse arrasando. Voltei a dançar em volta dele, colocando minhas mãos na sua cintura, enquanto ele olhava para os lados, como se tivesse uma plateia ali.
Ele baixou os olhos para mim depois de um tempo, apoiando seus braços nos meus ombros, dessa vez acompanhando o ritmo que eu fazia.
"Eu te amo, sabia?" Eu disse, olhando para ele.
Ele sorriu com aquilo, um sorriso largo e fácil, e me deu um beijo rápido. "Sabia," ele disse.
E eu sabia que aquele era o jeito dele de me dizer que me amava de volta. Era tão difícil fazê-lo falar! Mas aquela era parte da graça, pois quando ele falava, eu sabia que era porque ele não se aguentava. Como no dia do nosso casamento.
Eu deixei ele se voltar para a sua gravata e lhe dei um beijo no rosto antes de ir para o banheiro.
Já era quase meio-dia quando eu saí do meu quarto. Eu tinha passado a manhã toda desenhando sem parar a nova coleção e ainda estava muito atrasada. Eu não estava completamente certa da cartela de cores e sem a cartela, eu não sabia bem para onde ir com as formas. Eu tinha me concentrado na silhueta, tentando criar coisas novas, pelas quais a Singer Revolution tinha ficado famosa. Mas Ethan achava que nós deveríamos nos manter mais comerciais. Era legal ter ficado famosa pela minha criatividade, mas no final do dia, eu ainda precisava vender. Sim, nós ainda precisávamos vender. E eu precisava desenhar coisas mais comerciais.
Mas não era fácil. Ou eu me deixava levar pelo que me viesse à cabeça, ou eu mantinha o pé no chão. E aquela estava sendo a coleção mais difícil do mundo para desenhar! Eu estava tentando usar o castelo como referência, aproveitando essa loucura de Seleção que tinha se instalado sobre Illeá. Mas a verdade era que eu não sabia fazer vestidos muito bem. Eu era louca demais, gostava de camadas, mil camadas, uma em cima da outra, deixando o look completamente inesperado. Enquanto que as meninas, até mesmo as nossas consumidoras, elas queriam se sentir princesas. Mesmo sem terem entrado na Seleção, elas ainda queriam se sentir parte da realeza. E era bem isso que elas procuravam na loja da irmã da rainha, mesmo que não fosse isso que eu quisesse vender.
Depois de me contentar com dois desenhos aceitáveis que talvez pudessem virar realidade, eu larguei minhas coisas e saí do nosso quarto. Eu mal tinha visto minha irmã no dia anterior e eu estava pensando que um pouco de chá e alguns cupcakes não seriam um jeito ruim de passar uma conversa com ela. Além do mais, eu podia jurar que Gerad tinha dito que viria hoje de manhã com sua namorada e eu ainda estava louca para conhecê-la.
Pelo que ele tinha me contado em algumas cartas, ela era modelo. Eu ri quando eu li. Um jogador de futebol namorando uma modelo, dava para ficar mais cliché? Eu não entendia porque essas duas profissões se atraíam, de verdade! Mas achei melhor não falar nada para ele. Qualquer problema que eu tivesse com ela só o faria gostar ainda mais dela, eu tinha certeza.
Eu a tinha buscado na internet, Caresa Deponte, e descobri porque ele estava com ela. Ela era linda, morena e sorridente. Magrela, como modelos, mas encorpada. Ela gostava da fama, sorrindo para tudo que era câmera que apontava na sua direção. Dava para encontrar várias fotos dela com seu braço em volta de Gerad, exibindo-o como um troféu. Ele era mesmo bem mais famoso do que ela, apesar de ela parecer esquecer disso.
Eu não dei muita bola para ela quando ele me disse que eles estavam namorando, pensei que seria só mais uma na sua longa lista de conquistas. Mas já fazia seis meses que eles estavam juntos e isso era um recorde! Ela nem era tão boa modelo, mas agora estava em todos os lugares. Eu conseguia achar um defeito em todas as suas fotos, mas ser namorada de meu irmão estava mantendo-a no topo. E agora eu estava louca para conhecê-la e ver se ela merecia aquela atenção, se ela o merecia.
Sem contar que ela queria porque queria fazer parte do meu próximo desfile, mas eu precisava ter certeza de que ela era sincera antes de contratá-la. A última coisa que eu queria era fazer um favor para ela sem saber que tipo de pessoa ela era.
Andei pelos corredores feliz, ouvindo de longe algumas conversas, cumprimentando as criadas e os guardas que passavam por mim. Eu gostava de estar ali. Tudo me inspirava, tudo me dava vontade de começar a desenhar, começar a criar. Pena que quando eu chegava na frente do papel, eu só me lembrava das outras marcas, tomando conta do mercado, e a pressão do fracasso me afetava.
