Capítulo 7
O Ministro termina de ler o pergaminho e todos estão em silêncio, processando as palavras ditas e esperando por uma reação da Rainha. Eu honestamente já não lembro mais qual foi a primeira coisa que ele disse. Toda essa história de Profecia, Rainha prometida ou o que quer que seja isso tudo parece uma grande bobeira para mim e eu tenho mais o que fazer do que perder meu tempo aqui. Tenho que ficar por formalidade, porque meu pai achou que seria uma boa ideia me mandar. "Você precisa amadurecer blablabla" "Você precisa aprender a ter responsabilidade blablabla" "O Reino vai ser seu no futuro blablabla"
O Reino já é meu. Me pertence. Cada uma das pessoas que moram ali, são minhas. Eu sou o herdeiro, simples assim. Se não eu, quem vai assumir o controle do rico e poderoso Reino do Sul? Minha irmã? Por favor. Maryam vai morrer antes de levantar seus delicados dedinhos para fazer qualquer coisa além de escolher um vestido novo. Fora que ela só tem 15 anos e é capaz de gastar todo o ouro do Reino em sapatos. O lugar de Maryam é com seus acessórios e é ótimo que ela saiba disso. É melhor assim, só imagino a desgraça que seria ter uma mulher controlando tanto dinheiro.
E é exatamente for isso que fiquei muito feliz com o destino do Norte quando o Rei morreu. Duas garotinhas para comandar um Reino daquele tamanho? Perfeito! Para mim pelo menos. Tenho pena dos moradores do Norte; fadados ao fracasso. Só é uma pena que não seja a Princesa Layla a assumir o trono, só posso imaginar como seriam lindos os nossos filhos. Talvez com a gêmea do mal fora da jogada por causa dessa Profecia...
De qualquer forma o que o meu pai não entende é que eu tenho ainda muito tempo para me preparar para assumir o trono. Mal passei dos 20 anos, pelos Deuses. Tenho pelo menos mais dez pela frente antes de ter que assumir a postura do Rei responsável pelo povo e toda essa história. Por hora, tenho o direito de aproveitar minha vida como uma pessoa normal. E não me importaria nem um pouco em aproveitar a vida com a Princesa Layla. Maryam poderia ter algumas aulas de etiqueta com a Princesa do Norte, já que nem para isso aquela garota serve. Layla tem o porte de uma Rainha, e tudo que consigo pensar é em tornar nossos Reinos um só - e o vestido que ela está usando me serve muito bem de incentivo para isso.
- É isso? - pergunta Layla, com seus longos cabelos loiros emoldurando seu lindo rosto. A Rainha está parada olhando para o Ministro. Eu acho. Seu olhar me dá medo e evito olhar na sua direção. Suas sobrancelhas estão enrugadas e sua feição é aterrorizante. Não, meu olhar está preso à Princesa, uma visão muito mais agradável.
- Os Deuses não são conhecidos por serem bons em se comunicar, Princesa - responde o Ministro, e diz isso como se estivesse falando com uma criança. A Princesa sorri e acena com a cabeça. Tão bonitinha.
O Ministro põe o pergaminho em cima da mesa, e todos se reúnem ao redor.
- Sem dúvida a primeira linha se refere às "Terras Distantes". Mas nunca ouvi falar de nenhum Castelo de Ruínas, eu saberia se existisse. Nenhum dos relatórios das equipes encarregadas da vigilância das fronteiras indicou qualquer atividade para além dos limites dos Reinos - Adaliz diz, com uma postura militar, as mãos nas costas parecendo uma estátua. Uma estátua enorme e cheia de sardas.
- Acredito que toda informação que possa ser necessária será encontrada no diário - a Sanatrix interrompe. Qual o problema desse Reino e essa quantidade monstruosa de mulheres em posições de poder? - Talvez seja uma boa leitura para a noite de hoje, Vossa Alteza.
Todos concordam com a cabeça, menos eu - não tenho certeza se posso confiar nas suas recomendações. Todo mundo está olhando para a Rainha, que continua sentada olhando fixamente para frente. Tenho vontade de ir até lá e beliscá-la só para ter certeza que ainda está viva. Não se mexeu nem disse uma palavra desde que o Ministro começou a ler a Profecia. Tudo que fez foi sentar de volta na cadeira e encarar o nada. Em silêncio.
Os Mestres do Reino do Norte comandam os centros de ensino no Sul, então temos uma disciplina inteira dedicada aos estudos da História Antiga dos Quatro Reinos. Nunca fui o melhor dos alunos em História Antiga, meu forte sempre foram os números, mas me lembro do Mestre nos ensinando sobre o tempo em que os Quatro Reinos eram um só e os Deuses nos governavam pessoalmente. Nunca entendi como isso era possível, mas de qualquer forma, a história registrada pelos antigos moradores de nossas terras diz que a Profecia foi deixada pelos Deuses antes de eles se retirarem, antes de retirarem sua presença física dos Reinos e passar a nos guiar apenas espiritualmente - não que isso faça qualquer sentido. O que importa é que eles foram embora e deixaram o controle e as decisões finais nas mãos de governantes humanos - pra minha sorte -, e foi quando os Reinos se dividiram em quatro.
- Me perdoe a intromissão, Majestade, não acho que seja prudente adiar o início do cumprimento da Profecia - o Ministro diz, quebrando o silêncio já que ninguém mais o fez.
