Capítulo 8

Ouvi o barulho das cortinas sendo abertas e acordei levantando tão rápido que senti meu corpo pesado.

Meus olhos não se acostumaram a luz do dia e os fechei piscando para tentar ver Amália.

— Vejo que se divertiu ao ponto de se esquecer onde você dorme — falou Amália e a achei finalmente me acostumando a luz.

— Foi difícil não me divertir — disse abrindo um sorriso falso. — Tantos nobres com conversas estimulantes, vestidos esplêndidos e claro, a comida. A que fabulosa e apetitosa degustação...

Ela me parou antes que eu consiga terminar.

— Já entendi. Foi horrível — concluiu suspirando e concordei com a cabeça.

— Bom, a parte da comida era de fato verdade.

— Seu café da manhã está na outra sala. Mas acho que talvez prefira um banho antes — seus olhos avaliaram a situação do vestido e ela balançou a cabeça indo até o banheiro. — Era um vestido tão belo.

Quando ela terminou de preparar meu banho me lavei até sentir que o cheiro do álcool havia me deixando por completo.

Coloquei o vestido que ela tinha deixado sobre a cama enquanto ajeitava a mesa na outra sala, era de musseline verde-água com delicadas flores na saia e no corpete. E calçei as sapatilhas do mesmo tom do vestido.

Vou até a mesa com a comida e a como sem pressa. Gostava do fato de que não veria nem a familia real e nem as concorrentes enquanto fazia as refeições.

— Depois que terminar eu irei ajudá-la com o cabelo — falou Amália e concordei com a cabeça antes dela ir até o outro cômodo.

Assoprei o chá e bebi alguns goles.

Escutei uma batida na porta e coloquei a xícara de volta na mesa.

Quem seria a essa hora?

Amália foi abrir a porta e vi a silhueta de um homem.

— Alteza — disse Amália indo para o lado e o deixando entrar.

Me levantei achando que era Leon, mas era seu irmão.

Edward passou por ela e me viu. Ele abriu um sorriso jovial.

— Sinto muito pela intromissão, mas eu gostaria de conversar com você, Rosemary.

Entendendo a situação Amália saiu rapidamente dizendo que traria mais comida.

— Não quer sentar, alteza? — era estranho dizer aquilo sendo que era a cada dele.

— Claro. — Edward se sentou na outra cadeira e fiz o mesmo. — Eu não a vi no baile depois de nosso encontro, confesso que fiquei muito triste. Afinal, você me prometeu uma dança.

— Sinto muito, alteza...

— Por favor, me chame de Edward.

Sorrindo peguei a xícara novamente.

— Certo, Edward — suas covinhas se afundaram ao me ouvir dizer seu nome. — Foi rude da minha parte sair tão cedo do baile. Eu só estava muito cansada, da viagem. É muita coisa para assimilar.

— Sim, de fato. O que está achando? Do castelo e tudo mais?

— É uma experiência nova. Tudo é tão deslumbrante. Confesso que também é aterrorizante, afinal esse lugar é enorme.

Ele deu uma risada baixa.

— Devo concordar, até eu vivo me perdendo. Gostaria de oferecer a você um passeio para conhecer o castelo, mas temo não ser capaz de nos guiar sem nos perdemos.

Fiquei impressionada por ter achado o quarto novamente depois de ter me perdido no dia em que conheci o príncipe herdeiro.

— É tão grande assim?

— Esse lugar é antigo, diziam que os deuses costumavam governar daqui antes de acharem a vista do Monte Conorar mais atraente — disse pegando o bule de chá e se servindo. — Eu costumava o explorar quando era pequeno, sempre que eu achava ter gravado onde cada quarto e corredor ficava o castelo parecia crescer e novas salas e passagens apareciam. Parecia... magia.

Ele deve ter percebido minha cara de espanto, pois deu uma gargalhada.

— Sei que o meu pai odeia a magia e tudo o que a envolve. Mas eu a acho intrigante, gostaria de ter vivido na época em que ela corria livremente por cada canto da Cìlia.

Eu não diria que odiar era a palavra adequada, afinal ele condenou ao exilio todos os seres mágicos.

Suas palavras sobre viver naquela época me fazem refletir em como seria. Talvez fosse incrível, poder voar ou simplesmente controlar algum elemento, isso se a magia me fosse abençoada e meu corpo a conseguisse controlar. Mas por mais que a parte bela dominasse minha imaginação não deixei de pensar em como cada um usaria a magia de forma ruim.

Se a disputa pelo poder sem magia era cruel, com, seria impiedosa.

Amália entrou no quarto segurando uma bandeja, como ela havia feito isso sem deixa-la cair, era impressionante.

— Bom, mas eu não vim aqui só para ter uma agradável conversa com a senhorita. Infelizmente, vim dizer que você terá aulas, sobre política e história.

Levantei uma sobrancelha.

— Eu fui a escola, não sou analfabeta.

