Capítulo 4

Está manhã meu café foi servido no quarto. Tinha alguns papeis para ler e analisar, e se não começasse logo isso acabaria acumulando, já que fugir não era uma opção. Ser príncipe e futuro rei tinha seus prós e contras.

Suspirei baixo ao finalmente terminar de ler a última folha das várias que estavam esparramadas sobre a cama. Fiz as últimas anotações na agenda e juntei todos os papeis, colocando novamente dentro da pasta. Levantei e a deixei sobre a escrivaninha.

Olhei o relógio em meu pulso e reparei que já estava na hora de descer ao escritório do rei. Dois assessores viriam ao palácio hoje para nos informarem como seria o começo da construção da escola no centro da província.

Quando era hora do almoço as criadas trouxeram os pratos e almoçamos no escritório mesmo, entre os vários papeis. Já era quase noite quando meu pai finalmente nos dispensou.

Suspirei baixo passando a mão pelos cabelos enquanto saia do escritório, indo em direção à escada. Queria apenas tomar banho e descansar, mas estava em meio a um grande projeto, a escolha da minha esposa e futura rainha de Thompson.

Vi uma das criadas e a parei perguntando onde as garotas estavam agora. Ela informou que era no salão principal e pedi que convidasse Alisson para um passeio em minha companhia.

Esperei perto da porta principal do palácio com mãos nos bolsos da calça enquanto olhava distraidamente para meus pés. Tinha folheado a ficha de Alisson hoje pela manhã. Lembrava de vê-la conversando com Mabel e pareia ser uma garota legal.

— Príncipe. –— Ouvi alguém chamar.

Virei e encontrei a garota baixa parada a alguns passos de distância. Ela fez sua reverência e me olhou com um bonito e discreto sorriso.

— Como vai? — Perguntei oferecendo o braço.

— Muito bem e o senhor? — Alisson timidamente o aceitou.

— Creio que não seja tão velho assim, então pode me chamar de você. — Corrigi vendo seu sorriso constrangido — Respondendo sua pergunta... Estou bem, obrigado.

— Que bom. — Sussurrou.

— Pensei em darmos um passeio. — Comentei enquanto saíamos do palácio.

— Ó, seria ótimo. — Concordou.

Começamos a andar em direção ao lado esquerdo do palácio, onde mais à frente ficava o celeiro com alguns cavalos treinados para a realeza.

— Ouvi dizer que gosta de andar a cavalo. — Comentei a olhando rapidamente.

— Sim, faço aulas desde pequena. — Explicou dando de ombros — Eu gosto, isso me acalma.

— Podemos andar um dia desses. — Sugeri e ela assentiu concordando, parecendo realmente animada.

— Seria bom. — Sorriu.

Quando enfim chegamos, soltei gentilmente seu braço e abri as portas duplas de madeira. Dei alguns passos para dentro do celeiro e Alisson prontamente me seguiu. Os cavalos começaram a fazer barulhos de relincho e assoviei para que se acalmassem.

Como esperava assim que ouviram o sinal eles imediatamente fizeram silêncio. Sorri virando para Alisson, que tinha o olhar surpreso e admirado.

— Nossa... — Murmurou parando ao meu lado.

— Temos um bom adestrador. — Comentei dando de ombros.

— Posso? — Pediu andando até perto das baias.

— Claro. — Concordei e a vi passar a mão pela crina de um dos cavalos.

Alisson parecia ser um a garota meiga, quase que infantil. Tinha certa inocência no olhar e isso era bom e ruim. Bom porque crianças eram puras no modo de pensar e agir, e ruim porque podiam ser facilmente enganadas e iludidas.

Ficamos ali por algum tempo. Fomos de baia em baia, conversando sobre experiências em montaria e contando algumas histórias. Alisson era divertida e me fazia dar risada com certa frequência. Acho que era a espontaneidade dela que fazia isso, o que me fez entender porque se dava tão bem com Mabel. As duas não fingiam ser algo, só eram elas mesmas, independentemente de onde e com quem estivessem.

— Isso me preocupa um pouco. — Alisson confessou com a testa franzida.

Nós falávamos sobre os recentes ataques a algumas províncias perto da nossa. Uma matéria tinha saído no jornal. Nela algumas precauções eram explicadas e nós pedíamos que nosso povo tomasse cuidado. Já estávamos fazendo medidas de segurança, mas com a ajuda deles seria ainda mais eficaz.

— Nós estamos cuidando disso, não se preocupe. — Assegurei sorrindo para tranquiliza-la.

