Capítulo 66 - "E então o mestre e sua aprendiz duelaram uma última vez"
Depois de discutir mais alguns detalhes sobre a batalha que aconteceria dali à algumas horas, Willk se retirou e cumpriu logo a promessa de lhe enviar Martin. Cecilie fingiu estar adormecida, as mãos com as correntes ocultadas sob o travesseiro, a respiração rítmica e suave. Não levou nem dez minutos para que aquele ruivo tarado se aproximasse, e logo sentiu o corpo quente dele pairando sobre o seu, inspirando o aroma de seu perfume. Tão ágil que ele nem percebeu o movimento, Cecilie agarrou sua cabeça gorda e bateu a própria testa contra o nariz pontudo. Ouviu um estalo anunciando a fratura e sorriu diabólica enquanto o homem gritava à plenos pulmões. Depois, enrolou as correntes em seu pescoço e o sufocou até a morte.
Foi fácil e rápido. Agora estava esperando William retornar para se prepararem para desembarcar. Ela percebeu o momento em que o navio ancorou com um solavanco, portanto não demoraria muito. Confirmando suas suspeitas, a porta do compartimento foi aberta e seu tio entrou trazendo alguns objetos em mãos. Arregalou os olhos ao ver a quantidade de sangue respingado nela, mas sorriu ao notar a quantidade ainda maior por toda a cara feia de Martin. Passou por cima do corpo do homem ao se aproximar dela murmurando algo como "idiota", tirou a chave das algemas do bolso e libertou seus pulsos e tornozelos. Antes de sair ele havia oferecido deixá-la sem seus grilhões, mas Cecilie preferiu usá-los enquanto estivesse atacando o ruivo tarado para deixar as coisas mais divertidas e satisfazer seu ego.
-- Vamos desembarcar em vinte minutos. -- anunciou jogando as coisas que lhe trouxe em sua cama -- Não são dignas de uma princesa, mas vai dar pro gasto.
-- O que faremos com as correntes? -- perguntou se levantando desdobrando suas novas roupas.
-- Oh, essas algemas especiais são muito pesadas para usar fora do navio. Vai acabar nos atrasando, não acha? -- debochou e ela revirou os olhos -- Você vai usar algemas comuns, pirralha. Em quanto tempo consegue se livrar delas?
-- Dois minutos. -- considerou -- Talvez três. Agora saia, preciso me trocar.
-- Se lembra do que tem que fazer?
-- Essa não é exatamente minha primeira missão, Willk.
-- Ótimo. Então suponho que seja a hora de nos despedirmos.
Cecilie estava ajeitando os cadarços de sua nova bota de combate quando aquelas palavras arremataram sua atenção. Enrijeceu a coluna e jogou o calçado de volta à cama, levando seu olhar para o homem à sua frente. Até aquele momento, seus planos lunáticos não passavam de ideias distantes. Mas estava acontecendo. Era real. Seu estômago pesou e seus olhos umedeceram. Acenou a cabeça mas não foi capaz de dizer palavra.
-- Eu lhe desejo uma boa vida, pirralha. -- uma bolota desconfortável pareceu se instalar em sua garganta ao ver um brilho de carinho quase imperceptível naqueles olhos azuis -- Vai chorar por mim?
-- Não em público. -- admitiu em voz rouca, arrancando um sorriso de seu antigo mestre.
-- Boa garota. -- ele deu um passo e beijou sua testa delicadamente -- Você é filha do seu pai, Cecilie. Mas é minha também. Adeus.
Com um último olhar, ele se foi. Mas antes que abrisse a porta ela o impediu. Depois de tanta história, de tantos sentimentos bons e ruins que compartilhavam, um simples adeus era pouco demais para tudo o que viveram juntos.
-- Tio William! -- correu até ele, parando à frente do homem de expressão curiosa -- Nos últimos meses, você foi o homem que mais odiei.
-- Que gracinha... -- murmurou.
-- Mas antes disso, foi o que mais admirei e eu verdadeiramente o amei. Eu sinto... -- seus olhos arderam ainda mais -- sinto muito que sua vida tenha sido desse jeito. Tenho certeza de que teria sido um rei maravilhoso.
