Capítulo 63: POV Melissa McQueen

Eu sabia bem como Theo tinha conseguido me amaciar. Ele vinha conversar comigo, falava da Alemanha, das coisas que ele gostava de lá e principalmente de todos os problemas que ele estava tendo. Todos os problemas que seu país estava enfrentando e que poderia muito facilmente cair em seu colo de um dia para o outro.

Ele evitava falar sobre nós dois, soltando aqui e ali uma indireta de vez em quando. Eu ria, não comentava nada e mudava de assunto. Mas ele foi mencionando cada vez menos qualquer coisa que tinha a ver conosco e eu fui começando a sentir falta disso, apesar de que nunca admitiria.

Depois do jantar naquela quinta-feira, nós tínhamos combinado de passear pelo jardim. Mas quando saímos lá fora, vimos Charles e Beatriz e resolvemos que não seria uma boa ideia interrompê-los. Decidimos ver a natureza lá de cima e eu o levei para a varanda no meu quarto.

Ele foi um cavalheiro, como sempre, se sentando longe o suficiente de mim para eu não ficar constrangida e me dando seu blazer quando comecei a sentir frio. Nós falamos dos tempos em que ele morava perto de mim e em como a vida era bem mais simples naquela época. Ambos evitamos mencionar qualquer coisa que poderia ficar desconfortável. Eu guardei para mim mesma todas as vezes em que ele lembrava alguma coisa que tinha acontecido com a gente e eu pensava que naquela época eu já tinha me apaixonado por ele e já rezava para me enxergar algum dia como a garota para ele.

Eu só queria ser a sua garota preferida no mundo inteiro. Mas seus olhos pareciam se virar para qualquer uma na rua, contanto que ela não fosse eu.

E agora estávamos ali, sentados um do lado do outro, ele disposto a me oferecer tudo que eu sempre quis e eu sempre poder aceitar. Eu já tinha até superado o meu próprio orgulho. Já não tinha mais raiva dele, não iria me poupar de aproveitar sua admiração só por raiva de todo o tempo em que eu era invisível para ele. A única coisa que me mantinha longe dele era o compromisso que eu tinha para com Charles.

"Eu preciso te contar uma coisa," ele disse uma hora, seu tom rapidamente ficando sério.

"Pode contar," eu falei, já imaginando mil coisas que poderiam estar passando pela cabeça dele.

Mas nenhuma delas era a que ele realmente precisava me contar.

"Eu preciso me casar," ele disse, ainda soando desanimado. "Meu pai me mandou uma carta, explicando que ele está disposto a descer do trono se eu estiver casado e pronto para assumir."

"Mas você ainda pode continuar solteiro? Ele pode continuar como rei por mais um tempo," eu pensei alto.

Enquanto meu coração rezava para ele conseguir adiar aquilo pelo menos até eu ser eliminada da Seleção - o que eu já estava decidida a conseguir.

"Não por muito tempo," ele falou, me dando uma pontada de falta de ar que eu disfarcei. "Meu pai disse que ele não está conseguindo controlar o povo. Eu preciso tomar uma decisão o mais rápido possível."

Ficamos em silêncio por um tempo, e eu me perguntava se tinha alguma saída, algum jeito em que conseguíssemos conciliar a minha escolha de entrar na Seleção com essa necessidade de ele arrumar uma esposa.

Aí eu me lembrei uma das grandes razões para eu ainda não ter pedido para Charles me tirar dali: uma filha de Illéa não seria uma rainha apropriada para a Alemanha.

Suspirei devagar e ele deixou sua cabeça tombar para o lado, seus olhos caindo em mim. Pude perceber pelo canto dos olhos, já que eu mesma encarava o jardim escuro à nossa frente.

"O que você tá pensando em fazer?" Eu perguntei, mal conseguindo fazer as palavras saírem pela minha boca.

"Meu pai quer que eu aproveite meu tempo aqui para escolher a minha esposa," ele disse, se voltando de volta para a frente.

"Ah, é?" Perguntei, tentando matar a esperança que nascia dentro de mim.

Eu não podia me deixar sentir aquilo de novo. Não poderia começar do zero. Esquecê-lo tinha sido a coisa mais difícil que eu tinha feito na minha vida e eu sabia que não tinha forças para tentar de novo.

