Capítulo 74: POV Sebastian Regen

Não sei que horas eram, mas já era praticamente de manhã quando acordei com um barulho esquisito. Tentei abrir os olhos, mas a luz do sol me cegou. Só consegui ver quando Nina fechou a porta atrás dela, o quarto já bem mais escuro.

Meu corpo estava todo dolorido, e eu estava encolhido no pé da cama. Me estiquei para deitar direito e olhei para o teto. As estrelinhas de plástico já não brilhavam mais, não na claridade da manhã que passava pelas cortinas. Comecei a pensar no que tinha acontecido no dia anterior, mas acabei dormindo rápido. Vi Nina voltando para o quarto e deitando do meu lado, se encaixando nos meus braços. Mas depois senti como se estivesse caindo, o que me fez abrir os olhos em pânico e perceber que tinha estado sonhando. Tinha parecido tão real, que eu tive que presumir que tinha sido uma mistura de sonho com desejo.

Me virei para o outro lado, tentando esquecer do sentimento que tinha ficado em mim por ter acordado logo antes de adormecer de verdade, que era bem incômodo.

Quando o despertador tocou, eram nove da manhã. Eu estava esperando acordar antes, porque tinha marcado de sairmos logo às dez. O alarme era mais como uma certeza de que não dormiria demais, mas eu esperava acordar naturalmente antes. Ainda mais que eu não era de dormir muito, não conseguia relaxar o suficiente para apagar por horas. Quatro horas costumava já ser o suficiente para mim.

Mas, aparentemente, aquela festa dos irmãos da Nina tinha me cansado bem, pois eu acordei às nove ainda exausto, precisando dormir bem mais. E por um segundo, eu quase me convenci a ficar ali, mandar todo o resto à merda e continuar apagado até meu corpo dizer chega. Mas todos os brinquedos à minha volta só me lembravam que aquela cama não me pertencia e eu não tinha direito de ficar lá.

Então me levantei e me troquei o mais rápido que podia. Depois peguei meu telefone para ligar para Woodwork e avisar que podiam ir preparando o helicóptero, mas acabei avistando dentro do armário dos meninos que eles tinham skates. Pensei um pouco sobre aquilo, considerei várias opções e acabei decidindo que passar mais algumas horas em Kent não seria tão ruim. Então a ligação para Woodwork foi mais um pedido para ele arrumar algum jeito de nós ficarmos mais um pouco e termos acesso a alguma praça boa para andar de skate.

Eu sabia que ele não me questionaria, então aproveitei e pedi para eles arrumarem um carro para nós voltarmos pela estrada. Eu já estava cansado demais fisicamente, não queria nem pensar em ter que voar de novo.

Com tudo acertado, eu saí do quarto. Quando estava passando pela porta, ouvi os meninos no jardim gritando um com o outro, depois ouvi alguém pulando na piscina. Só de lembrar da festa deles, já me fez sorrir de novo.

Eu não era de ouvir atrás da porta, juro que não. Pelo contrário, nem gostava de me colocar nessa posição. Mas quando estava passando pela porta do quarto do pai de Nina, ouvi a voz dela. Se fosse só isso, eu teria continuado meu caminho. Mas quando percebi do que eles estavam falando, tive que tentar ouvir um pouco mais.

"Eu só estou falando que você precisa tomar cuidado com ele," seu pai disse, parecendo já impaciente.

"Mas eu não preciso, pai!" Ela rebateu, um pouco alto demais.

"O fato de você pensar que não precisa é uma das grandes razões porque você deveria tomar cuidado," ele disse. "Você não vê, não é? Não, eu entendo. Você está mesmo muito perto para perceber! Mas acredite no que eu estou falando, isso não é normal, Nina."

"Como assim, não é normal?" Ela perguntou, bufando de leve.

"Não é normal o irmão do príncipe da seleção vir com uma selecionada na casa dela para passar uma noite. Não é normal ele ir atrás de conseguir trazê-la para ver os irmãos. Não é normal o jeito que ele olha para você, Nina. Só você não vê isso."

"Ele não olha de jeito nenhum para mim," ela disse, e eu pensei que eu sabia bem do que o pai dela estava falando.

