Capítulo 75 - "Uma data perfeita"
O coração do duque ainda batia acelerado devido aos resquícios de seu êxtase. Já havia arrumado suas calças e se sentado no chão para recuperar a firmeza em suas pernas, a respiração ainda levemente descompassada enquanto observava sua amada ajeitar as saias emboladas do belo vestido esverdeado que usava.
-- Você está com cara de bobo. -- anunciou Cecilie com um sorrisinho luminoso nos lábios.
-- O que posso dizer em minha defesa? -- deu de ombros, displicente -- Sou um tolo apaixonado. Essa cara de bobo é uma consequência, amor. Lide com isso.
A princesa apenas revirou os olhos, balançando a cabeça em negativa, e terminou de ajeitar as malditas saias do vestido. Então ela se aproximou graciosamente e se sentou em seu colo. Imediatamente Thomas a segurou firme pela cintura enquanto buscava seus lábios num beijo profundo e ardente. Quando enfim se afastaram, permaneceram ali por alguns momentos. Unidos silenciosamente, apenas aproveitando a doce emoção de estarem nos braços um do outro. Se fosse possível engarrafar uma sensação, o duque guardaria com carinho a paz e felicidade plenas que sentia naquele momento. Incontáveis minutos se passaram, as respirações ofegantes voltaram ao normal, os corações retomaram o ritmo costumeiro.
-- Você não estava falando sério, não é? -- foi a princesa quem quebrou o silêncio.
-- Por que acha que não? -- perguntou seriamente, sabendo exatamente ao que ela se referia, uma sombra de sorriso nos lábios.
-- Porque é loucura! -- exclamou, mas o duque notou um brilho de curiosidade no fundo dos olhos cinzas tempestuosos.
-- Eu a choquei? Não foi minha intenção, asseguro. Foi só uma ideia, querida. Caso um dia surja o desejo de apimentar nossa relação.
-- Mas você... -- começou insegura -- Você gostaria que outra mulher viesse para nossa cama?
-- Não se isso deixá-la desconfortável. -- se inclinou para frente e depositou um beijo carinhoso em seu ombro.
-- Eu não tenho certeza de como me sinto quanto à tudo isso; você me pegou de surpresa, Thomas. -- a princesa se inclinou ligeiramente e passou a acariciar sua nuca -- E se eu nunca quiser que haja outra pessoa em nossa cama?
-- Então eu me esforçarei para que nunca enjoe de mim. -- deu de ombros -- Você tem o poder aqui, amor. Não só sobre o reino, mas sobre mim também. Farei tudo que você quiser.
-- Até mesmo assistir enquanto trepo com outro homem? -- ela parecia cética, incrédula.
-- Especialmente, amor. -- sorriu devasso -- Especialmente.
A verdade é que Thomas não é e nunca foi um homem possessivo. Sentiria ciúmes se Cecilie tivesse interesse amoroso por outra pessoa, com certeza. Mas quanto ao sexo... era apenas sexo. Desde que ele participe, ela pode muito bem se divertir com quem quiser. Ele já havia provado relações grupais algumas vezes e sabia o nível de prazer absurdo que aquilo tudo envolvia. Entretanto, caso ela nunca queira provar tais sensações, ele não se importaria realmente. Tudo o que queria o duque já tinha bem ali, sentada confortavelmente em seu colo.
-- Podemos apenas retomar o assunto daqui algum tempo? -- inclinou a cabeça levemente para o lado, lembrando-o de um pássaro atento -- Alguns anos, talvez... eu duvido que possa enjoar disso -- apontou entre eles -- antes de uma década de casamento.
-- Falando em nosso casamento, o que acha de escolhermos uma data? -- passou a traçar círculos na barriga dela com o indicador -- Em duas semanas será seu aniversário, poderíamos fazer uma comemoração dupla.
-- Você se lembra do dia do meu aniversário? -- soou comovida e admirada, os olhos cinzentos brilhando de emoção.
