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Ok, então vamos lá.

O ano era 2015 e eu tinha inaugurado minha floricultura a três meses. Esse era só mais um dia normal no verão escaldante do Rio de Janeiro. Mesmo sendo sete e meia da noite o calor ainda era insuportável, mas nada que eu já não estivesse acostumada.

Estava terminando de pegar minhas coisas e arruma-las na bolsa pra finalmente fechar a floricultura. Não via a hora de chegar em casa, tomar um banho e cair na cama. Eu estava muito cansada. O pior é que ainda era quarta-feira, ou seja, eu ainda teria muito trabalho pela frente.

Passo pela porta pegando a chave para trancá-la quando ouço um grito vindo do final da rua. Olho pra saber o que se passava e uma moça corria desajeitada em minha direção. Pensei em correr pra longe dela, mas algo me fez ficar ali, afim de saber o que estava acontecendo. Ela finalmente consegue se aproximar, tenta falar algo mas não consegue, então ela se abaixa apoiando as mãos no joelho tentando recuperar o fôlego. E eu? Bem, eu estava parada na mesma posição, ainda segurando a chave perto da fechadura e encarando aquela doida.

A moça levanta um dedo como se pedisse calma, se coloca de pé esticando a coluna com uma cara de dor e então finalmente diz as primeiras palavras.

- Não fecha! - Ela ainda estava um pouco ofegante, seu peito subia e descia violentamente. - Por favor!

Continuo encarando a doida sem muita reação.

- Caralho... Eu tô velha demais! - Ela diz puxando fôlego e então dá dois passos se encostando na parede. - Só um minuto!

Abaixo o braço que já estava cansado de ficar parado no ar e acato seu pedido. Não sei bem porque fiz aquilo, mas ela parecia querer alguma coisa e eu não sou de negar ajuda.

- Eu tentei chegar mais cedo, juro! - Sua respiração finalmente começa a se estabilizar, sua voz (e que voz...) sai um pouco mais grave. - Mas encontrei alguns empecilhos no caminho.

- Desculpa, você precisa de alguma coisa?

- Sim! - Ela se desencosta da parede e se aproxima. - Eu preciso de flores!

- Ah, entendi. Desculpa, mas eu tô fechando. Volta amanhã. - Coloco a chave na fechadura e ela segura meu braço.

- Não! Por favor! Você precisa me ajudar!

Encaro a garota. Ela tinha os olhos castanhos mais lindos que já vi. Suas sobrancelhas apontavam o quanto ela realmente precisava de ajuda.

- Moça, eu realmente já tô fechando.

- Não, por favor! - Sua expressão muda novamente demonstrando toda sua agonia. - Olha, eu sou fotógrafa e preciso de flores pra fazer um ensaio...

- Você pode voltar aqui amanhã.

- Esse é o problema moça! - Sua voz se altera dois tons e eu a encaro com o cenho franzido. Quem ela pensa que é pra gritar comigo? - Amanhã não vai dar. O ensaio é as nove da manhã. Por favor, você precisa me ajudar. Esse foi o lugar mais recomendado. Por favor!

Pondero por alguns minutos. Ela realmente parecia precisar de ajuda e minha floricultura tinha sido recomendada! Ela havia dado um voto de confiança e sinceramente?! Eu não seria louca de dispensar uma cliente.

Respiro fundo ao chegar no meu veredito e giro a maçaneta abrindo uma fresta da porta.

- Ok, eu vou te ajudar. - Entro deixando a porta aberta e vou direto pro balcão.

- Obrigado! - Ela diz fechando a porta e vindo em minha direção.

- Certo, me diga do que você preci... - Minha voz some assim que vejo seu rosto em meio a boa iluminação.

Não sei como nem porque, mas deixei de reparar naquela garota quando estávamos do lado de fora. Mas aqui dentro, encarando ela em uma boa luz, eu devo admitir, ela é gata pra caralho!

- Moça? - Ela diz tirando-me de meus devaneios e me sinto uma idiota completa.

- Desculpa! - Volto minha atenção para o computador que já estava ligando e então a encaro de novo. - Como é mesmo seu nome?

- Ludmilla! - Ela estica a mão pra mim com um sorriso cordial e meu Deus, que lindos dentes. - Ludmilla Oliveira. E você é Brunna certo?

Pisco algumas vezes ainda encarando aquele sorriso largo e perfeitamente branco e alinhado até que me dou conta de que sua mão ainda estava parada no ar.

- Isso! - Aperto sua mão dando uma leve chacoalhão. - Brunna Gonçalves.

- Eu sei.

- Desculpe?

Ela parece confusa e então sorri de novo. Deus, me ajuda!

- Eu sei quem você é, me recomendaram esse lugar, então...

Acho graça da pequena dancinha nervosa que ela faz com as mãos enquanto se explica.

- Ah sim! Claro...

Um silêncio meio constrangedor se faz presente, nos encarávamos como se tentássemos resolver um enigma e então o computador apita.

- Er, do que você precisa?

- Rosas! - Ela diz em um impulso. - De todas as cores. E margaridas. E violetas também.

- Ok... Quantas? - Encaro a tela e abro o programa afim de marcar seu pedido. - Uma de cada? Um buquê misto? Um arranjo?

- Quinhentas de cada.

Quase engasgo ao ouvir seu pedido e então volto a encará-la.

- Como? - Minha voz sai falhada devido a surpresa.

- Preciso de quinhentas. De cada.

Eu ouvi certo, né?!

- Qui... Quinhentas?

- Isso! Amanhã eu tenho um ensaio pra Vogue, sabe?! A revista?! Enfim, eu preciso das flores pro ensaio e tem que ser em uma boa quantia.

Meu cérebro parecia mais lento que o normal.

- Uau... - Respiro fundo e então encaro o computador de novo. - Ok, quinhentas de cada.

- Isso. E duzentos lírios, e cento e cinquenta copos de leite.

- Já dá pra alimentar uma família de três.

- Como?

Me arrependo na hora da piadinha sem graça e tiro o sorrisinho da cara negando com a cabeça, indicando pra que ela não ligasse pra mim.

Passei mais ou menos meia hora anotando seus pedidos que confesso, eram bem específicos e precisos. Tudo estava absolutamente profissional, mas perdi as contas de quantas vezes aquele sorriso me tirou o ar. Quer dizer, ela é linda! Um rosto quase angelical, lábios carnudos, olhos levemente puxados, um nariz muito bem feito, sobrancelhas marcadas e uma voz... Ah, aquela voz.

- Cinco mil e quinhentos. - Digo indicando o valor de tudo e ela me encara arregalando os olhos.

- Uau! Flores são mais caras do que pensei.

- Pode acreditar que sim.

Nós duas sorrimos e eu termino de anotar tudo. Pego a prancheta que estava sob o balcão e começo a preenchê-la com os pedidos. Deslizo a prancheta para ela que assina e me devolve em seguida.

A garota abre a mochila preta que estava em suas costas e tira um talão de cheques. Evito ficar encarando enquanto ela o preenche e finjo estar mexendo em algo no computador até que ela termina.

- Aqui! - A garota me entrega o cheque e eu lhe entrego o comprovante de compra.

- As flores serão entregues amanhã às oito da manhã no local que você pediu.

- Muito obrigado, você não sabe como me salvou!

Sorrio em resposta e ela guarda seu talão e volta a ajeitar a mochila. Termino de desligar e arrumar as coisas novamente enquanto ela se preparava para sair da floricultura. De repente percebo que ela está parada em frente a um arranjo de girassóis.

