Capítulo 20: POV Charles Regen
Quando entramos na Sala de Música, Beatriz esqueceu que eu existia. Ela ficou encantada com a nossa coleção de instrumentos, andando entre eles, parando em cada um para admirá-los. Ela parecia que queria pegar todos, mas não se atreveu a tocá-los. Era legal vê-la tão hipnotizada, sem escolher para qual deles olhar.
"O que acha?" Perguntei, fazendo-a olhar para mim.
Ela nem se preocupou em me responder, pois logo foi atraída por um piano no canto da sala. Ela praticamente correu até lá e eu a segui devagar. Estava olhando para as teclas, mantendo sua distância, quando cheguei até ela.
"Pode testar, se quiser," falei.
Achava que ela já sabia que era por isso que eu a tinha levado ali, para ela se divertir com eles. Ela foi delicada quando se posicionou na frente do piano e se sentou no banco dele. Respirou fundo e levou suas mãos às teclas, mas sem tocá-las.
"Algum problema?" Perguntei depois de alguns segundos sem ela se mexer.
"Não sei se estou pronta," ela falou.
Ri de leve com aquilo. Era bem isso que eu queria quando a levei lá. Queria que ela esquecesse os problemas dela e realizasse um sonho, mesmo que pequeno.
Sem pensar no que estava fazendo, apoiei minhas mãos nos seus ombros. Ela reagiu com o meu toque se encolhendo de leve, o que me fez pensar que estava indo longe demais. Mas tirar minhas mãos dali não era uma opção. Não tinha como eu fazer isso sem deixar um clima ruim entre a gente. Decidi então simplesmente tentar ignorar.
Mas não foi fácil. Não dava para esquecer que eu estava tocando nela.
Suas mãos acabaram relando nas teclas e ela começou a tocar uma música que eu reconheci.
"Beethoven?" Perguntei, deixando minhas mãos escorregarem de leve pelos seus ombros, aproveitando o contato com ela.
"Para Elise," ela falou, só confirmando o que eu já sabia.
Resolvi me sentar do lado dela e ajudá-la com uma segunda parte. Coloquei meus braços por cima do dela e comecei a tocar. Ela não pareceu se incomodar, nem por bem, nem por mal, e continuou tocando como se tivéssemos combinado e praticado juntos.
Estava gostando de estar tão perto dela, achava que seria um momento que ela poderia guardar e contrapor aquele tão ruim que ela tinha vivido poucos dias antes. E tudo estava indo tão bem, até eu ter que alcançar uma nota muito mais alta e acabar chegando meu rosto perto demais do dela.
Olhei para ela para ver que nossos olhos estavam a menos de dez centímetros um do outro. Ela ficou desconcertada com aquilo e parou de tocar, olhando para longe de mim. Parei também e me sentei direito ao seu lado, percebendo que ela escondia suas mãos na saia de seu vestido.
Eu esperei que ela fosse falar alguma coisa, se desculpar ou explicar porque a tinha incomodado tanto. Mas não falou nada e seus olhos ficaram vidrados no piano.
Eu, por outro lado, não queria deixar ela pensando sozinha no que quer que seja. Queria que ela soubesse que eu estava ali por ela. Eu era o aliado dela no castelo.
"Não quero te fazer ficar mal," eu falei, pensando que talvez fosse isso mesmo que eu faria sendo tão curioso, "mas eu gostaria muito de saber o que aconteceu com o cara que te machucou tanto."
Ela pareceu quase encolher com meu pedido, mas acabou me contando.
Estava mordendo o lábio e ainda olhava para frente quando falou. "Se você precisa saber, eu estava noiva de um cara chamado Noah," ela balançou a cabeça de leve. "Ele era um Três," ela comentou e eu pensei em falar de novo para não pensar em castas.
Mas tinha mais medo de falar a coisa errada e fazer ela parar de me contar, então fiquei quieto, esperando que continuasse.
Ela respirou fundo uma vez, como se estivesse cansada só de relembrar. "Um belo dia acordei com um bilhete na minha porta que dizia para eu ir até um restaurante no almoço, que o que eu veria mudaria a minha vida," ela parou por um tempo, mas então continuou. "Eu não sei quem mandou esse bilhete, mas quem quer que seja, estava bem certo. Nada mais poderia mudar a minha vida como aquilo," ela se virou para olhar para mim, seus olhos lacrimejavam levemente. "É engraçado pensar que enquanto eu ficava fazendo planos para uma vida ao lado dele, ele passava seu tempo mentindo para mim do lado dela."
Concordei com a cabeça, ainda com medo de falar alguma coisa que a ofendesse. Queria que me contasse mais, queria saber detalhes de como ele era fisicamente, o que ele fazia com ela, como a tratava, do que ela gostava nele. Principalmente do que ela gostava nele. Mas ainda era muito cedo e não queria assustá-la.
Quando percebi a mão dela apoiada no banco, senti um impulso de segurá-la. Não sabia se ela ia fugir de mim de novo, mas não me deixei questionar. Minha mão encontrou a dela e a segurei forte, tentando passar por aquele aperto toda a compaixão que eu tinha por ela, todo o apoio que eu achava que ela precisava. Ela não fugiu, mas pareceu apreciar meu toque.