-- Como eu poderia esquecer o aniversário da minha melhor amiga? -- deu um peteleco no nariz dela, que sorriu grandemente -- Dezesseis de dezembro sempre foi uma data importante para mim. Mesmo praticamente exilado da Cidade Real desde seu desaparecimento, todos os anos eu vinha até sua cripta para lhe trazer flores neste dia.
A confissão pareceu deixá-la sem palavras por um momento. A princesa passeou seus olhos em cada detalhe do rosto do duque, que de repente sentiu o coração acelerar sob a intensidade daquele olhar.
-- Eu amo você. -- ela disse com reverência -- Eu amei o moleque desengonçado que você foi, amei o duque tolo e irritante que cantava músicas obscenas. Eu amo o homem maduro, determinado e corajoso que se tornou. -- ela se inclinou e depositou um beijo casto em seus lábios -- Amo cada pedacinho seu, Thomas.
Cecilie o beijou novamente, dessa vez numa carícia cheia de línguas e dentes e júbilo. Thomas sussurrou um eu te amo que foi imediatamente engolido pelos lábios macios e úmidos da amada. Quando finalmente se separaram ambos estavam com cara de bobos apaixonados, mas nenhum deles comentou o fato.
-- Enquanto eu esperava que saísse da reunião do Conselho, eu estive pensando mais uma vez no momento em que me apaixonei por você.
-- E você chegou à alguma conclusão?
-- Talvez. Mas primeiramente preciso saber se minha lembrança é real, e não uma alucinação de uma mente entorpecida pela dor. -- ela acenou em concordância, silenciosamente pedindo que ele continuasse -- Naquela caverna onde nos escondemos assim que fugimos da Fortaleza da Irmandade, depois que você cuidou de mim e conversamos um pouco. Você... você cantou uma canção de ninar?
Os olhos dela se arrelagaram em compreensão conforme a lembrança a invadia. Um sorriso curvou os lábios da princesa, que acariciou a bochecha do noivo num toque tão suave quanto pluma.
-- Você estava sofrendo, e eu não podia fazer nada, então... tentei lhe dar algum conforto. Eu pensei que não tivesse ouvido, na verdade presumi que já tivesse adormecido.
-- Eu estava meio acordado meio dormindo, acho. Aquela melodia foi tão doce... me ajudou a esquecer da dor e medo, a me lembrar que a vida pode ser bela, que eu não estava mais sozinho, afinal. Foi ali, amor. Você me ganhou numa canção de ninar.
Ao contrário do que Thomas esperava, o olhar da princesa tornou-se triste, apreensivo.
-- Eu fui tão terrível com você. -- sussurrou, visivelmente arrependida -- Eu dificultei tanto as coisas, Thomas! Muita coisa poderia ter sido evitada se eu assumisse logo meus sentimentos. Você me perdoa?
O duque a puxou para um abraço e beijou-lhe o topo da cabeça na tentativa de confortá-la.
-- Eu vou pensar no seu caso. -- ela o cutucou nas costelas, fazendo-o se contorcer levemente -- Mas agora é sua vez. Diga-me quando se apaixonou por mim.
-- Eu não tenho certeza de quando foi, amor. Fiz um trabalho tão bom em fingir não sentir nada, que não sei muito bem quando começou. Só sei que antes de amá-lo, eu o odiei. -- aquilo o surpreendeu -- Você constantemente me fazia questionar todas as minhas certezas, enfrentar todos meus fantasmas e traumas. E sua vulnerabilidade me deixava louca! A atração que me impulsionava para você sempre existiu, mas o sentimento... lembra-se da discussão que tivemos na taverna da Vila do Tombo?
Os olhos castanhos do duque escureceram ao se recordar da ocasião.
-- Eu lhe disse coisas terríveis, Cecilie. Me per...