— Não, não foi isso que quis dizer - ele corou, envergonhado. — Você terá uma aula mais complexa, sobre leis, o comercio e a história e costumes dos outros reinos da Cìlia.

Suspirei. Uma coisa que não gostava era estudar.

— E quando será a aula?

— Se estiver pronta eu a levo até a sala.

— Só tenho que arrumar o cabelo.

— A estarei esperando no corredor.

Ele se levantou e se foi. Amália soltou um suspiro triste e a fitei.

— Não me olhe assim, achei que ele a eliminaria. Mandou uma princesa para casa.

Arregalei os olhos. Mas já?

— Então pôr que parece triste? Não deveria ficar feliz por mim?

Ela me lançou um olhar estranho.

— Claro, venha vamos arrumar seu cabelo.

Amália não gostava da minha presença e isso não me chocou.

— Tem certeza que vamos conseguir chegar sem nos perdemos? — perguntei após sair e o encontrar encostado na parede.

Edward riu me oferecendo o braço.

— Não, mas pense nisso como uma aventura.

E não nos perdemos, Edward me acompanhou até a porta da sala sem se perder. No caminho ele me contou quantos quartos e salões de baile o castelo possuía, fora os das concorrentes e da criadagem o lugar possuia mais de 650 quartos, seis salões de baile, cinco jardins, três estábulos.

O centro militar não ficava dentro das muralhas do castelo, e sim, escondido, de acordo com ele eram três estrategicamente posicionados ao redor de Mountsin.

— Essa é a sala — anunciou.

— Obrigada por me acompanhar até aqui, Edward.

— Eu me oferecia para busca-la, mas infelizmente tenho outros compromissos. Conseguirá voltar sem se perder?

Havia um tom de diversão na sua voz e não pude deixar de sorrir.

— Eu poderia te fazer a mesma pergunta. — Seu sorriso aumentou. — Sim, conseguirei alteza.

Edward fez uma referência.

— Então tenha uma boa aula — e se foi.

Encarei a porta que possuía espirais entalhadas em cada canto e no meio símbolos, palavras antigas e figuras de pessoas.

Bati na porta e como ninguém respondeu a abri entrando e me deparando com uma biblioteca bonita e espaçosa.

Um grande mapa do reino estava pendurado de uma forma que era visível pela sala toda. Havia estantes de madeira maciça com livros diversos e várias cadeiras confortáveis.

O lugar era iluminado por um castiçal de vidro suspenso no teto curvo. Fora as velas que ficavam presas na parede por suportes de ouro.

Grandes janelas redondas iluminavam o ambiente com a luz da manhã proporcionando uma bela vista para um dos jardins. Várias pinturas de cidades e pessoas adornavam as paredes.

Uma longa escada levava ao segundo andar e lá em cima mais livros eram distribuídos nas estantes.

Maravilhada soltei um suspiro alto e então notei uma mulher de óculos sentada de frente para uma mesa de mogno escura. Ela me olhava de uma maneira fria.

— Sinto muito eu não a vi. Eu me chamo...

— Sei quem você é. Vamos logo, eu não tenho o tempo do mundo. Sente-se — me interrompeu com uma voz fina e autoritária.

Me sentei na mesa a sua frente e comecei a pensar que isso passou do céu ao inferno em questão de segundos.

☽⋯❂⋯☾

— Qual é a fonte do comércio de Vinea?

— Açúcar?

Ela me atingiu com uma régua na cabeça, já era a segunda vez que fazia aquilo e isso estava me irritando.

— Não, você acabou de ler sobre isso no livro que te dei.

— Dez minutos não é suficiente para terminar de ler um livro de cinquenta páginas.

— Tem pessoas que terminam antes e você ainda reclama?

— Eu não sou uma dessas pessoas.

— Se quer ser a futura princesa deveria ser — ralhou.

— Mas eu não quero! Então não preciso saber sobre o que diabos Vinea vende para os outros reinos.

— Senhorita Swan, mesmo que não ache isso talvez essas aulas vão salvar sua vida algum dia. Agora quantos reinos tem mineradoras?

— Eu não faço ideia, você não me deixou terminar de ler.

Outra batida na cabeça.

— Em história você é um desastre — disse andando de um lado para o outro da sala com o livro em uma mão e na outra a régua. — Sem contar com seu péssimo modo de sentar — seus olhos azuis glaciais me mediram de cima a baixo. Me sentei mais ereta e tentei não ficar com raiva. — Em matemática e português você é bem melhor que a média.

Isso foi um elogio da bruxa velha?

— Então não sou tão ruim assim? — perguntei, sorrindo.

— Não foi o que eu disse. Você é horrível. Mas tem salvação.

— Se meu Anjo amável me dissesse seu nome eu ficarei mais a vontade.

Ela não me disse. Apenas me deu um caderno com umas equações estúpidas para eu resolver em cinco minutos e depois o livro em dez.

— Me chame de Senhora.

