Capítulo 60: POV Nina Marshall

Era quinta-feira e estávamos todas reunidas no Salão das Mulheres. Bom, todas menos a Annabel, que estava em um encontro com Charles.

Não era fácil tentar ir atrás dele, quando eu ficava encontrando seu irmão e a sua namorada pelo castelo o tempo inteiro. Ou noiva, né? Já devia ser noiva. Ou ele estava esperando para fazer um pedido que ela merecesse. Ele já devia ter um anel escolhido, enquanto ela já devia ter passado a vida inteira pensando em seu vestido. E eles seriam felizes para sempre.

Ele tinha me evitado desde sábado e eu o agradecia por isso. Eu não queria ficar perto dele nem um pouco mais do que ele queria ficar perto de mim. Ainda mais agora que a princesa francesa tinha voltado para contar para a Valentine que sua mãe estava apoiando o relacionamento dos dois.

Por sorte, eu podia passar meus dias do lado de Beatriz, que nunca parava de falar sobre como ela e Charles estavam se apaixonando. Eu me falava que tinha que me importar, que aquilo só estragava as minhas chances de viver o amor que eu tinha planejado viver com ele. Mas eu já não tinha forças em mim para fingir que aquilo me incomodava. Eu já estava com um pé para fora daquele castelo.

Eu não tinha chances com Charles. E, para falar a verdade, eu já nem queria ter. Eu gostava da sua presença, mas toda vez que eu via alguma coisa boa nele, a primeira coisa que pensava era que seu irmão era melhor naquilo. Sem contar, é claro, com o fato de que Charles era um amor de pessoa, enquanto Sebastian era puramente detestável. Mas nem isso conseguia me fazer sentir alguma coisa por ele. Eu só estava esperando ele me pedir desculpas e me eliminar. Ou me dizer que ia me manter aqui até a Elite só porque eu tinha virado sua amiga.

Essa para mim era a pior opção. Meu pai tinha me escrito falando que o dinheiro extra estava ajudando com a escola dos meus irmãos. Nós nunca tínhamos passado fome ou nada desse tipo, mas meu pai sempre quis tentar oferecer uma vida melhor para a gente, e ultimamente a loja não estava vendendo tão bem. E o dinheiro que a gente recebia era bastante. Tinha quem falava que era mais do que todas as outras seleções. Eu não queria que meus irmãos tivessem que parar de sonhar com uma faculdade boa porque eu não conseguia me importar se o príncipe gostava de mim ou não. Eles tinham uma chance de crescer. Eles eram da geração que passaria pelo término da nossa casta. Eles não precisariam ser como eu. Isso se eu conseguisse me manter aqui por mais tempo.

Mas era praticamente impossível me fazer me importar sem eu me sentir completamente falsa. Tentei fazer como Abigail, me mostrando interessada por ele. Mas Charles podia perceber que aquilo estava errado. Ele me olhava como se eu fosse louca toda vez que eu tentava dar a entender que eu queria ter outro encontro com ele.

E eu acabei por desistindo. Só estava tentando me manter ali pelo máximo de tempo que desse para conseguir juntar todo o dinheiro possível.

Mas tinha outra razão para eu querer estar longe dali, principalmente naquela época.

Eu estava andando pelo estábulo, quando parei para passar a mão em um cavalo. Depois de Victoria ter contado como tinha sido perfeito seu encontro com Charles, eu fiquei curiosa para ver os animais do castelo.

E tinha esse cavalo, Sonne, que era meu preferido. Tinha pegado o hábito de ir conversar com ele todos os dias, logo antes do jantar. Era quando quase todos os criados ficavam preocupados com a família real e o estábulo ficava vazio.

Ele estava calmo naquele dia, já acostumado com o meu toque.

"Você gosta dele?" Ouvi alguém me perguntar atrás de mim.

Levei um susto com a voz familiar, que fez meu coração acelerar na hora. Eu me virei para encontrar Sebastian apoiado na parede.

"Ele é meu, sabia?" Perguntou, andando até nós.

Eu escondi minha mão na minha saia, envergonhada de ter criado tanto carinho por algo que pertencia a ele.

"Não sabia," falei, baixinho.

Sebastian passou sua mão em Sonne, que respondeu feliz ao toque do dono. Dava para ver que era verdade, ele era dele.

"Por que ele chama Sonne?" Perguntei do nada.

Sebastian levantou as sobrancelhas, mas seus olhos estavam ainda em seu cavalo.