- Você vai querer alguns deles também? - Digo chamando sua atenção e ela me encara sorrindo.

Ok, eu acho que nunca vou me cansar de dizer o quanto esse sorriso é lindo. Porque ele realmente é.

- Na verdade eu quero um só!

Saio de trás do balcão e vou até ela. Tiro um dos vasos de lá e começo a embrulhá-lho.

- Vai dar de presente?

- Mais ou menos...

Continuou mexendo com o papel de embrulho e a fita.

- É um belo presente.

- Mesmo?

Termino o embrulho e a encaro.

- Sim. O girassol é a flor que inspira felicidade. Representa vitalidade, criatividade, otimismo e alegria. Por isso é uma excelente opção de presente, se o que você quer é desejar boa sorte, alegria, energias positivas, felicidade e outras boas vibrações, o girassol é o presente ideal.

Termino de falar e só então me dou conta de que ela estava parada tão próxima de mim. A mulher me encarava com tanta atenção e parecia saborear cada palavra que saía de minha boca. Seus olhos brilhavam e seu sorriso permanecia ali. Lindo e intacto.

- Uau. Eles tinham razão quando me recomendaram esse lugar, você realmente é muito boa!

Sinto minhas bochechas queimarem ao ouvir aquilo e tinha certeza de que estava vermelha feito um pimentão. Eu não conseguia tirar meus olhos dos seus, então respiro fundo e aproximo o vaso dela. Ainda mantendo o contato visual, ela estica a mão para pegá-lo, mas por um erro de cálculo, ou talvez não, nossas mãos se tocam e eu me sinto quente. Muito quente.

- Quanto é? - Ela pergunta com a voz rouca, quase sexy e eu estranho.

- Quanto é o quê? - Eu estava completamente perdido naquela imensidão castanha.

- O girassol.

- Ah! - Encaro a planta que eu ainda segurava. - Claro! Desculpe. São dez reais.

Ela pega a carteira no bolso de trás da calça e tira a nota de lá. Lhe entrego o vaso definitivamente dessa vez e vou até o balcão guardar o dinheiro na caixa registradora. De repente começo a ouvir seus passos e percebo que ela me seguia. Assim que fechei a caixa ela deu a volta no balcão, parando na minha frente. Ludmilla segurou minha mão direita e colocou o vaso sobre ela. Depois fez o mesmo com minha mão esquerda.

- Obrigado por ser sido tão atenciosa e paciente comigo. - Ela se aproxima e sinto minhas pernas fraquejarem. - Boa noite Brunna. - Ela me dá um beijo na bochecha e se afasta ainda sorrindo.

Pega o recibo em cima do balcão e o guarda no bolso da calça. A garota sai fechando a porta e eu continuo ali parada, com o vaso na mão, sem conseguir processar tudo o que tinha acontecido.

Eu me sentia uma completa idiota. Minhas pernas ainda tremiam, minhas mãos seguravam o embrulho tão forte que meus dedos começaram a doer, eu olhava pra porta esperando por algo que sabia que não iria acontecer. Eu queria que ela voltasse, que me agarrasse com força, arrancasse minha camisa e me beijasse direito, com vontade. Será que estou louca? Fantasiando com uma cliente que eu nunca tinha visto na vida. O que diabos está acontecendo comigo?

Pisco algumas vezes saindo do transe e coloco o vaso em cima da mesa. Encaro o girassol que parecia ainda mais vivo e então tenho uma idéia.

Desligo de vez o computador, ajeito minhas coisas novamente e pego minha bolsa e o girassol. Quando saio da floricultura olho ao redor na esperança de que talvez ela ainda estivesse ali, mas eu sabia que isso era impossível.

Tranco a porta e vou até meu carro que estava estacionado na esquina. Entro já dando partida e faço o mesmo caminho de todas as noites. Enquanto dirigia pelas ruas olhava em volta procurando por ela. Ok, eu definitivamente estava ficando louca. Procurando uma estranha na rua na esperança de encontra-la e viver um romance digno de contos de fadas com direito a final feliz. Eu sei que essas coisas não existem, mas eu posso sonhar, não?!

Chego em meu condomínio e estaciono o carro na garagem. Saio de lá passando pelo segurança e como de costume, ele me cumprimenta com um sorriso largo.

- Boa noite senhorita Brunna.

- Boa noite Sérgio. Como vai?

- Bem. E posso ver que a senhorita também.

- Como assim?

- Oras, com um sorriso desse tamanho e uma flor linda dessas na mão, posso ver que o dia foi bom, sim?!

Só então percebo que eu ainda tinha o mesmo sorriso e que o mantive por todo o caminho de volta pra casa.

- É Sérgio, o dia foi bom e a noite também!

- É, os prazeres da juventude!

Rio de sua fala e me despeço indo em direção ao elevador. Quando as porta se fecham encosto a cabeça na parede espelhada atrás de mim e começo a me lembrar. Aquela mulher era tão linda, sua voz rouca e firme ainda soava viva em meus ouvidos me causando arrepios, o contato de suas mãos nas minhas me fez sentir um leve choque acordando todos os meus sentidos que ficaram ainda mais aguçados com aquele beijo. Um beijo simples e rápido, dado na bochecha esquerda quase perto da boca. Seus lábios macios e quentes ainda estavam vivos na minha pele e isso me deixava ainda mais ensandecida.

Deus, o que aquela mulher tem?

As portas de metal se abrem e junto delas meus olhos. Encaro o pequeno corredor branco a minha rente e respiro fundo antes de dar o primeiro passo. Chego na minha porta e antes que pudesse abri-la, Larissa surge do apartamento ao lado com a cabeça pra fora.

- Chegou tarde hoje!

- Sim, eu tive um... Imprevisto.

- Humm... - Seus olhos se fecham levemente e ela me analisa com uma sobrancelha levantada.

- O quê?

- Quem é?

- Quem é o quê?

- Quem é o motivo do seu atraso?

- Não sei do que tá falando.

Destranco a porta, abrindo-a e entro no meu apartamento. Larissa vem logo atrás de mim fechando a porta logo em seguida. Jogo minha bolsa no sofá e vou em direção ao banheiro já tirando a roupa pelo caminho.

- Desde quando você traz flor pra casa?

- Eu ganhei. - Entro no banheiro tirando a lingerie e deixando a porta aberta e ela entra logo atrás de mim.

- Ganhou de quem? Do atraso?

Sorrio de sua palhaçada e entro no box ligando chuveiro.

- Deixa de ser boba.

- Me conta logo, inferno!

- Calma! - Entro debaixo do chuveiro deixando a água refrescante correr por meu corpo. - Eu tava fechando a floricultura quando uma doida veio correndo e gritando pedindo pra esperar.

- Cê foi assaltada?

- Não! - Pego a espoja e o sabonete. - Ela disse que tava lá por recomendação, pediu pra mim fazer uma venda pra ela e eu aceitei.

- Claro, você não perde cliente.

- Exato! - Começo a esfregar meu corpo deixando um rastro de espuma por onde passava a esponja. - Depois de tudo pronto ela comprou um girassol solto, perguntei se era presente e ela disse que sim. Pagou e me entregou o vaso agradecendo minha atenção.

- E?

- E... Me deu um beijo no rosto.

Encaro minha amiga que tinha uma expressão confusa.

- Um beijo no rosto?

- Sim.

