Meu pai chegou de manhã cedinho. Quando mamãe me acordou anunciando a notícia, com cara de poucos amigos, eu nem pensei em nada e desci as escadas correndo, ainda de pijamas, deixando Cassie na cama. Papai mantinha o mesmo ar de galã que tinha nas fotos antigas com mamãe, mas agora o cabelo loiro estava sempre cuidadosamente penteado para trás com gel, não havia nem um resquício de barba no rosto e algumas rugas rodeavam seus olhos azuis. Me joguei nos braços de dele antes que pudesse dizer qualquer coisa. Estava tão feliz!

- Não sei se minhas costas ainda aguentam isso, Liz! - ele riu enquanto me colocava no chão - Como você cresceu nesses últimos tempos! Você está linda; ela não está linda?

Só percebi a existência de Lola e Leigh Anne quando meu pai direcionou a pergunta a elas, provavelmente em uma tentativa de me fazer cumprimentá-las. Lola parecia não ter envelhecido um dia desde que eu a vira pela última vez, mas eu sabia que aquilo era devido as constantes aplicações de botox; seu rosto já havia até se tornado inexpressivo. Leigh Anne, no entanto, estava quase irreconhecível: havia pintado o cabelo de rosa e parecia não penteá-los há séculos, havia emagrecido muito e usava uma maquiagem escura demais para aquela hora da manhã; muito diferente da garota loira delicada e perfeita que eu vira há 1 ano. Pensei que talvez tivesse relação com o tal papel no filme irlandês. Elas concordaram com papai e eu as cumprimentei.

- Eu já falei com a sua mãe - meu pai virou para mamãe e eu jurava ter visto a loira revirar os olhos - e hoje teremos a tarde só para nós!

- Eu tenho tanta coisa pra te contar! - deixei um gritinho de alegria escapar. Eu estava na ponta dos pés.

- Nós também temos! Mas agora você tem que se arrumar se não quiser perder aula. Te pegaremos na escola quando as aulas acabarem.

Meu sorriso vacilou. Eu não tinha percebido que o "nós" de papai significava ele, Lola, Leigh Anne, e não uma tarde de pai e filha. Embora isso me deixasse levemente desapontada, nada seria capaz de roubar minha felicidade naquele dia.

O dia passou tão rápido que me surpreendi quando percebi que tinha que ir para a entrada do colégio se não quisesse deixar meu pai esperando. Meu pai iria me buscar na escola! Meu pai! Tudo bem que ele estava alguns anos atrasados, e essa experiência teria sido muito mais mágica se ele tivesse feito isso quando eu ainda era uma criança, mas eu tentava nem ligar para esses pensamentos.

Estive evitando o capitão do time de futebol desde que ele resolvera que era uma boa ideia declarar sua paixão por mim em um encontro que possivelmente era o pior de toda a minha vida, mas naquele dia percebi que se quisesse descobrir se Steve era ou não meu o meu namorado - porque algo naquela declaração atrapalhada acendera em mim uma empatia que não existia antes e eu percebi que era possível, sim, gostar de Steve Reynolds -, precisaria falar com ele. Então, entre uma aula e outra, fiquei em sua frente enquanto ele pegava o caderno surrado no armário e elogiei veemente sua participação no jogo da noite anterior - que eu não tinha assistido, mas tinha decorado tudo o que haviam me falado sobre - e até o abracei. Se Steve fosse meu namorado, aquilo era nada mais do que um esforço para que nosso relacionamento desse certo; se ele não fosse o meu namorado, no entanto, eu estava brincando com os seus sentimentos de uma maneira baixa.

Assim como estava com Ben Navarro. Entre uma ligação raivosa de seu pai e outra, Cassie me dissera na noite passada que ele comentara que havia se surpreendido positivamente comigo no dia do Prince of Wales, então, na hora do almoço, simplesmente sentei ao seu lado e perguntei qual era o seu top 5 melhores filmes de terror de todos os tempos. Percebi que todo mundo da mesa segurou a respiração quando eu me juntei a eles como se fosse nada, menos Benjamin, que apenas sorriu e começou a falar sem parar sobre milhões de filmes até finalmente resumir em cinco. Jurei que os assistiria e daria minha opinião sincera antes de levantar e ir para a minha mesa de costume.

