Capítulo 16

A APOSTA


Otávio estacionou em frente à casa de Maurício, que se localizava em um condomínio de luxo. Olhava ao redor, assobiando a música que escutava no rádio. Estava surpreendido com toda aquela ostentação, ao redor. Não havia reparado nas casas vizinhas e imaginava que tipo de pessoas famosas ou notórias moravam por ali.

"Se eu me demorar muito dentro do carro, vão chamar a SWAT, pensando que sou um espião ou algo do tipo..." – Pensou, divertido.

Passou-se alguns minutos, viu o encaracolado vindo em direção ao seu carro. Era como se o próprio sol descesse e viesse em forma humana. Ele iluminava tudo ao redor.

Otávio saiu do carro, para poder abraçá-lo.

- Dormiu bem, anjo? – Falou, revirando os cachos do menor.

- Ei! Você sabe que eu odeio isso! – Protestou, tentando ajeitar os cabelos. – Nem dormi pensando no que acontecera. E você?

- Dormi feito um anjo em nuvens fofas e celestiais! – Falou, colocando os óculos escuros e olhando o céu.

- Sei.... Vamos logo, seu mentiroso! – Riu, abrindo a porta do carro, se sentando e jogando a mochila no banco de trás.

Otávio, antes de entrar, olhou na direção da casa e viu Letícia, que acenava sorridente. Ele retribuiu com outro aceno, entrando no carro. Deu partida, olhando Maurício com um sorriso.

- É impressão minha ou sua mãe parecia mais feliz? – Olhou pra ele, curioso.

- Ela realmente está mais, mas não vou te contar nada! – Ria, divertido.

- Olha só! Estas crianças de hoje em dia, viu.... – Fingiu estar chocado, com a mão no peito.

- Vamo logo, seu bobo! – Riu!

Estavam no trânsito, quando Otávio lembrou de puxar um assunto antigo com o garoto encaracolado.

- Como assim seu pai é importante? – Perguntou exasperado.

- Não exagera, Otávio! – Franzindo a testa. - Nem sei porque tocou nisso, agora!

- Você deixa eu dar um soco em um adolescente e depois eu descubro isso?

- Ele não é importante. – Sacudiu os cachos. - Apenas trabalha já faz muito anos. – Encolheu os ombros.

-Como promotor, apenas?

- E por que essa curiosidade, agora? – Se ajeitou no banco para encará-lo melhor.

- Não é curiosidade, anjo. Eu dei um soco no garoto. E se sua mãe tivesse outra reação?

- Mas não é algo que eu pudesse impedir, Otávio. – Bufou, afundando no banco.

- Precisa me contar essas coisas, anjo. – Deu um leve tapa na coxa dele

- Tudo bem. Agora, vamos esquecer isto. – Virou o rosto para o vidro.

- Preciso passar no escritório, mas é coisa rápida.

- Ah! Fala sério! – Emburrado.

- Já disse que fica lindo assim? – Sorriu.

Estacionou em frente ao prédio do escritório e o convidou para subir com ele.

- Não tem problema eu subir com você?

- Eu só vou largar uns documentos na sala do meu chefe e já vamos sair. Eu só não quero que me liguem pedindo o relatório em pleno fim de semana.

- Faz sentido. Mas, você não faz nada no fim de semana mesmo! – Concordou, entrando no elevador com ele. –Já disse que você parece mais velho de terno?

- Não. Mas é bom saber. - O abraçou de lado e entraram no elevador quando ficou disponível.

- Voltando ao assunto do meu pai. Eu esqueci, entende? Eu me acostumei com isso e acabou passando – O olhou, sorrindo – Queria ter visto você batendo no Augusto. Eu estava tão desesperado, que sai com a mãe e nem vi nada!

- Se você quiser, a gente pode voltar, sem problemas. Repito, só pra você ver. – Levantou as sobrancelhas.

- Idiota! – Riu. – Só quero saber como ele vai aparecer nas aulas com o nariz machucado.

- Ele pode mentir que fez rinoplastia. – O puxou para perto. – De primeira, acreditei na mensagem que ele fingiu ser você. Achei que tinha sido trocado por uma aula de ioga.