Estava curtindo aquele momento, até pensando em como ia manter aquilo, quando o seu estômago fez um barulho estranho. Me segurei pelo tempo que pude, mas acabei rindo alto daquilo. Para a minha felicidade, ela também riu.
"Desculpa," ela falou, levando as duas mãos ao rosto para cobri-lo.
"Não, eu que tenho que pedir desculpas! Eu sou um idiota, estou te matando de fome," me levantei do banco e lhe ofereci minha mão. "Venha, vamos tomar café da manhã."
Nem pensei em irmos até a Sala de Jantar. Mesmo que todos ainda estivessem lá, não queria todas as outras selecionadas sabendo que tínhamos passado aquele tempo só nós dois.
Fomos direto para a cozinha, ela me segurando pela mão.
"Alteza," uma criada falou quando entramos pelas portas. Foi a primeira a nos ver.
"Qual seu nome?" Eu lhe perguntei, Beatriz sorrindo do meu lado.
"Scarlet, senhor," ela fez uma reverência.
"AH!" Soltei. "Então você é a Scarlet? Muito prazer," fiz um pequeno aceno de cabeça.
"Prazer," ela disse, olhando para baixo. Mas seus olhos rapidamente voltaram para os meus. "O que faz aqui, se não se importa de eu perguntar?"
"Queremos tomar café da manhã aqui, será que dá?" Perguntei e vi seus olhos iluminarem.
"Querem tomar café da manhã aqui?" Ela repetiu, se divertindo com aquilo.
"Sim, consegue preparar alguma coisa para nós?" Comecei a andar pela cozinha, trazendo Beatriz comigo.
Estava gostando daquilo, eu era o cara impulsivo e romântico que eu nunca tinha conseguido ser. Mas saber que ela já gostava de mim era o que me fazia ter menos medo de errar.
"Aonde você gostaria de se sentar, Alteza?" Ouvi Scarlet me perguntando atrás da gente.
"Na sua sala comum está bom," eu disse logo antes de entrar lá.
Todas as criadas e os guardas que estavam lá levaram um susto com a nossa presença. Depois de um segundo nos encarando, eles começaram a se levantar para sair de lá.
"Não, não," eu levantei uma mão para pedir para eles pararem. "Não precisam sair, é o seu lugar. Nós que somos os intrusos. Gostaríamos de tomar café da manhã aqui, se vocês não se importarem."
Eles trocaram olhares que provavelmente diziam que éramos loucos. Mas acabaram por dar de ombros e nos falar que tudo bem.
Beatriz sentou à minha frente em uma das longas mesas. Estava curiosa, olhando em volta, cumprimentando quem passava, quando duas criadas vieram nos servir com panquecas e maple syrup. Comemos conversando sobre coisas simples, como livros e música. Eu continuei pensando várias vezes sobre como abordar o assunto do seu noivo de novo, mas acabei decidindo que ainda tínhamos tempo demais para eu apressar as coisas.
Quando saímos de lá, ela sorria de orelha a orelha. Eu ficava cada vez mais satisfeito de vê-la tão feliz. Mas tivemos que nos separar na porta.
"Eu preciso ir encontrar meu pai," eu disse, e o sorriso dela diminuiu.
"E eu tenho que ir encontrar a Silvia," ela falou, meio triste. "Mas te vejo depois?"
"Claro," falei, mas estava pensando que talvez fosse melhor eu pensar antes de passar mais um tempo com ela.
Afinal, eu tinha mais trinta meninas para conhecer.
Enquanto ela andava para o outro lado do corredor, eu a olhava, parado de frente às portas da cozinha. Eu ainda tinha muita coisa para fazer, muitas meninas para escolher. Como é que eu estava pensando em fazer aquilo?
Quando ela virou a esquina e desapareceu da minha vista, respirei fundo e me virei para seguir o caminho contrário. Parei de andar quando percebi uma menina apoiada na janela no final do corredor. Reconheci na hora que era uma das gêmeas, mas não sabia qual delas.
"Não é justo," ela disse antes mesmo de me deixar chegar até ela.
"O que não é justo?"
"Você já estar saindo com ela," ela apontou para onde Beatriz estava um minuto atrás. "Achei que eu fosse ser a primeira que você escolheria."
Ela jogou seu cabelo loiro pelo ombro e o levantou de leve, como se estivesse me mostrando o que eu estava perdendo.
Sorri, pensando que não era possível já ter alguém brigando assim por mim.
"Me perdoe," falei, com uma mão no peito e a outra atrás das costas. "Gostaria muito de poder ter um encontro com você," fiquei esperando ela me falar seu nome.
Ela percebeu que eu não sabia quem ela era, pois levantou uma sobrancelha, desafiadora.
"Victoria," disse e sorriu. "Victoria Marin."
"Claro, Victoria, me perdoe, ainda estou decorando os nomes."
"E quando você acha que poderemos ter um encontro?" Ela deu um passo em minha direção, se inclinando sugestivamente para mim.
Tinha algo dentro de mim que queria rir alto daquela situação, mas era a mesma coisa que me mantinha naquele jogo.
"O que acha de agora?" Perguntei, com um sorriso de lado.
"Agora está ótimo," ela disse, chegando o rosto bem perto do meu.
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