Capítulo 21

O jantar tinha terminado e depois dele nós homens fomos todos até o escritório, e isso incluía Nolan e Jason. Lá conversamos um pouco sobre os ataques. Nada relevante de verdade, apenas para mantermos as aparências, já que se do nada nós parássemos de falar sobre isso eles com certeza desconfiariam.

Quando terminamos, nos despedimos e subi a escada rapidamente. Precisava de um banho quente para aliviar os músculos tensos do meu corpo.

Estava no segundo andar, quase subindo ao terceiro quando ouvi a voz já bem familiar. Virei olhando para o corredor e me deparei com as duas figuras paradas quase no meio, conversando baixo.

— Mabel? — Chamei dando alguns passos em direção a ela e o guarda.

Rapidamente os dois se desfizeram do abraço e viraram em minha direção. Olhei de um para o outro com o a testa franzida e cerrei as mãos em punho ao lado do corpo, meu maxilar travado para conter o impulso de cometer alguma burrada.

Mabel era uma garota incrível e mais do que natural a olharem com 'outros olhos'. Isso me deixava meio inseguro sim, mas teria que aprender a lidar. Só não era tão fácil como pensei.

— Príncipe. — Mabel cumprimentou enquanto dava alguns passos para longe do guarda.

— Alteza. — O guarda fez sua reverência.

— Conseguiu notícias? — Perguntei a ela, mas com meus olhos ainda nele.

— Sim. — Concordou erguendo o envelope que só agora notei em suas mãos — Eles mandaram uma carta. — Explicou.

— Que bom. — Afirmei agora a olhando.

Meu quarto? — Sussurrou chegando mais perto.

Nossas mãos se tocaram e senti seus dedos desfazendo os nós dos meus.

— Obrigada de novo Jerremy. — Mabel agradeceu sorrindo levemente.

— De nada senhorita. — Fez reverência a nós.

— Está dispensado. — Avisei com seriedade.

O guarda assentiu concordando e virou, seguindo pelo corredor.

— Ei, — Mabel chamou a atenção, fazendo com que a olhasse — É só você que eu quero! — Afirmou tocando meu rosto com a mão livre.

Encarei seus olhos por algum tempo, até suspirar baixo e assentir concordando. Apertei levemente sua mão e beijei os lábios carinhosamente. Me surpreendendo Mabel ficou na ponta dos pés e prolongou mais o beijo, nossos lábios massageando um o do outro com calma.

Quando terminamos encostei nossas testas e toquei sua bochecha acariciando levemente.

— Você vêm? — Questionou se referindo ao convite anterior.

— Ganho um cafuné? — Fiz um pequeno bico manhoso.

— Quantos quiser. — Prometeu sorrindo.

Mabel me puxou pelo corredor e seguimos juntos até seu quarto. Ela sentou na cama e deitei com a cabeça em seu colo, lendo a carta que seus avós tinham escrito.

Sabia que eram bem unidos e era perceptível o amor entre eles. Mesmo através de palavras escritas em uma carta conseguia notar o carinho e preocupação com Mabel

Fiquei ali em seu quarto até certo momento da madrugada. Então depois de algumas sessões de beijos resolvi que já era hora de ir, afinal, não seria nada legal sermos pegos juntos, ainda mais com todas essas coisas acontecendo agora em nossa província.

***

Deixei o jornal sobre a mesa do escritório. Nele tinha uma matéria sobre o ataque ao palácio: "Atentado ao palácio: Quando estaremos seguros?".

Não queria que o povo ficasse preocupado com a segurança, mas também não os queria desatentos, por isso resolvi tomar algumas 'medidas de segurança' junto com Felix, o chefe da guarda. Coisas como, manter suas portas e janelas fechadas após as dez horas da noite. Além de evitar andarem sozinhos nas ruas tarde da noite, entre outras coisas, e para finalizar avisava que guardas circulavam pela província caso algo suspeito acontecesse.

Não tinha muito mais a ser feito, não por enquanto, pelo menos até pegarmos Nolan e Jason. O que seria logo. Já tinha certo em minha mente o que faria. Iria seguir Nolan hoje quando estivesse voltando a sua província, se é que estava mesmo voltando, mas isso nós descobriríamos.

Félix tinha acabado de sair do escritório e combinamos de que ele escolheria alguns guardas da sua confiança para irem comigo nessa caçada.