Viu-o engolir em seco algumas vezes, forçando-se para conter a emoção. Em poucas horas, talvez minutos, aquele momento tão intenso e decisivo seria apenas uma lembrança. Então ela deu um passo à frente e o abraçou. Willk demorou um segundo para retribuir, mas quando o fez foi forte e firme. Uma parte dela se odiava por sua fraqueza em abraçá-lo, mas como poderia não fazê-lo? Passou junto daquele homem metade de sua vida, mais tempo do que esteve junto de seu próprio pai de sangue que, convenhamos, sempre fora um bocado ausente.
-- Agora chega dessa palhaçada sentimental, vamos. -- a afastou com delicadeza, e a mulher percebeu seus olhos marejados -- Se apronte, soldado. Você tem uma missão.
William sorriu debochado para ela, as sobrancelhas franzidas em nostalgia.
-- Sim, mestre. -- respondeu, com um sorriso maquiavélico.
Thomas estava escondido atrás de um amontoado de barrios de madeira. Junto dele, Estevão e mais cinco soldados esperavam a rampa do navio que havia acabado de ancorar no porto ser devidamente instalada. Por todo o lugar, soldados do rei estavam escondidos. Sob os panos das carroças, embaixo das mesas improvisadas dos vendedores de peixes, e nas barrinhas aos arredores. O porto em si estava distante, uma centena de metros à frente deles. Mas o único caminho era por ali, onde os cinquenta Rangers esperavam para uma emboscada. Junto de mais duzentos homens das tropas do rei. Apenas uma pequena parcela dos exércitos estavam ali, mas deveria ser o suficiente. O restante protegia a Cidade Real, e mantinham vigilância severa nas Cidades Fortes onde se tinha conhecimento de haver fortalezas da Irmandade das Sombras.
-- Vejam só, a rampa está descendo. -- apontou um dos seus companheiros.
-- Finalmente! -- exclamou seu amigo - Eu estou ficando com fome, já é quase hora do jantar.
-- Quando você não está com fome, Estev? -- revirou os olhos -- E o sol nem terminou de se pôr, tenha controle desse estômago, homem!
-- Ora essa, como alguém controla o estômago? Devo conversar com ele e pedir para que não...
-- Que merda é aquela? -- um outro soldado perguntou em voz tensa.
Imediatamente Estevão calou a boca e todos observaram o navio à distância. E todos soltaram um suspiro de exclamação com o que viram. Uma porção de homens uniformizados em vestimentas verdes e com armadura prateada desembarcavam do navio. Assistiram à uma dezena, seguida de outra dezena descendo pela rampa e aquilo parecia não ter fim.
-- Mas que... maldito desgraçado! -- resmungou Estev -- Ele foi buscar mercenários no outro continente!
-- Quantos homens tem ali? -- Thomas perguntou soando apenas curioso, nada assustado.
-- Cem? -- tentou adivinhar -- Cento e cinquenta?
-- Não sabe contar, rapaz? Ali tem pelo menos duzentos. -- corrigiu o soldado de nome Natan -- Mais os Irmãos que os estão esperando lá embaixo. -- apontou um amontoado de pessoas caminhando para lá e para cá na bagunça de marinheiros, comerciantes e compradores -- Eu diria que são uns trezentos e cinquenta homens, talvez um pouco mais. Mas ainda temos vantagem.
-- Vantagem? -- Thomas perguntou -- Eles nos superaram em quase uma centena, se estou certo em minhas contas.
-- Um Ranger vale por dois soldados. Está com medo, Zero? -- alfinetou o outro -- Ainda dá tempo de sair correndo.
-- Cale a boca. -- recusou-se a entrar na briga.
Conforme se aproximavam do porto, Thomas foi notando os soldados cada vez mais tensos e violentos. Discussões e brigas se tornavam cada vez mais constantes, como se estivessem ansiosos por liberar aquela selvageria contida dentro deles. O duque, entretanto, não participou daquela histeria coletiva. Manteve-se sempre quieto, pensativo, e quando alguém tentava irritá-lo ele simplesmente ignorava. O chamaram de covarde pelas suas costas algumas vezes, mas não se importou em nenhuma delas. Estava se poupando para o verdadeiro inimigo, guardando para a Irmandade toda a potência de seu ódio acumulado.
-- Aquele careca é o mestre Willk? -- perguntou Estev.
Mais uma vez Thomas olhou para a rampa e viu Willk descê-la em passos lentos. A cabeça do homem girou lentamente ao redor, observando detalhadamente todo o porto, como se estivesse detectando cada um dos homens do rei que o esperavam para uma emboscada.