- Eu deveria! – Brincou.

- Aguarde aqui, meu anjo. Não vou demorar. – Falou, sumindo numa sala toda envidraçada com uma loira exuberante.

Depois de conversar com ela, Otávio entrou por uma porta de madeira toda entalhada. Olhou para cima e vislumbrou um imenso lustre de cristal, se distraindo com as cores do prisma que dançavam no branco gesso da parede.

- Vamos? Preciso me apressar para não o fazer se atrasar. – Passou a mão sobre seu ombro, puxando-o para mais perto.

Entraram de volta no elevador e Maurício lembrou de uma coisa, se afastando um pouco para encarar o loiro:

- Ah! Já que você quer que eu conte tudo, tenho uma novidade, pra você! Um dos meus tios é advogado e outro é policial. – Riu alto.

- Você está mentindo. – Cerrou os olhos, o puxando contra seu peito, com carinho– Mas toda sua família é da lei? – Perguntou indignado, ajeitando um cacho.

- Bom! Só por parte de pai. – Saíram no saguão principal, indo em direção à rua. – Meus parentes pela mãe são mais do tipo empresários, donos de joalherias ou fábricas de tratores. Estas coisas.

- Realmente... O Carma existe! – Fez uma careta.

Notou que o mais novo se afastou dele, desmanchando o abraço e o encarando:

- É passado, não é mesmo? – Sorriu.

- Passado tipo ontem? Se sim, concordo com você. – Falando por cima dos óculos escuros.

- Otávio! – Arregalou os olhos.

- Eu tô brincando! – Riu alto. – Ontem fiquei até tarde no trabalho, pois alguém roubou a caneta cara do diretor.

- Otávio... – Repetiu, parando de andar. – Cadê a caneta?

- Hum.... Deixe-me pensar. No seu bolso.

- O que?!? – Murmurou, tateando os bolsos da calça jeans, achando uma caneta de marca, em preto e dourado.

- Maurício! Estou chocado! Eu não acredito que você roubou o meu chefe! – Colocou a mão no peito. – Devolve isso, garoto! Me passe a caneta, por gentileza? – Ao estender a mão, fez o celular do encaracolado descer de sua manga.

- Você.... Você me assusta às vezes! – Trocou os objetos. – Quando fez isso?

- Quando te abracei, peguei seu celular. Então entramos no elevador e coloquei a caneta no bolso. – Deu de ombros.

- Mas.... Eu não senti... – Juntou as sobrancelhas, confuso.

- Essa é a intenção! – Sorriu. – Mas se começar a prestar muita atenção, vai sentir.

- Vamos continuar, antes que eu desista de você! – O empurrou, para voltarem a andar.

- Sabe que fiz apenas para brincar, não? – O olhou preocupado. – Vou devolver a caneta.

- Mas e se te pegassem? Não pensou que podem te processar e você ficaria visível pra quem tava te investigando? – Cruzou os braços. – Burro! Você foi burro!

- Não me dá bronca. Eu sei o que estava fazendo. – Abriu a porta para entrar em seu carro.

- Mas por que testar suas habilidades, agora? – Perguntou ao estarem dentro.

- Não sei. Trabalhar em escritório é bem chato, às vezes. – Coçou a nuca. – Eu acho que queria me exibir pra você.

- Não é assim. Nunca mais faça isto. Me promete?

- Prometo. – Puxou -o, depositando um beijo em seu nariz.

O celular de Otávio tocou. Era Carlos querendo saber se ele tinha planejado algo para o fim de semana. Conversaram um pouco e Otávio desligou.

- Alguém pode ser demitido injustamente. – Maurício retomou a conversa.

- Já disse. Vou devolver e não vou fazer mais. – Começou a dirigir, nitidamente irritado com o rumo da conversa.

- Você já tinha prometido que não faria mais. E fez!

- Eu não peguei a caneta pra mim, Maurício! Se eu quisesse algo caro mesmo, teria pego o relógio dele. – Revirou os olhos, começando a ficar impaciente.

