CAPÍTULO 25 - PRINCESA DOS DRAGÕES



Cedo ou tarde Leozinho seria capturado e eu não sabia o que fazer para tirá-lo do castelo, já estava entrando em desespero. Pensei em fazer uma corda de lençóis, as o penhasco em que estava o castelo era alto de mais e eu não conseguiria expô-lo em risco. Me doeu perceber que ele pensava na mesma ideia, e que preferia morrer tentando do que voltar para Algea.

Quantos rebeldes estariam no castelo? Estava atrás do livro de Feitiços também, aposto, e das cartas de Hemera, que estavam seguras comigo. O vento soprou forte através das janelas. O fogo já apagava na lareira. Me aproximei da janela. E ao olhar além vi algo enorme voando baixo perto da copa das árvores e vinha para cá. Meu coração deu um salto, não sei se tenho forças para canalizar poder para enfrentar mais um inimigo.

Ouvi um estrondo e passos, me concentrei na vista da janela, o que parecia um morcego, virou algo muito maior, um dragão alado, seu corpo senpertino era inteiramente de cor escarlate com escamas afiadas acima da cabeça, e na longa cauda, suas costas tinhas chifres espinhosos, suas asas eram grandes, suas pernas traseiras eram curtas, dentes longos despontando da boca horrenda, os olhos felinos eram amarelados. O que era melhor, enfrentar mais guardas e revelar minha identidade ou um dragão. Suspirei fundo. Eu vou domar essa fera.

– Vieram me salvar! – disse Leozinho. Ele desceu do meu colo quando o dragão se aproximou o suficiente para que sua respiração quente soprasse meus cabelos.

– Rápido! – disse a mulher que o montava, ou melhor dizendo. Gal o montava, a qual só agora havia reparado – É, as pessoas sempre perdem o fôlego ao ver Félix pela primeira vez – ela me deu um aceno com a cabeça enquanto olhava a cena boquiaberta.

Leozinho deu-me um abraço apertado de surpresa e acariciei-lhe os cabelos, me lembrando que essa seria a última vez. Uma pedra se lojou no meu peito. Ele estava partindo, mas era melhor do que ser morto ou escravizado. Ele me olhou com o carinho de um filho e seguiu para o parapeito da janela, soltou minha mão e agarrou a de Gall.

Olhei para a pintura que se formava em minha janela, o dragão, Gal usando um macacão preto e os cabelos ruivos voando e Léo agarrado a sua cintura, dirigindo-me um olhar triste, como se quisesse fazer algo por mim, como se me pedisse para ir também...

– Cuide bem dele – ordenei com um olhar feroz a Gal.

Gal deu-me um último aceno e Leozinho deu tchau com a mãozinha estendida ao vento, até a imagem dos dois se tornar um pontinho preto no céu. Um estrondo na porta do lado de fora. Me joguei com força contra no chão cheio de vidro e fingi um choro.

Guardas invadiram meu quarto bagunçado, eu estava encolhida no chão e chorava e soluçava e gemia de dor.

– Onde está o garoto? – um deles perguntou.

– Eles o levaram, eu não sei onde ele está – respondi entre as lágrimas.

Os guardas então começaram a revirar tudo no quarto. Dylan entrou e ao me ver no chão correu até mim. Ele pousou as mãos ao meu redor e me levantou, ao mesmo tempo me abraçou.

– Está ferida – ele disse verificando os cortes no braço e no rosto.

– Não é nada grave, mas... eu tentei impedi-los Dy, mas não consegui.

Ele depositou um beijo na minha testa e me colocou na cama. Os guardas voltaram depois de olhar todo o quarto.

– Não encontrei nada.

– O mesmo aqui.

Então vieram até mim e me agarraram pelos cotovelos.

Dy se colocou na frente deles.

– Ei, o que estão fazendo? – ele perguntou com o olhar escurecido.

– Temos ordens de leva-la, será considerada cúmplice até que se prove o contrário.

Ele levou a mão a espada, mas parou ao perceber o pedido em meu olhar.

Os guardas me escoltaram pelos corredores e escadas abaixo. Meus pés estavam descalços e feridos, meu pijama atrás estava colando nas costas com o sangue, meu coro cabeludo doía e sangue escorria de algum lugar, meus olhos estavam marejados, mas mantive a cabeça erguida. Leozinho conseguiu escapar.

Chegamos à sala do trono, as portas foram abertas e todos já estavam lá, o rei e seus dois filhos. Lucas se levantou ao me ver, mas o pai gesticulou para que se sentasse. As mãos de Annie foram do colo para o peito. Margot sorria disfarçadamente por baixo da preocupação, Despina estavam com expressão de desinteresse e Camila parecia petrificada em ódio e mágoa, a encarei por tempo demais quase ao ponto de voar em seu pescoço ao me lembrar do seu quadro, mais especificadamente do dragão que ela pintou, Félix.