Eu já sabia o final daquela história. Já tinha lido o livro, visto o filme, várias vezes na minha cabeça. Eu sabia o final e insistir de novo não ia mudar aquilo. Só ia me fazer vivenciá-lo de novo para acabar do mesmo jeito, sem a mínima vontade de viver.

Eu precisava era focar na Seleção. Ali sim eu tinha verdadeiras razões de conseguir alguma coisa concreta.

"Ele gostaria que eu me casasse com a Princesa Amélie," ele disse.

Menina requisitada, pensei, lembrando do que Gabrielle tinha me contado dela com Sebastian.

"Mas eu não sei," ele continuou. "Ela é bonita, não estou reclamando disso. E entendo o potencial do exército dela. A França é logo ali, seria um dos melhores aliados se precisássemos de algum tipo de intervenção. Bom, na verdade o melhor seria a Polônia, mas eu não sou louco de achar que eles estariam dispostos a se aliarem a nós. Não depois de todas as vezes em que os traímos durante as guerras."

"Entendo," falei, só para demonstrar mesmo que ainda estava ouvindo.

Mas ele parecia tão disposto a falar, que eu duvido que se importaria se eu ficasse quieta.

"Mas a Amélie é meio chata," ele falou. "Não que eu tenha conversado muito com ela, mas ela parece meio dramática demais. Até um pouco depressiva, sabe? Esse humor dos franceses me incomoda. Parece que eles sentem tudo tão profundamente que se chover, eles são as pessoas mais tristes do mundo."

"Olha, até entendo a sua aversão à famosa melancolia francesa, mas não vai achando que todo mundo é assim, não," eu falei, me virando para ele. "A selecionada aqui que é descendente de franceses é muito mais feliz que eu."

"Isso não é muito difícil, né?" Ele disse, também se virando para mim.

Mas eu sabia que ele estava falando aquilo só para provocar.

"Há," eu disse. "De qualquer jeito, eu entendo o que você quer dizer. A princesa parece mesmo estar sempre de mal humor," ele concordou com a cabeça, desanimado. "O que você vai fazer?"

"Nada," ele respondeu, se levantando. "Eu não sei o que fazer, então decidi não fazer nada. Por enquanto, pelo menos."

"Boa ideia," eu disse, também me levantando e deixando seu blazer escorregar dos meus ombros.

"Está tarde," ele falou, pegando-o de mim.

"Eu sei."

Entramos para o quarto e eu o levei para a porta.

"Te vejo depois?" Ele perguntou desanimado e eu concordei com a cabeça.

Meu coração levou um susto quando ele se abaixou em minha direção e eu fiquei paralisada. Mas ele só me deu um beijo no rosto e depois saiu pela minha porta.

Eu ainda demorei mais alguns segundos para superar o toque dos seus lábios na minha pele.

Já tinha me deitado fazia quase duas horas e eu ainda não tinha conseguido dormir. Mal tinha conseguido fechar os olhos.

Eu não conseguia acreditar que estava naquela posição de novo. Tudo com Theo era tão instável, eu nunca conseguiria me sentir segura o suficiente para me arriscar por ele. Eu tinha ido da menininha apaixonada, para a abandonada, para a decidida, a que ele queria. Ele tinha estado atrás de mim. E depois da conversa de hoje, eu tinha voltado para a abandonada. Ele já não queria insistir em tentar me conquistar. Ele já tinha desistido e começado a pensar em conseguir outra menina. Fácil assim. Bem quando eu já estava começando a considerar me entregar, pedir para ser eliminada, admitir para mim mesma que nunca existiria outro cara no mundo que eu iria querer como eu o queria.

E eu o queria. Eu queria tanto que estava esperneando na minha cama, como se aquilo fosse matar aquela vontade que eu tinha de estar com ele. Mas não adiantava. E quanto mais eu o queria, mas raiva eu sentia de mim mesma. Eu estava tentando ser forte, por que é que tudo em mim parecia querer ser bem o contrário? Eu precisava esquecer aquilo, do jeito que fosse. Eu queria tanto voltar no tempo.

