Capítulo 40
Acordei em uma cela e a rainha estava lá e perguntou onde estava o rei. Minha reação foi suficiente para ela começar a chorar e a gritar com os guardas.
Nada adiantou, nenhum dos guardas cederam.
Porque eles eram guardas do Leon e ela já nem era mais considerada rainha.
Já tinha se passado três dias.
Não tinha coragem em abrir os olhos. Tudo voltava e preferia não reviver aqueles momentos. Sabia que teria que fazer e doiria cada segundo ao lembrar do que Leon fez.
De saber que ele não era o mesmo. De saber que tudo o que vivemos não significou nada para ele, que não teve o mesmo significado.
Preferia nunca mais abri-los. Nunca mais sentir. Nunca mais voltar a vê-lo e desejar que ele voltasse a ser Leon.
Meu Leon.
Abri os olhos depois de horas e observei meu quarto. Era uma masmorra de pedras com grades grossa e velhas. Um cheiro putrido preencheu minhas narinas e tive vontade de vomitar.
O lugar era úmido e cheio de bolor. Não havia luz suficiente, apenas uma fresta horizontal na parede mostrava que era dia.
Me sentei na cama, que consistia em uma pedra esculpida na parede que me deu dor nas costas. Porém a dor era bem vinda, para alguém que agora tinha um vazio no peito qualquer resquício de um sentimento era uma dádiva.
— Finalmente acordou — falou uma voz a minha esquerda e a olhei.
A rainha parecia abatida e me olhava preocupada, eu a evitava fazia tempo, apesar de seus esforços em começar uma conversa.
Em toda a minha estadia no castelo ela nunca conversou comigo de igual para igual. E ali estava ela, falando comigo como uma velha amiga.
Depois de chorar pelo rei morto, ela ficou em silêncio e depois tentou começar conversas comigo, sobre qualquer coisa.
Porque ela ainda lutava? Não lhe restava mais nada. Não tinha mais um título, não tinha mais o marido, nem os filhos, ou a liberdade.
— Achei que estivesse morta — continuou. — É entediante aqui sem ninguém para conversar, somente os ratos são amigáveis.
Voltei meu olhar para a porta e deitei novamente.
— Fingir que não aconteceu é bem pior. Ele é um monstro. Quanto antes aceitar melhor — sussurrou e voltei a fechar os olhos.
Quero sumir.
A rainha começou a cantarolar e a bloqueio do cérebro. Me bloqueio de mim mesma.
Eu era um mar fundo e sem fim. Podia ver a luz em cima, porém me recusava a subir e deixar o sol me penetrar; somente as trevas me saciava. E adorava a sensação de imensidão e solidão.
Tudo ficou escuro e adormeci.
Sonho com cores vermelhas, azuis e cinza. Elas se misturavam e criavam pessoas, lugares, animais. Depois elas me queimavam e eu não passava de cinzas ao vento.
Suas palavras e momentos que passamos juntos começaram a ganhar vida e forma.
"Eu iria até o inferno para te trazer de volta."
Não porque se importasse comigo, mas porque necessitava do poder que corria nas minha veias.
"Preciso de você."
"Pôr que você me faz sentir poderoso."
"Eu te amo, Rosemary Swan. Eu preciso de você, somente você."
Acordei quando o barulho de alguém abrindo a cela soou.
Levantei e vi a mesma loira de antes olhando para mim com desprezo.
— Ele quer vê-la.
— Eu não quero vê-lo — falei com a voz rouca.
A rainha estava encolhida em um canto encarando nos duas.
— Não foi um pedido — Lilith pegou meu braço me puxando com uma força anormal. — Vamos.
Minha pernas estavam tão francas que ela tinha que me arrastar escadarias de pedra a cima. Havia vários setores na masmorra.
Muitos corredores e tochas crepitante.
Seus saltos faziam barulho no chão afastando os ratos que corriam por cada canto.
Havia guardas também, todos com os trajes escuros.
Guardas dele.
Quando a luz tomou conta estávamos em uma escada de madeira e saímos em direção a um corredor.
Depois de tanto andar reconheci o corredor que levava ao salão do trono.