Andamos mais um pouco pelo jardim, até que vi Alisson encarar fixamente algo a nossa frente. Segui seu olhar e encontrei com Mabel, que estava acompanhada de um dos guardas do palácio. Franzi a testa e diminui o ritmo dos nossos passos enquanto chegávamos mais perto do casal.

— Mabel? — Alisson a chamou fazendo com que os dois se virarem em nossa direção.

Mabel parecia um pouco assustada, quem sabe surpresa, enquanto nos encarava em silêncio. Já eu revessava o olhar entre ela e o guarda.

Não tinha nenhuma regra que proibisse que as garotas andassem pelo palácio, isso incluía o jardim e qualquer outro lugar dentro dos murros dele. Sabia que tínhamos guardas espalhados, afinal eram eles que faziam a segurança, mas também não tinha motivos aparentes para que esses se relacionassem com as garotas.

Ok, pode ser exagero, na verdade, não tinha problema em elas conversarem com outras pessoas, criadas, guardas ou sei lá, mas meu problema era especificamente com Mabel. Realmente não gostei de vê-la com o tal guarda. Sim, é idiota, eu sei. Me julguem, mas não conseguia raciocinar isso com razão agora. A única coisa que vinha a minha mente era: Saia de perto dela seu guarda idiota! Nada educado, mas como já disse, não estava conseguindo ser racional.

— Olá Alisson... Príncipe... — Mabel fez uma pequena reverência.

— Alteza, — O guarda cumprimentou também fazendo sua reverência — A senhorita Mabel estava sozinha no jardim e como é tarde resolvi acompanha-la de volta ao palácio. — Explicou diante do meu olhar, que não devia ser nada amigável.

— Entendo. — Desviei os olhos dele e encarei a garota morena ao seu lado — Não devia ficar sozinha no jardim Mabel. — Constatei em tom de repreensão.

— Não estava sozinha. — Olhou de relance para o guarda.

Afinal o que ele ainda estava fazendo ali? Será que tinha que desenhar que não o queria perto dela? Contive a vontade de falar isso e mordi discretamente à língua.

— É perigoso. Thompson é um lugar calmo, mas como estava falando com o príncipe, os ataques ás províncias vizinhas me deixam preocupada. — Alisson explicou olhando para Mabel — Não sabemos quando chegará aqui. — Completou me olhando rapidamente.

— Não estava sabendo disso. — Mabel sussurrou me olhando.

— A segurança de vocês é minha responsabilidade e me preocupo com todas. — Afirmei com seriedade.

— Ok. Desculpe! — Sussurrou e assenti concordando.

— Estava levando Alisson até o quarto, mas acho que pode ir com Mabel, certo? — Sugeri olhando para Alisson.

— Claro. — Sorriu — Vamos Mabel? — Chamou soltando meu braço e indo até ela.

— Sim. — Concordou.

— Até mais tarde. — Dei um sorriso gentil e assim que já as duas garotas já tinham ido, olhei o nome bordado no uniforme do guarda — Jerremy, você está dispensado. Pode voltar ao serviço. — Avisei com seriedade.

— Com licença. — O guarda rapidamente se despediu fazendo reverência e voltou ao jardim.

Quando estava enfim sozinho suspirei alto e passei as mãos pelo cabelo. Só faltava isso mesmo. O que é que estava acontecendo comigo agora? Essa reação ao ver Mabel com o guarda. Jerremy, pensei em seu nome com certa raiva.

Isso não era normal e não podia deixar que acontecesse novamente. Logo eu que tinha repetido na cabeça, várias e várias vezes, que não faria nada precipitadamente. Que essa convocação seria calma e pensada, sem impulsos malucos e nem atos inapropriados.

Bufei alto e neguei com a cabeça. Até parece que conseguiria mesmo isso. Estava mais do que claro que seria uma completa loucura.

Voltei ao palácio e subi a escada, seguindo até o quarto. Tomei um banho rápido e me vesti. Era quase hora do jantar e meu estômago estava roncando. Sai do closet ainda tentando arrumar os cabelos e ouvi uma batida na porta. A abri e encontrei meu pai parado do lado de fora, no corredor.

— Posso entrar? — Pediu e assenti concordando enquanto dava espaço para que ele passasse.

— Aconteceu algo? — Questionei a fechando novamente e virando para olha-lo.

— Não, tudo certo. — Negou sorrindo — Quero saber como estão às coisas com as garotas.

— Ah, — Murmurei pensativo — Acho que estão tranquilas, por enquanto. — Expliquei dando uma risada baixa — Já estive a sós com duas delas.

— Mesmo? E... — Incentivou.

