• Arauto do Submundo, de Ananda Gron

        • Título: Arauto do Submundo
        • Autora: Ananda Gron (AnandaGron)
        • Gênero: Fantasia

     Nem só de calhamaços de distopia vive Ananda Gron, e é em Arauto do Submundo que a autora deixa de lado muitas das fórmulas usadas em Lua Vermelha — obra já resenhada pelo Ponto Crítico —, e aposta dessa vez num conto curto de fantasia. Aqui, conhecemos Rafaela, uma jovem que descobre ser arauto de um deus que a ignora e que desdenha de seu potencial. Como arauto, a garota tem grandes dons, mas também grandes maldições; caçada por crimes que não cometeu, ela terá que fugir daqueles que tentam capturá-la, enquanto busca formas de cumprir a missão a qual foi encarregada. 

     De uma capa de belo acabamento a uma sinopse enigmática, os elementos de apresentação de Arauto do Submundo são capazes de nos envolver sem entregar as reais intenções da história. É somente com o início da leitura que a obra mostra sua verdadeira face e, pouco a pouco, o leitor vai compreendendo onde está pisando e por onde Gron pretende o levar nessa curta aventura. E se em Lua Vermelha a autora dá vida a um universo de ficção científica distópica com muita qualidade, aqui vemos um novo e surpreendente lado seu, com a criação de uma fantasia urbana repleta de brasilidade. 

     São muitos os pontos técnicos em que a obra tem êxito. Gron aposta em um texto dinâmico, bem lapidado, de parágrafos curtos, frases rápidas e diálogos simples e naturais para dar forma a sua narrativa. E por falar em simplicidade, essa com certeza é uma das características mais fortes do conto. Seu texto é direto e, com uma linguagem  acessível a qualquer público, o enredo consegue cativar pela criação de universo. Essa dinamicidade também faz com que os personagens aparecem sem muito aprofundamento, no entanto isso não parece afetar negativamente a história, pois somos expostos ao essencial de cada um deles; o suficiente para entendermos suas origens, suas essências e nos envolvermos com o drama colocado sobre os ombros de cada um — mesmo que isso aconteça de forma sutil.

     No entanto, acima de qualquer técnica bem aplicada, considero que estamos diante de um conto que também tem a capacidade de mexer bastante com aspectos subjetivos do leitor. Apostando na brasilidade, a obra se apossa de nomes comuns para seus personagens, além de uma ambientação que, não só brasileira, também traz um quê de regionalismo paulistano. O ponto de maior brilho, todavia, está na parte fantástica; na mitologia indígena que é usada para construir o seu universo, trazendo uma familiaridade cultural que alegra a quem está atento a esses detalhes. A presença de deuses indígenas não só fortalece a sensação de estarmos diante de uma ambientação nacional, como também dá ao texto a originalidade necessária e, como uma cereja do bolo, consegue arrebatar de vez os leitores mais ariscos. 

     Com um clímax recheado de ação e magia, o conto se encerra com a mesma simplicidade de seu início, sem grandes reviravoltas, mas conseguindo manter a atenção do leitor até seu último parágrafo. O desfecho é forte na medida adequada e acerta ao dar destaque para os elementos principais, ao dar fim ao pequeno conflito instaurado desde o início da história, nos comovendo com uma certa singeleza e fazendo da curta leitura um instante bom de fuga da realidade. O que fica após o término é a vontade de conhecer mais sobre Rafaela e sobre os demais arautos; desvendar mais sobre suas origens mágicas e, principalmente, sobre a difícil vida da protagonista nesse meio hostil. 

     Arauto do Submundo é, então, uma ótima leitura a ser feita dentro da plataforma. Acessível a qualquer público, a fantasia urbana consegue divertir enquanto levanta, a nós escritores, reflexões importantes acerca de como narrativas simples são subestimadas. Também não deixa de nos abrir os olhos para o quão subaproveitada é a fantasia nacional. Quantas histórias ainda podem ser escritas e lidas sobre os deuses indígenas e suas criaturas mitológicas? Quantos gêneros literários podem beber dessa fonte? Aqui, estamos diante de um exemplo de sucesso nessa abordagem; um texto que pode servir de motivação para quem ainda receia mergulhar nessas águas que, à primeira vista, possam parecer turvas. 

Nota: 9,7

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