-- Ele não é careca. -- explicou ao amigo -- O cabelo dele é louro claro, e bem curto, por isso teve essa impressão.
-- As madames podem conversar sobre o estilo capilar daquele desgraçado mais tarde? Temos que ir para a nossa posição.
Obedecendo o soldado de nome Rhyan, saíram dali e foram rastejando até um ponto adiante que ficava mais próximo à passagem que usariam para descer. A equipe número um estava lá embaixo, há poucos metros do novo exército de Willk, e lhes daria um sinal quando fosse a hora de atacar.
Por estar focado em mudar de esconderijo sem chamar a mínima atenção, Thomas não viu uma certa pessoa descendo a rampa. Uma pessoa que tinha o rosto oculto por uma capa preta extremamente familiar.
Cecilie descia a rampa lentamente, a cabeça baixa e o olhar em seus pés. Havia trocado de roupa, vestia uma calça de linho marrom, uma camisa de lã cinza e um par de botas gastas. Seu único item pessoal era a capa preta que usava para esconder sua identidade. Claro que na luz dourada do fim do dia, aquela capa mais chamava atenção do que a ocultava entre a escuridão noturna, que era o propósito para o qual costumava usá-la. Mas não podia arriscar ser reconhecida pelos soldados de seu pai antes da hora, pois poderia colocar tudo à perder.
Dois mercenários a escoltavam, um de cada lado. À sua frente, Willk caminhava despreocupadamente, passando os olhos pela paisagem, sempre alerta e atento. Foram os últimos à desembarcarem, o que foi premeditado pelo homem, assim como todo o restante de seu plano. Para Cecilie, restava apenas cumprir suas ordens uma última vez já que aceitou aquele compromisso. Levantou ligeiramente a cabeça, percebendo que em mais alguns metros chegaria a hora de agir. Começou a remexer as mãos, torcendo os dedos para deslizá-los do aperto das algemas que seu tio deixou mais frouxas do que o costumeiro. Sua mão direita se libertou primeiro, e sem movimentos bruscos livrou a mão esquerda. Segurou o objeto de metal para que não caísse chamando a atenção, viu Willk reduzir discretamente a velocidade de seus passos e começou uma contagem regressiva. Em cinco segundos, o caos explodiria ao seu redor.
Cinco, quatro, três, dois... - respirou fundo, reunindo todas as forças que existiam dentro de si para fazer o que deveria ser feito, a missão mais difícil de sua vida. Abriu os olhos e com uma forte expiração saindo pelos lábios se colocou em movimento - um.
Virou-se para a esquerda o mais rápido que foi capaz, jogando as algemas no rosto do mercenário que a escoltava. Enquanto o homem reagia assustado, virou-se para a direita e puxou a espada da bainha do outro mercenário, enfiando-a na perna do homem em seguida na intenção de debilitá-lo. Antes que os outros inimigos sequer percebessem o que estava acontecendo, Cecilie começou uma corrida desenfreada até William, que fingia-se de distraído enquanto conversava com um de seus homens. Seguindo o plano, chocou seu corpo no dele com força total o empurrando com seu ombro para desestabilizá-lo. William caiu de cara no chão, agora na plataforma de desembarque que ficava na praia, e enquanto se levantava a mulher já seguia atacando os Irmãos que começaram à sair de seus esconderijos para confrontá-la.
Dezenas e mais dezenas de homens corriam pelo mercado do porto, vindo ao seu encontro. Cecilie seguiu lentamente até eles girando a espada em suas mãos, ansiosa por matar quantos Irmãos fosse capaz, um sorriso cruel torcendo seus lábios. Puxou a fita que prendia sua capa preta e foi nesse instante que uma trombeta tocou, quase ensurdecendo-os. Em seguida, o grito de guerra de centenas de soldados do rei invadiu o ambiente tornando-o ainda mais caótico, e eles atacaram com força total cercando os homens da Irmandade por todos os lados possíveis. Nesse meio tempo, viu por sua visão periférica Willk já em pé e seguindo até ela rapidamente, mas outro inimigo a alcançou antes dele.