E eu já nem tentava disfarçar tanto. Eu só queria que ela soubesse o que eu estava pensando sem eu ter que pensar, sem eu nem ter que admitir direito para mim mesmo. Me salvaria um trabalhão se ele percebesse o que eu queria sem eu ter que me expor e pedir.

"Você pode negar como quiser, filha, pelo tempo que quiser," o pai dela continuou. "Eu só não quero que você se machuque."

"Por que eu iria me machucar?" Ela perguntou, inconformada.

Até do outro lado da porta, eu podia ouvir que ela estava se emburrando com aquela conversa, provavelmente já revirando os olhos naquele momento.

"Não sei, Nina. Só estou falando para você não cair nessa conversa dele. Você sabe como ele é," seu pai falou, me fazendo querer entrar ali e me defender.

Mas é claro que eu não faria isso, né?

"Não estou falando que não gostei de conhecê-lo, pelo contrário," seu pai continuou. "Ele me surpreendeu, de verdade. Estava esperando que fosse muito mais fútil. Longe disso, ele consegue manter uma conversa bem mais do que a maioria dos rapazes hoje em dia. Fiquei impressionado com a sua inteligência, mesmo. Até com o seu caráter. Não quero desmerecê-lo por isso, de verdade. Estou só falando que ele não é bom o suficiente para a minha filha."

Nina bufou alto, enquanto eu a imaginava de braços cruzados, irritada. Só a imagem já me fez sorrir sozinho.

"Você está louco, pai," falou.

"Talvez," ele disse, "talvez eu esteja mesmo. Mas eu sei bem como ele trata as mulheres e eu não quero ver você nessa posição."

"Não existe a menor possibilidade de eu estar nessa posição," ela disse, de repente bem alto. "Você está mesmo louco, porque eu ainda quero Charles. Eu estou lá por ele, você lembra disso? Sebastian só é um amigo."

Outch, pensei, sentindo um nó na garganta.

"Vai tentando se convencer disso se você quiser, filha, mas eu também vejo o jeito que você olha para ele," seu pai disse, me fazendo sorrir que nem um idiota.

A pessoa que a conhecia melhor no mundo inteiro achava que ela me olhava de um jeito especial? Cara, como eu era idiota de ficar nervoso, com o coração batendo rápido só de pensar naquela possibilidade. Ainda mais depois de ela ter falado que eu era só um amigo.

"Você está imaginando coisas, pai," ela falou, ainda alto. "Não tem com o que se preocupar, pode deixar que minha cabeça está bem no lugar. Agora eu preciso ir me arrumar que nós vamos embora daqui a pouco."

Entrei em pânico pensando que ela estava indo até a porta, então andei o mais rápido possível até a sala. Mas eles ainda demoraram uns cinco minutos para saírem do quarto dele, minutos que eu passei tentando achar a melhor posição possível para mostrar que tinha estado ali por horas, completamente ignorante à conversa que eles tinham tido.

Não que eu tivesse achado tal posição. Pelo contrário, toda vez que eu mudava a perna de lugar, ou olhava para outro lado, só me sentia mis desconfortável, mais estudado.

"Bom dia," Nina disse, toda alegre quando me viu.

"Bom dia," falei, me levantando e desistindo de tentar parecer indiferente.

"Já tomou café?" Perguntou, indo até a mesa e eu fui com ela.

"Não, ainda não."

"Ah," ela mexeu em algumas coisas, meio sem saber direito o que estava fazendo. "Você quer comer o quê?" Perguntou, me olhando meio inconsolável.

Foi quando eu percebi que ela estava desconfortável porque logo eu estava na casa dela, pronto para tomar um café humilde em sua mesa pequena. Eu esperava que ela já não me visse mais assim.

"Eu me viro," falei e me sentei na primeira cadeira que vi.

Ela pareceu surpresa, mas logo se virou e foi até o seu pai, que lia o jornal em cima da bancada da cozinha. Ela pegou a caixa de sucrilhos do lado dele e voltou para a mesa.

"Nós temos que sair daqui a pouco?" Perguntou, enquanto afogava cada rosquinha colorida em leite.