-- Não, não se desculpe. -- o interrompeu -- Suas palavras me feriram, mas foram necessárias pois só então eu percebi o quanto sua opinião sobre mim era importante. Claro que antes disso eu já gostava de você, mas ali... foi quando eu percebi que gostava demais.
-- Vivemos muitas histórias em apenas seis meses, não é? -- ele perguntou com um sorriso nostálgico.
-- Sim, nós vivemos. -- ela concordou -- Antes de irmos, há algo que eu gostaria de contar. -- o homem aguçou o olhar, curioso -- Eu tive um sonho interessante essa noite.
-- Comigo? -- o sorriso de lado que ele lhe lançou foi absolutamente pervertido.
-- Não, querido. Com uma certa criança de cabelos castanhos e olhos azul acizentados.
-- Era... -- hesitou, subitamente inseguro -- Era nossa criança?
-- Antes de minha mãe ficar grávida de mim, ela teve um sonho semelhante. E como aconteceu com ela, a criança de meu sonho disse um nome.
Thomas estava se sentindo extasiado com aquela conversa. Um sentimento grande e inominado surgiu em seu peito, inundando-o de contentamento.
-- Diga-me, diga-me! -- pediu ansioso, incapaz de conter sua ansiedade.
-- Gaia.
O nome incomum era familiar aos ouvidos estudiosos de Thomas, que como a própria Cecilie, tinha uma fascinação especial pela mitologia grega. Gaia é a deusa Mãe, a personificação da própria Terra.
-- Teremos uma menina, então? -- sua voz soou exultante.
-- Thomas, foi apenas um sonho. Eu só quis compartilhar com você e...
-- Uma menininha! -- a interrompeu, puxando-a para um beijo rápido -- Uma menina batizada com o nome de uma deusa mitológica! Oh, Cecilie... ela será tão linda, tão linda! Você realmente não deveria ter me contado isso.
-- Por que não? -- o sorriso da princesa crescia a cada segundo ao notar a empolgação do noivo.
-- Porque agora estou ansioso pela vinda de nossa Gaia. Na verdade, talvez eu me esforce em persuadi-la para concordar em apressar a chegada dela, o que me diz?
-- Thomas, nós não estamos nem casados! -- o lembrou -- Não vamos fazer loucuras!
-- Sim, há esse impecílio. O rei me mataria se a engravidasse fora do matrimônio, não? O que nos leva de volta à questão da escolha da data! O que achou de minha sugestão?
-- Dezesseis de dezembro parece uma data perfeita para mim, amor. -- se inclinou e beijou-lhe a ponta do nariz -- Agora vamos, é quase hora do almoço e nosso atraso certamente será notado.
A refeição do meio dia chegou e se foi. O casal apaixonado conseguiu chegar à tempo, mas não conseguiu ocultar as expressões cúmplices de afeto e paixão que permanecia firme em suas feições. Foram educados e cordiais com todos que lhes dirigiram a palavra, mas constantemente seus olhares se buscavam. Era como se a presença do outro fosse tão necessária para eles quanto o ar em seus pulmões, quanto a chama de vida que fazia seus corações baterem em uníssono. Quando a louça da sobremesa começou a ser retirada o rei se levantou e, ao invés de se retirar, surpreendeu a todos chamando-lhes a atenção.
-- Senhoras. Senhores. -- Abenforth bradou, sua voz calando os sussurros das conversas paralelas que aconteciam pela mesa -- Um minuto de sua atenção, por favor. Há uma boa noticia que eu gostaria de dividir com todos vocês, meus amigos e pessoas de confiança. Thomas -- chamou o sobrinho -- levante-se e faça seu anúncio.
Cecilie não gostou muito do rumo que as coisas estavam tomando, mas àquela altura não poderia fazer nada. Preferiria anunciar seu casamento apenas quando os crimes da rainha fossem expostos e devidamente punidos; entretanto não teria escolha, afinal.
