3 - Reencontro

Quatro anos atrás


Aquela era a noite pela qual ela vinha esperando há meses.

A noite do seu aniversário de quinze anos.

Após recepcionar os convidados, cumprimentá-los e trocar de roupa, Lorena se preparou para o momento que mais queria vivenciar — o cerimonial clássico de uma festa de quinze anos.

As luzes do salão diminuíram e Lorena se preparou quando uma música triunfal irrompeu das caixas de som.

Trajando um longo vestido rubi, estilo princesa, que destacava a cor de sua pele e de seus cabelos que caíam em mechas encaracoladas ao redor do rosto, Lorena atravessou o corredor formado por quinze casais de amigos, incapaz de parar de sorrir. Tudo estava mágico e perfeito, do jeitinho com que sempre sonhara.

A única coisa que não tinha conseguido era um príncipe para a valsa, um menino especial e bonito que pudesse conduzi-la durante uma dança. Não era fácil encontrar o tal menino quando seu pai era um investigador ciumento, protetor e que andava sempre armado. Assim, quem faria aquele papel era um de seus primos, e ela já havia se conformado com a ideia.

Não deixaria que um detalhe como aquele estragasse uma noite especial.

Andou até os pais, que a esperavam no meio do salão. Recebeu um abraço de sua mãe, Valéria, e um de seu pai.

Assim que se soltou deles, sorriu outra vez; era um alívio vê-los se dando bem e não discutindo, mesmo estando divorciados há anos.

— Obrigada, mãe. Obrigado, pai. Tudo está incrível.

Sorrindo para ela, Tomás segurou sua mão e a levou para o meio do salão, dando início à tradicional valsa entre pai e filha, ao som de uma música clássica.

— Você está linda — ele sussurrou. — E eu te amo.

— Também te amo, pai. E estou feliz por você e pela tia Josi. Vocês merecem toda a felicidade do mundo. A mamãe também merece e sei que vai encontrá-la.

— Assim como você, filha. Você também merece ser feliz e conquistar todos os sonhos que desejar.

Ao final da música, ela e o pai se separaram, e Lorena se virou na direção do seu primo que faria o papel de príncipe naquela noite.

Suspirando, Lorena esperou que seu primo viesse até ela.

Então, as luzes do teto mudaram de direção.

Lorena piscou, confusa, observando seus quinze casais de amigos abrindo espaço, como se estivessem dando passagem para alguém.

E ela o viu.

E quase achou que seu coração sairia pela boca ou que jamais seria capaz de respirar direito outra vez.

Vinícius, o meio-irmão caçula de Josiane, que tinha dezessete anos, caminhava com um porte elegante em sua direção. Ele estava usando um requintado traje de gala, as íris verdes brilhando, um sorriso tímido nos lábios que fez as pernas de Lorena bambearem embaixo da saia volumosa do vestido.

"Minha nossa. Minha nossa. Minha nossa. Minha nossa".

Vira-o apenas uma vez, através de uma chamada de vídeo feita com Josiane.

Era a primeira vez que seus olhos assimilavam Vinícius pessoalmente.

E ele era ainda muito mais lindo sem estar atrás de uma tela.

Nenhum dos meninos da sua classe chegava aos pés dele.

Lorena sugou o ar com força. Não acreditava que seu pai e tia Josi tinham encontrado um "príncipe" para dançar com ela e haviam guardado segredo. Que haviam trazido Vinícius de Brasília até Belo Horizonte para participar da valsa.

E, feito um príncipe dos filmes e dos vídeos de festas de quinze anos que tinha ela assistido, Vinícius parou diante dela e estendeu a mão.

Outra vez, o coração de Lorena deu um salto vigoroso no peito.

Mas, então, com toda graça e elegância, ela aceitou a mão oferecida por ele.

Juntos, eles se colocaram no meio do salão.

A multidão de tornou um borrão de luz e cor ao redor dos dois.

Vinícius a envolveu nos braços, dando início à valsa. O queixo dela tocou o ombro dele. Lorena o sentiu inspirar, a respiração balançando os fios do seu cabelo. Naquela posição, conseguia escutar o coração dele, sentir a firmeza do seu peito.

Nunca tinha ficado tão perto assim de um menino.

Lorena olhou para ele. O rosto de Vinícius estava tranquilo, os olhos para baixo, os cílios escuros caindo sobre as maçãs do rosto.

Engoliu em seco. Sabia o que tinha acontecido há pouco tempo com a mãe e o pai de Vinícius — que também era pai de Josiane e sempre a tratara como uma bastarda indesejada. Todo mundo sabia. Estava na televisão, nas redes sociais. Seu pai e Josiane haviam sido os responsáveis pelo desdobramento daquela história, daquela investigação que terminara com mortes e prisões.

Mesmo assim, Vinícius estava ali, a pedido da meia-irmã.

Mesmo assim, ele não deixava nenhum sentimento transparecer através do sorriso tímido e educado enquanto a conduzia no compasso da valsa, a mão esquerda descendo pelas costas dela até a cintura.

O corpo de Lorena balançou.

Era como se um milhão de borboletas estivessem sob sua pele, batendo as asas.

Ela se forçou a ignorar aquilo e a continuar com a dança.