Ouvi batidas a porta que logo já se abria. Victor colocou a cabeça para dentro e fiz sinal para que entrasse.

— Precisava conversar com você. — Avisou vindo até a mesa e sentando a minha frente.

— Diga. — Incentivei.

— Sobre Nolan estar partindo hoje... Não podemos deixa-lo simplesmente ir. — Negou com a cabeça.

— Também acho e já tenho uma ideia. — Confessei e Victor se inclinou me olhando mais atentamente.

Contei tudo que planejei com os guardas. Seriam poucos tecnicamente, mas suficientes, afinal não queria chamar a atenção. Iriamos segui-lo, ver para onde ia e se estava dizendo mesmo a verdade sobre a província, e caso a situação piorasse iriamos agir mais efetivamente. Victor ouviu tudo e no final assentiu concordando.

— É uma boa ideia. — Comentou pensativo — Acho que dará certo e se estivermos mesmo com razão, Nolan nos levara diretamente ao rei.

— É o que espero. — Confessei me recostando a cadeira.

Ouvi novamente batidas na porta e então uma criada entrou avisando que o café seria servido. Eu e Victor seguimos para o salão das refeições e assim que entramos vi as garotas já ali, bem como minha mãe e Verônica. Sentamos em nossos lugares e alguns poucos minutos depois Nolan, Ian e Jason entravam também, e enfim o café foi servido.

Percebi que minha mãe quase não comida e suspirei baixo pensando que isso era temporário, se dependesse de mim não passaria de hoje.

Quando terminamos as garotas pediram licença e saíram. Acompanhei Mabel e Alisson com os olhos, mas não podia falar com elas agora, precisava acertas com os guardas o que faríamos.

Levantei da mesa e pedi licença, dizendo que resolveria um assunto e logo os encontraria no escritório.

— Partirei em breve e espero poder me despedir. — Nolan avisou quando passei por ele na mesa.

— Claro, não deixaria que fosse o contrário. — Afirmei colocando minha mão sobre seu ombro.

Sai do salão a passos rápidos e segui para a frente do palácio. Lá Félix me esperava junto com mais seis guardas, eles fizeram reverência e retribui com um aceno de cabeça.

— Já os coloquei por dentro do plano. — Avisou e assenti — São meus melhores homens, garanto que conseguiremos alcançar o objetivo.

— Ótimo. Preciso da total dedicação de vocês, o rei precisa. — Olhei para cada um deles.

Os guardas assentiram concordando e combinamos que ficariam a postos. Não sabia o momento exato em que Nolan iria partir, mas eles estariam perto do palácio e preparados para segui-lo.

Voltei para dentro, indo direto ao escritório. Lá encontrei com os outros que estavam sentados bebendo e conversando. Aparentemente descontraídos, mas podia ver os olhos atentos de Victor sobre Nolan, que parecia ou fingia não notar.

— Aí está ele. — Jason ergueu seu copo como se brindasse.

Segui até o aparador e peguei uma dose de uísque também. Andei até perto deles e dei um generoso gole. A bebida descendo ardente pela minha garganta.

— Estávamos conversando sobre o sequestro do rei. Não está achando tudo muito quieto? — Ian comentou pensativo.

— Sim, está mesmo, — Concordei e queria poder contar tudo a Ian, mas não era o momento — Mas já tomei providências. — Dei de ombros — Tenho guardas à procura de pistas e estamos em alerta para qualquer contato, ou mediação.

— Além de que vou mandar mais guardas para ajudar Thompson. — Nolan avisou sorrindo.

Assenti concordando e contive a vontade de revirar os olhos debochadamente. Ridículo!

— Sim e agradeço sua ajuda. — Sorri levemente.

— Partirei depois do almoço. — Avisou.

— Agradecemos a visita. — Fiz um pequeno aceno de cabeça.

Troquei um olhar rápido com Victor que assentiu uma única vez, entendendo o que silenciosamente quis lhe dizer: Nós iremos pega-lo!

Quando era hora do almoço nós seguimos até o salão, onde as garotas e a rainha já estavam sentadas a nossa espera. Fui até minha mãe e beijei sua testa carinhosamente.

— Sempre linda. — Sussurrei e ela sorriu levemente.

O almoço foi servido e comemos com calma. Minha mãe conversava baixo com Verônica. Já Jason confabulava com Ian e Nolan, e Victor apenas observava assim como eu.

