Eu não tinha sonhado. Toda a noite tinha se misturado na minha cabeça e quando eu abri os olhos naquela sexta-feira de manhã, eu ainda não tinha certeza se tudo aquilo tinha sido um sonho ou não. Mas eu me virei na cama e meu braço caiu no torso de alguém, que pegou na minha mão e se virou para mim.

Eu nunca tinha imaginado acordar com os olhos azuis de Theo em mim e então eu não conseguiria pensar em nada mais maravilhoso. Até que ele sorriu para mim e me disse bom dia.

"Bom dia," eu respondi, ainda um pouco grogue.

Ele se mexeu até chegar mais perto de mim, colocando seu braço em volta da minha cintura, enquanto eu fiz o mesmo. Ele brincou com o meu cabelo devagar, enquanto eu observava o movimento que seu peito fazia com a sua respiração.

"A gente não pode ficar aqui," eu falei, encostando minha testa em sua pele.

Era legal, porque eu podia sentir seu coração batendo forte e acelerado.

"Claro que pode," ele falou, sorrindo.

Eu me afastei um pouco dele para lhe olhar.

"O que a gente acabou de fazer é traição, Theo," falei. "Isso é sério."

"Eu sei," ele disse, perdendo seu sorriso. "Eu sei disso, mas você não precisa se preocupar, eu não vou contar para ninguém."

Mas isso não era o suficiente, porque bem naquela hora alguém bateu à porta.

"Lady Melissa?" Uma das minhas criadas chamou logo antes de tentar abrir a porta várias vezes.

Olhei para o lado em pânico, para encontrar um criado-mudo bloqueando a porta.

"Você fez isso?" Eu cochichei para o Theo e ele concordou com a cabeça.

"Lady Melissa? O que está acontecendo?" A criada insistiu, sua voz entrando em pânico

"Estou aqui, desculpa, eu dei um jeito de trancar a porta," falei, colocando uma mão inteira na frente da boca de Theo.

"Você está bem?" Ela perguntou, sua voz preocupada.

"Estou bem," eu disse, querendo acalmá-la, mas ainda precisando de uma desculpa. "Eu só queria um pouco de privacidade."

"Ah," ela soltou, desanimada.

"Que horas são, você sabe?" Perguntei.

"Duas da tarde," ela disse, me fazendo entrar em pânico.

"Meu deus," soltei sem pensar, enquanto Theo ria embaixo da minha mão.

"Charles gostaria de falar com a senhorita," a minha criada disse, só para aumentar meu pânico.

"Quando?"

"Daqui meia hora no jardim," ela explicou. "Devo avisá-lo que o encontrará lá?"

"Claro," falei, e Theo me olhou esquisito.

"Quer ajudar para se arrumar?" Ela sugeriu, enquanto eu só estava rezando para que ela me deixasse o mais rápido possível.

"Não, pode deixar," falei e fiquei esperando ouvir ela se distanciando.

Quando finalmente achei que ela já não podia nos ouvir, tirei minha mão de Theo.

"Você vai se encontrar com ele?" Ele perguntou, enquanto eu me levantava e ia até o meu guarda-roupa.

"Claro que eu vou," falei, pegando o primeiro vestido que achei. "Eu não posso simplesmente negá-lo."

"Então você vai em um encontro com ele? Ainda quer ser a escolhida?" Theo estava colocando sua camisa de volta, abotoando-a.

Eu me escondi um pouco dentro do closet e deixei o vestido deslizar pela minha cabeça, caindo em meus ombros. Depois amarrei uma faixa na minha cintura.

"Olha, Theo," eu falei, me virando para ele, "Não importa o que aconteceu ontem à noite, hoje eu preciso fazer tudo direito."

"Não aconteceu nada ontem à noite," ele disse, bufando depois.

"Te garanto que todo o nada que aconteceu ainda é considerado traição."

"O que você está planejando fazer?" Ele perguntou, enquanto colocava seus sapatos. "Você quer falar a verdade?"

"Pensei nisso," confessei, indo até o banheiro. Eu o olhei pelo espelho, enquanto tentava passar um pouco de maquiagem. "Mas acho que seria melhor nós esperarmos até que eu saia da Seleção para começarmos a ter alguma coisa."

"Você não está sugerindo que eu espere o príncipe de Illeá decidir se quer você ou não para depois você vir atrás de mim, não é?" Ele andou até a porta se apoiou lá, me olhando.

"Claro que não," falei, passando por ele até o quarto e indo encaixar meus pés em sapatos que eu sabia que aguentariam a grama. "Eu estou te pedindo para não falar disso para ninguém até que eu convença Charles a me eliminar."