Precisaria agradecer a Josiane depois. Chamar o meio-irmão para bancar o príncipe provavelmente tinha sido arquitetado por tia Josi, que dobrara, torcera e esticara seu pai até que ele concordasse também.

Mas, por ora, só queria aproveitar o momento e a dança, pois o impossível havia acontecido: a noite tinha ficado mais mágica.


***************


Atualmente


Lorena piscou, entreabrindo os lábios e exclamando baixo quando Vinícius surgiu do nada e segurou o pulso de Artur.

— Me solta, Milani — Artur ralhou.

— Só se você se afastar dela. — O olhar, tom e a pegada firme de Vinícius não cederam.

— Ela provocou.

— E você é um santo e não fez nada, né?

Artur revirou os olhos, soltou alguns palavrões baixinhos, deu de ombros e gesticulou que não faria nada.

Assim que Vinícius soltou o pulso dele, Lorena libertou o ar que não percebeu que estava prendendo.

Enquanto alguns rapazes levavam Artur para longe dos calouros, Lorena se surpreendeu quando Vinícius a segurou gentilmente pelo braço e a afastou do grupo. O toque foi tão inesperado e espontâneo que fez a pele dela estremecer do mesmo jeito quando tinham dançado em sua festa de quinze anos.

— Você tá bem?

Ela o fitou e assentiu devagar, sentindo as palavras se perderem na boca ao olhá-lo tão de perto.

Nas pouquíssimas vezes em que o vira naqueles últimos quatro anos, lembrava-se da imagem de Vinícius com cabelos curtos e ajeitados, feito um típico menino de família rica.

Mas, agora, as mechas estavam um pouco maiores, espessas e bagunçadas. O bronzeado de sol em sua pele branca harmonizava-se ao acastanhado claro dos fios. Os olhos dele, que eram verdes como os de Josiane, pareciam mais intensos, brilhantes e escuros, como um oceano cheio de segredos e mistérios. Algo no formato do seu rosto também havia mudado; as linhas eram mais adultas, menos adolescentes, revelando a mandíbula que destacava seu queixo, descendo para a clavícula visível logo abaixo do colarinho da camiseta.

Lorena desviou o olhar. Para sua surpresa, o coração batia de um jeito descompassado e afoito no peito.

— Já imaginava que ia encontrar gente como ele aqui na universidade, mas não achei que seria logo de cara — ela balbuciou, tentando afastar o rubor que subia e se espalhava em seu rosto.

— Infelizmente, gente assim existe em todo lugar. Tome mais cuidado com esse cara.

Ela voltou a olhar para Vinícius.

— Se ele importunar minha colega ou qualquer outra pessoa, e eu estiver por perto, não ficarei calada.

— Ok, mas você precisa tirar essa cola do cabelo antes que ela faça um estrago — Vinícius falou, apontando para os fios grudentos e pegajosos.

— Sim. Vou pra casa. — Ela deu de ombros. — Acho que a noite de recepção acabou para mim.

— Venha, eu te dou uma carona.

— Não precisa. Escolhi um apartamento aqui perto da universidade para poder ir e voltar a pé.

— Mas já está tarde. E eu não aceitarei "não" como resposta — ele falou antes que ela tivesse a chance de argumentar, acrescentando logo em seguida: — Josiane me mataria se soubesse disso.

Lorena revirou os olhos e bufou.

— Tá bom.

Enfiando as mãos que tremiam de um jeito desajeitado dentro dos bolsos do macacão, Lorena seguiu Vinícius pelo estacionamento, olhando por cima do ombro para se despedir de Tati.

Viu Tati acenando em sua direção e fazendo um sinal positivo com o polegar enquanto apontava para Vinícius.

Lorena quis estapear a própria cara e gritar que Tati estava interpretando tudo errado.

Vinícius era o meio-irmão de sua madrasta. Só estava cuidando dela porque era assim que as coisas funcionavam entre uma família. Não havia nada demais naquilo, mesmo que seu coração insistisse em bater de um jeito afobado naquele momento.

— Estou de moto, não tenho carro. A minha é aquela ali, uma...

— Uma CBR 1000 branca da Honda! — O queixo de Lorena caiu ao contemplar a moto. — Que incrível!

Vinícius abriu um sorriso tímido e enfiou as mãos nos bolsos da calça, a fitando de soslaio.

— Olha só, você entende de motos.

— Eu amo essas belezuras. A velocidade, o ronco! — Os olhos dela brilhavam. — Ainda vou ter uma, mesmo sabendo que isso causará um ataque cardíaco precoce no meu pai.

Ele riu baixinho, apanhando um capacete e entregando outro para ela, dando a Lorena mais uma chance de observá-lo. Vinícius estava menos magro, mais musculoso, apesar de não ter um tipo físico forte e cheio. Ele parecia um atleta de alta performance.

— Minha roupa tá suja de tinta e cola — ela falou, engolindo em seco. — Vou sujar você e a moto.

— Não tem problema. Nada que água e sabão não resolvam.

Vinícius subiu na moto e ela sentou na garupa, colocando as mãos em torno da cintura dele, constatando com um arrepio que ele era mesmo mais forte do que aparentava.

E, enquanto ele acelerava e deixava o campus universitário, com o vento passando entre eles, Lorena agradeceu pelo rugido do motor abafar o som acentuado das batidas do seu coração.

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