- Ou os Deuses vão me punir - a Rainha responde finalmente, com um sorriso frio nos lábios. Ela respira fundo e pergunta - A Profecia menciona os Quatro Reinos, e diz que eu não estarei sozinha. O que exatamente isso quer dizer?
A divisão dos Reinos foi há mais de 5 mil anos. Sempre achei que a Profecia não passasse de uma lenda, como tantas outras sobre seres místicos e frutas mágicas e águas envenenadas que ouvi quando era criança. Não achei que fosse real. A lenda não dizia em qual reino a tal Rainha seria coroada - não dizia nem se seria uma rainha ou um rei -, mas deixava claro que envolveria os quatro Reinos. E é claro que tinha que acontecer logo quando eu estou aqui. Então tenho que dar algum crédito à Rainha dessa vez, também não entendo qual o papel dos outros Reinos nessa jornada ou o que quer que isso seja.
- De acordo com os textos mais antigos, a Profecia é destinada a uma pessoa em específico, mas deve ser cumprida pelos Quatro Reinos - Sanatrix começa a explicar - Não é especificado como; muitos dos textos foram escritos na linguagem antiga, e apesar de terem sido traduzidos pelos Estudiosos daquele tempo, a tradução não é precisa, ou tem muitas lacunas. Há a indicação em alguns pergaminhos que cada um dos outros três Reinos deve enviar suporte na forma representantes ao Reino contemplado na Profecia.
Era só o que me faltava. Me distraio por um momento e paro de prestar atenção no que quer que Adaliz esteja falando. Ele ganha minha atenção de volta quando a Rainha praticamente grita.
- Certo, os outros Reinos enviam auxílio, isso é ótimo - a Rainha diz, e não consigo ter certeza se ouço uma ponta de histeria em suas palavras. -E quanto a mim? Não é como se eu pudesse simplesmente deixar o meu Reino e o meu povo para trás, pegar um cavalo e partir para o meio de terras desconhecidas, das quais não temos notícias há séculos, em uma missão suicida por causa de um pergaminho que foi escrito há mais de quatro mil anos!
- Cinco mil - corrijo, e acho que é a primeira vez que digo alguma coisa para a Rainha hoje. Ela olha na minha direção e ergue as duas mãos no ar.
- Pior ainda! - diz, e volta a olhar para o Ministro - E então?
- É exatamente isso que os Deuses esperam que você faça - o Ministro responde sem rodeios, impaciente. Pode ser impressão minha, mas tenho certeza que ele está sorrindo um pouco. A Rainha sorri um sorriso grande e largo em resposta, de ponta a ponta de seu rosto. Ela parece estar a ponto de voar no pescoço do Ministro a qualquer segundo, mas apenas sorri.
Ela percorre os olhos por cada um de nós que está aqui de pé esperando a conclusão dessa história. - A Profecia diz que não vou estar sozinha e diz que os Quatro Reinos serão afetados. Acredito que seja justo esperar que cada um de vocês enviará alguém capacitado de seus Reinos para fazer parte desta... jornada? - ela pergunta, mas não é realmente uma pergunta. Adaliz concorda com a cabeça imediatamente. Tobiah a acompanha, e por fim eu também. Desde que não seja eu a ter que entrar nessa doideira, não me importo.
A Rainha respira fundo e parece cansada. Obviamente não consegue dar conta da pressão.
- Eu sou a Rainha do Norte, mas não tenho poder algum sobre os Reinos de nenhum de vocês - ela diz, e arruma os ombros que estão meio caídos - Mas essa Profecia diz respeito a todos os nossos Reinos, então espero poder contar com seu auxílio. Agora se me dão licença, ainda há assuntos pendentes do Reino para resolver - e assim, encerra o assunto e nos dispensa. Como se mandasse em alguma coisa.
Todos se preparam para sair do escritório, e eu fico para trás por um segundo para acompanhar a Princesa Layla. Somos os últimos a sair, e me esforço para puxar assunto de alguma maneira, o que é mais fácil do que imaginei. Quando estou fechando a porta do escritório pelo lado de fora, ouço sussurros. O isolamento acústico deste lugar é terrível!
- Ela precisa saber! - ouço uma voz feminina dizer rispidamente
- Não tem nada que ela possa fazer sobre isso! O destino dela está atrelado a essa Profecia, ela não vai ficar no Castelo por muito mais tempo. Em que essa notícia vai ajudar? Não acha que ela já tem muito com o que se preocupar? - a voz masculina responde.
- Ora por favor, você quer mesmo me convencer que está preocupado com ela? Nós dois sabemos que você só se importa com seus próprios interesses! Era o pai dela! - a voz feminina diz com uma rosnada.
- Não importa quais são meus interesses! É o meu trabalho filtrar as informações que chegam à Rainha e é isso que eu estou fazendo! Fim de discussão! - responde a voz masculina.
- Você vem, Hadaward? - a voz gentil de Layla me faz parar de escutar a discussão misteriosa. Ela está alguns metros a minha frente no corredor. - A vista do jardim é maravilhosa a essa hora do dia, não queremos perder o por-do-sol. Há tanto que quero te mostrar dos arredores do palácio! - ela diz, e posso ver como está animada.
O que quer que esteja acontecendo na outra ponta do corredor não é problema meu. Mas Layla... Se tem alguma coisa que eu quero que seja problema meu, essa alguma coisa é Layla. Ando em sua direção e tomo o seu braço no meu. Ela sorri e deixo o formato de seus lábios me hipnotizarem e tirarem minha mente completamente da discussão que ouvi. Sigo-a para fora do Castelo e deixo sua beleza tomar conta de mim.
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