Capítulo 6 - A Viagem

No enorme terraço do castelo, nós nos preparamos para nosso destino a Nilfgaard. Iremos de trem, esse foi o meio de transporte que nosso pai escolheu para evitar chamar atenção desnecessária, como a mídia, que poderia antecipar por meio de uma fofoca o anúncio desse noivado detestável. Nossas poucas malas estão sendo postas na limusine, com o intuito de nos fazer chegar rapidamente a estação de trem.

Atento meu olhar para meus irmãos, vendo que parecem animados com nossa rápida viagem. Contemplo rapidamente o lindo céu na minha frente, azul e sem nuvens. Quando viro meu rosto, vejo uma Eli com um sorriso tímido vindo em minha direção. Depois de uma conversa tida com meu pai, há alguns dias atrás, havia mencionado a necessidade de ter uma dama de companhia. Só não havia encontrado a pessoa certa, até Eli chegar. Assim, que me deparei com essa garota tão doce e meiga, vi que seria perfeita para tal posto e foi só avisar meu pai, depois de seu rápido sermão durante o jantar, que havia escolhido a moça perfeita para ser minha dama.

- Alteza! - Ela faz uma breve reverência, ao dizer isto, imagino que esteja me chamando assim para evitar atenção dos outros criados.

- Eli, querida, estou muito feliz que irá conosco. - Eu digo, esboçando um sorriso.

- É um prazer, Alte-Antonella. - Ela agradece, sussurrando meu nome no final, deve ser seu jeito de dizer que está realmente agradecida.

Sem querer meus olhos vagueiam para sua mão onde ela segura uma pequena bolsa surrada em suas mãos. Tiro meu olhar, disfarçadamente, procurando meus irmãos e constato que já adentraram no veículo.

- Vamos, Eli - Eu pronuncio, agarrando sua mão para entramos no carro.

Assentados no carro, Eli diz uma rápida saudação aos meus irmãos. Henri responde educadamente, então Justine e minha doce dama iniciam uma conversa, enquanto isso, Henri e Lucca parecem entretidos em conversar e comer os aperitivos presentes na limusine.

O caminho do castelo para a estação é razoavelmente rápido, assim como a rápida caminhada para o trem. Eu entro no vagão dos passageiros, que está impecavelmente limpo e bonito. Um corredor fica no meio da duas fileiras de assentos vermelhos perfeitamente limpos, entre os assentos, várias mesas cobertas com os panos brancos extremamente bem cuidados.

Mas não estou com humor para nada disso, então sento em uma cadeira aleatória e olho para a janela.

A estação estava cheia e movimentada como sempre, mas o diferencial era que hoje estava cheia de guardas, porque quase todos os membros da família real estavam aqui. Meu pai achou melhor nos mandar em pares, em trens diferentes, e nesse caso, ele estava certo. Todos os herdeiros do reino em um só lugar... seria um alvo absurdamente fácil para terroristas, ou assassinos.

- Antonella? - Eli me chama, me puxando de volta a realidade - Algo de errado? - Ela me encara com os mais doces e inocentes olhos castanhos, é simplesmente difícil demais contar-lhe minhas preocupações, tenho medo de assustá-la com meu temor sobre assassinos e sequestradores ou coisa pior, então tento sorrir despreocupada.

- Estou bem, Eli, só estou um pouco mais pensativa que o normal - Ela então sorri e acena com a cabeça, então sai para o outro vagão. Já eu, coloco a mão no queixo e volto a admirar a janela.

Vejo uma menina correndo com outra, elas tem doces em suas mãos e uma mulher que parece cansada chama-as repetitivamente, perto de um senhor olhando um jornal e um rapaz, andando e olhando para os lados. Caramba, o lugar está mesmo cheio.

Sinto-me cansada por algum motivo, o treino de ontem foi exaustivo, claro, mas hoje tem algo de diferente... Parece que meu cansaço não é só corporal, sinto minha cabeça pesada e não sinto vontade de fazer nada.