- Você está de olho no relógio dele?!

- Óbvio que não, Maurício! É de marca, qualquer um saberia que é caro! Mas que saco!

- Não tem como saber. – Murmurou.

- Então você realmente acha que quero roubar meu chefe, Maurício? – Estacionou na primeira vaga que viu. – É sério isso? – Se virou, quase gritando.

- Pegou a caneta dele e até meu celular. – O olhou diretamente nos olhos, magoado.

- Não acredito que estou tendo esta conversa com você! – Esfregou as mãos no rosto, tentando se controlar.

- Mas, tá tendo! – Maurício disse, virando o rosto em direção a janela do carro.

- Só queria te mostrar o que sei fazer. – Baixou os ombros. – Não acredito que pensa que roubaria seu celular. – Virou o rosto para sua janela, vendo os carros passarem, ficando quase de costas para o menor.

Ficaram alguns minutos em silêncio. Maurício resolveu quebrar o gelo:

- Não achei isso. Me expressei mal. – Se virou, sentindo-se culpado. – Apenas me preocupo. Eu não quero que você seja demitido por conta de uma brincadeira boba. Ou preso! Não quero perder você...

- Não precisa explicar. Eu entendi bem. Até eu duvidaria de mim– Riu, amargo. – Agora entende porque sempre escondi meu passado. Para não ter que ouvir algo semelhante. Por isso que fiquei com receio de contar. Eu entendo que as pessoas vão ficar sempre com um pé atrás em relação a mim.

- Para com isso, por favor! Tá me fazendo sentir pena de um ladrão barato. – Brincou e o abraçou.

- Uau! Agora você foi ofensivo! – Bufou.

- Otávio? Me desculpa? – Fez beicinho, com o rosto muito próximo ao do loiro.

- Não sei. Estou pensando. Não sou barato, não. Sou caro. Por que acha que fiquei com você? – Beijando a ponto do nariz do encaracolado.

- Meu Deus! Como você é nojento! – Corou e bateu em seu peito.

- Sabe que tô brincando. És bem mais valioso que tudo isto. – Riu ao vê-lo se afastar, cruzando os braços. – Vem cá, vem... – Foi para os bancos de trás.

- Não quero. Você é sujo. – Se empertigou todo. – Você vai esmagar minha mochila, seu perdido!

- Agora você falou como um verdadeiro policial. – Arqueou a sobrancelha.

- Af! Idiota! – Murmurou, indo também para os bancos de trás. – Esse é nosso encontro então? – Perguntou ao ser abraçado. – Me resgatar de um colega maluco, que não quis me deixar sair e acabar ficando assim, no banco de trás do seu carro?

- Não. Definitivamente, não. Ainda é surpresa. – O apertou contra si. – Mas hoje, não poderemos mais. Demoramos muito.

- Onde íamos? Me conta, por favor? – Fez bico.

- Não. - O beijou. – Vai gostar. Eu prometo. – Sorriu, beijando-o novamente.

- Se não me contar, vou te denunciar por roubo. – Sussurrou entre um beijo e outro

- Roubo do que, meu anjo ligado no 220?

- Da caneta! É óbvio!

- Que caneta? A que está no seu bolso? – Beijou seu pescoço

- Otávio! Para com isso! – Bufou ao tirar o objeto novamente do bolso. – Parece aqueles mágicos que vão às escolas.

- Sou muito melhor que eles. – Rindo muito, puxando o menor para mais perto.

- Pra mim, são a mesma coisa. Com truques baratos, só pra impressionar.

- Não preciso de mágica, pra te impressionar. – Olhou para ele, com um sorriso malicioso.

- Você é tão convencido...- Riu.

- Tenho certeza que conseguiria roubar algo importante do seu pai, sem nem chegar perto dele. – Otávio falou, coçando o queixo.

- Ah claro! – Revirou os olhos. – Pois eu duvido muito!

- Posso ter ajuda do Carlos?

- A vontade. Você nunca conseguiria, mesmo com a ajuda dele! – Cerrou os olhos, desafiador. – Mas ele vai aceitar?

