XXIX. Recaída
Não pense que esqueci que você aceitou ser meu par no baile. Estarei na sua casa de terno amanhã. Eu juro que estarei bonito, meu nariz está quase recuperado.
OBS: desistiu da escola?
Arremessei o celular na cama, e fiz a mesma coisa com meu corpo. Já era sexta-feira. A semana havia passado extremamente rápido, em parte porque eu faltara às aulas praticamente todos os dias. Eu só punha os pés na St. Margaret para os ensaios da peça e voltava direto para casa, evitando todo e qualquer contato interpessoal. Não que eu realmente precisasse ensaiar, já que minha participação era mínima e eu passava a maior parte do tempo vendo Tobias e Henriette a contracenarem, mas porque eu era obrigada a comparecer. Quanto a Tobias, ele era um dos únicos que tinha se tornado ainda mais legal comigo depois daquilo tudo, provavelmente por influência de Cassie. Era ele quem me fazia companhia nos ensaios, e eu gostava da ideia de me dar bem com o namorado de minha amiga, era como se aquilo me desse alguns dos pontos que eu havia perdido por ser estúpida.
Eu estava evitando qualquer ser vivo que vestisse o uniforme da St. Margaret, mas estava concentrando todos os meus esforços em evitar qualquer garoto da minha lista. Fazia parte do meu plano de desintoxicação. Por isso, ao receber a mensagem de Christofer, minha reação foi murmurar "merda!" e enfiar a cabeça no travesseiro. A missão "Elizabeth Paz e Amor" estava sendo ameaçada por uma promessa do passado, uma que eu não tinha coragem para quebrar.
E eu precisava de um vestido e uma máscara.
Três lojas, vinte vestidos e milhões de fotos tiradas no provador e enviadas para Cassie depois, e eu estava começando a ficar preocupada. Havia odiado todos os vestidos, alguns mais que os outros. Eu vasculhava uma arara no fundo da loja quando o ouvi aquela voz.
- Precisa de ajuda?
Girei nos calcanhares, apenas para dar de cara com Matteo Caputo, com um terno apoiado no braço e a mesma expressão cínica no rosto. De todas as lojas da cidade! Que brincadeira sem graça o destino continuava a pregar. Suspirei, lembrando-me que ele havia se envolvido em uma briga para me defender e, somente por isso, eu deveria ser amável e cordial, mesmo que estivesse estressada porque não conseguia escolher um vestido e nem ter uma semana de paz.
- Preciso de um milagre, na verdade.
- Isso ainda está fora do meu alcance. Por enquanto - ele apoiou o terno em um puff e moveu para o fim da arara, vistoriando cada vestido - Ei, o que você acha desse?
- Aterrorizante - fiz uma careta, e Matteo retornou o vestido verde para o cabide.
- Que tal se você escolher alguns e eu der minha opinião depois, então? Já que eu claramente não agrado o seu gosto.
- Que tal se você experimentar seu terno e voltar para casa?
Okay. Meu ímpeto descontrolado acabara de estragar a trégua silenciosa a qual havíamos acordado. Matteo riu.
- Não preciso experimentar.
- Então que tal se você... for pra casa?
Ele deu alguns passos para frente, e eu tive que resistir ao instinto que me mandava dar alguns passos para trás. Àquele ponto, estávamos estranhamente próximos, e eu segurava os vestidos com dificuldade. Engoli em seco.
- Por favor! Eu estou tão entendiado - ele colocou uma mecha de cabelo atrás de minha orelha, sua mão roçando no meu rosto.
- Você pode... pode visitar a Leigh - dei um passo para trás - Meu pai deve estar trabalhando e a Lola não consegue ficar em um ambiente fechado por muito tempo. Ela deve estar sozinha em casa.
Eu sabia dessas coisas sobre minha outra família porque, desde a festa de Emma Barret, estávamos nos comunicando por mensagens de texto. Na maior parte, falávamos de coisas banais, mas aquilo já era um progresso e tanto em nossa relação. Pela primeira vez, não nos odiávamos secretamente.