Eu teria lhe falado que eu o amava bem antes de ele ir embora. Muito antes de ele ter começado a namorar aquela menina da nossa vizinhança. Bem antes mesmo de eu ter que assistir os dois juntos, ouvir ele falando das brigas e ter que dar conselhos para ele conseguir se acertar com ela. Tudo isso enquanto eu pensava comigo mesma que ele estava certo, que ela não merecia ele. Eu tive que ser a amiga que o convencia a voltar com a namorada quando eu mesma queria estar no lugar dela.

Se ela ao menos tivesse percebido a sua sorte.

Mas eu mesma não percebi, me ocorreu do nada. Quando ele estava na minha frente, quando ele veio me dizer que não conseguia imaginar a sua vida com mais nenhuma outra garota, eu o dispensei. Eu não percebi a sorte que eu tinha.

Mas eu não tinha sorte. Eu tinha azar. Azar era o que fazia tudo dar errado. Ou melhor, tudo dar certo na hora errada. Eu pelo menos já sabia qual seria o nome do meu livro. "A coisa certa na hora errada".

Eu tinha decidido que se pudesse voltar no tempo não voltaria para muito longe. Voltaria para sexta-feira e me faria entender que nenhuma raiva no mundo, nenhum orgulho valia a pena. Não queria que aquilo tivesse me custado a felicidade de uma vida inteira.

Tinha chegado à conclusão de que era uma idiota quando ouvi uma batida tímida na minha porta. Aquilo me deu um medo enorme no começo, e eu imaginei mil coisas que poderiam estar acontecendo. Até me peguei me perguntando se eu não tinha imaginado aquilo.

Mas a batida se repetiu e foi seguida por uma voz.

"Mel? É o Theo, você tá acordada?" Ele perguntou baixinho, mas foi o suficiente para eu ouvi-lo.

Saí debaixo das cobertas correndo e abrir para ele.

"Eu não conseguia dormir," ele cochichou, enquanto entrava e fechava a porta atrás dele.

Mas eu não queria falar. O escuro e o eco dos meus próprios pensamentos na minha cabeça já tinham decidido para mim o que aquela noite seria. E eu não ia me deixar perder mais uma oportunidade.

"Mel-" ele começou a falar de novo, mas parou quando eu fiquei na ponta dos pés e encostei meus lábios no seu.

Eu o peguei de surpresa, mas ele não me questionou, retornando o beijo com muito mais urgência do que eu tinha demonstrado. Ele me abraçou rápido, entrelaçando os braços nas minhas costas, me guiando até a cama. Eu cambaleei um pouco, mas estava segura em seus braços, mal precisava andar. O que era bom, já que estava ocupada demais com seus cabelos para pensar nos meus próprios passos.

Ele me deitou com cuidado na cama, se distanciando só o suficiente de mim para me olhar. Seus dedos seguiram até a minha testa, e ele afastou uma mecha do meu cabelo, colocando-a atrás da minha orelha enquanto ele me observava.

Eu sentia o peso do seu corpo em cima de mim, enquanto minhas mãos subiam pelos seus braços. Meu coração estava batendo que nem louco no meu peito, ainda reagindo àquele momento. Eu não sabia se aquilo estava mesmo acontecendo. Não sabia como tinha ido de ficar rolando sozinha minha cama para estar com ele em cima de mim, seus lábios a alguns centímetros de distância.

Mas se eu estivesse sonhando com aquilo, eu preferia não descobrir por enquanto. Eu preferia continuar sonhando por mais algum tempo. Só mais alguns segundinhos, eu pensei, levantando a minha cabeça o suficiente para alcançar sua boca de novo.

Sua mão se colocou no meu rosto, sustentando minha cabeça, me trazendo para ainda mais perto dele. Ele era cuidadoso, ao mesmo tempo que parecia que me queria tanto quanto eu o queria. Quando nos distanciamos de novo, eu percebi que estava praticamente segurando a respiração.

"Theo," sussurrei, com medo de fazer algum movimento brusco demais que fosse fazer aquele sonho desaparecer na minha frente.

"Hm?" Ele perguntou, seus lábios descendo dos meus para o meu queixo, meu pescoço, meu ombro.

Eu esqueci completamente o que ia falar, só deixei minha cabeça cair para trás com os pequenos arrepios que seus beijos me davam.

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