— Tenho a impressão de que as coisas estão tomando seu rumo. — Comentei pensativo — Algo me diz que vai realmente dar certo.

— Que bom filho. Estou torcendo muito por isso. — Confessou andando em minha direção e colocando a mão sobre meu ombro — Alguma pretendente em vista já?

— Quem sabe. — Dei de ombros.

— Sua mãe ficará eufórica em saber disso. — Afirmou dando uma risada baixa.

— Posso até imaginar. — Sussurrei revirando os olhos.

Minha mãe ficaria curiosa assim que soubesse que já tinha alguma preferida. Sabia da sua preocupação com tudo isso, não só como rainha, mas principalmente como mãe.

— Vamos descer? — Chamou e assenti concordando.

Descemos ao salão das refeições e encontramos minha mãe já a mesa. Ela conversava baixo com Jason e dava risada, com certeza de alguma besteira que ele tinha dito. Desde que seus pais morreram nós o considerávamos da família, meus pais tinham praticamente o adotado como filho e eu como irmão, é óbvio.

Dei um beijo na testa da minha mãe e apertei o ombro de Jason, sentando ao seu lado. Tinha terminado de me acomodar quando ouvi o barulho dos saltos batendo contra o piso do palácio.

— Majestades. — Verônica sorriu entrando no salão junto com as garotas.

Elas fizeram a reverência e sentaram em seus lugares. Alguns poucos minutos depois o jantar foi servido e começamos a comer.

As garotas conversavam baixo entre si e percebi que elas já tinham criado alguns laços de amizade, verdadeiros ou não, mas estavam interagindo mais. Fatalmente e já como o esperado, meus olhos caíram sobre a morena que andava perturbando minha mente. Mabel estava quieta e parecia concentrada na conversa das garotas ao seu lado.

Depois de satisfeitos a sobremesa foi servida e a comi com calma, me deliciando. Assim que terminamos Verônica deu à deixa as garotas, que levantam e se despediram seguindo aos seus quartos.

Quando já estávamos sozinhos no salão senti alguém colocar a mão sobre a minha. Olhei para frente encontrando com o sorriso calmo de minha mãe.

Dei boa noite aos meus pais e sai do salão acompanhado de Jason. Subimos a escada e quando estávamos no segundo andar me despedi dele, que sorriu dando uma piscada marota.

— Juízo hein. — Brincou dando uma risada baixa.

Revirei os olhos em desdém e segui pelo corredor. Parei novamente em frente à porta do quarto de Mabel e dei duas batidas. Então nem um minuto depois ela já a abria e a primeira coisa que vi foram os olhos cor de mel que tanto me encantavam. Mabel estava surpresa, com certeza não esperava que a procurasse há essa hora e em seu quarto.

— Oi. — Sorri levemente.

— Oi... Entre. — Indicou o quarto.

— Obrigado. — Agradeci entrando.

— Você quer algo? — Questionou.

— Sim... Vê-la. — Confessei encarando seus olhos.

— Já nos vimos hoje. — Sorriu levemente e neguei com a cabeça.

— Não do jeito que eu queria. — Sussurrei.

Estava com mania de falar as coisas sem pensar quando estava perto dela. Será que isso era contagioso? Tinha pegado isso de Mabel?

— Que jeito? — Me olhou intensamente.

Caminhei devagar e parei a sua frente, ainda encarando seus olhos. Mabel mordeu o lábio inferior e imediatamente minha atenção foi para sua boca, que parecia extremamente convidativa. Toquei seus lábios gentilmente e os massageei, lutando com todas as forças para não fazer nada impulsivamente.

— Não devia fazer isso. — Repreendi.

— É mania. — Explicou me fazendo sorrir e negar com a cabeça.

Com cuidado entrelacei nossos dedos. Mabel baixou os olhos para nossas mãos agora unidas e depois os levantou novamente, encontrando com os meus.

— Acho que fui meio rude com você hoje. — Confessei fazendo uma careta.

Desde que saímos do jardim onde encontrei Mabel com o guarda, sentia que devia um pedido de desculpas. Acabei sendo rude demais quando a repreendi, mas não estava raciocinando muito logicamente naquele momento.

— Rude? — Franziu a testa.

— La fora... No jardim. — Expliquei.

— Tudo bem. Entendo sua preocupação com todos nós. — Deu de ombros.

— Não. — Neguei e ela me olhou confusa — Fui um pouco rude sim, mas é que me preocupo demais com você Mabel. Não quero nem imaginar se algo acontecesse com você. — Confessei negando com a cabeça, mas dessa vez com os olhos fechados.

— Têm guardas por todo o jardim. — Lembrou me tranquilizando — Jerremy disse que são feitas rondas sempre.