- Ela me deu um pé na bunda - Matteo deu dois passos para trás, alargando a distância entre nós - Não quer nada comigo desde a festa.
Finja não se importar. Finja não se importar.
- E com quem você vai pro baile?
- Brianna - ele deu de ombros e voltou sua atenção para a arara, tirando um vestido vermelho - E esse?
Ele parecia perfeito, mas eu não queria admitir isso, então apenas respondi:
- Pode funcionar - dei de ombros, e ele abriu um sorriso de orelha a orelha.
- Então vamos - ele caminhou em direção ao provador, ainda com o vestido na mão, e não me restou outra opção senão segui-lo.
A funcionária esguia e ruiva que guardava os provadores nos lançou um olhar desconfiado assim que adentramos seu campo de visão. Não era difícil imaginar o que ela estava pensando, e os adolescentes daquela região não tinham uma reputação muito boa.
- Eu só estou aqui para dar minha opinião - Matteo a tranquilizou antes que ela precisasse falar qualquer coisa, e em seguida me entregou o vestido. A ruiva afastou-se, o bastante para nos dar alguma privacidade, mas não o suficiente para nos deixarmos sem supervisão.
Matteo esparramou-se no chaise longue a frente do provador, repousou o rosto na palma da mão e me encarou, como se dissesse "e agora?". Fechei a cortina atrás de mim sem dizer uma palavra.
- Com quem você vai para o baile? - ele quase gritou para que eu conseguisse ouvi-lo.
O primeiro vestido ficou folgado. Abri a cortina, segurando-o de modo que não deslizasse do meu corpo e me deixasse em uma posição desconfortável. Matteo respondeu apenas com uma careta.
- Com Christofer - fechei a cortina novamente, e segui para o próximo vestido.
- Pensei que ele tivesse morrido depois da briga. Ele nunca mais apareceu nos ensaios da banda.
- Ele está muito bem, obrigada - abri a cortina em um rompante, revelando um vestido branco que, embora coubesse perfeitamente em meu corpo, parecia pertencer ao século passado - Por que a Leigh terminou as coisas entre vocês?
- Ela disse que não gostava do que estava se tornando desde que se mudou para a América, e eu era parte disso - ele balançou a cabeça negativamente, apontando para o vestido bufante - E porque eu não parava de olhar pra você na festa.
Fechei a cortina um pouco rápido demais ao ouvir aquilo, quase derrubando o varão. Eu podia ver no espelho que minhas bochechas estavam pegando fogo. Um silêncio constrangedor pousou sobre nós.
- E ainda bem que eu estava - Matteo continuou, ao perceber que eu não diria uma palavra - Senão o seu amiguinho teria muito mais do que um nariz inchado.
- O que você tem contra o Chris? - abri a cortina novamente, e dessa vez eu vestia o vestido vermelho que ele escolhera. Eu sabia que aquele seria o vestido no momento que me vi no espelho, mas a confirmação só veio quando percebi que Matteo mal sabia como reagir, parando na metade de uma palavra qualquer que iniciaria sua frase e sorrindo com os olhos.
- E então? O que achou? - provoquei.
Ele levantou, e andou ao meu redor com a desculpa de ver o vestido por todos os ângulos. Meu coração bateu ainda mais forte quando ele sumiu do meu campo visual, e eu conseguia apenas senti-lo atrás de mim, a respiração forte em meu cabelo. Fechei os olhos, tentando me concentrar. Elizabeth, você fez tanto progresso nessa semana! Não estrague tudo se envolvendo com o Caputo!
Mas quando eu senti sua mão afastarem meu cabelo e seus lábios tocarem meu pescoço, uma corrente de eletricidade percorreu o meu corpo e eu só conseguia pensar que eu queria aquilo há muito tempo.
E, quando eu virei e nossos lábios enfim tocaram, eu não conseguia pensar em nada.
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