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Alguns meses depois...
— Essa foi a última caixa mandona? — Nicolau diz olhando ao seu redor e encarando a minha casa, agora vazia.
— Acredito que sim... Pronto pra pegar a estrada? — digo, segurando a minha bolsa e olhando pela última vez para aquelas paredes.
— Prontíssimo! — ele sorri e me puxa para um abraço. Quer dizer, ele faz o melhor que ele consegue, já que a minha barriga enorme não permitia que eu ficasse tão colada a ele quanto eu gostaria.
Faltava pouco mais de um mês para que eu desse a luz e já estava mergulhada de corpo e alma nessa ideia. Tinha ajudado o Nicolau a fazer a decoração do quarto da nossa filha na nossa nova casa. Sim, nós vamos nos mudar.
Tomamos essa decisão facilmente. Conseguimos uma casa bem maior do que a nossa atual, e bem mais próximo aos meus pais. Queria nesse momento ficar mais próxima a eles. Nunca tivemos nada que nos prendesse aquela cidade, e tudo o que aconteceu lá, nos enchia de lembranças negativas. Eu até que tinha conseguido uma boa carta de recomendação lá da delegacia, mas acho que nem vou usar.
Eu estava apaixonada pela ideia de ser mãe em tempo integral. Nicolau ia trabalhar em casa nos primeiros meses para me ajudar. Meus pais também iam passar uma temporada lá em casa, nas primeiras semanas, minha mãe disse que ia me encher de dicas importantes. Fiquei super feliz por ela estar empolgada com a ideia de ter uma neta.
Agora ela se permitia respirar um pouco mais. Quem sabe não seria a netinha dela a ser esse sopro de vida que ela ainda pode precisar?
Era tanta coisa pra aprender em tão pouco tempo. Mesmo não sendo uma rotina de delegacia e perigo. Sei que não vai faltar adrenalina e correria na minha rotina de mãe.
Tranco a porta da casa e deixo ali uma parte importante de mim. Nunca vou esquecer do quanto eu cresci e amadureci naquela cidade. Ela me proporcionou muitas coisas boas, mas estava na hora de dizer adeus a cidade de Capella.
Agora que as investigações não iam mais precisar das nossas contribuições, estávamos livres para deixar a cidade.
Nem preciso dizer que o pendrive que o Erick entregou para o Nicolau teve um papel importantíssimo no andamento das investigações. As informações que tinham ali dentro serviram para ligar alguns pontos e fazer prisões importantes para a investigação.
Os noticiários anunciavam tudo com grande alegria.
Realmente foi um grande passo para a cidade. Agora eles poderiam respirar mais aliviados, já que não estavam mais nas mãos de assassinos em série. Foi uma verdadeira revelação para todos quando anunciaram que eram 4 assassinos e não somente um como a polícia acreditava.
Era difícil ver as notícias sobre o Erick. Depois de sua morte, um monte de notícias e escândalos envolvendo ele vieram à tona e dava para perceber a dor no olhar do Nicolau sempre que via alguma notícia ruim relacionada ao Erick. Ele me contou o que aconteceu entre os dois e mesmo não concordando com a atitude de nenhum dos dois, procuro mostrar o meu apoio ao Nicolau. Afinal, não importa o que eu diga agora, sei que palavras nunca conseguem apaziguar um coração ferido.
Fico feliz em saber que o Pedro está frequentando um psicólogo, e está sendo bem tratado. Ele tem um problema, mas sempre lidou com ele de maneira errada, e quando as circunstâncias foram ao extremo, ele simplesmente quebrou. Ele parece conformado em pagar pelos seus crimes. Entende que o que fez e errado e está arrependido de seus atos.
Não que eu ache que isso seja suficiente para que ele se redima pelos seus pecados... Ele ainda tem um longo caminho a percorrer, mas me anima muito ver que ele está indo pelo caminho certo.
Sempre soube que ele tinha um coração bom. Só não sabia que ele estava tão perdido assim. Espero que ele se redima por tudo o que fez e que um dia volte a sociedade completamente recuperado.