"Estava pensando em passar mais um tempo aqui," eu disse, bem na hora que seu pai estava chegando até a mesa.

Os dois trocaram um olhar, mas ela parecia querer evitá-lo. E eu sabia bem porquê.

"Eu vi que seus irmãos andam de skate," falei, tentando me explicar antes que o pai dela a reprimisse mais.

"Eles não andam," ele falou, um pouco sério demais.

"Mas eles tentam," Nina explicou. "Sempre quiseram aprender, mas estão tendo que tentar sozinhos, então ainda não tiveram muito sucesso."

Aquilo era ainda melhor.

"Eu adoraria ensiná-los," disse, levando uma mão à barriga em humildade. "Eu adoro ensinar as pessoas."

"Eles vão ficar loucos," ela falou, rindo.

E eles ficaram. Depois do café, ela contou para eles e eles não conseguiam se conter! Corriam de um lado para o outro da casa, pulando em tudo que dava. Aí resolveram ir pegar os skates e tentaram andar pela sala, mas eles eram realmente ruins. Não conseguiam nem ficar de pé direito. E quando um tentava ajudar o outro, as coisas só pioravam.

Até umas duas da tarde, consegui ensiná-los a ficar em pé e a remar. Também consegui fazê-los descer uma rampa boa sem entrar em pânico com a velocidade que pegavam. Era melhor uma rampa pequena, que tivesse uma inclinação que os ajudasse a se movimentar, do que uma muito grande. Mas a única que tinha lá já era inclinada o suficiente para eles se assustarem no começo.

Quando estávamos indo embora da casa dela naquela tarde, era nas minhas pernas que eles estavam agarrados e não nas de Nina. Eles falavam que não queriam por nada que eu fosse embora, que queriam que eu morasse ali. Ou que pelo menos voltasse no dia seguinte. Nina fingiu que estava ofendida que eles me preferiam do que a ela, o que fez os dois saírem correndo para abraçá-la, tentando mostrar que não era assim.

Já o pai dela só apertou a minha mão e me disse que tinha sido um prazer me conhecer. Eu quase falei que ele não precisava se preocupar, que eu só tinha as melhores das intenções com a filha dele, mas não consegui. Quando Nina foi para o carro e só ficamos nós e Ridley, pensei em falar. As palavras estavam na minha garganta e eu queria muito simplesmente colocá-las para fora. Mas não consegui. Deixei o momento passar e tive que ir embora antes de ter outra chance.

A viagem foi muito melhor do que a ida. Só de eu não ter que olhar pela janela e ver que qualquer caída nossa me transformaria em pó já era uma grande vantagem. Mas eu também pude dormir, apoiando a cabeça na janela, o que a fez bem mais curta. Quando chegamos no carro, até perguntei para Nina se ela não preferia ir de helicóptero, eu poderia muito bem ir pela estrada sozinho. Mas ela disse que não, até insistiu. Disse que era o mínimo que ela podia fazer depois de eu ter demonstrado tanta bondade só em trazê-la para ver sua família. Até chegou a falar que seria egoísta da parte dela não conseguir passar algumas horas a mais indo até o castelo depois de tantas horas de felicidade que ela tinha passado naquele final de semana.

Juro que o jeito que ela sorriu naquela hora me fez querer muito agarrá-la. Eu tive que praticamente me segurar para não a abraçar. Mas eu tinha tanto medo de ela simplesmente me empurrar e me chamar de louco, que preferi não tentar nada.

Se o pai dela estivesse errado, eu colocaria tudo a perder tentando falar alguma coisa para ela antes que ela sentisse o mesmo. Eu precisava ter certeza de que eu não cairia antes de pular. A última coisa que eu queria era cair. E eu nem deixaria com que ela tivesse uma chance de fazer isso de novo. Não queria a rejeição, não queria nem pensar na possibilidade. Ou ela me falava primeiro que tinha mais alguma coisa entre nós, ou eu nunca falaria nada para ela. Não importava quanto tempo passasse, eu não iria me expor assim só para ela passar por cima de mim em direção ao meu irmão. Eu nunca admitira nada antes que tivesse certeza de que não estaria me arriscando cegamente. Eu precisava que ela me falasse primeiro.

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