Capítulo 20 - Descobertas

(1656 palavras)

Felicity

   Abri os olhos lentamente assim que os grãos de areia pararam de açoitar minha pele. Eu estava em um lugar do oceano totalmente diferente dos quais eu já havia estado. Parecia um daqueles templos construídos na Grécia Antiga, porém embaixo d'água. Era lindo! 

— Por favor, não surte! — ouço a voz de Flora quebrar meu momento de encanto.

    Eu poderia rir de seu pedido, afinal, eu tinha coisas muito mais chocantes para me fazer surtar do que isso.

— É preciso mais do que um templo antigo para me fazer surtar — declaro distraída, ainda observando o lugar.

— Eu estava falando sobre a perseguição e o teletransporte — Flora fala surpresa.

— Oh… Bem, isso foi bem inesperado mesmo. Como…

— Eu fiz isso? — Flora questiona completando minha fala.

— Nós não deveríamos falar sobre isso — Farrah finalmente se pronuncia.

— Ela já viu muito mais do que deveria, não tem como voltar atrás. Além do mais, eu acredito que ela vai guardar nosso segredo.

— Mas e se ela não guardar? — Farrah questiona em dúvida.

— Podem parar de falar como se eu não estivesse aqui ouvindo? — interrompo as duas — Não precisam me contar nada que não queiram okay? E eu prometo que não vou dizer a ninguém o que aconteceu hoje, seu segredo está seguro.

— Viu só? Podemos confiar nela! — Flora fala em direção a Farrah.

    Farrah suspira pesadamente parecendo se dar por vencida.

— De qualquer forma, tenho certeza que não vai funcionar novamente. Você sabe o que acontece quando tentamos falar sobre isso.

— Não custa tentar — Flora fala positiva — Além disso, Felicity é diferente de todos que já conhecemos, ela é de Karpata, nunca tentamos falar para alguém de Karpata.

— Bem, só por segurança então, faça-a jurar — ela pede para a irmã mais velha.

— Felicity — Flora se aproxima de mim com os olhos fixos nos meus — O que vamos te contar agora é um segredo que praticamente ninguém no reino sabe. Precisa prometer pela sua cauda que jamais contará isso para ninguém! Pelo menos, não agora. 

— Você está me assustando! — falo desviando meus olhos dos seus.

— Prometa! — ela ordena segurando-me com as mãos.

— Tá legal, eu prometo! — grito erguendo as mãos em um gesto de rendição.

     As duas irmãs se entreolham rapidamente e então Farrah começa a falar.

— A verdade é que… Não somos quem você pensa que somos…

   Olho para elas me sentindo levemente preocupada.

— Mas isso não significa que somos más! — Flora acrescenta rapidamente.

— Então o que vocês são? — pergunto com medo da resposta.

      Elas se entreolham novamente, em dúvida, mas por fim, Farrah se pronuncia.

— Somos as filhas do último rei que foi banido dos mares! — Farrah declara rapidamente, como se vomitasse as palavras ao mesmo tempo em que parece não acreditar que conseguiu dize-las.

    As duas irmãs se encaram surpresas e sorridentes ao mesmo tempo.

— Eu não acredito mesmo que funcionou! É inacreditável! — Flora fala sorrindo impressionada.

    Eu as observo sem esboçar qualquer reação instantânea. Elas o quê? Eu nem sabia que o antigo rei havia tido filhas! Então elas eram filhas de um assassino?  

— E antes que você possa pensar o pior dele, não, ele não matou a nossa mãe! Ele foi acusado injustamente e agora precisa viver exilado na terra como um peixe fora d'água e ainda ser tachado por todos os sete mares como o vilão da história! — Flora se pronuncia, novamente chocada com as palavras que saem da sua boca e, em sincronia, com os olhos marejados de lágrimas.

— Como vocês podem ter tanta certeza que ele não assassinou a esposa? — pergunto.

— Porque ela não está morta — Farrah declara — Nossa mãe está dentro desse templo que você está vendo — ela fala apontando para o templo à nossa frente.

    Encaro-a como se ela fosse uma louca delirando. Se a mãe está viva e o pai foi condenado injustamente, então por que ela não aparece a todos e prova a inocência do marido?

— Eu sei o que você deve estar se perguntando agora — Flora fala — Por que nossa mãe não prova a inocência do nosso pai, certo?

— Você também lê mentes agora? — pergunto desconfiada. 

— Infelizmente não, mas não é difícil imaginar a dúvida pela expressão em seu olhar, você é muito expressiva.

— E então? — questiono.

— Nossa mãe foi amaldiçoada a ficar presa nesse templo por um feitiço lançado por um dos seres mais antigos desse mar, o obscuro Solberg! — Farrah conta — Ele sempre foi obcecado pela mamãe, mesmo antes que ela se casasse com o papai, os dois chegaram a ter um romance antes que ele se deixasse ser corrompido pela ganância em se tornar o rei. A sua sede por poder o fez perder o amor de nossa mãe, que acabou se apaixonando por nosso pai que, na época, ainda era o príncipe herdeiro. 

— E como foi que as coisas acabaram como estão? — pergunto curiosa.