Lisa continua presa e o caso montado contra ela é tão pesado que ela acumulará anos de sentença até a sua quarta geração. Me senti bem ao ver que ela tinha sido acusada e considerada culpada pela morte da minha irmã. Senti como se a justiça tivesse sido feita.
Ela serviu facilitar as investigações também, já que na mente conturbada dela, ela sentia orgulho de cada coisa que fez e nem fez questão de esconder de ninguém tudo o que já tinha feito em sua vida. Ela contava tudo o que tinha feito, em detalhes assustadoramente sórdidos, o que facilitou e muito a investigação.
Ela não parecia se importar com os anos acrescentados a sua sentença com cada coisa que ela admitia. Não tinha jeito daquela mulher sair da cadeia.
Ainda me lembro como se fosse ontem do choque eu que fiquei em escutar a notícia da morte do Leonardo. Ele foi encontrado morto em sua cela, poucos dias depois da divulgação da sua sentença. Ele ficaria preso uns bons anos.
Mas parece não ter aguentado a pressão de estar preso e acabou tirando a própria vida. Não quis saber dos detalhes de sua morte nem como descobriram. Assim que eu escutei a notícia, desliguei a televisão e não entendi o motivo de ter começado a chorar.
Foi um choque. Deve ter sido por conta disso.
Mas estou bem mais aliviada agora que não teria mais nada haver com essas investigações, não precisaria mais dar depoimentos, nem comparecer a delegacia. Poderia relaxar e deixar toda essa confusão para trás.
A viagem durou pouco mais do que seis horas. Fizemos mais paradas do que eu posso contar para fazer xixi. Nicolau dirigiu com muita calma o meu Camaro e a noite começava a cair quando estacionava na garagem da nossa nova casa.
Já dava pra perceber uma diferença enorme no quintal. Ele devia ser duas vezes maior do que o antigo. A piscina era praticamente do mesmo tamanho, mas tinha uma pequena banheira de hidromassagem do lado da piscina. Aí sim eu vi vantagem. O caminhão da mudança já tinha vindo mais cedo e as caixas já estavam todas dentro de casa.
Até que eu queria ver a casa com mais detalhes, explorar cada pedacinho dela, mas tudo o que eu queria agora era tomar um banho quente e dormir. Viagem sempre me cansa e viajar grávida me cansou ao triplo!
— Por favor amor diz que a nossa cama já está arrumada?
— Não sei se está arrumada, mas sei que ela já está no lugar... Faz o seguinte minha linda, vamos lá dar uma olhada, e se não tiver, enquanto você toma um banho, eu preparo ela pra você, tudo bem assim?
— Claro.
— Precisa de ajuda para subir as escadas?
— Não, acho que não, mas se eu precisar, grito.
— Certo. Vou tirar essas caixas do carro e já te encontro lá no nosso quarto — ele me dá um selinho rápido e abre a mala do carro.
— Nico? — chamo a sua atenção ao olhar com muito desejo pra banheira de hidromassagem. Acho que um banho ali seria tudo o que sonhei.
— Oi mandona? — ele pergunta se virando minha direção e colocando a caixa que ele carregava no chão.
— Será que aquela banheira que eu estou vendo ali esta pronta pro uso? Ou ainda precisa limpar?
— Eu pedi que fizessem uma limpeza geral na casa antes de virmos, incluindo a área externa. Pode ir lá, tranquilo...
— Posso mesmo? — acho que meu olho até brilhou agora.
— Claro que sim mandona. Pode ficar à vontade lá. Vou somente conferir a nossa cama, colocar essas caixas para dentro e venho pra relaxar com você. Aproveito e pego uns roupões pra nós. O controle de temperatura e intensidade dos jatos está no lado da banheira.
— Obrigada lindo — dou um beijo em seu peito e vou o mais rápido que consigo para a banheira, o que não é nada rápido, já que tenho essa melancia na minha barriga que me torna uma tartaruga.