— Bom, gostaria de pedir licença para me despedir formalmente de todos vocês. — Nolan falou ficando de pé e chamando nossa atenção — Estou voltando a minha província, pois preciso resolver algumas pendências, mas foi um prazer conhecer as senhoritas. — Sorriu calorosamente — Agradeço a estadia aqui e estou mandando guardas de minha província para ajudarem... Sei que logo acharemos rei Philliph. — Completou agora me olhando.

— Não precisa agradecer Nolan, sabe que é sempre bem-vindo. — Minha mãe sorria gentilmente, sem nem saber o que realmente se passava.

Nolan foi até a rainha e beijou sua mão, fazendo o mesmo em seguida com cada garota, inclusive com Mabel que deu um pequeno sorriso para disfarçar.

Depois disso Nolan pediu licença e saiu do salão, provavelmente foi pegar as malas, afinal logo partiria. Depois os outros saíram e as garotas foram as próximas. Percebi que Mabel permanecia para trás e então estávamos apenas nós dois no salão.

— É agora, não podemos deixa-lo ir. — Sussurrou.

— Já está tudo pronto. Victor e eu já organizamos tudo. — A tranquilizei.

— Ok e qual a minha parte no plano? — Questionou me olhando ansiosamente.

— A mais difícil, — Justifiquei encarando seus olhos — Ficar aqui... Quieta e em segurança. — Completei.

— O que? — Sua voz saiu um pouco alta e automaticamente Mabel tampou a boca com uma das mãos.

— Isso mesmo que você ouviu. — Confirmei.

Nisso Mabel não me driblaria. Hoje não conseguiria mudar minha ideia.

Ela não iria participar e ponto final. Pensei.

— Sem chances. — Negou com a cabeça.

— Bel, preciso me concentrar e só vai acontecer se você estiver em segurança. — Expliquei encarando o fundo dos seus olhos.

Queria que Mabel entendesse o meu ponto de vista naquilo. Precisava que estivesse em segurança. Pelo menos ela.

— Mas.... — Começou a argumentar.

— Por favor. — Pedi pegando suas mãos.

Mabel suspirou rendida e internamente comemorei por isso. Pelo menos essa eu tinha vencido. Sabia o quanto seria sofrido para ela ficar ali quieta, sem fazer nada. Teimosa do jeito que era.

— Tudo bem. — Concordou por fim, mas com um bico enorme de descontentamento.

— Obrigado. — Agradeci suspirando alto, aliviado — Minha mãe vai precisar de companhia.

— Como se Verônica e Bianca não estivessem aqui para isso. — Contestou.

— Você entendeu. — Apertei seu nariz em forma de brincadeira — Bom, tenho que ir. Nolan sai daqui a pouco e queremos ficar no seu alcanço.

Na verdade, tinha demorado mais do que pretendia e Victor já devia estar me esperando.

— Vão segui-lo? — Questionou.

— Sim. — Concordei beijando sua testa.

— Se cuida e... Volta inteiro para mim. — Sussurrou encarando meus olhos.

— Sempre. — Afirmei sorrindo.

Segurei seu rosto com as duas mãos e encostei nossos lábios. Nos beijamos por alguns minutos. Não estava me despedindo de Mabel, porque voltaria em pouco tempo, bem e com meu pai. Dei um último selinho demorado e então segui para fora do salão.

— Ele está indo. — Avisei Félix, que estava parado perto da porta de entrada.

Félix apenas assentiu concordando e saiu, indo em direção aos guardas escolhidos. Já eu voltei para dentro do palácio, me deparando com Nolan que descia a escada carregando sua mala.

— Então... — Parou a minha frente — Até. — Estendeu sua mão e a aceitei apertando com certa força.

Victor e Ian apareceram e também se despediram, Ian mais calorosamente já que não sabia de nada do que estava acontecendo.

Ian se prontificou em ir até o carro com Nolan, enquanto eu e Victor seguíamos para o salão principal e saiamos pela porta lateral, que dava ao jardim. Ali perto um carro preto nos esperava, dentro já estavam dois guardas e Félix.

— Vamos! — Exclamei quando vi que o carro de Nolan estava saindo do palácio.

Então assim que ele já estava a uma distância segura, aceleramos e começando a segui-lo.

Não conseguia desviar os olhos do carro mais ao longe. Passamos pela província e saímos dela. Entramos na estrada principal, que levava para fora de Thompson, pelo menos até fazer uma curva alternativa em uma rua de chão. Era mais esburacada e estreita, só passando um carro por vez.