-- Serei rápido, senão corro o sério risco de me desmanchar em lágrimas como uma adolescente afetada. -- brincou o duque, fazendo todos a mesa rirem divertidos -- Querida, não me deixe monopolizar a atenção dos presentes já que nós dois estamos envolvidos nisso. Levante-se, por favor.
Sentindo-se repentinamente tímida, Cecilie se levantou muito à contra gosto. Thomas levantou uma única sobrancelha como se dissesse "jura, você envergonhada?", e a princesa fez uma nota mental de castigá-lo por isso mais tarde.
-- Senhoras e senhores, essa mulher diante de vocês não é apenas a heroína que pôs um fim à guerra. Não é apenas uma princesa, filha de sua majestade rei Abenfoth. Ela é minha amiga desde sempre e, em duas semanas, ela finalmente fará de mim o homem mais feliz do reino. -- alguns suspiros emocionados foram ouvidos, vindo certamente das damas presentes -- Cecilie, quantas vezes eu a pedi em casamento?
-- Se não me falha a memória foram três, meu lorde. -- ela respondeu com um sorriso de escárnio, fazendo todos darem pequenas gargalhadas.
-- Sim, pois é. Sou um homem perseverante. -- deu de ombros, fazendo pouco caso das recusas anteriores -- Tenho o prazer de anunciar que, depois de muita insistência, Cecilie aceitou meu pedido.
Os presentes, cerca de vinte pessoas, explodiram em palmas e vivas em comemoração pela evidente felicidade do casal e pela festa iminente. Christopher, que permanecia silenciosamente sentado ao seu lado, a surpreendeu levantando-se e a puxando para um abraço. A princesa se emocionou com o gesto e em como o tratamento do irmão para com ela havia mudado radicalmente.
-- Esse anúncio era apenas uma questão de tempo. -- ele murmurou em seu ouvido -- Mas estou contente por vocês, deveras contente. E tenho certeza de que Deus também está, afinal Ele preza muito pelos votos do matrimônio.
-- Obrigada, irmão. -- agradeceu sincera, admirando os trejeitos religiosos que a cada dia ficavam cada vez mais aparentes no príncipe herdeiro -- Sua opinião é muito importante para mim.
Se afastaram e Christopher lhe sorria timidamente, as feições adolescentes um tanto avermelhadas. A primeira impressão que tivera dele meses atrás fora de que ele era implacável e maldoso, mas percebia agora o quanto esteve enganada. Christopher na verdade era gentil e caridoso, ele apenas assumia um personagem quando precisava ser o futuro líder da nação.
-- Estarei livre esta tarde, o que acha de um passeio pelos jardins? Se tiver compromisso não há problemas, nós podemos remarcar e...
-- Hoje está ótimo! -- o interrompeu -- O dia está muito belo para desperdiçá-lo, afinal.
Na realidade Cecilie tinha planejado dar continuidade, ainda naquela tarde, à sua investigação na busca de mais detalhes do envenenamento de Cassandra. Entretanto aquilo poderia esperar, apenas deveria avisar Salete sobre a mudança de planos, afinal sua interação com seu irmão era definitamente mais importante.
-- Excelente! -- ele sorriu -- Te espero no pátio leste em duas horas.
-- Combinado.
O rapaz acenou com a cabeça em concordância e se afastou para que o pai pudesse alcançá-la a fim de cumprimentá-la, puxando-a para um efusivo abraço. Cecilie enterrou o rosto no pescoço do pai, deliciando-se com o quanto o colo dele era reconfortante, fazendo-a se sentir novamente uma garotinha.
-- Parece que, mesmo com todas as voltas que vocês dois deram, tudo terminou como sempre deveria ter sido. -- Abenforth comentou -- As linhas do destino não se rompem, independente do tempo e distância.
-- O senhor acredita que, independentemente do que aconteça, tudo está pré determinado? -- perguntou verdadeiramente curiosa -- Isso tira um pouco do poder de nosso livre arbítrio, não acha?