- Você tá sorrindo feito palhaça por causa de um beijo no rosto?

Reviro os olhos e continuo esfregando meu corpo.

- Você não entende...

- Ah, eu entendo sim, aliás se tem uma coisa que eu entendo é de beijo. Sério que você tá assim por causa de um beijo no rosto?

- Larissa, não foi só isso!

- O que então? Vocês se pegaram depois? Rolou tapa na cara?

- Não! Garota? - Enxáguo meu corpo e então pego o sabonete pra lavar o rosto. - Foi o gesto sabe? Eu disse pra ela o que o girassol significava. Quando ela me entregou ele foi tão... Cuidadosa.

- Ah não Brunna. - Ela se levanta e vai até o espelho. - Você e esse seu romantismo de uma garota de 13 anos. Pelo amor...

- A culpa não é minha se você não acredita no amor. - Enxáguo o rosto e termino meu banho.

- Eu acredito no amor. Amor de mãe, de irmão, de vó. Isso é amor. Essa sua idealização de amor só acontece em filme de Hollywood.

- Não é bem assim...

- Claro que é! - Ela se aproxima de novo e abre a porta do box me encarando. - A garota conhece o garoto na escola, ela derruba os livros, ele ajuda e então suas mãos se tocam e no exato momento os dois se apaixonam e vivem uma linda história de amor. - Ela me encara com desdém. - Coisa de filme, fanfic, história pra boi dormir. Na vida real é bem diferente!

Fecho o chuveiro e pego a toalha que havia ali. Enrolo ela no meu corpo e passo por ela saindo do box.

- Você precisa superar essa mágoa que sente do João.

- Não tem mágoa nenhuma Brunna! - Ela me segue até o quarto se sentando na cama e eu procuro um pijama pra vestir. - O que aconteceu com a gente foi o retrato perfeito do que acontece na vida real.

- Larissa, vocês terminaram por uma besteira!

- Besteira? Ele foi pra Bahia fazer faculdade Brunna. Isso não é besteira.

- Claro que é! - Visto a calcinha e o short do pijama. - Vocês se amavam, formavam o casal perfeito e você quis terminar porque acha que namoro a distância não existe.

- Mas não existe! Ele na Bahia e eu no Rio, cê acha mesmo que iria dar certo? Me vendo a cada seis meses, sem poder beijar ou transar com ninguém.

- Se ele realmente te amava, como eu acho que amava, iria sim conseguir.

- Brunna, ele é homem! - Coloco a camisa do pijama e a encaro com a mãos na cintura. - Homem não fica nem dois dias seguidos sem trepar, minha filha. Um mês naquela faculdade ele já ia logo querer achar uma toca pra enfiar topeira dele.

- Ai Larissa, que horror.

- A verdade te assusta, nega?

Reviro os olhos e saio do quarto depois de estender a toalha. Larissa sempre foi assim, fala tudo o que vem a sua mente, sem filtro algum. Ah, aliás, deixem-me apresentá-la, Larissa é minha melhor amiga desde a época da faculdade. Nos conhecemos logo no primeiro período, eu em administração e ela em educação física. Apesar dos cursos serem diferentes, vivíamos sempre grudadas. Depois que terminar a faculdade arrumamos emprego em uma academia, cada uma em seu respectivo cargo. Como sempre estávamos juntas em absolutamente tudo, sugeri que dividíssemos um apartamento, mas ela não aceitou. Não queria ter sua privacidade invadida, então deu a idéia de sermos vizinhas de porta. Por sorte encontramos dois apartamentos que estavam para serem alugados em um edifício perto do centro da cidade, não era muito caro e era perfeito e seguro para duas solteiras.

Desde sempre Larissa foi minha confidente, minha caixa de segredos, ela sabe tudo sobre minha vida e eu sei sobre a dela. Nossa amizade desde o início sempre foi forte, do tipo de terminarmos frases e quase conseguir ler os pensamentos uma da outra. Lari nunca foi do tipo romântica, mas sempre foi do tipo durona. Ela já havia sido machucada algumas vezes. Quando nos conhecemos, ela estava no meio de uma relação conturbada e um pouco tóxica, Lari tentava entender seu namorado mas ele era louco. Tudo terminou quando em uma discussão, ele ele foi pra cima dela, mas ela se defendeu dando um chute no saco do cara.

Depois de um ano ela conheceu o João, ele era um amor, super atencioso, carinhoso, um verdadeiro príncipe. Penou muito pra conquistar minha amiga, não a culpo, afinal ela passou por muita coisa. Depois de seis meses tentando, João finalmente conseguiu marcar um encontro com ela, eles saíram, ficaram e então aos poucos foi acontecendo. Nunca houve um pedido de namoro oficial, porque Larissa não gosta de nada romântico, mas eles ficaram juntos por três anos, até que no ano passado ele quis engressar em sua segunda faculdade e conseguiu uma ótima bolsa na UNEB. Ele tentou convencer minha amiga a ir com ele pra Bahia mas ela não aceitou, disse que se fosse, seria ruim pro relacionamento. De qualquer forma, três meses depois eles terminaram, porquê de acordo com ela...

- Homem nenhum aguenta ficar sem sexo! Você pode até não acreditar, mas é a verdade!

Coloco a frigideira sobre o fogão e ligo o fogo. Despejo um pouco de óleo e espero esquentar enquanto mexo os ovos.

- De qualquer forma, eu ainda tenho esperanças de que vocês voltem.

- Hum, eu duvido! Ele já deve ter conhecido alguma bahiana bem bonita lá.

- Não seja tão pessimista.

- Pessimista não, minha amiga, realista!

É, essa é a Larissa.

Aliás, aquele papo todo sobre eu "invadir seu espaço pessoal" morando juntas não serviu de nada, já que ela passa mais tempo na minha casa do que na dela. Larissa não diz, mas odeia ficar sozinha. E ela também me ama, sei disso porque não sai de perto de mim, mesmo me xingando e me xoxando sempre. É o seu jeitinho de dizer "te amo".

- Mas fala. - Ela diz abrindo a geladeira e pegando o tomate. - Como ela é? Bonita?

- Linda!

- Uh, conta mais!

- Negra, pele escura sabe?

- Uuuuh...

- Alta.

- Quanto?

- 1,80 eu acho.

- Porra...

- Tatuada.

- Adoro tatuagem! - Ela coloca um pedaço de tomate na boca.

- Eu também! Olhos castanhos, boca carnuda, um nariz lindo...

- Piercing?

- Sim, alguns.

- Quais?

- Argolinha no nariz, nos dois tragos e um transversal.

- Sapatão!

Rio de sua fala e despejo os ovos mexidos na frigideira.

- Como sabe?

- Transversal! Toda sapatão tem!

- Isso não é meio preconceituoso?

- Só se você se ofender.

Não sei se posso concordar com aquilo então só deixo pra lá. Seguro a espátula e viro o omelete do outro lado.

- Como era a roupa?

- Regata preta meio justinha, calça de moletom também preta e coturno.

- Nossa, ela é muito sapatão!

Larissa não tinha jeito.

- Como eram as tatuagens?

- O braço direito quase fechado. Um leão bem grande no ombro, alguns desenhos aleatórios na parte de dentro no braço, e algo parecido com um tribal na mão.

- Colorida?

- Só a rosa.

- Mais nenhuma?

Tento me lembrar de mais alguma e tiro o omelete dali colocando em um prato. Larissa se aproxima e começa a fazer o dela. Eu até faria, mas não suporto nem o cheiro de queijo.