– Então – disse o rei – Você acobertou um rebelde e o trouxe para o nosso castelo.

– Pai – interveio Lucas, mas o rei levantou a mão e ele se calou.

Quantas vezes aquelas mãos além de lhe calar haviam lhe agredido.

– Não – falei – Eu não sabia que ele era um rebelde.

– E onde ele está agora, já que estava sob sua responsabilidade? – ele perguntou.

– Eu não sei. Eu não estava no meu quarto. Quando cheguei só encontrei dois rebeldes que tentei impedir, mas eles eram muito fortes, o pequeno Leão já não estava mais lá.

– Ela está mentindo – falou Margot com tranquilidade – com certeza o ajudou a fugir, isso se não estiver envolvida nos movimentos rebeldes. – Ela arqueou uma sobrancelha.

Vaca!

– Não seja estúpida – falei me controlando para não a xingar.

Ela andou alguns passos até mim.

– Você não tem provas e...

Neste momento as portas da sala se abriram e Levi entrou caminhando casualmente, logo atrás Dylan.

– Ela estava comigo na biblioteca quando aconteceu – ele anunciou.

Me virei parcialmente para ele. Mantive a expressão neutra, mas por dentro incrédula. O mago estava me defendendo. Margot já não conseguiu esconder a surpresa.

– Dois guardas revistaram o quarto da senhorita Selena e não encontraram nada majestade, a mesma estava debilitada no chão – interveio Dylan.

O olhar o rei se suavizou, ele estava agora analisando a situação.

– Aliás – Levi continuou e dois guardas entraram trazendo duas pessoas encapuzadas que vimos na biblioteca – esses aqui estavam perambulando por aqui em busca de alguma.

Ele não mencionou onde estavam e nem o que procuravam na passagem secreta.

– Selena e eu estávamos lendo e conversando quando ouvimos barulhos suspeitos e pedi a ela que voltasse ao quarto e se refugiasse.

O rei o encarou com olhos mortais, Levi sustentou o olhar por baixo dos óculos redondos. O rei perder, gesticulou para os guardas me largarem e me afastei, os dois rebeldes agora ocupavam o meu lugar. Voltei meu olhar para Camila, ela encarava os dois rebeldes com os punhos fechados, imaginei se os conhecia. Dylan apareceu ao meu lado.

– Você precisa parar de me deixar preocupado – ele disse passando as mãos pelos cabelos.

– E você precisa confiar mais em mim – retruquei com um sorriso.

***

No dia seguinte acordei tarde, bem depois do almoço. Devo ter ido dormir de madrugada depois do banho e de Ivy ter cuidado dos meus ferimentos. O que acordou foi o som de batidas na porta. Entreabri os olhos e vi Ivy fazer uma reverência antes de Lucas entrar no quarto com uma bandeja de café da manhã. Ivy se retirou nos deixando à sos.

– Eu que deveria fazer isso, afinal você que ganhou a corrida – falei e abri a boca de sono. Ele sorriu e se sentou na cama.

– Como você está – ele perguntou.

– Melhor – respondi, o que na verdade era mentira. Eu sentia falta de Leozinho desde que ele tinha soltado a minha mão e também estava muito preocupada. Peguei um macaron com o copo de leite. Agradeci-lhe pela gentileza e ele olhou para as próprias mãos.

– Eu deveria ter te defendido daquelas acusações – ele falou com a voz embargada – Eu não consigo enfrentar meu pai...

– Não quero que se prejudique por minha causa e quando você for rei, poderá ser um rei melhor... um rei melhor que ele – falei e coloquei minha mão sobre a sua.

Lucas levantou o olhar e me encarou um momento.

– Pensei que iria conseguir me controlar depois de ontem – disse ele olhando para meus lábios – Mas acho que é um esforço em vão.

Minha mão começou a suar sobre a sua, então a voltei para meu colo, mas as mãos dele me perseguiram e passearam pelo meu maxilar, enxerguei as águas do lago da deusa Selene e senti novamente as mesmas sensações. Percebi que eu desejava que todas as manhãs e tardes podiam ser como ontem, porque eu me senti feliz pela primeira vez e Lucas também, e eu ouvi sua risada genuinamente pela primeira vez. Um palmo nos separava agora, mas Lucas esperava que eu concordasse, entreabri os lábios com um convite e Lucas me beijou.

A bandeja de café já vazia caiu no chão tilintando, mas continuamos nos beijando. Não sei porque permiti que acontecesse de novo, só sei que não quero pensar nisso agora, nem pelos próximos dias, se não, não poderei beijá-lo mais vezes. Senti sua mão em minha cintura, pousada ali delicadamente como um pássaro em seu ninho, com cuidado para os meus ferimentos. Meus dedos adentraram seus cabelos macios, tudo em Lucas era tão reconfortante, suas mãos, seus cabelos e sua boca que agora reivindicava a minha numa dança sinuosa.