Talvez seja porque estou a caminho da minha "festa de noivado" e só de pensar nisso me faz querer ficar deitada o dia inteiro encarando o teto. Solto um meio suspiro, meio grunhido que acho que foi mais alto do que pretendia, porque em menos de dez segundos, meu irmão está sentado no banco a minha frente com cara de não-começa-agora.

- O que aconteceu? - Ele me pergunta, com um rosto desconfiado, como se estivesse falando com uma criança prestes a surtar.

- Nada, quer dizer... tudo, quer dizer... Sei lá Henri! - Cruzo os braços, irritada, e ele ri de mim.

- Você é ridícula! - Ele me olha sorridente e brincalhão, enquanto empurra minha perna com a dele, me provocando.

Então, ele olha para o outro lado do corredor e seu sorriso brincalhão some repentinamente. Ele melhora sua postura e olha disfarçadamente para o final do vagão, o que atrai minha atenção para lá, e quando me viro para olhar, abro um sorriso na hora. Eli se aproxima de nós, com um sorriso gentil e bochechas levemente coradas, ela para ao nosso lado em pé.

- Precisam de algo? - Ela nos pergunta gentilmente.

- Eu não, obrigado! - Henri diz, educado, sorrindo levemente.

- Já eu, tenho um pedido. - Ela me olha, esperando.

- Quero que sente aqui conosco. - Seus olhos se arregalaram levemente e meu irmão me encarou, sua expressão de choque e preocupação era hilária.

- Quero que relaxe, vai ser uma viagem um pouco longa, e ficar trabalhando nesse período vai ser cansativo, e também, oficialmente, você é minha dama de companhia.

- Obrigada! - Ela sorri, agradecida.

- Me dê licença só por um instante.

Ela sai, ainda sorrindo, e assim que passa pela porta para outro vagão, Henri me interroga:

- Pra quê isso? -

Ele parece nervoso, gostei disso.

- De nada, bobão, agora vai poder passar a viagem ao lado do seu amor. - Dou uma risadinha ao ver seu rosto surpreso.

- Do que você está falando? - Ele tenta se fazer de sonso, mas suas bochechas vermelhas não o deixam mentir.

- Por favor. Achou mesmo que eu não ia notar? Desde aquele dia no quarto de Justine, você anda estranho. Na verdade, antes disso. Está muito pensativo, até pra você - Abro um sorriso - Desde que conheceu a Eli. É muito óbvio que você gosta dela, eu teria que ser idiota pra não notar.

Ele parece em conflito por um instante, até que suspira, parecendo cansado.

- Certo. Eu admito, sinto algo por ela. - Eu solto um baixo gritinho de animação. - Mas nada pode acontecer, Lah.

- Mas, por que não? - Quase não consigo conter a frustração.

Henri tem uma mania irritante de complicar as coisas simples, e o pior? Quase sempre ele tem razão.

- Primeiro, porque nosso pai nunca, e eu quero dizer nunca mesmo, iria aceitar - Reviro os olhos. Bem, isso é óbvio - E segundo, eu nem sei se ela gos- se ela se interessa por mim.

Contenho um risada, ele quase disse "gosta", o que quer dizer que ele quer que ela goste dele, esse meu irmão consegue ser muito fofo mesmo sem querer, e eu lembro daquela vez que Eli veio ao meu quarto me contar algo, mas saiu envergonhada antes de concluir.

Não precisa ser um gênio pra perceber, certo?

Mas não vou contar a ele, o segredo não é meu pra sair contando, mesmo que seja sobre ele.

- O fato de ela fica vermelha quando fica perto de você não diz nada?

- Eli fica vermelha com quase tudo - Ele sorri quando diz isso.

- Uau! - Ele olha pra mim - Você está caidinho por ela.

Ele fica vermelho, o que é raro, então é inevitável rir na mesma hora. E é nessa hora que Eli decide voltar, carregando a bolsa velha que estava segurando, antes de sairmos do castelo.

