3 - Tempos entremeados

— TODA AJUDA É bem-vinda. Ainda mais a sua, Josi. — Ingrid alargou o sorriso. — Que bom te ver de novo!

A voz de Ingrid mal era audível por causa das batidas nervosas e animadas do coração de Josiane. Com os olhos brilhando, sua ex-colega deu um passo à frente, abrindo os braços para cumprimentá-la com um abraço carinhoso.

— Bem-vinda de volta.

— Obrigada, Ingrid. É bom te ver também. — Josi retribuiu o abraço. Fazia um ano que não via a amiga pessoalmente e, por conta dos horários apertados e da correria do trabalho investigativo que compartilhavam, mal conseguiam conversar por chamada de vídeo. — Você está mantendo nossos meninos na linha?

Ingrid deu um passo para trás, batendo os dedos no cabelo de forma teatral. Céus, Josi tinha sentido falta do jeito único dela.

— Sabe como é. As rédeas precisam ser curtas o tempo todo, senão eles abrem demais as asinhas. Sentiu a falta dela também, Felipo?

O investigador, que havia se levantado, a olhou de cima a baixo.

— Você esteve fora esse tempo todo? Nem percebi.

Josi não conseguiu segurar o sorriso. E o abraço de urso que Felipo lhe deu sugeria o contrário de suas palavras.

— Também senti sua falta, Felipo.

Quando Felipo se virou para voltar para a mesa dele, Josiane ficou cara a cara com Tomás pela primeira vez em um ano. Os cabelos pretos pareciam mais curtos, destacando a cor âmbar dos olhos, enquanto os músculos estavam mais acentuados, marcados embaixo da camisa social. A barba por fazer, a gravata afrouxada, o relógio no pulso esquerdo; cada detalhezinho de Tomás estava ali, como da última vez em que o vira.

Josiane não havia percebido o quão cheio seu coração ficaria ao vê-lo até que ele estivesse ali, na frente dela, em carne e osso.

Sim, ele estava diferente, mas, ao mesmo tempo, ainda era o mesmo de suas memórias.

Como se nada houvesse mudado.

Como se não houvessem ficado distantes um do outro por um ano.

— Tomás.

O nome foi um suspiro, um arquejo, uma quebra entre o tempo passado e o tempo presente, que se entremeavam e se misturavam através da conexão de seus olhares.

A boca dele se contraiu na palidez de um sorriso.

— Oi.

Josiane parou diante dele e, pela primeira vez, sentiu-se subitamente estranha, como se não soubesse o que fazer. O que era incomum, já que se conheciam há anos. Tomás parecia igualmente sem jeito. Mas então, tomando a iniciativa, ela deu mais um passo para a frente; o reflexo do seu movimento fazendo-o erguer os braços para recebê-la em um abraço mais contido do que o abraço de Ingrid e Felipo.

Sim, foi mais contido, mas... Josiane deixou que suas mãos se apoiassem nas costas largas de Tomás, encostando o queixo em seu ombro, os olhos se fechando em um gesto automático enquanto seu corpo era envolvido pelo calor dos braços dele, pela familiaridade protetora que havia no silêncio daquele abraço.

Uma súbita emoção passou por Josiane ao ser invadida pelo cheiro de sua loção pós-barba, o mesmo cheiro que ele espalhava pela delegacia todas as manhãs, desde que ela conseguia se lembrar. Um suspiro suave e satisfeito escapou de seus lábios.

Havia hesitado em retornar para Belo Horizonte.

Havia se preocupado com os verdadeiros motivos que a tinham obrigado a voltar para a cidade onde trabalhara por anos.

Mas agora, ali, naquele abraço, naquele palpitar intenso do seu coração contra o dele, ela relaxou e se sentiu à vontade.

Ergueu o rosto, pronta para dar um sorriso e perguntar para Tomás como Lorena, a filha adolescente dele, estava. Mas ao ver o semblante estranho nos olhos de Tomás, a forma como seus músculos se contraíram ao toque dela, o sorriso de Josiane se dissipou.

Com a testa franzida, a investigadora deu um passo para trás.

— Quer dizer que você só voltou para nos ajudar no maior caso que já caiu nas mãos dessa delegacia? — Ingrid perguntou, empoleirada na ponta de uma mesa. — Sabia que o chefe estava desesperado por uma resolução, mas não imaginei que ele te traria de Blumenau para cá. Bom... A mídia está pressionando demais para que ele encontre o assassino dos dois deputados. E você sempre foi uma das melhores, não é, Josi?

Josiane disfarçou a apreensão que começou a escalar por suas pernas atrás de um sorriso fraco.

— Na verdade...

Tomás limpou a garganta, cortando-a enquanto lançava um olhar autoritário para Ingrid e Felipo.

— Já sabemos que não há um sistema de câmeras no hotel. Uma equipe foi enviada para mapear todo o bairro e checar se havia outras câmeras pela vizinhança. Entrem em contato com todos os envolvidos agora mesmo. Quanto antes tivermos respostas, melhor.

Ingrid soltou um assovio.

— Quem te colocou no comando?

— Nosso chefe. E você sabe disso.

Ingrid bufou e revirou os olhos, apanhando o telefone enquanto Felipo fazia o mesmo.

Quando o olhar de Tomás se voltou para ela, Josiane sentiu que o coração falseou nas batidas.

A ideia que teria chance de uma recepção amigável, de uma conversa para matar as saudades com todos, se esvaiu assim que ela entendeu que a tempestade já havia atingido as paredes da delegacia.

— Venha comigo.

Engolindo em seco, Josiane disfarçou qualquer apreensão e assentiu, seguindo Tomás através da delegacia. Retribuiu alguns cumprimentos de antigos colegas, mas não os ouviu de verdade; era como se estivesse no modo automático.

Eles adentraram em uma das dalas de interrogatório.

Assim que Tomás fechou a porta, virando outra vez aquele par de olhos âmbar para ela, Josiane se sentiu sem ar.

Cruzou os braços, erguendo o queixo e camuflando aquela agitação inesperada. Sempre se sentira à vontade na presença de Tomás. Mas, desde que o vira quando pisara na delegacia, algo parecia estar funcionando errado dentro dela.

— Ingrid e Felipo... — Josiane começou, umedecendo os lábios. — Eles não sabem o verdadeiro motivo que me trouxe até aqui?

— Não. Por enquanto, apenas nosso chefe e eu sabemos. Mas isso é questão de tempo.

Josiane inspirou fundo, inalando outra vez as notas da colônia masculina que seus sentidos conheciam tão bem. O corpo largo e alto de Tomás fazia com que a sala de interrogatório parecesse pequena e apertada.

— Eu sei. E tanto eu quanto você não gostamos de enrolação — ela balbuciou. — Então, pergunte o que quer perguntar.

Tomás deu um passo à frente. Josiane ergueu o queixo ligeiramente para poder observá-lo melhor.

— Por que o deputado Hélio Milani ligou para você na mesma noite em que foi assassinado?

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