— Logo após nosso pai herdar o trono e o poder do tridente, ele e mamãe se casaram. Pouco tempo depois eu fui concebida — Flora conta concentrada — mas Solberg nunca aceitou a derrota, então ele trabalhou durante anos para conseguir banir nosso pai do mar de alguma forma. E conseguiu. — ela declara cabisbaixa — No entanto, ele não teve coragem de verdadeiramente assassinar nossa mãe para incriminar o rei, na verdade ele queria levar nossa mãe para as profundezas obscuras do oceano e obrigá-la a ficar com ele. Mas ela jamais aceitaria isso, e quando ele viu que não conseguiria o que queria, a aprisionou nesse templo por toda a eternidade.

— Isso é… Horrível! — falo chocada e, por algum motivo que não sabia explicar, senti meu coração se apertar dentro do peito com uma dor inexplicável. Lágrimas involuntárias caíram dos meus olhos.

— Farrah e eu éramos apenas adolescentes quando tudo aconteceu, mas desde então não cessamos em tentar libertar nossa mãe e provar a inocência de nosso pai. — Flora fala determinada — Solberg sabe de nossos planos então está sempre mandando alguém para tentar nos matar. Normalmente conseguimos nos esconder com pequenos feitiços de ocultação, mas eu não sei o que aconteceu hoje que nos fez sermos encontradas.

— De qualquer forma, deve existir uma maneira de libertar a mãe de vocês desse lugar! — falo angustiada.

— Os únicos seres capazes de quebrar a maldição são os que pertencem à linhagem de Solberg e, infelizmente, seu único filho é tão ruim quanto ele — Farrah suspira pesadamente.

— Conhecem o filho dele? — pergunto esperançosa, talvez seja possível convencê-lo de alguma forma.

— Ele aparece no reino algumas vezes, é provável que venha para a festa dos sete mares, ele tem prazer em tornar um ambiente harmonioso em algo caótico — Flora fala enojada — Eu tenho arrepios apenas de pensar nele.

— Como vocês descobriram sobre o templo? E como souberam que a mãe de vocês estava viva? — questiono curiosa.

— Nossa mãe sabia que em algum momento Solberg iria fazer algo para destruir nossa família, então ela confeccionou colares mágicos com o poder de ligar a energia dela com a nossa. Logo que tudo aconteceu e o boato de sua morte se espalhou, percebemos que a energia de nossa mãe apenas enfraqueceu, mas não deixou de existir. Então soubemos que ela estava viva. Farrah e eu procuramos incansavelmente desde então, até que encontramos um tritão que tem o dom de saber exatamente onde alguém está, desde que pense naquele ser. Qual era mesmo o nome dele? — Flora leva um dedo ao queixo pensativa, tentando lembrar o nome do tritão.

— Darvin? — arrisco, mesmo já sabendo que ele era o único tritão que tinha esse poder.

— Isso! Ele mesmo! — ela responde sorrindo — Como você sabia? Você o conhece?

— Até demais — falo revirando os olhos.

— Você também precisou dos serviços dele? — Farrah pergunta curiosa.

— Digamos que sim… Mas não para a mesma coisa que vocês… Enfim, eu estava pensando — volto ao assunto anterior — o rei com certeza consegue quebrar a maldição do templo com o tridente! Podemos procurá-lo!

— Você acha que nunca pensamos nisso? — Farrah pergunta cabisbaixa — Não sabemos que tipo de magia negra Solberg usou, mas toda vez que tentamos falar sobre isso com alguém, nossa voz não sai. Toda vez que tentamos trazer alguém até aqui, paralisamos e não conseguimos. Pra ser sincera, não entendo como conseguimos te trazer aqui e como estamos conseguindo te contar tudo isso.

— Por isso vocês pareciam tão surpresas? — pergunto entendendo a reação delas.

    Elas assentem com a cabeça.

— E por que me fizeram prometer não contar a ninguém? — pergunto confusa.

— Te fizemos prometer não contar a ninguém que somos filhas do antigo rei, estaríamos enrascadas se descobrissem isso antes de provarmos a inocência de nosso pai. Mas se você conseguir contar ao rei que nossa mãe está viva e nosso pai é inocente, você será nossa heroína para sempre! — Flora fala animada como sempre.

— Sim! Talvez você realmente consiga fazer isso! — Farrah concorda com a irmã — Ah Felicity, você poderia fazer isso por nós? — ela pede com um olhar esperançoso.

    Eu não tinha muito o que pensar, é óbvio que eu faria tudo o que fosse possível para ajudá-las a recuperar sua família. 

— É claro que eu faria! Eu vou contar isso hoje mesmo ao rei! 

    As duas irmãs nadam em minha direção e, sem que eu esperasse, me abraçam chorando.

— Muito obrigada mesmo, Feli! — Farrah fala.

— Sim, você é como um raio de esperança para nós! Não sei como não havíamos pensado antes em procurar uma sereia de Karpata! Mas o importante é que você está aqui agora, o destino te trouxe até nós! — Flora acrescenta.

    O olhar de esperança no semblante das irmãs fez meu coração se encher de culpa por elas pensarem que sou de Karpata. Talvez eu não conseguisse contar para o rei, afinal de contas, eu não era de Karpata e muito menos sereia. Elas estavam depositando tanta expectativa em mim, que eu sentia medo de decepcioná-las no fim… Talvez fosse melhor dizer a verdade agora…

— Sobre isso… — começo receosa — Eu acho que… Vocês merecem saber sobre o meu segredo também…

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