- Só fui buscar meu material de tricô. - Ela se senta, com um leve rubor em suas bochechas, tirando da bolsa algo que parece dois palitos coloridos com vários fios neles formando uma espécie de retângulo e um novelo de lã para fora.

- Se não houver problema, estarei tricotando - Henri lança um olhar de admiração para ela e a mesma retribui com um sorriso e, é claro, um par de bochechas rosadas.

Depois disso, ouço um apito e não demora muito para o trem começar a se mover. Os próximos dez minutos são dedicados a fingir que não vejo a troca de olhares daqueles dois. Sim, eles tentam disfarçar, o que se torna meio inútil, já que sou muito observadora. Me contenho para não gargalhar dessa tentativa falha dos dois.

Primeiro, Henri fica olhando Eli tricotar, depois olha para seu rosto, depois de um tempo, ela olha de relance para cima e percebe que ele a está encarando, então olha imediatamente para suas mãos, e Henri olha para para o corredor, muito vermelho, claro. Então ele olha novamente para as mãos de Eli, e o ciclo começa de novo.

Isso já aconteceu três vezes. Acho que nunca tive que me controlar tanto para não dar uma gargalhada alta.

Viro, meu rosto para o lado da janela para dar mais privacidade ao casal. Observo, algumas crianças brincando pelas ruas, elas parecem se divertir.

A situação desses dois é engraçada, mas não posso evitar sentir um pouco de inveja deles, apesar de suas classes diferentes, eles gostam um do outro, obviamente. Já eu, estou presa numa relação, se é que posso chamar disso que definitivamente não quero.

Naquela noite, no corredor, eu disse a Ian que aquele casamento não ia acontecer. Mas eu estava falando sério? O que eu posso fazer, realmente? O que aconteceria se eu entrasse no escritório do meu pai e dissesse que esse matrimônio não ia acontecer?

Me pegando de surpresa, o trem desacelera até parar por completo. A estação de Nilfgaard, apesar de ser parecida com a de Crawford, tem colunas mais altas e menos bancos, menos pessoas também. É notável a riqueza desse reino, se só a estação já é assim, imagino que o castelo deva ser muito belo e luxuoso.

Retiro meu olhar da janela, pondo-me de pé, Henri e Eli fazem o mesmo. Assim que as portas do trem abrem, não perdemos tempo e saímos rapidamente. Ao pôr nossos pés no piso, é possível vê o trem que agora pouco estávamos partir, restando apenas alguns guardas de nosso reino e um pouco mais a frente a guarda real de Nilfgaard.

Agora, é inevitável fugir desse noivado?

Eu... não desistirei, lutarei até onde puder.

Com uma rapidez, nos retiramos da estação, os guardas nos direcionam a um carro luxuoso e dessa forma, iniciamos um trajeto ao castelo. Dentro do veículo há vários aperitivos e nossa, estou faminta. Olho de relance para Henri e Eli, notando que os dois, outra vez, estão interessados em fingir que estão perfeitamente normais estando um do lado do outro. E, sim, ambos tentam disfarçar a troca de olhares. Controlo minha risada pelo que parece a milésima vez hoje. Eles são tão fofos!

Tiro meu foco deles, direcionando o olhar para as ruas desse reino. Uau. Noto grandes prédios e algumas casas simples, porém bem cuidadas, esse parece ser um lugar bom para se viver.

Meu pescoço está doendo um pouco, então balanço ele levemente, tentando relaxá-lo e por acaso vejo Henri e Eli... próximos.

Eles estão um do lado do outro, no banco a minha frente, Henri olha para sua janela e Eli olha para a sua, ambos tem um sorriso nervoso no rosto, então olho para suas mãos, que estão a milimetros de distância, os dedos mínimos quase se encostando.

É uma péssima hora pra eu rir, mas não posso evitar. Passei várias horas tentando, mas isso é a gota d'água. Eles me olham meio surpresos, Henri com certa irritação e Eli com certeza envergonhada.

- Desculpa, me lembrei de uma situação engraçada.