— Onde Nolan está indo? — Sussurrei como um pensamento alto.

— Com certeza não é de volta para a província dele. — Victor comentou ao meu lado.

Notei que o carro começava a desacelerar, ou seja, Nolan estava chegando ao destino dele e consequentemente nós também.

— Chegamos! — Victor avisou quando o carro parou logo à frente.

Estávamos a uma boa e até grande distância, mas mesmo assim consegui ver quando Nolan saiu e andou em direção as árvores. Neste momento um homem estranho surgiu do meio delas e o encontrou. Eles apertaram as mãos se cumprimentando e então outro homem se juntou aos dois.

— Vou até lá. — Abri a porta do carro.

— Ficou maluco? — Victor puxou a porta do carro e a fechou novamente — Está na cara de que seu pai não está aqui.

Olhei para frente e vi Nolan ainda conversando com os dois homens. O que estariam falando? Onde meu pai estava? Olhei ao redor tentando encontrar alguma casa ou indicio de civilização por perto, mas não consegui.

— Ele está voltando. — Victor comentou.

Vi Nolan entrar novamente no carro e os dois homens sumirem por entre as árvores.

— Vamos continuar seguindo. — Avisei ao motorista, que assentiu concordando.

O carro de Nolan seguiu pela estrada e retomamos nosso caminho atrás dele. Quando passamos pela altura em que os dois homens tinham entrado tentei acha-los, mas não consegui, pois já tinham sumido no meio das árvores.

Então quase dez minutos depois nós vimos o carro de Nolan parando novamente, mas dessa vez ele estacionou perto de uma árvore grande. Nolan desceu junto com o motorista e juntos andaram mais para frente. Ele tinha uma pequena maleta nas mãos e conversava com o companheiro.

Sem esperar por Victor desci do carro e caminhei a passos rápidos atrás dos dois. Quando estava perto do carro deles olhei para o lado e encontrei com a casa velha em uma cor desbotada de amarelo. Meu pai estava ali? Coitado.

— Ok, vamos pensar no que fazer. — Victor comentou parando ao meu lado.

Estávamos quase atrás do carro em que Nolan veio. Félix também estava ali, junto com os guardas.

— Vamos nos separar. Vocês se espalham ao redor da casa, caso eles queiram fugir. — Olhei para os guardas, que assentiram concordando — Nós dois vamos entrar. — Avisei a Victor.

— Vou com vocês. — Félix avisou pegando a arma que estava em sua cintura.

— Ok. — Concordei pegando a outra arma que ele oferecia.

Hoje as aulas de tiro que tive desde os catorze anos me serviriam para alguma coisa. Pelo menos esperava que sim.

Os guardas já tinham se espalhado e camuflado muito bem, pois eu não sabia onde estavam exatamente.

— E lá vamos nós. — Victor sussurrou mais animado do que o apropriado para o momento.

Neguei com a cabeça e segurei a arma com mais firmeza nas mãos. Era agora.

— Com cuidado. — Avisei olhando para os dois.

Eles assentiram concordando e nós seguimos em direção a casa. Fomos a circulando, quase que pulando de árvore em árvore, até estarmos na parte lateral. Dei uma rápida olhada para Victor que sinalizou que iria pela direita e concordei já começando a seguir para a parte dos fundos. Quem sabe tivesse uma porta por ali.

Félix me seguiu, mas para nosso azar não havia nada ali, nem mesmo janelas, que dirá uma maldita porta. Suspirei alto e passei a mão livre pelos cabelos, tentando pensar no que fazer.

— Fumaça. — Félix avisou chamando a atenção.

Olhei para o teto da casa e percebi que saia uma quantidade relativa de fumaça, mas não podia dizer ainda se era a casa toda ou apenas um cômodo.

— Ache os guardas. — Pedia e Félix assentiu concordando, saindo rapidamente.

Dei a volta na casa novamente, mas dessa vez indo até a parte da frente. Agora a fumaça já era maior e saia pelo teto e janelas. A casa estava completamente em chamas. Se meu pai estivesse mesmo ali eu tinha que tentar tira-lo rápido.

Então antes que tivesse chance de chegar até a porta da frente ela já abria. Duas pessoas saíram, junto com uma grande quantidade de fumaça. Agora conseguia ver um pouco do interior da casa e o fogo que a queimava.

— Lorenzo. — Alguém chamou.