"E como você vai fazer isso?"

Quando cheguei até o jardim, meu coração ainda estava no meu quarto. E não só porque eu tinha deixado Theo lá, e sim porque eu não sabia como ele planejava sair sem que alguém o visse. E se alguém descobrisse que ele tinha passado a noite lá, nós teríamos sérios problemas.

Sérios problemas que eu estava tentando evitar naquele momento.

Charles estava sentado em um banco de pedra no meio do jardim e tinha seu cachorro deitado aos seus pés.

"Alteza," eu disse, fazendo-lhe uma reverência.

"Lady Melissa, estava preocupado com você," ele se levantou e me deu um beijo no rosto.

Uh-oh, pensei. Ele não podia estar achando que a gente tem mesmo esse tipo de conexão, podia?

Ele se sentou de novo e eu fiz o mesmo do seu lado. Tentei me mostrar o mais formal possível.

"Você está bem?" Ele perguntou, me olhando sério.

Eu não estava planejando fazer aquilo naquela hora. Na verdade, eu não tinha planejado nada. Mas tinha alguma coisa em seus olhos que parecia tão sincero e preocupado, eu me senti culpada de ter um segredo daquele tamanho. Ainda mais um que o implicava muito.

"Não, Charles, desculpa," falei, só o deixando ainda mais alarmado. "Eu não ia falar nada, porque eu estava tentando superar. E do fundo do meu coração, eu acreditava que tinha superado. Mas depois de vê-lo aqui..."

"Do que você está falando?" Ele perguntou com cuidado.

Eu mantive meus olhos no meu colo, tentando não o encarar. Mas dava para ouvir na sua voz que ele já estava acabado com tudo aquilo.

"Antes de vir para cá, eu estava apaixonada por outro cara," expliquei. "Ele tinha me deixado e eu pensava que tinha me esquecido dele. Mas ele está aqui. E eu percebi que na verdade, eu nunca deixei de amá-lo."

Levantei meus olhos para ele bem na hora em que ele se levantou, olhando para os lados, esfregando sua nuca.

"Você está me dizendo que esse amor seu está no castelo?" Ele perguntou, sem olhar para mim.

"Sim," falei, baixinho.

"Quem é?" Ele se virou para mim e me encarou sério.

Apesar de estar a alguns metros de mim, seu olhar pesado conseguia me fazer me sentir mais culpada ainda por tudo aquilo.

"Theodore Kaiser," falei, fazendo-o arregalar seus olhos de surpresa.

"Príncipe Theodore da Alemanha?" Ele perguntou e eu só concordei com a cabeça. "Então eu estou competindo com o príncipe da Alemanha que provavelmente logo virará o rei?"

"Charles-"

"Não," ele me cortou, segurando uma mão no ar. "Eu acho que nosso encontro vai ter que ficar para depois, eu preciso ficar um pouco sozinho."

Eu abri a boca de novo para falar, mas ele começou a andar em direção ao castelo e eu não sabia o que poderia dizer para convencê-lo. Eu nem queria que ele tivesse entendido daquele jeito! Por que ele tinha reagido assim? Não que eu fosse esperar que ele ficasse feliz em saber que eu praticamente não tinha espaço no meu coração para ele. Não era tola o suficiente para pensar assim. Mas eu não esperava que ele fosse ficar tão emotivo. Sensível até. Eu achei que ele fosse pensar naquilo, mas não me largar daquele jeito antes mesmo que eu conseguisse explicar tudo direitinho. Antes que eu pudesse até pedir para ele me deixar ser eliminada.

Será que ele não me deixaria ser eliminada?

Seu cachorro mal tinha se mexido desde que ele tinha se levantado, então eu me sentei na grama do lado dele e comecei a fazer carinho atrás da sua orelha.

E se ele fosse me eliminar de qualquer jeito? E aí? Eu não podia estar simplesmente pensando que seria tudo um mar de rosas. Eu era estrangeira, uma filha de Illéa. Eu não seria bem aceita na Alemanha, não como futura rainha. E então, o que faríamos? Será que conseguiríamos aguentar a pressão de um povo insatisfeito?

Ai, meu deus. Tudo aquilo de Theo assumir o trono era para acalmar o povo. E se eu chegar lá e só piorar tudo? Eu não poderia ser responsável pelo povo alemão se revoltando contra ele. Eu não queria estragar a vida dele, pelo contrário. Eu queria poder ajudar de todos os jeitos possíveis, como pudesse.

E se eu tivesse que sacrificar a minha própria felicidade pelo bem dele? Eu conseguiria?