Tiro as minhas sapatilhas e já vou colocando para encher a banheira. Vi que estava mesmo impecavelmente limpa e tinha até uma pequena lona protegendo a banheira. Tirei a proteção com um pouco de dificuldade e me sento na borda. A água quente é muito bem recebida pelos meus pés e aos poucos vou relaxando. Retiro o óculos de sol que estava no topo da minha cabeça e o vestido que me cobria, ficando apenas com um conjunto de calcinha e sutiã azul escuro.
A noite estava um pouco fria, então vou logo entrando na banheira e deixando a água me cobrir e me aquecer. Ah, que delícia!
Logo a banheira encheu e ligo a hidromassagem. Fecho os olhos e me sinto relaxar ao extremo. Isso sim que é vida! Mergulho na banheira, e deixo o calor me preencher. Estou tão feliz que nem preciso esconder o sorriso.
Então eu sinto.
Uma contração tão intensa me faz querer afundar os dedos na borda da piscina. Solto um grito alto e fecho os olhos com força. Sinto algo sair de mim e me desespero pensando que possa ser sangue. Mas a água ainda esta tão límpida quanto antes.
Merda. A minha bolsa estourou!
— Nico! — grito o mais alto que consigo, completamente desesperada. Nenhuma resposta — NICO! — fico de pé na banheira e vou logo saindo de dentro dela.
Nicolau aparece alguns segundos depois e ao me ver tentando sair da piscina, vem correndo na minha direção. Ainda bem que ele já tinha os roupões nas mãos.
— O que está fazendo Vivian? Está frio, você pode ficar resfriada... — ele diz me ajudando a sair da banheira e me envolvendo com o roupão de algodão bem quentinho.
— Está acontecendo! Minha bolsa estourou! — digo e tento não parecer tão nervosa como estou me sentindo.
— Tem certeza? — ele pergunta deixando cair o outro roupão que ele segurava no chão.
— Acho que tenho. Se aquela dor que acabei de ter não for uma contração, pode cancelar as minhas porque definitivamente não aguento mais dor do que aquela.
— Vamos pro hospital então — ele nem me espera falar mais nada, me toma nos braços e me leva até o carro. Então corre para o banco do motorista e pela primeira vez, ele pisa com vontade no acelerador do Camaro.
Tudo pareceu acontecer numa velocidade assustadora. As dores eram alucinantes, e aconteciam em períodos cada vez menores... Como era que eu iria respirar entre cada uma delas? Eu não tinha tempo nem de pensar em respirar e já estava acontecendo novamente. Quando percebi, já estavam me mandando fazer força, que a minha filha já estava pronta para nascer.
Nicolau enlaça seus dedos nos meus e eu aperto com tanta força que nem sei se eu quebrei as duas mãos. Ele fala calmo em meu ouvido. Diz para que eu continue a fazer tudo o que estou fazendo. Que está tudo perfeito, que eu era perfeita.
Juro que queria me concentrar mais na voz dele, mas tudo o que eu conseguia fazer nesse momento era força.
Até que eu não precisei fazer mais força. E eu escutei um chorinho baixo e contido. Não tinha forças nem para abrir meus olhos nesse momento. Todas as minhas forças tinham sido usadas para trazer a vida esse pequeno pedaço de nós dois.
O choro vai ficando mais forte. Essa é a minha garota! Grita aos quatro cantos do mundo que você chegou!
Estou exausta, mas eu ainda quero ver a minha pequena. Não sei como consegui, mas abri os olhos somente para ver o Nicolau olhar para algum lugar atrás dele. Não sei se ele percebeu que eu o olhava, mas ele dirige seu olhar dourado brilhante na minha direção.
Ele tinha um sorriso nos lábios e lágrimas nos olhos.
— Bom trabalho amor — Nicolau fala beijando minha testa suada.
— Onde está? Onde ela está?
— As enfermeiras já estão limpando a nossa princesa. Você vai ver, é a coisa mais adorável e incrível que você verá — ele diz com um sorriso orgulhoso nos lábios. Seu rosto tinha uma feição completamente diferente do que eu já tinha visto nele. Meu coração bateu mais forte ao vê-lo assim tão entregue, sua alma assim tão exposta.