Cecilie abaixou-se e se defendeu do homem que a atacou com raiva desvairada, chocou sua espada com a dele e a torceu, fazendo-o derrubar a própria lâmina ao chão. Desarmado, o homem sequer teve chance. Antes que o corpo dele terminasse sua queda ao chão, um outro Irmão à alcançou. Correu até ela com um grito raivoso, mas a mulher impediu seu avanço ao dar um pulo e depois um chute feroz em seu peito. Cortou-lhe a garganta enquanto se esforçava para respirar e, quando partia para o próximo inimigo, seus cabelos foram puxados para trás pela trança que usava, e ela caiu deitada sobre a areia fofa. Maldito Willk, precisava puxar tão forte? Um mercenário veio ajudá-lo a acabar com ela, mas o mestre o encurraçou aos berros.
-- Ela é minha! -- urrou, levantando sua espada e partindo para atacá-la.
Girou para a esquerda, saindo do alcance da lâmina que Willk fincou no chão. Apoiou uma mão acima da cabeça, enquanto a outra ainda segurava a espada, e deu um impulso com os pés para se levantar, num movimento que o homem a havia ensinado e praticado junto dela centenas de vezes pois tivera dificuldades em aprender. Mas ela aprendeu. Lançou para Willk uma piscadela acompanhada de um sorriso ardiloso, e o homem respondeu com um meio sorriso e um arquear de sobrancelhas, o olhar orgulhoso. Então o mestre e sua aprendiz duelaram uma última vez.
Depois que a trombeta soou, tudo virou um maldito caos. Num primeiro momento apenas os Rangers iriam para o centro da batalha, pois o restante dos soldados do rei ficaria aos arredores da confusão para capturar possíveis fugitivos. As ordens eram claras, nenhum inimigo da Coroa poderia sair dali vivo. Escondido atrás dos arbustos, Thomas viu quando Podrick levou a trombeta até sua boca e soprou, fazendo o som agudo e penetrante do sinal de ataque arrepiar os pêlos de sua nuca. Depois, gritos furiosos romperam a tranquilidade do pôr do sol e os Rangers saíram de seus esconderijos raivosos, seguindo até onde os soldados da Irmandade e os mercenários estrangeiros estavam aglomerados.
Junto dos companheiros Thomas sacou sua espada da bainha e correu, fazendo sua voz soar tão alta e feroz quanto a deles. Mas havia algo nele que fez seu grito parecer mais sombrio, quase desumano. A dor latente que conteve dentro de si nos últimos três meses sem Cecilie finalmente veio à tona, e o duque não tentou afastar as garras sufocantes da ira vingativa que se enrolava em sua alma ferida. Thomas se entregou ao ódio, ao luto, à mágoa e à saudade, entregou tudo de si em busca de alívio para seu sofrimento, em busca do acerto de contas com aqueles que destruíram toda a luz em sua vida, deixando-o no escuro. Segurando firme no cabo de sua espada enquanto corria até aqueles malditos desgraçados, já tão perto que havia escolhido seu primeiro alvo e o encarava diretamente, percebeu de súbito que dentre todos os Rangers ele era o mais perigoso por uma simples razão: não estava sentindo medo. Afinal, ele não tinha mais nada a perder. De um tolo incapaz, tornou-se um soldado impiedoso. E foi com essa sensação de poder que chocou sua espada com um Irmão que chegou para enfrentá-lo.
O impacto estremeceu seu braço direito e com a mão esquerda socou o rosto do homem gorducho, pegando-o de surpresa. Cecilie sempre o ensinou a não lutar com honra se quisesse viver, e ele sempre ouviu suas instruções com muita atenção. Atordoado, o Irmão à sua frente não pôde se defender do próximo golpe de Thomas, que enfiou a espada entre o peitoral da armadura e sua ombreira. Entre toda aquela algazarra ensurdecedora ao redor deles, o grito de dor que o homem soltou mal chegou aos seus ouvidos, mas rapidamente Thomas o silenciou com um corte profundo em seu pescoço. Vendo o homem cair ao chão, banhado em sangue, um prazer perverso o dominou.