"Meu nome do meio é Regen," falou, como se fosse para eu entender tudo só por aquilo. Depois de eu ficar em silêncio, ele acabou se virando para me olhar. "Regen é chuva em alemão. Meu pai tinha descendência alemã. Queria um pouco da sua cultura no meu nome."

"Sebastian Regen Schreave," falei, para eu mesma guardar. "O que Sonne tem a ver com isso?"

"Sonne é sol," ele disse, orgulhoso.

"Sol e chuva?" Perguntei.

"Por ali," ele sorriu, voltando ao seu cavalo. "E você?"

Eu brincava com as minhas mãos atrás das minhas costas.

"Eu o quê?" Perguntei, observando-o brincar com Sonne, hipnotizada.

"Tem nome do meio?"

"Tenho," respondi, um pouco desanimada. Aquele assunto não era dos meus preferidos.

"Quer me contar?" Seus olhos pareciam tão compreensivos, tive que checar na minha cabeça algumas vezes para ter certeza de que ainda pertenciam a ele.

Não parecia que aquele era o mesmo cara que tinha praticamente ameaçado de se casar com outra menina só porque eu falei que eu não gostava dele. Parecia mais aquele que eu tinha visto na frente do elefante.

E a lembrança daquele dia foi o suficiente para me fazer contar uma coisa que eu nunca tinha contado para mais ninguém.

"Nina Meer Marshall," falei, desanimada ainda por tudo que aquele assunto me trazia. "Minha mãe se chamava Meer."

"Chamava?" Ele perguntou, parando de fazer carinho no Sonne.

Ele se virou para mim, sério. Provavelmente percebendo aonde aquilo estava indo.

"É, ela morreu no parto dos meus irmãos," expliquei e engoli em seco para conseguir tirar o nó que tinha na garganta. "Que é amanhã, aliás," comentei.

"Amanhã é o aniversário dos seus irmãos e de morte da sua mãe?" Sua frieza me incomodou um pouco, mas de certo modo era até confortante uma pessoa não tentar aliviar a dor daquela lembrança.

"É," falei, suspirando. "Eu queria muito poder passar o dia com eles, mais até pelo meu pai. Nunca é um dia fácil para ele."

Nós ficamos quietos por um tempo, enquanto eu me arrependia de ter contado. Não queria que ele me visse e pensasse que eu estava estragada, que tinha uma parte de mim faltando. Mesmo que fosse verdade. Não queria que ele me olhasse como me olhava. Era como se eu estivesse exposta na frente dele, todas as feridas à mostra. Já tinha o que eu poderia esconder.

"Por que você não vai?" Ele disse do nada.

"Como assim?"

"Volta para casa para o aniversário dos seus irmãos," falou, como se fosse simples.

Ele não me queria ali, pensei. Ele queria que eu desistisse.

"Não quero deixar a Seleção," expliquei. Ia falar que não queria deixar o irmão dele, mas seria uma mentira tão grande, que não tinha certeza de que conseguiria falar.

"Você não precisa deixar nada," ele falou, voltando a fazer carinho no Sonne. "Você poderia ir e voltar no dia seguinte. Só um dia para poder passar com a sua família."

Suas palavras ecoaram na minha cabeça por alguns segundos e eu me perguntei se tinha imaginado aquilo ou se ele tinha mesmo me proposto isso.

"Tá falando sério?" Perguntei, fazendo-o o sorrir.

"Claro," disse. "Se é importante para você, você é livre para ir e será muito bem recebida quando voltar."

"E eu iria sozinha?" Perguntei, já começando a imaginar como seria voltar para lá, ser recebida pelos meus pais.

"Não, claro que não," ele disse. "Você teria que ter alguns guardas com você."

"Entendo."

"Quer ir? Eu posso arranjar tudo," ele se afastou de Sonne e eu entendi que ia começar a voltar para o castelo.

Comecei a andar do lado dele e ele ofereceu-me seu braço. Tinha alguma coisa na ideia de estar tão encostada nele que me incomodava, mas me confortava muito. Claro, pensei. Ele tinha acabado de me oferecer tudo que eu mais queria. Meu coração já o via como uma pessoa melhor, mesmo que minha cabeça soubesse que ele não era.

"Quero ir," falei, quando já saíamos do estábulo.

"Aliás," ele disse, "Meer, seu nome do meio? Significa mar em alemão."

"Ah, é?"

Chuva e mar. 

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