Nenhum deles pede mais detalhes. Agora mantém certa distância um do outro, Eli mantém suas mãos no colo e olha para a janela parecendo muito envergonhada, Henri não olha para mim, mas encara a janela sem demonstrar emoção nenhuma.

Me sinto péssima por ter arruinado o momento, então me foco em encarar a janela novamente. Devo ter passado um bom tempo observando, pois o veículo para e logo avisto que chegamos ao nosso destino.

O castelo é como eu imaginei, sem muitas torres, elegante e enorme. Assim que saímos do carro, os seguranças nos fazem subir uma dúzia de degraus e entrar no castelo rapidamente, não me dando tempo de ver os jardins, ou algo além das escadas e da porta. A primeira coisa que vejo são as colunas douradas, logo em seguida o carpete vermelho e aproximadamente três lustres que, eu não poderia diferenciar nem sob ameaça, as paredes são decoradas com pinturas de pessoas com nariz em pé, que eu assumo serem os antepassados da atual família real, o lugar inteiro praticamente cheira a realeza e dinheiro. Olho de relance para trás, e vejo Eli que parece hipnotizada por cada detalhe de tudo, um sorriso de puro encanto enfeita seus lábios delicadamente.

Os seguranças nos direcionam a um grande salão que imagino que seja o salão de recepção, o ambiente é bem arrumado, possui alguns sofás, uma mesa com variadas comidas e aperitivos, as paredes são em um tom azul-claro. Viramos a direita no corredor e de pé podemos vê a rainha e sua simpática filha, sorrindo educadamente para nós, curiosamente, nem o rei, nem meu "noivo" estão aqui.

- Bem-vindos, meus queridos! - Disse a rainha, com um sorriso educado.

Sua postura era impecável, ombros para trás, pescoço erguido e mãos juntas delicadamente em frente ao corpo. De repente, me lembro que no jantar ela era referida como Verena, pelo meu pai e pelo rei de Nilfgaard.

- Majestade! - Eu digo respeitosamente.

Nós três nos curvamos, mostrando educação.

- Obrigada, por nos receber!

Ao mesmo tempo, Scarlet se curva sorrindo para nós e a rainha Verena acena com a cabeça, sorrindo.

- Não há necessidade disso aqui, fiquem como ficariam em sua própria casa. E também, eu devo avisá-los, seus irmãos tomaram o caminho mais longo, por isso demoraram mais um pouco para chegar. Enquanto isso, as empregadas levarão suas malas para seus quartos, então vocês podem se juntar a mim e a Scarlet para um lanche, se quiserem, claro. - Ela sorri ao terminar, é realmente uma mulher educada.

Presto mais atenção nela, ela tem algumas poucas rugas no rosto e um cabelo loiro escuro, que imagino que seja de onde Ian tenha herdado.

Fiquei muito tempo sentada em um trem, um lanche me faria bem, olho para Eli, que sorri para mim em incentivo, então olho para a rainha e aceito. Não perco tempo, começo a degustar um pouco de cada lanchinho posto na mesa. Que delícia, até os aperitivos desse reino são incríveis.

Enquanto degustamos nossos aperitivos, já todos devidamente sentados, a rainha Verena faz questão de me explicar sobre alguns preparativos para o jantar que anunciará meu trágico noivado.

Mas algo vem me incomodando, os outros dois membros da família real não estão presentes. Será que sabem de algo sobre as informações de meu pai?

Terminado nossos lanchinhos, me pondo de pé, avalio a rainha e Scarlet com mais atenção. Seus sorrisos educados parecem rígidos, e seus ombros, tensos. Será que sabem das informações também? O pendrive ainda está em casa, no meu quarto. Posso sentir daqui, a tensão das duas. Henri, que até então estava distante, surge e aperta minha mão como se quisesse me dizer algo, talvez também esteja percebendo algo de estranho? A única no salão que aparenta está tranquila é Eli, que parece encantada com o ambiente.

Eu sabia, esse lugar parecia ser bom demais. Estarei atenta, essa família esconde algo. Começarei a descobrir isso, assim que puder.

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