-- Em coisas tão grandiosas não há livre arbítrio, querida. Veja eu e sua mãe, por exemplo. Eu a amei desde o momento que a vi, e ela me deu você, minha primogênita. Assim como você esteve destinada à Thomas, antes disso você o esteve para mim. Eu nasci, Cecilie, para ser seu pai. -- Abenforth a beijou na têmpora, carinhosamente -- Mas não tenho interesse em ser avô antes dos cinquenta, então se cuide.
-- Papai... -- ela riu nervosamente e se afastou, imaginando que Thomas não aceitaria esperar tanto tempo.
-- É brincadeira. -- o rei riu junto da filha -- Bom, não totalmente. Não pense que me passou despercebido a escolha da data de vocês, pretende realizar a cerimônia no dia dezesseis?
-- Provavelmente sim.
-- Bem, então a festa deverá ser realmente estupenda pois haverão duas grandes comemorações. Zaya vai estar ocupada pelos próximos dias, organizando tudo.
-- Certamente eu estarei. -- a voz da rainha soou próxima à eles, e Cecilie se esforçou para não contorcer as feições numa careta -- Duas semanas é um tempo muito curto para um evento desse porte, mas eu suponho que pode ser feito.
-- Na verdade, Thomas e eu gostaríamos de algo simples e intimista. -- anunciou a princesa em voz vazia de emoção.
-- Um casamento real simples e intimista? Isso é quase um ultraje, Cecilie! O povo espera um evento grande e...
-- Tia Zaya, suponho que tal decisão caiba somente à nós. -- Thomas a cortou, pondo-se ao lado da rainha de maneira imponente -- Se minha noiva quer uma cerimônia particular, então ela terá uma cerimônia particular. Não há discussão.
Dito isso, o duque lhe lançou uma piscadela. Entretanto a princesa notou o tom levemente rude com que ele dissera tais palavras, e percebeu que Thomas tinha a postura um tanto defensiva ao lado da tia. Caso a rainha percebesse as verdadeiras razões para o comportamento frio do sobrinho, poderia ela suspeitar de que Cecilie tinha conhecimento de suas ações diabólicas do passado? O que a mulher faria, então? Fugiria? Tentaria matá-la? Não tinha ideia... O único jeito era se apressar para descobrir tudo logo, antes que Zaya sequer percebesse que a espada da justiça pairava sobre sua cabeça.
-- Jamais imaginei que seria um noivo tão subserviente, querido. Você sempre me disse que quando se casasse, gostaria de uma festa de casamento que durasse ao menos três dias. -- apontou a rainha.
-- Oh, mas eu certamente pretendo festejar. -- o olhar que o duque lançou para Cecilie a arrepiou até os dedos dos pés -- Entretanto nossa comemoração será apenas entre eu e minha esposa.
O casal se encarou intensamente por mais alguns segundos, até que uma tosse fingida lhes chamou a atenção. Cecilie retornou o olhar para o pai, ligeiramente envergonhada, e foi instruída de que os convidados gostariam de parabenizá-los também. Nos minutos seguintes a princesa e o duque receberam alguns abraços e muitas reverências, acompanhadas de congratulações e votos de felicidade. Por fim os lordes e ladies se retiraram da sala de refeições um à um, e a família real viu-se só.
-- Thomas, você pretende continuar seus treinamentos com os Rangers? -- perguntou o rei ao sobrinho -- Podrick me questionou isso hoje durante nossa reunião.
-- Honestamente, eu ainda nem tive tempo de pensar à respeito. -- respondeu o duque ao passar um braço sobre os ombros da princesa.
-- Eu acho que deveria. -- opinou Cecilie -- Você evoluiu demais, seria tolice parar agora e desperdiçar seu potencial e as lições que teve.
-- O quê? Não! -- se intrometeu a rainha -- Não acho necessário, afinal Thomas é um aristocrata, não um soldado.