Victor praticamente carregava a outra pessoa e corri até eles para ajuda-los, reconhecendo então o outro homem. Era meu pai. Machucado e sujo, mas era ele. Vivo!

— Não! — Meu pai negou — Ela ainda está lá dentro.

— Ela? — Questionei sem entender.

— Mabel, está lá dentro ainda... Com Nolan. — Explicou indicando a casa.

— Mabel? — Olhei para a casa que estava sendo consumida pelas chamas.

O que ela estava fazendo lá se eu pedi para que ficasse no palácio em segurança? Porque Mabel tinha que ter esse espirito suicida? Sempre se metendo em alguma encrenca.

Suspirei alto e caminhei, ou melhor, corri até a casa. Subi os dois degraus da frente e respirei fundo antes de entrar no meio daquela fumaça. Não conseguia ver direito nada ali, mas parecia estar em uma sala, pois acho que aquilo mais ao canto era um sofá, ou algum dia já foi, afinal estava se decompondo pelo fogo.

Coloquei o braço em frente ao nariz e dei mais alguns passos para dentro. Ouvi um barulho alto ecoando e me assustei, recuando um passo. Parecia algo quebrando, algo grande.

— Mabel! — Chamei tossindo algumas vezes — Mabel! — Chamei novamente, agora entrando mais.

Precisava encontra-la logo, pois o fogo estava aumentando e a fumaça logo nos intoxicaria. Eu mesmo já não conseguia respirar direito.

Dei três passos e desviei de uma viga de madeira caída. Estava prestes a andar mais quando senti algo em minha perna. A princípio me assustei, mas então senti os dedos se fechando ao redor. Olhei para baixo e encontrei os cabelos escuros já bem conhecidos.

— Alexander! — Mabel sussurrou de forma quase inaudível.

— Vou te tirar daqui. — Avisei me abaixando e a pegando nos braços.

Mabel segurou em meu pescoço e encostou a cabeça ali. Caminhei rapidamente para fora da casa, afinal o calor era excessivo e as chamas ficavam cada vez maiores.

Praticamente corri até perto das árvores, onde coloquei Mabel sentada em um tronco que estava caído no chão.

— Tudo bem? — Me agachei a sua frente.

Mabel estava com os olhos fechado, mas assentiu concordando. Ficou assim alguns minutos, até abri-los novamente e me encarar.

— Estou bem. — Afirmou.

Me inclinei e beijei sua testa, para depois lhe dar um selinho demorado.

— Nunca mais faça isso. — Sussurrei.

— Desculpe. — Mabel sussurrou tocando minha bochecha.

— Nolan ficou lá dentro? — Victor questionou chamando nossa atenção.

Ele e meu pai estavam sentados perto de nós. O rei tinha o braço amarrado com um pano, onde provavelmente se machucou.

— Sim, acho que parte do teto despencou em cima dele. — Mabel explicou olhando para onde a casa terminava de pegar fogo.

— Melhor nós saímos daqui. — Jason se pronunciou pela primeira vez.

Nem tinha notado sua presença ali, pois estava um pouco mais ao longe, apenas nos observando.

'Nós'... — Repeti levantando e o olhando com raiva — Não existe um nós. Você é um traidor. — Acusei dando um passo em sua direção.

— Alexander. — Mabel chamou fazendo com a olhasse — Vamos sair daqui e resolver tudo com calma... Por favor.

Olhei novamente para Jason e depois para Mabel, suspirando rendido.

— Tudo bem. — Concordei por fim — Você não merece, mas minha mãe me ensinou que temos que ser melhor do que os outros... Não vou me igualar a você. — Respirei fundo.

— Entendo sua raiva, — Jason concordou — Mas você vai me entender, pelo menos espero que sim.

Duvidava muito disso. Não estava disposto nem a ouvi-lo, que dirá entende-lo. Por mais que minha curiosidade estivesse aguçada com tudo isso, não sei se queria ouvir seus motivos. Me sentiria ainda mais traído.

— Vamos então. — Victor chamou enquanto ajudava o rei a levantar.

Assenti concordando e ajudei Mabel a levantar. Assim que ela estava de pé ouvi seu gemido baixo e imediatamente olhei sua perna, onde tinha um corte que sangrava. Merda!

— Você está machucada. — Constatei o óbvio e me abaixei a sua frente.

Toquei sua perna gentilmente e analisei o corte. Não era profundo, mas com certeza devia doer.