Ele parou um momento e me olhou. Não sei qual era minha aparência, mas seu olhar se incendiou. Dessa vez foi diferente de ontem, tinha gosto de saudade, como se sua boca estivesse com saudade da minha. Senti meus lábios dormentes, mas queria que ele continuasse.

– Eu queria te beijar desde o baile de máscaras – ele disse – pelo menos tentar.

Dei um sorriso.

– Você não conseguiria – falei.

– Mas por isso eu queria tentar, você é desafiante, mas é um desafio que quero fazer de tudo para vencer.

E então eu o beijei.

***

Lucas ficou um pouco mais no meu quarto. Expliquei a ele que não fazia ideia de que Leozinho era um rebelde, mas omiti a parte que o entreguei a eles. O tempo todo eu me perguntava se ele estava bem, principalmente agora que era um procurado, um criminoso contra o reino.

No fim da tarde decidi sair para caminhar um pouco. Fui até o jardim da frente e fiquei observando a estátua de uma arqueira. Até que ouvi algumas pessoas saindo com roupas brancas respingadas de sangue carregando duas macas com corpos cobertos por um saco preto, a mão de um pendendo de uma delas, pingando sangue, uma empregada vinha limpando e reclamando atrás até que esconderam a mão.

Controlei o enjoo que crescia em meu estômago. Os homens saíram e entraram em uma carruagem velha. Seguiram pela estrada principal, imaginei aonde levariam eles.

– É isso o que acontece com traidores – disse uma voz imunda atrás de mim. Frank.

– O que aconteceu com eles? – perguntei.

– Foram corroídos em ácido e agora terão seus membros espetados em estacas na praça central.

Cobri a boca com a mão.

– Mas isso é tortura! – gritei.

– E o que que tem? – ele deu de ombros.

– Não era para os iluminados serem os bonzinhos e os sombrios os malvados?

– Certo, mas os sombrios já foram para o espaço, assumimos os dois lados da moeda – ele respondeu e ergueu meu queixo.

O enjoo que eu sentia aumentou, dei-lhe uma mordida na mão e sai correndo. Corri até o banheiro mais próximo e vomitei, vomitei o café da manhã que Lucas havia levado para mim. Uma repulsa muito grande embrulhou meu estômago. Uma criança em um movimento rebelde, pessoas sendo torturadas e os culpados tendo uma vida luxuosa aqui, não sei se aguento ficar sob o mesmo teto.

Fui até um canto e bebi um pouco de água, vi Camila passando no cato oposto, usava um kimono vermelho como sangue, o cabelo preso com palitos afiados. Resolvi segui-la de longe, apertei o passo, quando não havia ninguém agarrei o seu ombro e pressionei-a contra parede com meu braço abaixo do seu queixo.

– Ei! – ela soltou uma exclamação, mas tapei-lhe a boca com a outra mão.

Eu sabia que ela não era indefesa, poderia me fritar em segundos, então fui direto ao assunto.

– O que você tem a ver com os rebeldes? E não adianta mentir para mim, eu vi o seu dragãozinho Félix. E sei que o seu reino é o lar deles.

Ela arregalou os olhos e retirei a minha mão de sua boca.

– Como sabe do dragão? – ela perguntou.

– Eu é quem faço as perguntas aqui – retruquei.

– Aqui não é seguro para falar disso...

– Eu quero saber agora – falei e pressionei mais meu braço ela.

– Está bem – ela levantou as mãos em rendição. Soltei-a antes que alguém visse alguma coisa.

Ela fez um sinal para que eu a acompanhasse até uma sala de estar vazia e nos sentamos. Mantive o olhar firme.

– Meu pai está pensando em se juntar a causa – ela respondeu – Oferecemos alguns dragões para o transporte de rebeldes e prisioneiros recém-libertados, mas não podemos atuar nós mesmos, pois como ainda estou na competição correria risco de vida e também meu reino.

– E aquele papo de expor corpos de rebeldes para amedrontar as outras pessoas?

– Isso é uma prática de Anelin. Nunca concordaríamos com isso e eu não sabia se você era confiável.

– Eu não sou – respondi e ela me encarou – Mas entreguei Leozinho a Gal e não sei se ele está seguro. – Ela balançou a cabeça – Você conhecia aqueles dois? – perguntei.

– Não, mas eu sabia o que iria acontecer com eles depois de pegos e não haveria escapatória.

Há metros dali os corpos dos dois rebeldes mortos com ácido e esquartejados eram expostos para todos verem, comerciantes e mercadores se amontoavam ao redor como urubus admirando a carne fresca.

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