Pela primeira vez em três meses o duque sorriu. E foi desta forma que seguiu para seu próximo oponente. E para o outro, e o seguinte. Uma fúria cruel o movia adiante, estava tão dominado pela cólera e por um desejo assassino que o mundo silenciou ao seu redor. Agora sou um monstro como ela um dia foi, pensou consigo ao sentir um cheiro pútrido invadir suas narinas, um cheiro rançoso de sangue e fezes e urina. O cheiro da morte. Puxou sua espada de onde estava fincada, no abdômen de um inimigo, fazendo tripas caírem ao chão. Com um chute brutal derrubou o homem que se recusava a morrer enquanto tentava recuperar as entranhas que vazavam de sua barriga, e sentiu uma ardência em seu braço esquerdo. Abaixou-se com agilidade e virou-se para encarar quem o estava atacando, mas Estevão já havia matado o mercenário estrangeiro.
-- Até que você está se saindo bem, Tom! -- elogiou o rapaz, o rosto respingado em sangue -- Agora vamos recuar alguns metros, os barris de pólvora logo serão acesos.
-- Certo, vamos. -- concordou com os dentes cerrados, e junto do amigo abriu caminho entre os mercenários, forçando-se para retroceder alguns metros e sair da área que logo seria explodida.
Thomas e Estevão formavam uma boa dupla, atacavam e protegiam as costas um do outro enquanto retornavam para uma área segura. O duque já havia pedido as contas de quantas vidas ceifou, tudo o que lhe interessava era o próximo e o próximo. A escuridão da noite estava pairando sobre eles conforme o sol finalizava sua descida no horizonte. Estava quase alcançando uma área segura, abaixando-se para desviar de uma flecha que passou de raspão em sua perna, que o último raio de sol iluminou a praia refletindo em algum objeto de metal que cintilou à distância chamado sua atenção imediatamente. Virou o rosto naquela direção e, algumas dezenas de metros à frente, em meio à toda aquela batalha sangrenta, uma mulher de longos cabelos negros brandia sua espada no alto.
Um líquido gélido invadiu seu estômago, suas veias, seu ser... estancou os passos e ficou encarando aquela cena, completamente arrebatado. Mestre Willk duelava com a mulher, o rosto vermelho pelo esforço da luta. A espada dela, que fora o que resplandeceu no último raio de sol, baixou com força total e o homem quase não foi capaz de conter o golpe. Entretanto ele era hábil, e num movimento ardiloso conseguiu desarmá-la e arremessar sua lâmina longe.
-- Thomas! -- gritou Estev ao seu lado, sacudindo-o -- Precisamos ir! Os barris vão explodir à qualquer momento, vamos!
O duque o ignorou e voltou sua atenção para o duelo mais importante que acontecia alguns metros adiante, sua mente entorpecida parecendo recobrar a vida ao finalmente compreender o que seus olhos estavam vendo. Thomas conhecia aqueles movimentos fluidos, aqueles cabelos negros esvoaçando como seda trançada. Conhecia aquele perfil, aquele nariz arrebitado. Será que ele morreu em algum momento daquela batalha? Estaria ele no céu, encontrando-a numa outra vida, numa outra realidade? Viu-a sacar uma adaga que tinha escondida às suas costas no cós da calça, e ouviu quando Estevão gritou que a trilha de pólvora havia sido acesa e que deveriam correr pois em segundos os barris explodiriam. Então, ele correu. Sem nem mesmo pensar no que estava fazendo, seus pés correram com força total na direção daquela mulher que estava na linha de fogo das explosões.
Ele a reconheceria em qualquer lugar, à qualquer distância, em qualquer situação, naquele mundo ou em outros. Pois eles eram predestinados, e as linhas do destino que os uniam são inquebráveis. Sem hesitar nenhum maldito segundo, Thomas seguiu até Cecilie e viu o momento exato em que ela enfiou sua adaga no peito de Willk, cravando-a até o cabo. Ele viu a troca de olhares entre eles, viu-a retirar a adaga num puxão brusco e viu o homem murmurar alguma coisa, um fio de sangue lhe escorrendo pelos lábios. Não demorou e o mestre da Irmandade caiu, os olhos azuis vítreos e vazios permaneceram encarando sua sobrinha enquanto ela pairava acima dele, parecendo confortá-lo. Foi no instante em que viu a linha de pólvora acendendo próximo aos pés dela que ele gritou, ao mesmo tempo em que pulou para protegê-la da explosão que se seguiria em poucos segundos.
-- Cecilie! -- seu corpo se chocou contra o dela, levando-a ao chão, no mesmo instante em que o inferno desabou ao redor deles num estrondo ensurdecedor.
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