Agora eu o via com outros olhos. Nunca pensei que fosse tão intimidador, grande.
As pesadas portas foram abertas por guardas e entrarmos.
Leon estava lá sentado em seu trono de ossos. De alguma forma a cena pareceu se encaixar. A maldade que o trono necessitava com a maldade no coração do príncipe.
Eles pareciam uma pintura diáfana.
Alguns de seus homens conversavam com ele e assim que nos viu ele os dispensou com um aceno de mãos.
— Olá, minha querida. Faz alguns dias que não nos vemos.
— Está entregue — Lilith me soltou e oscilando quase cai.
— Seja mais cuidadosa — grunhiu Leon.
— Continue seu teatrinho Leon, sabe sobre o preço pelo qual pagou. O poder sempre cobra — disse saindo do salão e Leon suspirou.
— As vezes Lilith é emocional demais. Veja como está imunda. Isso é culpa minha. Ela não confia em mim perto de você, então me obrigou a colocá-la na cela.
Encarei seu rosto e a dor que achei ter sumido voltou. Na realidade acho que nunca foi embora.
— Quem ela é? Sua amante?
— Ciúmes, Rose? Não fique, ela é apenas uma velha conhecida. Fergus — chamou e ele entrou e fez uma reverência. — Trouxe o que lhe pedi?
— Sim, meu rei — havia uma cesta em sua mão e ele colocou nos meus pés.
Rei.
Será que ele já foi coroado?
— Agora saia — Fergus passou por mim abrindo um sorriso cruel para minha aparência.
Queria ter ficado chateada com sua traição. Mas era óbvio que ele também tinha aquela crueldade de Leon.
Semelhante atraia semelhante.
— Se troque — pediu Leon e encarei a cesta.
— Estou bem com este vestido — mesmo que o cheiro e a aparência já tivessem perdido o encanto.
A raiva era nítida em seu rosto e antes que ele pudesse dizer algo as portas fazem um estrondo ao serem abertas.
Alba entrou belíssima em um vestido cinza e dourado.
— Alba, pensei ter sido claro quando disse que nosso noivado acabou.
Ela não fez reverência e me olhou de forma gélida e analisou minha aparência. Se estranhou algo não demonstrou.
— É assim que trata sua nova noiva? Graças aos céus que não sou mais a sua — disse o encarando. — Se vai acabar com nosso noivado então espere as cartas de quebra de paz até amanhã. Gulaab e Mountsin estarão em guerra.
— Tão dramática. Quase me faz pensar que está com ciúmes. Mas sei que não possuí coração, então é impossível ter tal sentimento.
— Tem certeza que não está falando sobre si mesmo?
Leon soltou uma risada.
— Está certa. E é por você sentir demais que nunca teríamos dado certo — ele se levantou do trono e caminhou até ela. — Alba a princesa de coração de ferro. Era seu apelido no seu reino, creio eu — Leon começou a rondar ela que permaneceu parada como uma estátua . — Como acha que eles ficariam ao descobrir sobre sua paixão secreta?
Um leve tremor em seus olhos.
— Nunca tive tal coisa.
— Entre nós dois você é a mais habilidosa para mentir. Devo admitir que encobriu durante muito tempo. Mas eu descobri com quem se deitava — ele se inclinou e sussurrou em seu ouvido. Alba ficou pálida. — Amava tal escória, Alba. Uma reles...
— Basta — disse o encarando. Teria ficado assustada se fosse Leon com o olhar da princesa. Mas o olhar só desencadeia um sorriso no príncipe. — Ela está morta, seu pai a matou. Não tem como a usar contra mim.
Pisquei tentando compreender de quem falavam.
Seria a plebéia?
Alba e ela?
— Não — ele se afastou e parou na frente dela. — Então foi por isso que continuou sendo minha noiva. Apenas para se vingar de meu pai ou talvez destruir este reino? Pode tentar, mas seus pais não a deixaram. Não passa de um fantoche dos dois.
O modo como falou de seu falecido pai me fez pensar que não havia divulgado que ele estava morto. Não que ele fosse dizer que fora ele quem o matou, mas achei que já teria inventado alguma desculpa.