Jerremy... — Repeti o nome, me lembrava dele de algum lugar.

— O guarda. — Explicou e assenti concordando.

Sim, o guarda, o mesmo que tinha me feito desejar que estivesse a quilômetros de distância de Mabel. Precisava rever a posição deles pelo jardim, isso era um fato.

— Então vocês conversaram. — Comentei pensativo.

O que teriam conversado? Ela não tinha dito nada antes sobre eles terem ficado algum tempo juntos, por menor que fosse. Mabel disse apenas que o guarda a acompanhou pelo jardim para que estivesse em segurança.

— Nada demais. — Deu de ombros.

— Mesmo assim... Ainda não sabemos muito sobre estes ataques e todo cuidado é pouco. — Avisei a olhando sério.

— Tudo bem. Vou tomar cuidado, prometo. — Assegurou levantando sua mão e oferecendo o dedo mindinho.

Olhei para ela de forma interrogativa. Porque Mabel estava oferecendo o dedo? Era para eu pega-lo? O que faria com ele? Percebendo meu olhar confuso Mabel segurou minha mão e engatou nossos dedos.

— Isso quer dizer que temos um acordo. — Explicou me fazendo sorrir e olhar nossos dedos ainda engatados.

— Você sempre me surpreende. — Comentei.

— E isso é bom? — Perguntou.

— É sim. Muito bom, afinal nada óbvio é legal. — Pisquei fazendo um lindo sorriso surgir no seu rosto.

— Se você diz. — Deu de ombros.

— Então estou perdoado? — Sorri de canto.

— Sim Alteza. — Fez uma pequena reverência.

— Não, você não. — Bufei baixo e revirei os olhos.

Tudo o que menos precisava era ela me tratando com formalidades.

— O que? — Deu risada.

— Nada de Alteza, ok? Só Alexander. — Pedi e Mabel assentiu concordando.

— Sim... Alexander. — Corrigiu.

Isso. Apenas Alexander e Mabel. Esse era o certo. Nós dois.

— Bem melhor, a propósito... Você está linda. — Elogiei fazendo com que ela corasse.

— Obrigada. Lucia sabe o que faz. — Sorriu timidamente.

— Lucia? — Franzi a testa, não sabendo a quem se referia.

— Minha criada. — Explicou.

— Claro. — Sorri e lembrei de já ter visto uma das criadas saindo de seu quarto — Ela é boa, mas a modelo ajuda. — Pisquei.

— Ok, já pode parar com isso. — Andou até sua cama e sentou na beirada.

— Ah, acabou com a diversão. — Brinquei enquanto sentava ao seu lado.

— Trágico. — Debochou me fazendo dar uma risada alta dessa vez.

Ficamos em silêncio por alguns minutos. Mabel olhava para seus pés, parecendo pensativa.

— Sábado tenho que mandar uma das garotas para casa. — Comentei de repente.

— É. Fiquei sabendo. — Sussurrou — Deve ser uma situação ruim.

— Sim. — Concordei quase em um sussurro.

— Já sabe quem? — Questionou.

Pensei naquilo por alguns minutos e percebi que independente da minha escolha, uma certeza eu tinha, a de que não seria Mabel. Havia uma possibilidade em minha cabeça, mas a pensaria melhor até o dia da eliminação.

— Acho que sim. — Comentei a olhando.

— Entendi. — Murmurou.

Suspirei baixo e peguei novamente sua mão, beijando o dorso.

— Tenho que ir. — Avisei levantando.

— Te acompanho. — Se levantou também e me levou até a porta.

— Boa noite e não esqueça sua promessa. — Sorri.

— Pode deixar. — Revirou os olhos.

— Durma bem, Ma Belle. — Coloquei uma mecha solta do seu cabelo atrás da orelha.

Então sem que esperasse Mabel se aproximou e beijou minha bochecha.

— Durma bem Alexander. — Sussurrou já se afastando novamente.

Não consegui conter um sorriso e ainda com ele no rosto acenei para Mabel e sai ao corredor. Caminhei com calma e subi a escada, seguindo até meu quarto. Entrei e fechei a porta, indo até o banheiro. Parei em frente ao espelho e me apoiei à bancada, encarando meu reflexo.

Meus olhos tinham certo brilho, contido, mas perceptível. Toquei a bochecha lembrando de seus lábios ali, desejando internamente que um dia eles estivessem junto aos meus. Sim, as coisas definitivamente estavam andando mais depressa do que pensava, mas quem sabe fosse para ser assim. Estava começando a acreditar mesmo nesse negócio de destino.

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