— Não foi nada demais. — Tranquilizou-me.

— É claro que foi. — Afirmei levantando.

Rasguei um pedaço da barra da minha camisa social e a enrolei em sua perna, em um curativo improvisado.

— Isso deve resolver, — Comentei — Pelo menos até chegarmos ao palácio.

— Obrigada. — Agradeceu sorrindo levemente.

Me inclinei e beijei seus cabelos.

— Vem. — A peguei no colo.

— Não precisa disso. — Negou.

— Você não acha que já me desobedeceu muito hoje? — Questionei a olhando sério.

Mabel não disse mais nada, apenas desviou os olhos visivelmente constrangida. Meu pai e Victor caminhavam logo a nossa frente e alguns passos mais ao longe Jason, que verificava se o caminho estava livre para nós. Revirei os olhos com a ironia da situação.

— E quanto aos capangas? — Mabel perguntou.

— Enquanto Nolan entrava novamente na casa eles foram em direção à trilha, Jason também já estava seguindo e então nós os pegamos. — Expliquei olhando para a trilha a nossa frente.

— E onde estão agora? — Questionou curiosa.

— No porta-malas do carro que Jason e você vieram. — Expliquei a olhando de relance.

Mabel assentiu concordando e encerou o assunto, deitando a cabeça no meu ombro.

— Posso levar os capangas até o palácio. — Jason se prontificou.

— O que te faz pensar que confiamos em você para isso? — Questionei arqueando uma sobrancelha.

— Filho. — Meu pai chamou a atenção.

Sabia que ele estava cansado e machucado. A única coisa que devia querer era ir para casa, o palácio, onde minha mãe estava e com certeza ficaria eufórica quando o encontrasse.

— Guardas. — Chamei vendo que estavam a alguns poucos metros de nós — Vocês vão com esse senhor, mas fiquem de olho nele. — Avisei e eles assentiram concordando.

Jason não contestou e apenas seguiu para o carro sendo acompanhado pelos quatro guardas. Respirei fundo e ainda com Mabel no colo segui ao nosso, que estava um pouco mais ao longe. Victor entrou e sentou no banco do motorista. Meu pai se acomodou ao seu lado e atrás ficamos eu e Mabel.

Mantive o braço ao seu redor enquanto o carro acelerava, saindo finalmente dali. Mabel deitou a cabeça em meu ombro e suspirei baixo aliviado. Estávamos voltando ao palácio e tudo tinha enfim acabado.

O carro seguia rápido e cerca de vinte minutos depois nós finalmente chegamos. Assim que parramos em frente ao palácio, Victor desceu para ajudar meu pai. Já eu peguei Mabel novamente no colo, mas dessa vez sem protestos da sua parte.

Em segundo vários guardas já estavam ao nosso redor, prontos para receber ordens e comandos. Seus rostos demonstravam o alívio ao ver o rei bem. Os outros dois carros já estacionavam também e Jason saiu de um deles caminhando em nossa direção com certo receio, mas isso não me comovia.

— Temos prisioneiros no porta-malas, — Os avisei e indiquei o carro de Jason — Sabem o que fazer.

Os guardas assentiram concordando e nós seguimos para dentro do palácio. Quando já estávamos perto da escada vi minha mãe no topo. Ouvi seu ofego enquanto tampava a boca com as duas mãos, nos olhando surpresa.

Saindo do seu transe ela desceu rapidamente a escada. Meu pai já abria os braços a recebendo ali com carinho, me fazendo sorrir. Sempre acharia bonito o amor deles.

— Fiquei com tanto medo. — Ela sussurrou.

— Está tudo bem, querida. — Meu pai a reconfortou tocando sua bochecha.

— Você está sujo... E machucado. — Constatou enquanto avaliava todo seu corpo.

Típico de minha mãe fazer isso. Sempre foi preocupada ao extremo com nós dois.

— Só preciso de um banho. — Meu pai a tranquilizou, dando uma risada baixa e cansada.

— Venha, vou pedir para que preparem a banheira e depois vamos fazer um curativo no seu braço. — Minha mãe segurou sua mão e o puxou em direção a escada.

Meu pai sorriu com sua preocupação, mas antes que subisse virou e olhou para cada um de nós.

— Obrigado. — Agradeceu — Assim que estiver recomposto vou chama-los para conversar. — Avisou.

Nós concordamos e então o rei deixou que minha mãe o levasse para cima.