- Ela tinha uma no pescoço também.

- Sexy...

- Muito!

- E o cabelo?

- Lindo. Longo até o meio das costas, meio ondulado sabe. Um castanho médio...

- Bem o seu tipo.

- Sim... - Sorrio e então começo a comer.

Ela termina de preparar seu omelete e se junta a mim, sentando em um dos bancos que ficava de frente para o balcão.

- Já sabe quando vai ver ela de novo?

Encaro minha amiga e tento disfarçar minha alegria.

- Já!

- Hum, já vi que tá tramando algo.

- Sim. Mas só te conto se der certo...

- Você e suas supersticiosidades.

Dou de ombros e nós terminamos de jantar entre uma brincadeira e outra. Ela me contou como seu dia havia sido agitado. Quando contei a ela que abriria meu próprio negócio, Larissa me incentivou muito. Depois da inauguração da floricultura ela acabou se demitindo da academia e foi dar aula em uma escola particular pra turma do ensino médio. Eu amava suas histórias de como ela fazia questão de torturar os "adolescentes preguiçosos e sedentários" pra quem ela dava aula. Larissa adorava obriga-los a praticar esportes e dar provas surpresas sobre eles, a cara de desespero dos alunos era o que alimentava sua alma.

Termino de lavar os pratos e os coloco no escorredor. Apago a luz da cozinha e vou pro quarto onde Larissa já me esperava, devidamente deitada debaixo das cobertas, a TV estava ligava em uma série da Netflix e ela ria, como se nunca tivesse assistido aquela série antes. Ela já tinha assistido. Sete vezes.

Me ajeito debaixo das cobertas e ela desliga a tevê se deitando também.

- Não vai assistir mais?

- Não, vou deixar você dormir.

Viro para ela, encarando-a e ela sorri.

- O quê?

- Uma caçadora precisa de uma boa noite de sono.

Dou um tapa em seu braço e ela ri passando a mão no local.

- Você é ridícula.

- Não fui quem se apaixonou por um beijo na bochecha de uma desconhecida.

- Cala a boca.

Viro novamente e ela me abraça por trás. Lari adorava dormir de conchinha.

- Boa noite, princesinha da Disney. - Ela diz me dando um beijo na bochecha.

- Boa noite, vilã de novela mexicana.

Rimos um pouco e finalmente me entrego ao sono. O dia havia sido cheio e amanhã eu iria colocar meu plano em prática, eu realmente precisava dormir bem.

{...}

Acordo com o despertador gritando e alguns raios de sol esquentando meu rosto. Solto um grunhido e desligo o alarme. Me estico na cama sentido meus músculos darem sinal de vida e me espreguiço um pouco. Levanto da cama calçando meus chinelos e vou pro banheiro.

Saio de lá indo em direção a cozinha e o cheiro de café empestiava a casa.

- Bom dia flor do dia. - Lari diz colocando a garrafa sobre a mesa.

- Bom dia.

Me sento e começo a preparar meu café. Eu não sou uma pessoa muito ativa de manhã, gosto de curtir um pouco a preguiça e a cara inchada de sono em um silêncio confortável. Larissa sabia disso e também era assim, o que deixava as coisas um pouco mais fáceis.

- Hum, quer almoçar comigo hoje? - Ela diz chamando minha atenção.

- Pode ser. Que horas?

- Vou estar livre a partir das dez.

- Eu te ligo então, pra gente marcar.

- Ok.

Terminamos o café e ela vai pra casa. Me levanto da mesa seguindo até meu quarto e tomo um banho me preparando pra sair. Coloco uma calça jeans clara, uma camiseta branca com um desenho qualquer e uma jaqueta jeans. Calço meus tênis e pego a bolsa em cima do sofá. Tranco a porta e antes de ir para o elevador, Larissa sai de seu apartamento me encontrando.

- Hum, tá bonita, garota prodígio.

Sorrio em resposta e vamos juntas até o elevador.

Lari havia me dado esse apelido quando nos conhecemos. O motivo? Eu havia entrado na escola dois ano antes de todo mundo. Enquanto todos na sala do primeiro ano do ensino fundamental tinham sete anos, eu com meus cinco já tinha a mesma capacidade intelectual que eles... Talvez até um pouco mais. Entrei na faculdade bem antes que todo mundo, afinal terminei o ensino médio com 15 anos. Me formei com 19, o que me fez merecer tal apelido.

Finalmente chegamos juntas ao estacionamento. Cumprimentei Sérgio com um aceno de cabeça e ele sorriu em resposta, ele também sabia que eu não era muito de conversar logo pela manhã. Segui para meu carro e Larissa foi em direção a sua moto. Entrei dando partida e ela fez o mesmo depois de colocar o capacete e ligar a Daphne, apelido carinhoso que tinha dado para sua motoca. Sorri para minha amiga e ela me desejou um bom dia. Saímos juntas pela garagem seguindo caminhos opostos e eu liguei o rádio afim de me animar um pouco.

O caminho foi tranquilo. Cheguei na floricultura no mesmo tempo de sempre. Rafael, meu ajudante, já me esperava do lado de fora como toda manhã. Desligo o carro e pego minha bolsa saindo de lá.

- Bom dia Rafa.

- Bom dia Bru! Cê tá linda!

Sorrio para ele e destranco a porta.

- Obrigado, são seus olhos.

Entro na floricultura e ele vem logo atrás de mim. Viro a placa de fechado ao contrário e fecho a porta novamente indo em direção ao balcão e pegando o papel que havia deixado ali na noite anterior.

- Rafa, separe essas flores aqui pra mim, por favor. - Entrego o papel ao rapaz e ele arregala os olhos.

- Wow! Duas mil flores? - Ele se aproxima e abaixa o tom. - Algum famoso morreu?

Rio de sua fala e ligo o computador.

- Não. São pra um ensaio fotográfico de uma revista.

- Ufa! Menos mal... - Ele coloca as luvas de borracha e o avental. - Qual o endereço?

- Ah não, pode deixar que essas eu mesma entrego.

Ele me encara, curioso.

- Por que?

- Porque eu quero.

O garoto levanta as mãos em sinal de rendição e vai para o outro cômodo da loja onde ficavam as flores. Alguns minutos depois ele surge dizendo que já estava tudo devidamente arrumando e separado no furgão do lado de fora. Agradeço ele e pego as chaves indo até o carro.

Ligo e sem muita dificuldade começo a me locomover. Vou seguindo as coordenadas do GPS e depois de vinte minutos, chego ao local indicado.

Saio do furgão indo até a recepção do local.

- Bom dia, posso ajudá-la? - Uma moça simpática me chama.

- Bom dia. Eu tenho uma entrega de flores para o escritório 9.

- Um momento. - Ela pega o telefone e disca o número.

Começo a reparar no lugar e a arquitetura era impecável. Moderna e luxuosa, paredes de vidro deixavam o lugar claro e arejado, havia um saguão enorme com uma pequena fonte no meio, dois elevadores laterais e alguns sofás perto da recepção.

- Os ajudantes já irão descer para buscar a mercadoria. - A moça diz me tirando do transe.

- Ah sim, obrigada.

- De nada.

Me afasto um pouco dali e me sento no sofá. Pego meu celular conferindo as horas e então uma das revistas me chama atenção. Começo a folhea-la sem muito interesse até que paro em uma das páginas de propaganda. Uma modelo bem bonita usava uma lingerie minúscula de uma marca bem famosa. No rodapé da página um nome me chamou atenção. Foto por: Ludmilla Oliveira.