E agora ali estava, checando o relógio do celular a cada segundo enquanto morria de ansiedade esperando por meu pai. Até que ele finalmente chegou.

- Adivinha para onde estamos indo! - ele me olhava pelo espelho enquanto eu me posicionava ao lado de Leigh Anne no banco de trás. Ela estava especialmente assustadora hoje.

- Não faço ideia!

- Ao Big John! - papai e Lola anunciaram em uníssono, muito felizes.

Big John era o meu restaurante favorito de toda a cidade. Quando eu tinha oito anos. Mais uma vez, ignorei o fato de que meu pai não conhecia meus gostos atuais em nome da alegria que estava sentindo e agradeci como se aquele fosse realmente o melhor local do mundo todo, e como se eu tivesse frequentado o Big John todos os dias nos últimos seis anos, quando na verdade era o oposto.

O restaurante estava completamente diferente do que eu lembrava. As cadeiras coloridas tinham sido substituídas por cadeiras pretas, as mesas agora eram de madeira e toda a decoração que costumava ser tão exótica e cheia de alegria que seria capaz de queimar nosso olhos agora tinha um tom monocromático morto. Nada era como antes.

- E então, quais são as novidades? - meu pai perguntou, assim que fizemos nossos pedidos.

- Fiz um teste de audição para a peça do ano ontem - escondi minhas mãos embaixo da mesa, porque sentia que elas poderiam começar a tremer a qualquer segundo - e fui escolhida para o papel da ama de Julieta. Não é nenhum filme irlandês - lancei um sorriso para Leigh Anne, que me olhava inexpressiva -, mas já é um avanço para mim. Vai ser a minha primeira vez no palco.

- Uau! Então essa é uma refeição de comemoração! - papai pareceu tão empolgado que só poderia ser uma reação falsa.

- Isso é maravilhoso! Sabia que eu fiz alguns trabalhos como atriz quando era mais jovem?

- Não acho que ser figurante em séries de investigação criminal conta como trabalho, mãe - era a primeira vez que eu ouvia a voz de Leigh Anne no dia.

- Minhas duas meninas são atrizes! - ele colocou uma mão em meu ombro e outra no da garota de cabelo rosa - A Leigh aqui já está indo para o seu segundo filme. Conta pra ela, Leigh!

Leigh começou a dizer que não era nada e que ela provavelmente nem deveria estar falando do projeto, mas meu pai e Lola insistiram tanto que infelizmente ela aceitou falar sobre.

- É um remake de um filme húngaro de 1970 - me perguntei como ela poderia parecer tão entediada o tempo todo, mesmo quando estava falando sobre um filme em que atuaria -, mas pelo ponto de vista da mulher. A obra visa despertar o debate sobre a liquidez das relações e do lugar da mulher na sociedade atual - Leigh deu de ombros e coçou o olho, borrando a maquiagem preta como se fosse nada - Vai ser legal.

- Ah - foi a única coisa que consegui dizer. Eu me sentia inútil.

Todo o nosso tempo no Big John seguiu o mesmo padrão. Eu contava alguma coisa inexpressiva que acontecera na minha vida, Sebastian e Lola pareciam animados até demais com minha conquista e então a melhor filha falava de algo infinitamente maior como se fosse a coisa mais comum do mundo. Tive vontade de matá-la quando ela narrou um encontro romântico com um ator famoso como se ela tivesse saído com o atendente do Walmart. E o pior: tudo aquilo com um sotaque britânico como se ela fosse a rainha da Inglaterra.

Até que meu pai deixou escapar a bomba; o motivo pelo qual eles estavam ali em primeiro lugar. E não era eu.

- É bom ver que vocês estão se dando bem - ele disse, quando me viu comentando educadamente uma das histórias da minha meio-irmã. Eu não chamaria aquilo de se dar bem - A Leigh Anne está passando por um momento... difícil. Ela foi expulsa da escola e eu pensei que essa fosse a oportunidade perfeita para que minhas meninas finalmente se conectassem. A St. Margaret's é a única escola de elite que me ama o suficiente para aceitar um aluno expulso no meio do semestre.

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OLAAAAAAAA! É QUARTA-FEIRAAAAAA!

O que acharam da Leigh Anne? Ela é um personagem importante para a história, com ela a gente pode entender um pouco mais sobre as inseguranças de Liz e a relação com o pai.

Espero que estejam gostando... Até a próxima quarta!!