— Vou leva-la para seu quarto. — Avisei Mabel que ainda estava em meu colo.

— Ok. — Concordou.

— Victor, te encontro na biblioteca? — Olhei em sua direção e ele assentiu concordando.

— Lorenzo. — Jason chamou quando já subia os primeiros degraus da escada.

— Agora não. Vou deixar você falar, mas não agora. — Avisei olhando-o sério — Se quiser fique no mesmo quarto de hospedes de sempre, mas acho que entendera a atitude de colocar guardas para segui-lo, afinal é a segurança da minha família.

— Entendo. — Concordou com a expressão meio triste, o que ignorei e apenas voltei a subir a escada.

Dei uma rápida olhada para um dos guardas e ele entendeu que estava designado a tarefa de vigiar Jason.

Continuei subindo até o quarto de Mabel, onde a coloquei sentada na cama com as costas apoiadas a cabeceira.

— Vou chamar Lucia para ajuda-la. — Avisei enquanto ajeitava um travesseiro embaixo da sua perna machucada — Dói muito? — Olhei o curativo improvisado.

— Não muito. — Negou.

Levantei já pronto para sair do quarto e procurar por sua criada, mas senti Mabel segurar minha mão e não deixar que me afastasse completamente.

— Alexander... — Chamou.

Não queria olhar para Mabel, pois sabia que no momento em que fizesse isso ela veria tudo que estava sentindo, e nem mesmo eu conseguia explicar isso agora. Estava uma confusão só.

— Sim? — Sussurrei.

— Me perdoa. — Pediu encarando seus olhos.

Percebi que Mabel se controlava para não chorar. O que apertou ainda mais meu coração.

— Sabe o que senti quando Victor chegou com meu pai e disse que você tinha ficado dentro daquela casa totalmente em chamas, junto com Nolan? — Fechei os olhos contendo a angustia que surgia no peito ao pensar nisso — Você tem ideia da importância que tem Mabel? De que simplesmente não conseguiria viver com sua ausência? — Olhei novamente para Mabel e neguei com a cabeça — Não precisei de muito para me apaixonar por você... Mas iria precisar de uma vida para tentar te esquecer. — Confessei e uma lágrima traiçoeira e solitária escorreu pelo canto de um dos meus olhos.

Já Mabel chorava livremente. Suas lágrimas rolando por seu rosto. Peguei sua mão e a puxei fazendo com que sentasse a beirada da cama, perto de mim. Sequei suas lágrimas com a mão vaga e olhei seu nariz vermelho.

— Me perdoa. — Repetiu soltando um soluço baixo — Fui imprudente, estúpida e o que mais quiser pensar... Mas fiz isso por você. Sei o quanto ama seus pais e que ficaria arrasado se acontecesse alguma coisa com o rei. — Explicou suspirando baixo — Além da rainha Elisabeth, que não merecia nada do que estava acontecendo.

Ficamos em silêncio por alguns minutos, apenas nos encarando, até passar novamente a mão pelas suas bochechas secando-as.

— Odeio vê-la chorando. — Sussurrei e ao contrário do que queria, suas lágrimas pareceram aumentar — Sabe qual é o seu maior defeito? — Perguntei e Mabel negou com a cabeça — Esse aqui... — Toquei o lado esquerdo do seu peito — Você tem um coração muito grande.

Mabel deu uma risada curta e negou com a cabeça enquanto chegava mais perto. Me inclinei e parei com o rosto a centímetros do seu, nossos narizes se tocando levemente. Fechei os olhos e inspirei seu cheiro característico. Lavanda.

Ainda de olhos fechados beijei seus lábios, macios e gentis, sem pressa.

— Precisamos cuidar da sua perna. — Sussurrei colocando uma mexa do seu cabelo atrás da orelha.

— Acho melhor tomar um banho primeiro. — Sugeriu me dando um selinho.

— Vou colocar a banheira encher e chamar Lucia. — Avisei beijando sua testa e levantando.

— Alexander... — Mabel chamou quando já estava na porta, fazendo com que me virasse — Também não saberia viver sem você. — Confessou.

Sorri abertamente antes de abrir a porta e sair do quarto. Segui rapidamente pelo corredor, afinal precisava achar Lucia para que ajudasse Mabel e cuidasse de seu machucado.

Suspirei alto e desci a escada pensando que tudo tinha acabado, pelo menos torcia para que sim.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top