É, ela é bem famosa.

- Com licença! - Uma moça diz e eu a encaro. - Você é a florista?

- Sim!

- Pode nos mostrar onde estão as flores?

- Oh, claro!

Largo a revista no lugar onde peguei e caminho na frente da moça e do rapaz. Abro a porta de trás e eles começam a pegar as caixas com as flores, com cuidado. Depois de tudo devidamente arrumado, as caixas começam a ser levadas para dentro do lugar e eu fecho as portas do furgão.

- Desculpa, imagino que você seja muito ocupada, mas poderia nos ajudar com as caixas?

Aquilo soa como música para meus ouvidos.

- Claro!

Pego algumas das caixas e vou até o elevador. Subimos até o último andar, as portas se abrem me dando a vista de um escritório amplo, espaçoso e muito bem mobiliado. Haviam mais cinco pessoas ali dentro arrumando alguns equipamentos e mexendo em um computador. Duas mulheres que eu poderia facilmente dizer que eram modelos terminavam de conferir suas roupas. Caminho atrás dos dois que haviam descido e coloco as caixas em um canto.

Paro para analisar um pouco tudo ao redor e quase infarto, quando vejo Thaís Araújo saindo de uma porta que parecia ser o camarim. Ela cruza a sala, indo em direção a um grupo de pessoas que estavam vestidas de preto e então começa a conversar com elas.

- Brunna? - Ouço aquela voz, já muito bem conhecida e paraliso.

Meu coração da uma leve acelerada e minha garganta seca.

- Ei! - Foi tudo o que consegui dizer quando aquele sorriso perfeito veio em minha direção.

- Além de dona e vendedora, você também entrega? Uau, uma mulher multitarefas.

- É, sabe como é...

Ela sorri e vira as costas, indo até uma mesa de café da manhã e eu quase me dou um soco de tão patética. Eu não conseguia nem falar de tão nervosa que ela me deixava.

- Café? - Ela pergunta me mostrando a garrafa.

- Não, obrigada.

Lud se afasta e vai até o grupo de pessoas que estavam com a Thaís.

Paro alguns segundos e me xingo mentalmente. Eu devo ser muita burra, uma mulher dessa me oferece café e eu nego? Burra, burra, burra!

- E então. - Ela diz voltando e eu disfarço minha cara de desespero. - Como está sua manhã?

- Ah... Normal...

- Ah sim.

Silêncio. O mais constrangedor e vergonhoso silêncio paira no ar e meu estômago se contorce em agonia.

- E a sua?

Ela me encara e sorri. Maldito sorriso.

- Agitada. - Ela da uma olhada na sala e eu sigo seu movimento. - E o girassol? Tá cuidando bem dele?

- Ah sim! Claro... Antes de sair eu o reguei.

- Ótimo. Cuide bem, ok?

- Ok.

Me deixa cuidar de você também!

- Bom, eu tenho que ir. A gente se vê! - Ela se aproxima e me dá um beijo no rosto, dessa vez foi mais demorado. Talvez um segundo mais demorado.

Vejo aquele corpo maravilhoso se afastar aos poucos e não consigo conter meus instintos.

- Espera! - Grito e ela me encara junto com o grupinho de pessoas.

Sinto meu rosto queimar na hora e tinha certeza de que já estava vermelha.

- Sim? - Lud volta a se aproximar.

- Eu... Queria saber se... Você quer... Se aceita... - Meu Deus as palavras não saem! - Se você quer sair comigo... Qualquer dia... Desses...?

Ela sorri e coloca uma das mãos na cintura.

- Sabe o que é... - Ih, lá vem. - Eu tô meio atarefada esses próximos dias. Mas a gente pode marcar.

- Ah... Sei...

Acho que ela se deu conta do banho de água gelada que me deu e agora me olhava com pena. Eu odiava esse tipo de olhar. Quer dizer, eu nunca fui do tipo que chama alguém pra sair, não tenho essa coragem, e quando o faço, recebo um não logo de cara?

- Já sei! - Ela diz indo em direção a mesa. Percebo que ela escreve algo e então volta. - Vai ter uma festa hoje pro pessoal da equipe, uma resenha básica sabe? Aparece por lá.

Ela me entrega um guardanapo com um endereço escrito nele.

- Ah... Claro!

- Começa às sete.

- Você vai estar lá?

- Sim! - Ela diz em um tom meio óbvio. Eu sou muito burra. - E espero que você também esteja.

- Bom, vai ser meio difícil te achar já que todos aqui parecem iguais - Que porra foi essa Brunna?

Ela sorri. ELA SORRI. ATENÇÃO, ELA SORRIU DA MINHA PIADA BOSTA.

- Pode deixar, eu te acho! - Ela diz dando uma piscadela.

Meu estômago se contorce outra vez, dessa vez de excitação.

- Talvez não seja tão fácil assim...

- Claro que é! Se você estiver tão linda quanto agora, vai ser bem fácil encontrar a garota mais bonita da festa.

Ok. Isso foi uma cantada? Porque se sim, deu super certo!

Sorrio em resposta e ela faz o mesmo. Deus se ela soubesse o que esse sorriso me causa...

- Aí traça! - A mesma moça que havia descido agora apareceu. - As flores já estão aqui.

- Daiane, eu já disse pra não me chamar assim.

- Por que? É só um apelido carinhoso.

- Eu já falei que não gosto desse apelido.

Daiane levanta as mãos em sinal de rendição.

- Ok, desculpa. Não tá mais aqui quem falou...

Ela se vira em minha direção e me encara dos pés a cabeça. Me sinto um pouco violada com aquele olhar.

- Vocês se conhecem?

Estava pronta para falar quando Lud entrou na frente.

- Sim! Ela me salvou ontem a noite quando fui encomendar as flores.

- Ah, então você é a Brunna? - A garota pergunta e Ludmilla cora. Eu nem sabia que ela era capaz de corar.

- Er, sim...

Ela me estende a mão eu aperto. A garota sorria com certa malícia, enquanto me encarava como se quisesse desvendar algum mistério.

- Lud falou de você. Muito!

- Daiane! - Ela dá um tapa no braço da moça que faz cara de dor.

- Ai. Que foi?

Ludmila funga pesado e revira os olhos.

- Melhor eu ir. - Ela me dá um beijo e se afasta. - Prazer em conhecer Brunna! - A garota se afasta e vai em direção ao grupinho.

- Desculpa por isso.

- Imagina...

Ficamos ali mais alguns minutos em silêncio apenas nos encarando e e dessa vez não foi tão constrangedor. Percebo que seus olhos migram dos meus e pairam sobre meus lábios. Sinto meu corpo esquentar com aquilo. Lud estava bem próxima de mim, eu podia sentir o calor que seu corpo emanava. Ela passa a língua nos lábios, umedecendo um pouco e eu sinto minhas pernas fraquejarem.

- Eu... Tenho que ir... - Lud diz meio sem graça.

- Oh, claro! Pode ir...

- O dever chama...

- Sim... - Rio um pouco. - Sempre!

- É...

Mais um pouco de silêncio com um toque de troca de olhares. Deus, tá quente aqui né?!

- Bom, nos vemos a noite então? - Ela me encara em dúvida.

- Claro! - Digo levantando o guardanapo. - Às sete!

- Às sete!