Estava descendo para o primeiro andar, quando vi das escadas uma mulher que parecia a Meri. Fui chegando mais perto e reconhecendo ela, que falava com Mary e uma outra criada. Era engraçado vê-la assim, como rainha. Me lembrei do casamento dela, da sua coroação. Ela estava tão insegura, sem perceber que ela tinha sido feita para aquilo. Ela achava que nunca conseguiria ficar no lugar de Amberly, que não era nem metade do que ela tinha sido. Ela não via que ela era bem mais, que não existia um coração maior no mundo.
Illeá tinha mudado tanto durante o reinado dos dois e parecia que todos sabiam que isso aconteceria naquele dia. Todos seguraram sua respiração quando o bispo colocou a coroa na cabeça dela, que estava ajoelhada à sua frente. Ele não se apressou, nos deixou ansiosos enquanto a coroava devagar. Ela tinha seus olhos fechados embaixo dele, enquanto eu a imaginava se perguntando pela milionésima vez se ela estava pronta para aquilo, se ela era boa o suficiente.
E agora ela estava ali, com a pose de rainha, elegante e leve, calma e linda. Soberana, mas generosa. A coroa lhe caia muito bem, mas ela ainda assim não se via como nós a víamos. Até aquele dia ela se perguntava se estava sendo o melhor que podia, se tinha mais alguma coisa que ela podia fazer. E eu entendia que era bem aquilo mesmo que fazia dela incrível.
"Olá," eu disse, quase cantando, quando desci o último degrau da escada.
Ela se virou para mim já sorrindo e veio me abraçar forte.
"MAY!" Ela disse no meu ombro. "Ah, achei que você ainda estava dormindo!"
"São onze da manhã," eu me afastei um pouco dela para olhá-la.
"Verdade, esse é o horário em que você vai dormir," ela disse, brincando.
"Ei, criatividade acontece em horários esquisitos, okay?" Me defendi e ela sorriu.
"Estava com saudades," disse, me observando. "Estou tão feliz de você estar aqui!"
"É, desculpa ter demorado," eu falei, enquanto nós duas começávamos a andar pelo corredor, deixando Mary e a outra criada para trás. "Ethan tinha negócios para fazer em Paris e eu achei que mais um dia olhando o Sena ia me ajudar a ter ideias para a Primavera-Verão."
"Alguma sorte?" Perguntou, entrelaçando seu braço no meu.
"Nenhuma," confessei, desanimada.
Nós ficamos em silêncio um pouco, até que ela soltou uma risada baixinho.
"Que foi?" Perguntei ofendida, parando de andar e me virando para ela.
"Nada," ela disse, pegando no meu braço e me forçando a continuar. "É só esquisito pensar em você como uma mulher casada! Sra. Whitten," ela soltou outra risada. "Desculpa, de verdade, mas eu nunca imaginaria que você fosse se casar!"
"Ah, é tão esquisito assim pensar que alguém gostaria de passar o resto da vida comigo?" Perguntei, fingindo que estava incomodada.
"Não, pelo contrário," ela disse. "É difícil pensar que você conseguiria escolher um dos seus vários pretendentes."
"Na verdade, foi bem fácil," eu falei, lembrando do dia que tinha entrado no escritório de Ethan para lhe pedir um emprego.
"Sei o que quer dizer," ela disse e nós viramos o corredor. "Agora só falta vocês me darem alguns sobrinhos. Quando é que-"
Sua voz desapareceu e eu me virei para olhá-la, tentando entender o que a tinha feito parar de falar. Ela olhava para a sua esquerda, para um outro corredor, onde uma menina estava deitada no chão, no colo de um guarda.
Meri se soltou de mim e correu até ela, eu fui atrás. Ela perguntou para um guarda no caminho o que tinha acontecido e ele explicou que Gerad tinha esbarrado nela e que ela tinha batido a cabeça no chão. Foi quando eu reconheci as pessoas no corredor. Gerad, vestido em seu terno ajudado. Do lado dele, sua namorada morena, com uma expressão assustada no rosto que eu não tinha visto em nenhuma de suas fotos. E Ridley, um dos guardas favoritos dos príncipes com a menina no colo.
"Quem é essa?" Eu perguntei, bem na hora em que Caresa gritava com Gerad que ele era desastrado demais.
"Não sei," ele disse, se virando para ela com um olhar muito preocupado no rosto.
Ele nos avistou chegando até ele e foi direto para a nossa irmã.