— O que ofereceu a eles?
— Nada, ainda. Mas conheço os desejos dos humanos. Sei o que almejam — seu sorriso era lupino.
Encarei Alba.
Ela sabia que ele não era humano? Mas sua expressão não era surpresa quando o ouviu se dirigir aos seus pais como humanos.
Ela me olhou.
— Pôr que me chamou aqui?
— Para ajudar Swan a se vestir.
Alba abriu um sorriso frio.
— Por que acha que o farei?
— Ao invés de conceder os desejos de seus pais eu poderia lhe conceder — ela pensou durante um bom tempo. — Vamos, Alba. Sabe que é um negócio vantajoso.
— Um contrato com o diabo não é vantajoso para quem o faz. Mas espero que cumpra — ela se abaixou e pegou o vestido.
Dei alguns passos me afastando.
— Não, Rose. Vai se trocar aqui — disse Leon amorosamente.
O olhei com nojo e incrédula.
Como fui tão tola de não perceber? Como não escutei os avisos?
O monstro que habitava o corpo de Leon. O monstro que não vi nele.
Burra.
Tola.
— Não farei isso.
— Ótimo, então eu matarei Alba — disse de forma casual.
A princesa me olhou de canto de olho e meu coração se acelerou.
O que era aquilo? Uma brincadeira sádica?
— É só uma roupa, Rose — disse Alba.
Mas não era.
Existiam várias formas de tortura.
A física e a psicológica.
Leon parecia gostar de ambas.
Sem paciência o príncipe puxou sua espada e entreguei a cesta a Alba com raiva e uma vontade de chorar.
— Sábia decisão — falou Leon sorrindo ao se afastar e retornar ao seu trono.
Alba se aproximou e começou a retirar meu vestido. Estava praticamente nua com os olhos de Leon em mim. Os dedos de Alba tocaram minhas costas nuas e engoli em seco.
Ela se demorou na parte de trás das saias.
Só com uma roupa de baixo simples ela me ajudou a colocar o outro vestido da cesta.
Encarei seu rosto sem expressão.
Alba tinha visto minhas cicatrizes.
Seus olhos se fixaram nos meus enquanto ela ajeitava a parte da frente.
— Devia ter ido embora, plebéia — falou baixinho só para mim.
Quando abri a boca para lhe falar que ele havia matado a outra plebéia Leon disse:
— Pode sair, Alba.
Alba de afastou e assentiu.
— Não esqueça o preço desta humilhação compartilhada Leon — alertou saindo do salão.
— Deve estar com fome — disse olhando para mim com tanto amor que apertei o punho.
Estava começando a odiar cada gesto e olhar que me fez ama-lo.
☽⋯❂⋯☾
Não resisti quando pegou minha mão e me levou até o salão de refeições. Seria inútil.
E eu precisava avaliar minha situação. Saber quem ainda estava vivo ou não. Se Edward, Ivna e Yanna estavam bem. Não ouvi nada sobre nenhum deles.
Uma refeição farta estava disposta sobre a mesa e parecia que foi a anos que não comia nada decente. Mas minha fome simplesmente não existia e ao olhar sua mão na minha sentia enjoo.
Ele puxou a cadeira e me sentei. Tudo de forma normal, rápida. Não podia deixá-lo perceber que eu estava arquitetando um plano de fuga. Porém antes, eu precisava saber daqueles que me eram importantes.
Não seria morta, não depois de tanto ter lutado para finalmente me ver livre.
Ele se sentou na minha frente e colocou vinho na minha taça.
— Coma, está pálida.
Não queria fazer mais ninguém sofrer então obedeci seu pedido e forcei um pedaço de tomate goela a baixo.
— Onde está as outras competidores? — perguntei sem paciência.
— Assim não tem graça. Vou lhe dizer somente sobre um deles. Escolha.
Mais jogos.
O único problema era o jogo, já que eu sabia o prêmio final. Minha morte.
Não pense nisso agora.
Quem eu estava mais desesperada para ouvir que estava bem... Edward? Ivna? Imyir? Yanna? Todos são importantes para mim. Não conseguia negligenciar um.