Seu sorriso permanecia intacto. Deus que calor...

- Bom, eu vou lá. Tchau!

- Tchau! - Ela se aproxima de mim e me dá dois beijos na bochecha. Um de cada lado.

Fecho os olhos apreciando o momento, seu toque, que fora rápido mas pra mim parecia em câmera lenta. Ela se afasta e vai em direção ao grupinho e eu sigo meu caminho de volta a floricultura.

Assim que entro de volta no elevador dou uma leve surtada. Ludmilla falou de mim. Ela falou de mim pra amiga. Ela me chamou pra sair depois de falar de mim pra amiga e ficou encarando minha boca como se fosse me devorar. Meu Deus... Eu não tô bem!

...

- Uma festa?

- Sim!

- Em plena quarta a noite? Uau, isso é que é horário flexível.

- Bem, eu não vou ficar até o final...

Pego o saleiro e tempero a salada do prato.

- Como não?

- Eu trabalho amanhã! E também só vou pra poder ver a Lud mesmo, quem sabe rola algo...

- E se rolar algo cê vai embora no meio do bagulho?

- Algo tipo beijo, Larissa! - Abocanho algumas folhas e ela me encarava incrédula.

- Ah não! Você vai gastar roupa, maquiagem e combustível pra ir numa festa beijar? Ah garota, se fuder...

- Ei!

- Desculpa.

- Você que é a safada daqui ok, eu não sou de ir pra cama com alguém no primeiro encontro.

- Transar Brunna! Fala transar. Converse como uma pessoa de 20 anos, pelo amor de Deus!

- Você que é a promíscua daqui.

- Tá.

Continuo comendo e ela pede mais uma taça de vinho. Não sei como aquela garota ainda não tinha sido demitida por chegar no trabalho levemente alterada e cheirando a álcool, mas se eles aceitavam numa boa, quem sou eu pra discordar, certo?!

Desvio o olhar por alguns segundos e vejo Rafa entrando no restaurante. Ele sorri acenando pra mim e eu sorrio em resposta, quando menos esperava ele começa a caminhar em minha direção.

- Oh merda. - Digo sem mexer os lábios e Larissa me encara.

- Quê?

- O Rafa.

Ela olha pro lado e o vê.

- Ih, lá vem o de menor...

- Oi Rafa! - Ele me dá um beijo na bochecha e faz o mesmo com Larissa logo em seguida.

- Oi Bru. Larissa.

- Que tá fazendo aqui?

Encaro minha amiga quase pulando em seu pescoço e ela da de ombros.

- Eu vim almoçar.

- Ah sim...

- E desde quando cê tem dinheiro pra pagar?

- Larissa!

- Quê? O garoto tem 17 anos, trabalha como ajudante e vem comer num restaurante desse? - Ela vira para o rapaz. - Cê é rico?

Rafa sorri.

- Não. Meu pai é o dono do restaurante.

- Então é rico! - Ela chama o garçom pedindo a conta e Rafa continua ali, parado, me olhando.

- Bru. - Ele me chama e quando volto minha atenção percebo que ele parecia nervoso. - Eu queria saber... Se você gostaria de pegar um cinema comigo... Qualquer dia desses...

Continuo encarando o garoto por alguns instantes e ouço Larissa segurar a risada. Ele mantinha sua atenção focada em mim e seus olhos mal piscavam.

- Rafa...

- Não precisa responder agora! - Ele me interrompe. - Só... Pensa no caso, ok?

Respiro fundo, não queria magoa-lo.

- Ok, vou pensar.

- Obrigado.

Ele da as costas e vai em direção ao balcão do restaurante.

- Devo admitir, ele pode até não ter saído das fraldas ainda, mas tem coragem!

Rio da palhaçada de Larissa e pago a conta. Saímos do restaurante e caminhamos até o carro em uma conversa animada.

Não era de hoje que sei que Rafael tem uma quedinha por mim. Desde que começou a trabalhar na floricultura todos os seus gestos e olhares foram muito bem captados por mim, mas eu não poderia fazer nada. Apesar da pouca diferença de idade, ele ainda era um adolescente e nossa linha de raciocínio não era a mesma. Tínhamos pensamentos e objetivos de vida diferentes. Sem contar que ele ainda estava no ensino médio. Imagina ser dona do próprio negócio e quando chegar em casa cansada do trabalho, perguntar pro seu namorado "Como foi seu dia?" e ele responder "Foi foda, tive prova oral hoje"... É, não dá.

Deixei Larissa na escola e segui de volta pra floricultura. Não demorou muito e Rafael voltou também, ele ainda tinha o mesmo sorriso meigo que tinha me dado no restaurante. Apesar de todos os pesares, eu devo admitir: esse garoto tem charme! Ele é alto, 1,75 mais ou menos. Bronzeado, cabelo castanho meio avermelhado, olhos verdes e um sorriso lindo. Sem falar nas covinhas... Um charme!

O dia passou normal como todos os outros. Alguns clientes regulares, outros novos. Arranjos das mais diversas flores, buquês coloridos, cestas de presentes e outras coisas. Pode não parecer, mas o dia em uma floricultura é agitado.

Chego em casa jogando a bolsa no sofá e indo até a cozinha afim de beber um pouco de água. Eu não tinha sido tão barulhenta assim, mas Larissa devia ter algum sensor que apitava quando eu estava próxima em um raio de 10km. Ela entra e se senta no banco em frente ao balcão.

- Ansiosa pra festinha da sua namoradinha?

- Ela não é minha namoradinha. Ainda...

- A-Ha! - Ela da um tapa no balcão e aponta pra mim. - Então você quer que ela seja!

- Talvez...

- Hum...

Guardo a garrafa na geladeira e vou em direção ao banheiro. Tiro minhas roupas jogando-as no cesto e entro no box. Começo lavando o cabelo primeiro e depois passo a lavar meu corpo. Não demoro muito ali, saio com uma toalha enrolada no corpo e uma na cabeça. Entro no closet que ficava do outro lado do quarto e vejo minha amiga ali.

- Tá fazendo o quê?

- Escolhendo sua roupa!

Encaro ela, arqueando uma de minhas sobrancelhas e percebo que ela segurava duas peças de roupa, uma em cada mão.

- Não mesmo!

- Por que?

- Você está louca querida! Nunca vou me vestir com algo que você escolher, não tô afim de parecer uma garota de programa.

- Assim você me ofende! Desde quando meu gosto por moda não te agrada?

- Desde quando me fez usar aquele vestido minúsculo e ridículo na festa do Henrique.

- Que Henrique?

Paro de mexer na gaveta e encaro minha amiga.

- Seu ex!?

- Ah, esse Henrique... Brunna, aquilo já passou ok?! Faz anos, meu gosto mudou.

- Larissa, nem vem!

- Ah eu venho sim. Se eu te deixar escolher uma roupa cê vai pra essa festa parecendo crente. Sai dessa.

Estreito os olhos e cruzo os braços. Eu sei me vestir bem ok? Meu gosto não é tão ruim assim. Ela da de ombros e vai até a parte de vestidos. Tira um longo de lá, verde musgo, encara o vestido de cima a baixo e o descarta.

- Muito vó!

Depois pega um azul de cetim.

- Muito chique.

Depois de uma boa olhada ela finalmente escolhe um vestido tubinho preto, curto, com alças finas e douradas e um decote nas costas. Ela olha pra mim e depois pro vestido e um sorriso malicioso nasce em seu rosto.