A senhora era do tipo malvada ao extremo, até a sua aparência arrepiava meus cabelos da nuca. Tinha cabelos brancos com mexas loiras saindo do coque mais apertado que já vi.

Suas roupas consistiam em um vestido vinho escuro. Usava saltos altos pretos e possuía rugas em torno dos olhos e ao lado dos lábios, não de sorrir, mas de os puxar para baixo em desgosto.

— Certo, então será Anjo.

Anjo cerrou o maxilar e ajustou os óculos pequenos no nariz pontudo.

— Plebeus gostam de se apelidar. É tão repugnante. Vamos trabalhar nessa sua personalidade insultuosa.

— Claro. E depois nas suas boas maneiras.

Ela ergueu a régua e tentou me atingir, mas a segurei. Perdi o sorriso de desdém e a encarei sem emoção.

— Como ousa...

— Aceitarei suas palavras ruins e até seu comportamento ofensivo. Ou até mesmo o fato de que não me dirá seu nome. Mas não vou aceitar que me bata. Não serei humilhada por tipos iguais a você.

Soltei a régua e me levantei.

— Ainda tem muito o que aprender — falou quando saiu do estupor.

— Sim, eu sei. Voltarei amanhã. E espero que essa régua tenha sumido até lá. Ou encontrei um lugar não muito agradável para você colocá-lo. Se me dá licença, Anjo — abri a porta e sai a fechando na sua cara petrificada.

Me apoiei na parede no corredor.

Eu nunca fui tão radical em toda a minha vida. Achei que ela me bateria com aquela régua novamente antes que pudesse terminar de falar, mas não ficaria com a cabeça baixa.

Respirei e olhei para o corredor.

Onde ficam os quartos?

Havia dito ao Edward que sabia onde eles ficavam, mas a verdade era que não sabia.

Pensei em perguntar para um dos guardas, mas vi Leon falar com um deles e depois me notar ali parada. Ele falou algo para o guarda e o dispensou vindo na minha direção.

Que conveniente, eu realmente queria vê-lo para dizer a minha decisão sobre seu trato.

— Pela sua expressão, a aula foi divertida.

— Tão agradável quanto o coice de uma mula.

Leon sorriu de lado e aquilo fez algo em mim se agitar. Era uma mistura de sorriso de menino travesso capaz de amolecer até o mais frio coração.

O príncipe herdeiro era muito bonito, e a luz do dia, quando seus olhos ganhavam um brilho e um tom mais claro era fenomenal. Seus cabelos estavam perfeitamente arrumados, menos pela mecha rebelde que caia pela sua testa.

— Acho que o coice seria mais divertido.

— De fato, alteza.

— Quer que eu a acompanhe até seu quarto? Parece um tanto perdida.

— Dei essa impressão?

— Não, mas a maioria das pessoas sempre se perdem aqui.

— E você não é essa maioria, presumo.

Seu sorriso se tornou misterioso.

— Não. Odeio não conhecer algo, me deixa em desvantagem. E a desvantagem me faz perder.

Não consigo não os comparar. Enquanto Edward apenas vivia pelo momento, Leon planejava cada passo e sempre estava adiantado como se tivesse dado uma olhada no futuro e sabido em que posição jogar.

— Você não gosta mesmo de perder.

— Ninguém gosta de perder, Srta.Swan e sei que você também pensa igual — ele me ofereceu seu braço e o segurei sentindo o calor de seu corpo.

Era diferente de estar com Edward, não sabia se devia ao fato de ter contado a ele que não me interessava pela competição ou que ele queria a minha ajuda.

Estar ao lado de Leon me fazia ficar ansiosa esperando algo que eu nem sabia o que era.

— Então quem é a sua professora?

— Hum... Anjo?

Leon soltou uma risada sonora que vibrou pelo meu corpo.

— Anjo?

— Ela não me disse o nome e sinceramente eu não vou insistir.

— Ah! Então você está tendo aula com ela.

Ela?

— Você não foi a única a ficar sem saber o nome daquele ser meigo. Ela já me deu aula, talvez tenha dado até ao meu pai. Não tenho ideia de a quanto tempo está conosco.

— Ela não disse nem para você?

Céus! Ele era o futuro rei!

Leon deu de ombros.

— Não, mas talvez Anjo de fato lhe caia bem.

Ele me deixou na porta do quarto.

— Até breve — disse pegando minha mão e depositante um beijo e seu hálito gelado arrepiou os pelos do meu braço.

Leon começou a se afastar e me lembrei do que tinha para falar a ele.

— Alteza! — ele se virou. — Eu aceito.

Aquilo era a coisa sabia a se fazer, ele me mandaria embora mais rápido.

Não era presunção da minha parte admitir que pelo modo como Edward me olhou hoje e que não fui eliminada ainda, ele não me mandaria embora tão cedo. E não queria lhe dar falsas esperanças.

Leon sorriu.

— Ótimo. Amanhã mandarei um guarda para te buscar, lhe darei sua primeira tarefa.

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