E se Leon mentir sobre cada um deles?
Sabia que ele o faria. Mas meu coração não aguentaria a espera.
Decida.
— Esta demorando demais — falou interrompendo meus pensamentos. — Eu escolho. E vai ser... a princesa Yanna — pisquei rapidamente e fiquei desapontada. Embora quisesse saber sobre ela, era errado até mesmo pensar, porém ela estava em último lugar na minha lista. — Vejo que não se importa com o bem estar de Yanna.
— Pelo contrário — disse tentando sorrir e fracassado. — Então, como ela está?
— Muito bem. Está no quarto dela desfrutando dos seus últimos dias no castelo.
Era um jogo perigoso, não sabia o próximo passo do meu adversário, só tinha em mãos o manual de instruções.
Ele precisava de mim, um parente de sangue para o sacrifício. Não tinha necessidade de matar mais pessoas. Porém tudo o que percebi sobre esse Leon, é que matar era um prazer e ele gostava de fazê-lo.
Tinha que ser mais esperta. Precisava planejar um plano de fuga, antes do dia do ritual. Não sabia quando aconteceria, essa era uma desvantagem enorme.
Ele parecia ler cada pensamento meu e tentei manter minha mente vazia.
Não posso ir antes de saber que estão todos bem.
Bebi o vinho que restou na taça. O doce sabor da uva alegrou minha garganta.
Peguei um pedaço de pão e o comi.
— Pensei que teria que forçá-la a comer — falou sorrindo. — Que bom que ainda tem animo para comer.
Preciso de energia para fugir.
— Vivi minha vida comendo junto a pessoa que mais me fez mal. Está refeição com você é até agradável.
— Nunca me contou como foi que esta pessoa marcou suas costas. O porquê de ter feito — tentei não me abalar com suas palavras. Mas tremi involuntariamente. — Queria tê-la marcado antes. Uma pena.
— Não preciso destruir sua imagem da minha cabeça, você faz isso muito bem sozinho — minha garganta estava fechada e não consegui colocar nada para dentro.
Seus olhos azul cobalto pareciam divertidos com a situação.
— Você está errada — ele pegou um morango grande e o encarou. — Você construiu uma imagem minha na sua cabeça. A de um príncipe encantando montado num cavalo branco que te salvaria desse mundo cruel e amendontrador. Claro, eu posso ter contribuído para sua fantasia. Mas todo o resto, foi você Rose. Eu encobri minha verdadeira identidade, mas acho que lá no fundo você sabia. Só não queria admitir para si mesma que o homem que amava era tão cruel — seus olhos se prenderam nos meus e inspirei segurando com força a taça. — Tenho uma reunião agora. Nos vemos mais tarde — ele se levantou e se retirou.
Joguei a taça no chão a vendo quebrar. Estava ferida com suas palavras.
Ele queria me fazer sentir culpada, como se eu fosse a errada por tê-lo amado.
Odiava tal tortura, preferia ser ferida com a ponta de uma faca. Seria mais agradável.
Me levantei e peguei a faca na mesa olhando em volta para me certificar que nenhuma guarda viu.
— Não faria isso se fosse você, humana — disse a loira Lilith, sorrindo parada ao lado da porta. — Ele é muito mais forte que você. E eu também sou.
Virei a faca de um lado para o outro.
— Ainda sim eu posso acabar com tudo isso.
— Então eu teria muito o que limpar depois. Mas você não vai fazer. É covarde, e sabe porque eu sei? Humanos temem a morte mais do qualquer coisa.
A coloquei na mesa.
— Tem razão, mas eu não sou humana, lembra?
Seu sorriso cresceu.
— Talvez não tão burra quanto achei que fosse. Vamos — ela abriu a porta para mim.
Eu podia correr. Podia atirar a faca nela e isso me daria alguma vantagem. Mas ela podia se curar rapidamente? Ela tinha esse poder? Era mais rápida que eu?
Pensei em várias alternativas, no entanto nenhuma com um resultado positivo para mim.
Fui até ela. Porque era a única coisa que eu podia fazer agora, observar, ouvir e planejar.
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