- É esse!

- Não!

- Eu não tô perguntando Brunna, agora coloca logo essa porra e vaza daqui!

Reviro os olhos bufando e pego e vestido de sua mão. Ela sai do quarto me dando privacidade, coisa que era difícil de acontecer. Coloco uma calcinha de renda preta, visto o vestido e vou até o banheiro afim de secar meu cabelo e fazer a maquiagem. Não exagerei muito, somente destaquei um pouco meus olhos.

Saio do banheiro e procuro um sapato, peguei um na cor prata, salto médio, nada muito chamativo. Pego uma bolsa pequena e saio do quarto arrumando minha carteira e celular na tentativa de fazê-los caber ali.

- Uau! - Levanto o olhar e encontro Larissa boquiaberta. - Caralho Brunna, se você não fosse minha amiga eu te pagava.

Rio de sua fala e caminho até a cozinha.

- Será que ela vai estar lá?

- Ela te convidou né, não faz sentido ela não estar.

- Assim espero. - Bebo um copo de água colocando na pia logo em seguida, respiro fundo e encaro minha amiga.

- Calma amiga, vai dar tudo certo.

- Amém!

Lari sorri e me abraça.

- Agora sai logo daqui e vai trepar.

- Tão sensível...

- Até demais, baby.

Pego as chaves do meu carro em cima da mesa e saio do apartamento. Não demoro muito para chegar em meu carro e logo dou partida e saio dali indo em direção ao endereço da festa. Cerca de trinta minutos depois, paro em frente a um edifício que ficava no centro da cidade. Tinha muitos andares, uns trinta talvez. Somente o último andar tinha luzes acesas, eram coloridas e piscavam. Estaciono o carro e desço indo em direção ao prédio. Entro no elevador e aperto o último andar, eu não sabia bem o que estava fazendo mas a festa parecia ser lá. Assim que as portas de metal se abrem, caminho até a porta do lugar e dois seguranças me impedem de continuar.

- Com licença senhorita, seu nome está na lista?

Encaro aquele brutamontes e sinto uma frio na espinha. O homem é alto, careca e muito, muito forte.

- Er... Eu não sei.

- Qual o seu nome?

- Brunna. Brunna Gonçalves.

Ele confere as folhas da prancheta e o outro homem que estava ao seu lado continuava parado, com os braços cruzados na frente do corpo e encarando o nada. Sua cara de mal era tão ruim quanto a do outro.

- Aproveite a festa senhorita Brunna. - O moço diz abrindo a porta e saindo da minha frente.

O encaro sem saber ao certo o que fazer e em um impulso, meu cérebro envia o comando para o meu corpo e minhas pernas se mexem.

Entro no lugar e a música alta me atinge em cheio. Haviam muitas pessoas ali. As luzes néon corriam por todos os lados, todos tinham um copo na mão e conversavam animadamente. A pista de dança improvisada estava lotada e o DJ fazia questão de brincar com os mais animadinhos. Caminho entre as pessoas evitando encostar muito nelas e começo a procurar Ludmilla no meio da multidão. Estava escuro, o som estava alto e tinha muita gente com roupa preta na festa. Caminho mais um pouco até conseguir achar um lugar mais privado, um pouco mais afastado da muvuca.

Me encosto na parede e quando me dou conta, o bar estava a minha frente. Vou até lá e peço uma gin-tônica. Eu não poderia beber muito, afinal iria dirigir, mas por enquanto eu posso me soltar um pouco mais. Quando estava pronta para voltar pro meu lugar sinto uma mão em meu braço, me viro já com um sorriso enorme mas ele morreu assim que percebo quem era.

- Chefinha?

Urgh! Eu odiava esse apelido.

- Oi Rafa! O que tá fazendo aqui?

- O mesmo que você! - Ele sorria sem parar enquanto me encarava.

- Tá mas... Como te deixaram entrar?

- Minha prima é uma das organizadoras da festa.

- Ah, entendo.

- Tá aqui sozinha?

- Na verdade...

- Brunna! - Paraliso ao ouvir sua voz. Meu coração acelera, minhas mãos tremem e meu estômago revira.

Me viro para encarar e la está ela. Uau! Ludmilla tá linda! Ela usa uma calça de couro que fica justa ao seu corpo destacando suas curvas, uma blusa soltinha que deixava o ombro a mostra, seu cabelo estava parcialmente solto e sua maquiagem era leve. Ah, e claro, lá estava seu coturno preto.

- Ei! - Já disse o quanto sinto raiva de mim mesma por perder a fala perto dela?

- Tá tudo bem? - Ela encara a mão de Rafael que ainda estava em meu braço e eu me incomodo com o toque.

- Tá. Esse é o Rafa, ele trabalha comigo.

- Oi! - Lud estende a mão e ele segura, balançando por um tempo.

Os dois travam uma batalha com o olhar e eu fico sem entender direito o que acontecia ali. Ludmilla solta a mão dele e segura a minha. Sinto um leve choque passar por todo meu corpo naquele momento. LUDMILLA TÁ SEGURANDO A MINHA MÃO CARALHO!

- Vem, vamo dançar um pouco!

Ela diz e começa a andar comigo em direção a pista. Modéstia parte eu danço muito bem, sabe?! O problema é que tenho vergonha de fazê-lo na frente dos outros. Chegamos bem no meio da pista e Lud começa a se balançar no ritmo da música. Era um hip-hop antigo que tocava e todo mundo conhecia a música, ela arrisca alguns passinhos e eu apenas me balançava pra lá e pra cá. Bebo mais um gole da minha bebida e decido deixar de ser careta, eu tô numa festa poxa!

Fecho os olhos, respiro fundo e começo a me soltar. Primeiros os braços, depois as pernas, logo meu tronco vai tomando vida própria e quando vi, estávamos dançando juntas e sincronizadas. Parecia até que tínhamos ensaiado, mas a música era tão conhecida e a batida era tão fácil de se acostumar, que qualquer um conseguiria dançar ser problema algum.

Percebo que aos poucos outras pessoas nos acompanhavam. Ludmilla sorria pra mim o tempo todo e por alguns segundos o mundo se desligou e eu só conseguia prestar atenção nela. Deus, essa mulher é linda!

A música vai acabando e ela me puxa pela mão de novo. Saímos dali indo em direção a varanda, o vento gelado bate na minha pele me causando um leve arrepio. Ela me leva até o parapeito e eu me encosto ali.

- Você dança bem! - Lud estava um pouco ofegante assim como eu.

- Obrigada. Você também!

Ela me encara ainda sorrindo.

- Você tá linda!

Sinto meu rosto esquentar violentamente e tinha certeza de que estava vermelha.

- Você também tá linda. Adorei sua calça!

- Obrigado!

Sorrio em resposta enquanto ela me encarava. Seus olhos estavam um pouco mais claros e mesmo com a baixa iluminação, eu conseguia vê-los brilhar. Lud não parava de sorrir um segundo sequer. Percebo que ela vai se aproximando aos poucos, meio passo de cada vez. Meu nervosismo vai crescendo cada vez mais e decido distrair minha mente. O céu estava aberto, sem nuvens. A lua cheia brilhava feito ouro e as estrelas desenhavam o céu. Era uma bela noite pra ganhar o primeiro beijo da garota que não sai da minha cabeça.

Quando ela finalmente fica a pouquíssimos centímetros de mim, seus olhos encaram minha boca e ela umedece seus lábios. O mesmo movimento que tinha feito hoje mais cedo. Sinto seus dedos tocarem os meus e engulo seco. Ela realmente iria me beijar?