— Você está com uma cara bem engraçada agora... — digo tentando sorrir, mas parecia estar cansada até mesmo para abrir um maldito sorriso.
— E você está lindamente descabelada e um pouco assustadora, mas eu não me importo com isso, você me deu a melhor coisa do mundo. Você foi maravilhosa Vivian. Acima de todas as expectativas. Acima de qualquer média.
— Como é que até me fazendo sentir um trapo, você ainda consegue ser um amor de pessoa?
— Sou um verdadeiro cavalheiro.
— Você é um convencido.
— E você me ama... — ele sorri e coloca uma mecha do meu cabelo detrás da minha orelha.
— Assim como eu sei que você também me ama.
— Perdidamente — ele se inclina e me dá um beijo suave nos lábios. — Obrigado Vivian, você encheu a minha vida de significado...
Meus olhos se enchem de lágrimas e eu mordo o interior da minha bochecha para não fazer uma cena ainda maior.
— Você não pode falar isso para uma mulher que acaba de dar a luz, eu estou mais emotiva do que nunca.
Batidas na porta e então uma enfermeira vem segurando aquela pequena parte de nós. Nicolau tinha razão, era a coisa mais adorável do mundo. Ajusto-me na cama para que a mulher possa colocar a minha filha em meu colo. E assim que sinto aquela vida pousa em meus braços, a responsabilidade e a emoção me atingem em cheio. Eu era responsável por aquele lindo ponto de luz. Eu acabei de conhecer pessoalmente ela, e incrível como ela já era a coisa mais importante da minha vida.
Ela estava quietinha em meu colo e a sua respiração era curta e o melhor som que eu já tinha escutado em toda a minha existência. Possuía um pequeno tufinho de cabelo preto e ralo em sua cabeça. Seus traços pequenos fizeram meu coração acelerar. Eu já a amava mais que a minha vida. Coisa maluca isso de ser mãe.
— Oi pequena — digo num sussurro suave e não sei se reconhecendo a minha voz, ela abre os olhos. Me surpreendo em ver um olho verde igual ao meu e um dourado assim como o do Nicolau. Ela abre um sorriso banguela e termino de derreter.
— Ela é incrível — Nicolau diz ao meu lado e seus olhinhos curiosos já procuram o pai. Incrível é pouco para ela.
— Como vamos chamá-la Nic? — pergunto observando a nossa pequena mocinha de olhos heterocromáticos. Ela olha para mim mais uma vez e parece até curiosa para saber a resposta.
— Eu venho pensando em um nome há um tempo. Não sei se você vai gostar... Mas pensei em chamá-la de Vanessa. O que você acha? Acho um nome bonito para a nossa pequena bonita.
Meus olhos se enchem de lágrimas. A lembrança da minha irmã é forte e Nicolau tinha pensado nela até nesse momento. Fui capaz de ver por baixo da sua armadura, fui capaz de ver o verdadeiro Nicolau, vi o seu melhor, o seu pior e as suas mudanças, e a partir desse momento estava perdida. Perdidamente apaixonada por ele. Tudo o que ele fazia me cativava de algum modo.
Até mesmo quando eu pensava que ele era um assassino em série.
— Vanessa é perfeito.
— Seja bem vinda a família Vanessa Castilho — ele fala passando o dedo pela lateral do rosto da nossa filha.
Ela solta um grunhido feliz, acho que tinha gostado do nome. Vanessa, você vai encher esse mundo de alegria, você vai me encher de vida. Dou um beijo na cabecinha pequena dela e não controlo minhas lágrimas de alegria.
Ah, mas como eu amei escrever esse capítulo. Espero que tenham gostado dos momentos finais que os personagens guardaram pra vocês.
Não saiam daí, que agora ainda vou postar um epílogo curtinho, mas cheio de emoções pra vocês. Tinha que dar um final mais do que feliz para esses personagens que estavam comigo há muito tempo... Eles merecem esses momentos finais especiais.
Um beijo especial e até daqui a pouco hahahaha
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