"Meri, não foi a minha intenção," ele disse, mas Meri levou uma mão ao seu ombro, o consolando.
"Eu sei, não se preocupe, eu só preciso ter certeza de que ela está bem," ela falou, deixando-o para trás e indo até Ridley, que a levantava no ar.
Eles seguiram para o outro lado do corredor com pressa, provavelmente levando-a até a ala hospitalar. Gerad esfregou a testa, preocupado, e eu achei que aquela era a hora perfeita para tirar sarro dele.
"Já chegou abalando, hein, Gerad?" Falei, lhe dando uma empurradinha para descontraí-lo.
"Valeu, May, de verdade," ele disse, sarcástico.
"Ah, você que é a May," Caresa falou, vindo até mim. "Eu sou sua MAIOR fã, você não tem ideia! Desfilar para você é um sonho que eu tenho desde que eu tinha onze anos!"
Então não devia fazer muito tempo, pensei, mas logo me reprimi. Eu não queria julgá-la, não queria odiá-la só por ciúmes do meu irmão. Eu gostaria dessa. Eu tinha que pensar que ela era legal. Pelo menos até que ela me provasse o contrário.
"Que legal," eu disse, no meu melhor estilo simpático.
"Eu vou ver se ela está bem," Gerad nos interrompeu, ainda parecendo super incomodado com o incidente.
Antes mesmo que eu pudesse implorá-lo para levar sua namorada com ele, ele saiu correndo pelo corredor.
Valeu, pensei. Agora eu tinha que conversar com ela de verdade.
"Eu já trabalhei para várias grifes, tenho bastante experiência," ela continuou, sem perceber que eu já estava planejando minha fuga.
"Eu já tenho minhas modelos prontas," eu disse, tentando cortar o assunto.
"Para a próxima coleção?"
"É," falei e lhe sorri, triste. "Desculpa. Mas eu prometo entrar em contato com você quando começar a procurar o rosto da nossa próxima campanha."
"Ah, eu prefiro mesmo campanha!" Ela disse, animando. "Eu adoraria ser o rosto da sua marca, sério. Eu acho que tem tudo a ver. Assim, eu namoro seu irmão, quem melhor para representar a Singer Revolution? E eu adoro cantar, o que tem tudo a ver com a sua marca..."
Nós começamos a andar pelo castelo e eu ouvi uma menina rindo. Me virei para ela, que tocava um violão com cuidado, enquanto ria alto de alguma coisa. Sua amiga a acompanhava, com a mão na barriga, como se tivesse acabado de ouvir a coisa mais engraçada do mundo.
Senti um impulso de ir até elas e perguntar o que era tão engraçado. Eu queria estar ali, me divertindo, ao invés de estar ouvindo a Caresa me falar sobre como ela era boa modelo e como ela tinha tudo a ver com a minha marca.
As meninas continuaram rindo e Caresa e eu continuamos andando, deixando-as para trás. E eu fiquei me perguntando porque o meu irmão não podia gostar de uma menina assim, legal e feliz. Por que ele tinha que escolher as mais sem graça? Por que ele sempre preferia as mais superficiais?
"E eu não me importo de posar nua, contanto que seja artístico," Caresa completou o que dizia, e eu percebi que tinha parado de ouvir há muito tempo.
"Oi?" Perguntei, só para ter certeza de que não estava ouvindo coisas.
"Eu não me importo em mostrar o corpo," repetiu, "sabe, de um jeito artístico."
Eu concordei com a cabeça e ela sorriu. Mas o que eu estava pensando era que eu não iria querer vê-la mostrando o corpo nunca na minha vida. Artístico ou não, eu não ia deixar a minha marca se rebaixar desse jeito.
"Ai meu deus," falei do nada, "esqueci de falar com Meri sobre a fantasia dela! Eu preciso encontrá-la," comecei a andar de volta pelo caminho que nós tínhamos feito, já pensando em como eu ia me apresentar para as meninas que tinham estado naquela sala de estar alguns metros atrás.
"Ah, ótimo," Caresa disse, me alcançando. Ela passou o braço por dentro do meu, como Meri tinha feito e eu me perguntei porque ela achava que tínhamos essa intimidade. "É melhor mesmo eu ir ver como Ge está."
Ge, repeti na minha cabeça, sentindo um calafrio. Tinha alguma coisa naquele jeito dela que me incomodava demais. Era quase como se eu pudesse sentir o cheiro da sua falsidade.
Seja legal, May, eu falei para mim mesma na minha cabeça, enquanto nós andávamos até a ala hospitalar. Seja legal e pense rápido em outro jeito de se livrar dela.
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