-- Ele não sairá em missão, obviamente. Esses treinos seriam pela segurança pessoal dele. -- a princesa tentou fortemente não rosnar enquanto dizia essas palavras à rainha.
-- Segurança pessoal? -- guinchou a mulher, assustada -- O que quer dizer com isso, Cecilie? A guerra acabou!
-- E outra pode começar à qualquer momento. Somos um reino pequeno no meio de um continente, rodeado por nações que já tentaram nos invadir uma penca de vezes. -- informou usando sua voz autoritária -- Quem garante que não tentarão novamente?
-- Mas... Abenforth? -- Zaya buscou o auxílio do marido, visivelmente transtornada pela possibilidade.
O rei, por sua vez, soltou um suspiro exasperado e apertou a ponte do nariz, aparentando certo cansaço.
-- A última tentativa de invasão do reino ao sul foi há mais de vinte anos, querida. E o reino ao norte está silencioso há quase três décadas. Não devemos nos preocupar sem necessidade.
-- Eu discordo, pai. Devemos sempre estar preparados, para quaisquer inimigos que possam surgir. -- insistiu Cecilie.
-- Bem, isso não é você quem decide, não é mesmo? -- a voz da rainha foi cortante e decisiva.
Cecilie afiou o olhar na direção da mulher, e as duas se encararam severamente por alguns segundos. Zaya não aparentava estar confortável com o rumo que as atitudes de Cecilie estavam seguindo, cheia de ideias e opiniões que - segundo a rainha - não diziam respeito à mentes femininas. Mente feminina essa que começava a invadir o campo que pertencia ao seu amado filho e herdeiro de direito.
-- Miladies, como saímos de uma comemoração de anúncio de casamento, para preparativos de planos de uma guerra que nem está em curso? -- perguntou o rei divertidamente, tentando aliviar a súbita tensão que se instalou entre as mulheres.
-- Cecilie está sempre vários passos à frente de qualquer um, meu rei. -- Thomas a beijou no topo da cabeça e apertou-lhe o ombro, num claro sinal para que mantesse a calma.
-- Isso certamente se deve ào... treinamento que recebeu de William. -- Zaya sorriu-lhe, um sorriso tenso e difícil -- Mas isso passou, querida. Agora deve apenas relaxar e ser a princesinha que nasceu para ser.
A mulher fechou as mãos em punhos e percebeu o aperto de Thomas ficar ainda mais firme em seu ombro. Queria pular na garganta da rainha, desmanchar aquele penteado perfeitamente arrumado e bater sua cabeça no chão de mármore repetidas vezes.
-- Ora, mas que coisa! -- Christopher quase gritou de onde estava, observando o óbvio atrito de opiniões das duas mulheres com muita atenção -- Lembrei-me de que tenho lições de... de... hum, matemática, isso! -- era uma clara mentira, mas ninguém seria tão indelicado ao ponto de apontar isso -- Cecilie, você teria alguma objeção quanto à antecipar nosso passeio para agora mesmo?
A princesa contou até três mantendo ainda seu olhar preso ao da rainha - que tinha uma força férrea em não se permitir demonstrar-lhe nenhuma expressão -, então olhou para o irmão que aparentava certo nervosismo e, sorrindo, prontamente aceitou seu pedido.
-- É claro, Christopher. -- virou-se para Thomas, depositando-lhe um beijo na bochecha em despedida -- Até mais tarde, querido.
Seu noivo apenas acenou a cabeça para responder seu cumprimento.
-- Papai -- fez uma discreta mesura -- Zaya.
-- Voltem antes do pôr do sol, crianças. -- pediu o rei, soando como o pai protetor que Cecilie se lembrava de que sempre fora -- E levem os guardas com vocês.
-- Sim, senhor. -- concordou o príncipe ao oferecer o braço para a irmã, que educadamente entrelaçou o seu próprio próprio ao dele.
Juntos, Christopher e Cecilie saíram da sala de refeições, deixando um tenso silêncio para trás.
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