- Estou pensando, mas creio que sim. Ele é meu amigo – Otávio aproximou os olhos do menor. - Vou me arriscar muito fazendo isso. O que eu ganharia? – Arqueou a sobrancelha.

- Eu.... Estou pensando...– Olhou para cima, pensando em algo. – Aceito aquela sua bobagem de dormir na sua casa.

- Bobagem, é? – Balbuciou. – Tudo bem! Mas só isso?

- Você é realmente nojento, Otávio!

- Não quis dizer isso! – Riu alto. – Vamos fazer assim. Se eu conseguir, você vai passar lá o fim de semana todo.

- Não sei... Tenho medo que te aconteça algum de ruim... – Murmurou, cabisbaixo.

- Não vai me acontecer nada. E eu só vou pegar e te devolver. No máximo, seu pai vai achar que o filho dele o está roubando pra comprar maquiagem! – Riu.

- Como você é idiota! – Batei no peito dele. - Tudo bem! E se falhar?

- Maurício, se eu falhar, provavelmente vou ser preso. – Disse sério, olhando profundamente para ele.

- Não gosto disso. Não gosto mesmo! – Murmurou. – Se for pego, vou explicar pro meu pai. Ele vai me ouvir. – Deu de ombros.

- Explicar o que? Eu, o cara da pousada, roubando-o? –Cruzou os braços, o encarando.

- Vou achar uma desculpa. Deixa comigo. – Sorriu. – Então.... Se falhar, você terá de me pedir em namoro. – Corou, desviando o olhar.

- Tudo bem! Vou me dedicar ao máximo para não falhar. Prometo!

- Como você é idiota! – Bufou, dando soquinhos no seu ombro, provocando risadas no loiro.

Mas logo acabou rindo ao ter todo o rosto e pescoço beijado pelo mais velho. – Otávio, você me deixa....

- Deixo...? - Falou, sem se afastar dele.

- Nada. Esquece. – Maurício disse, se ajeitando no banco. - Ele ama um relógio de bolso, que fica sempre preso no bolso direito dele ou na gaveta fechada com chave e senha. É de ouro branco maciço, com diamantes no lugar dos números. A corrente tem elos sem emendas e as iniciais dele atrás. É tudo que vou dizer.

- Hum.... Já está ótimo! Você deu uma bela descrição! – Sorriu, puxando-o de volta e o beijando. – Como eu o deixo, mesmo? – Sussurrou.

- Sem ar. Você me tira o ar, Otávio...

- E isto é bom?

- Me beija mais, que depois eu te conto se é ou não bom.

Otávio riu, abraçando Maurício com carinho e delicadeza.

Ficaram conversando sobre qualquer coisa, vários assuntos escutando música e se beijando até Otávio perceber que precisava levar Maurício a faculdade, demorando mais que o normal para se despedirem.

- Você vem me buscar? – Falou, se apoiando no vidro do carro, que estava abaixado.

- Vou pensar no seu caso. Se não tiver nenhum compromisso mais tentador para fazer....

- Otávio! Vai a merda!

- Que boca mais deliciosamente suja! Eu venho, sim. Mas avise sua mãe! Pelo amor dos deuses!

- Pode deixar! – Enfiou a cabeça pelo espaço da janela, beijando-o nos lábios.

- Tome cuidado? Não deixe aquele emo azulado psicopata se aproximar dez metros de você, está bem? Me liga que eu venho de voadora nele!

- Pode deixar, papai! - Maurício riu, se afastando dele.

Ficou olhando o encaracolado subir os degraus da faculdade, com um sorriso no rosto.

Ele sabia que estava despertando sentimentos profundos no garoto. Os mesmos que ele, naquele momento, estava sentindo. Sabia que era amor e estava irremediavelmente apaixonado por ele.

Ficou sorrindo ao vê-lo subir os degraus e dar uma última olhada pra trás e acenar, antes de entrar no prédio.

- Como te amo, anjo...– Sussurrou, antes de ligar o carro e se dirigir até o escritório, para devolver a caneta.

( 2489 palavras)


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