Ela volta a me encarar e se aproxima mais.

- Lud! - Levo um susto quando três pessoas surgem do nada.

Ludmilla se afasta de uma vez e parecia tão assustada quanto eu.

- Tô te procurando a mó tempão cara.

- Daiane! - Ela diz entre dentes e me olha de soslaio.

A moça me encara e então sorri, sem graça.

- Desculpa...

- Quem é essa barbiezinha? - Um rapaz pegunta me encarando.

Ele era alto, tinha uma barbixinha ajeitada e um sorriso largo.

- Renatinho, essa é a Brunna. - Lud diz apontando pra mim. - Brunna, Renatinho.

- Prazer! - Estendo a mão e ele ri.

- Ai que bonitinha, gente. Toda educadinha. Vem cá! - Ele me puxa e me abraça. Um pouco apertado, mas era bom.

- Essa daqui é a Daiane! - Ele mostra a moça que foi buscar as flores hoje de manhã.

- Nós já nos vimos, mas não fomos apresentadas da forma certa. - A garota era bonita, tinha um cabelo cacheado lindo, magra, alta. Ela me abraça também me dando um beijo de cada lado do rosto.

- E eu sou Patrícia! - A outra moça surge e se apresenta. - Mas pode me chamar de Patty. Prazer! - Ela me abraça e eu já estava ficando tonta com tanto contato físico.

- E então, o que vocês estão fazendo aqui? - Renatinho pegunta e Ludmilla me encara.

- A gente só tava...

- Conversando!

- É! Conversando.

- Hum. - Ele cruza os braços e nos encara pelo canto dos olhos. - Sei.

- Onde vocês se conheceram? - Patty pergunta e percebo que já estávamos em uma roda.

- Brunna é a florista, lembram?

- Ahhhhh! - Todos soltam em uníssono e eu sorrio. A sincronia deles era boa.

- Então foi você quem nos salvou hoje! - Renatinho diz e as meninas concordam. - A gente tava ficando louco já, precisávamos de flores mas nenhuma floricultura tinha a quantidade que pedíamos. Até que nos recomendaram a sua, bem em cima da hora. Ainda bem que deu certo.

- Agradeçam a Ludmilla, ela quem me convenceu a vender, eu já tava fechando.

- É, a Lud é assim. - Patrícia diz abraçando a garota lateralmente. - Quando quer alguma coisa vai até o fim pra conseguir.

As duas se encaram de forma um tanto maliciosa e eu fico boiando ali. Logo outro assunto acabou engatando e eles faziam questão de me incluir sempre. Mesmo quando não sabia o que falar, um deles me explicava e eu logo tratava de participar da rodinha. Os amigos de Ludmilla eram doidos e eu acabei descobrindo que ela também. Ela tinha toda a marra dela, aquela cara de brava que parece que a qualquer minuto vai te dar um socão na cara, mas na real, Lud é um amor. Atenciosa, brincalhona e de sorriso fácil. E que sorriso...

Enquanto a música rolava lá dentro, aqui fora a festa parecia estar bem mais animada e interessante. Já tinha perdido a noção do tempo e espaço e agora estava apenas aproveitando a companhia daquelas pessoas. Como Renatinho era o DJ da festa, ele acabou ganhando bebida de cortesia e nós já estávamos no terceiro round de shots de tequila, minha visão já estava turva e levemente embaçada, minha língua se embolava um pouco na hora que eu falava e tudo já começava a ficar extremamente engraçado. Bom, já sabemos que eu teria que ir embora de táxi hoje.

- Eu juro cara! Foi super do nada. - Ludmilla terminava de contar a história em meio a risadas. - Aí ele virou e falou, mas você nem vai notar a diferença, ele é pequeno! - Ela diz imitando a voz do cara e então todos explodimos em uma risada.

Estávamos sentados em uma mesa que tinha no canto da varanda. Ludmilla me abraçava com o braço esquerdo e eu me segurava ao máximo pra não agarrar ela ali mesmo. Vez ou outra, Daiane trocava olhares com ela e eu apenas fingia que não estava vendo. Patty e eu conversávamos entre cochichos e Renatinho ficou o tempo todo me elogiando dizendo o quanto eu realmente parecia uma Barbie.

- E aquele dia do sorvete? Lembra? - Patty grita e todos riem. Até eu ri, mesmo sem nem saber o que era.

- Verdade! Brunna, aquele dia foi foda. A gente tinha combinado de ir na sorveteria...

- Amor! - Demoro um pouco pra assimilar o que tinha acontecido.

Ludmilla estava contando uma história engraçada, quando de repente, uma mulher surgiu chamando alguém. Ela se sentou no colo da Lud e na frente de todos, enfiou a língua dela na garganta da garota. Ludmilla a encarava de olhos abertos, tão atônita quanto eu. Assim que o "beijo" termina a garota a encara de volta e sorri.

- Senti sua falta!

Lud permanecia imóvel. Ela encarava a moça e todos os seus amigos estavam boquiabertos com a cena.

- Quem é sua amiguinha?

Sinto meu estômago se revirar e a vontade enorme de vomitar me atinge.

- Com licença. - Levanto ainda meio tonta e entro de volta na festa. Caminho, esbarrando nas pessoas, tentando chegar o mais rápido que podia no banheiro, mas o mundo parecia estar em câmera lenta e eu também.

Mal sentia meus pés saírem do lugar e a vontade de chorar só fazia crescer cada vez mais. Eu só queria sair dali. Sinto uma mão segurando meu braço e me viro pronta pra atingir um soco na cara de quem fosse, até que vejo Rafa.

- Brunna, tá tudo bem?

Encaro o rapaz e ele parecia preocupado. Logo atrás dele, Ludmilla vinha em nossa direção. Não penso duas vezes.

- Rafa, me leva embora!

- Você tem certeza?

- Sim! Só me leva embora.

- Ok, vou chamar o Uber.

Ele pega o celular e Ludmilla chega ainda mais perto. Ela me encara e eu encaro o rapaz. Ele destrava a tela do celular e Ludmilla para atrás de nós. Puxo Rafa pelo pescoço e o beijo. Nem sabia direito o que estava fazendo. Ele demora pra corresponder, mas logo o faz. Abro levemente os olhos e Lud continuava ali, parada, apenas observando. Separo o beijo e ele parecia em choque.

- Brunna...

- Eu quero ir embora!

Sinto as lágrimas invadirem meus olhos e ele volta a mexer no celular. Ludmilla se aproxima mais e sussurra em meu ouvido.

- Posso falar com você?

- Não!

- Brunna, por favor. - Ela toca meu braço e eu me afasto.

- Eu disse não!

Saio dali puxando Rafael e vamos até a porta.

- Pronto, o Uber vai chegar em cinco minutos.

- Vamo descendo.

Entramos no elevador e eu aperto o térreo. Encosto a cabeça na parede de ferro e sinto o olhar do rapaz queimar sobre mim. Não queria dizer nada agora. Quando o elevador para e as portas se abrem, saio de lá correndo e paro em frente a uma lixeira. Coloco tudo pra fora enquanto Rafa segura meu cabelo e faz um leve carinho em minhas costas. Me coloco de pé e ele me dá um lenço. Agradeço e seguimos até o carro. Entro me sentando do lado da janela e assim que o motorista começa a andar, eu apago.

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